O NEOCONSERVADORISMO COMO AGENDA PARA A POLÍTICA EDUCACIONAL: UMA ANÁLISE DO DISCURSO DA “IDEOLOGIA DE GÊNERO” EM NOTÍCIAS DA INTERNET (2019-2021)
Resumo
Nas últimas décadas presenciamos no cenário político de países da América Latina e da Europa o avanço do neoconservadorismo nas disputas de agendas para a política pública. No Brasil, os atores religiosos da vertente cristã conservadora aparecem no centro das disputas em torno das questões de gênero e sexualidades na educação. Objetivo: A finalidade deste trabalho é analisar o discurso da “ideologia de gênero” nas notícias divulgadas na rede de internet, no período de 2019 a 2021, identificando seus sujeitos, sentidos de gênero reiterados e os impactos para a política educacional. Método: Trata-se de estudo qualitativo de cunho exploratório e analítico. As notícias acerca da “ideologia de gênero” foram levantadas por meio do site de busca Google, com o uso de descritores específicos. Selecionamos o filtro “notícias” e no link “ferramenta” personalizamos o intervalo de tempo, por ano, semanalmente e/ou diariamente, excluindo as notícias repetidas, publicadas em diferentes sites. As notícias acerca da “ideologia de gênero” foram analisadas como discursos segundo a teoria Michel de Foucault, tendo como embasamento os referenciais teóricos dos estudos de gênero e do neoconservadorismo. Resultados: Nos três primeiros anos do governo Bolsonaro foram mapeadas um total de 204 notícias sobre “ideologia de gênero”, sendo 36 no ano de 2019, 60 em 2020 e 108 em 2021. As notícias evidenciam o que ocorreu no cenário político e apontam que o governo tem mantido a disputa insistente pela agenda conservadora acerca do controle de temas de gênero e sexualidades na educação. Encontrou-se discursos de sujeitos que se posicionavam contra a “ideologia de gênero” e também daqueles que defendiam a importância do debate de gênero. Assim, nas notícias mapeadas em 2019 encontramos 35 posicionamentos de sujeitos contra, indicando 79,54% do total, em 2020 os posicionamentos contra apresentam menos força em relação ao ano anterior, com 54,28% dos posicionamentos encontrados, no ano de 2021, obteve-se nas notícias 126 posicionamentos, sendo 69,49% contra e 36,51% defensores do debate de gênero. Segundo as notícias, os principais sujeitos que se posicionaram contra gênero foram a Ministra Damares, o Presidente Bolsonaro e políticos que atuam no Congresso, de partidos que representam forças neoconservadoras. Conclusão: Os dados analisados evidenciam que a enunciação do discurso da “ideologia de gênero” não somente foi recorrente como se ampliou nos três anos de governo Bolsonaro. E isso evidencia um cenário em que as forças políticas conservadoras, que vem atuando no executivo e no legislativo, têm mobilizado discursos, estratégias e ações na tentativa de implementar uma agenda conservadora no campo das políticas educacionais. Como estratégia política os atores conservadores têm reiterado sentidos distorcidos da categoria de gênero no intuito de fortalecer o pânico moral na população e encontrar apoio da opinião pública para avançar nos seus interesses. Faz-se necessário denunciar a sustentação equivocada do enunciado da “ideologia de gênero” proposta pelos grupos conservadores, que ameaça não somente o caráter político e transformador da educação pública e democrática, como, também, fomenta um pânico moral generalizado na população, enfraquecendo o projeto de uma sociedade pautada na convivência plural, pacífica e igualitária.