CUMPRIMENTO DOS DESEJOS DO PACIENTE POR MEIO DAS DIRETIVAS ANTECIPADAS DE VONTADE
Resumen
As diretivas antecipadas de vontade (DAV) constituem um gênero de manifestação de vontade para tratamento médico, do qual são espécies o testamento vital e o mandato duradouro (DADALTO; TUPINAMBÁ; GRECO, 2013). O testamento surgiu nos Estados Unidos, após grande publicidade do “caso Cruzan”, para proteger o direito individual do paciente e garantir-lhe uma morte digna. Antes disso, já havia uma luta em favor da eutanásia – prática pela qual se abrevia a vida de um enfermo incurável de maneira controlada e assistida por um especialista. Neste trabalho, objetivou-se analisar a importância da universalização da aplicação das DAV no Brasil e sua regulamentação jurídica, com o intuito de ajudar médicos e familiares a cumprirem as vontades do doente quando ele estiver incapaz de decidir. O método utilizado foi a busca on-line por resoluções do Conselho Federal de Medicina e por artigos relacionados ao assunto, dos quais foram selecionados seis: Diretivas antecipadas de vontade: um modelo brasileiro; Terminalidade da vida e diretiva antecipada de vontade do paciente; Testamento vital: o que pensam profissionais de saúde?; Diretivas antecipadas de vontade: benefícios, obstáculos e limites; Testamento vital: percepção de pacientes oncológicos e acompanhantes; e Declaração prévia da vontade do paciente terminal: reflexão bioética. A partir da metade do século XX, a medicina sofreu avanços tecnológicos e diagnósticos na parte clínica, preventiva e cirúrgica. Em vista disso, a vida passou a ser o cerne das ações e das descobertas, com o intuito de adiar a morte, a qual passou a ser vista como uma inimiga a ser vencida a qualquer custo. Embora o prolongamento da vida seja benéfico, percebe-se como contraditório o fato de se manter uma vida que já apresenta sinais de morte, situação que leva o indivíduo, por vezes, a negar a presença da morte ou sentir-se fracassado diante dela. [CS1] Fica o dilema de quando se deve envolver todos os esforços possíveis em tratamentos para o prolongamento exagerado da vida[CS2] – a distanásia – e quando se deve cessá-los para evitar um prolongamento além do natural – a ortotanásia. Entrementes, na composição da carreira médica e no seu longo tempo de formação, a manutenção da vida é o coração, a fim de que não se perca a essência da alma humana, por mais que a dignidade seja violada. À contramão disso, as DAV impõem ao profissional uma conduta sentimental, a qual coloca o médico na situação do paciente, isto é, de respeitar sua vontade mesmo que seja contrária à vida. Os limites para que o respeito à vontade do paciente de viver fosse preservado estiveram estagnados, levando à tona as questões legais e humanas sobre a dignidade da vida. Com isso, o Conselho Federal de Medicina (CFM), após dois anos de estudos, aprovou a inserção das diretivas antecipadas de vontade (DAV) – também conhecidas como Testamento Vital ou Living Will, em inglês – no âmbito da ética médica, em agosto de 2012. É um norte para o médico se aproximar do desejo do paciente em relação aos tratamentos e limites terapêuticos aos quais quer ser submetido. As DAV indicam os critérios que qualquer pessoa pode usar para estabelecer suas vontades, com seu médico, quanto às suas preferências, e ainda autorizar outra pessoa a decidir por si. A resolução define as [CS3] diretivas antecipadas de vontade como o conjunto de desejos expressos previamente pelo paciente a respeito de tratamentos e cuidados que quer ou não receber quando estiver incapaz de se expressar;nesses casos o médico considera suas diretivas antecipadas de vontade, e caso o paciente designe um responsável para tomar as decisões, o médico respeitará essas informações; elas serão registradas no prontuário do paciente e ele somente deixará de respeitá-las se estiverem em desacordo com o Código de Ética Médica.
Os principais efeitos positivos da DAV se relacionam com realizar o desejo do paciente por tratamentos menos invasivos, predominantemente paliativos no final de vida; facilitar as discussões de final de vida; ajudar no alcance de um consenso e fornecer clareza para outros membros da equipe multiprofissional e familiares com relação ao cuidado. (NUNES; ANJOS, 2014).
Com base na análise, é assegurada ao paciente a livre elaboração, modificação e revogação do documento a qualquer momento de sua vida. O instrumento visa garantir e proteger a autonomia do paciente, além de fazer com que ele pense a respeito de possíveis doenças e sua morte, para que converse com seu médico e familiares sobre sua visão a respeito dessas questões. O principal empasse na efetiva aplicação das diretivas está em uma cultura que nega a autorresponsabilização por sua própria condição de finitude acrescido de – em relação à quantidade de profissionais e de pacientes – um vago conhecimento de tal documento por essas pessoas.
Embora se trate de documento muito bem aceito entre os profissionais de saúde, o testamento vital encontra um grande entrave à sua aplicação: o fato de ser pouco conhecido pelos próprios profissionais. Os dados [...] atentam para a importância de ampliar a discussão do tema entre os profissionais de saúde [...] (CHEHUEN NETO, 2015).
Segundo Nunes e Anjos (2014), cada um idealiza sua forma de morrer, mas quando se está saudável não se consegue refletir sobre isso, e o assunto surgirá somente quando a morte estiver iminente. A morte precisa ser encarada de maneira mais construtiva, como uma fase inevitável. O objetivo do testamento vital, além de garantir que as vontades do paciente sejam cumpridas mesmo no fim de sua vida, é também ajudá-lo a refletir sobre o morrer e “[...] atribuir a esse fenômeno fúnebre um caráter mais humano.” (LINGERFELT et al., 2013). A literatura mostra, ainda, que a participação do paciente nas decisões sobre seu tratamento traduz melhores resultados, reforçando a importância da manifestação de seus desejos tanto para os profissionais da saúde responsáveis por seu cuidado quanto para seus familiares. É importante que o Brasil leve outros países como exemplo, principalmente a Itália, que movimentou positivamente a opinião pública, dos católicos e dos médicos, aplaudindo de pé a aprovação da lei que levou as DAV para o campo jurídico. Lá, o Código de Ética Médica segue exatamente as vontades antecipadas dos pacientes, e essa medida também foi aderida na Espanha alguns anos antes. Consoante estudo de Dadalto, Tupinambás e Greco, o aumento da expectativa de vida no Brasil e o fato de as patologias mais comuns nessa população serem multifacetadas e com perda de capacidades, enfatiza a necessidade de efetiva aplicação das DAV. Esse tema abrange não somente a garantia do direito à autonomia do paciente, mas também a sua relevância no fortalecimento da relação médico-paciente. Além disso, a transferência de suas vontades para um documento é mais acessível quando a pessoa está sadia do que no momento em que recebe um diagnóstico ruim. Segundo os dados coletados e explanados pelo artigo Testamento Vital: percepção dos pacientes oncológicos e acompanhantes, realizado no Serviço de Oncologia do Hospital Universitário Santa Terezinha (HUST), do Município de Joaçaba, SC, concluiu-se que a aceitação do testamento vital é proporcional ao tempo em que a pessoa está em tratamento, isto é, quanto mais longa a terapia, maior será a aceitação. Ademais, a adesão do testamento vital no Brasil foi amplamente aceita pelos pesquisados, em que apenas um fator se mostrou frágil quanto a essa vontade idiossincrática: a idade. Tal resultado mostrou que a experiência de vida é mister para melhor preparo das respostas do testamento vital, ou seja, os jovens não são muito propensos a responder quando o assunto é doença ou morte. A pesquisa revela, ainda, grande aclamação pela regulamentação jurídica do testamento, a qual “[...] obteve a concordância plena de 90,9% dos pacientes e 94,4% dos acompanhantes, denotando o elevado valor atribuído por ambos os grupos ao testamento vital.” (BONAMIGO et al., 2012).
[...] é imperioso que se faça uma campanha de conscientização dos cidadãos brasileiros acerca da importância do respeito à vontade de seus familiares, objetivando evitar conflito entre a vontade manifesta na DAV e a vontade da família. Como esta campanha é um esforço paulatino, entende-se que para tentar amenizar o conflito de vontade de forma imediata será necessário que os médicos conversem com as famílias quando forem informá-las da existência da DAV e que os hospitais mantenham psicólogos e assistentes sociais com esta habilidade. (DADALTO; TUPINAMBÁ; GRECO, 2013).
Em suma, as diretivas antecipadas de vontade – devidamente esclarecidas pelas pessoas tanto durante a vida sadia quanto em seu leito de morte – facilitam e norteiam as ações médicas em relação ao tratamento, fundamental para agilizar e para determinar o caminho a ser seguido. Muitas vezes, tal documento diminui os gastos públicos na saúde e poupa esforços aos profissionais quanto ao desgaste físico e mental. A implementação das DAV é, consoante a pesquisa supracitada, bem aceita tanto por profissionais da saúde quanto por usuários e seus familiares, já que respeita não somente a moral do paciente, mas também facilita a decisão médica no tratamento.
Palavras-chave: Diretivas Antecipadas de Vontade. Testamento vital. Respeito à autonomia. Regulamentação jurídica.
[CS1]Embora o prolongamento da vida seja benéfico, percebe-se como contraditório o fato de se manter uma vida que já apresenta sinais de morte, situação que leva o indivíduo por vezes a negar a presença da morte ou sentir-se fracassado diante dela.
[CS2]vida
[CS3]A resolução define as
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Citas
BONAMIGO, Elcio Luiz et al. Testamento vital: percepção de pacientes oncológicos e acompanhantes, Revista Bioethikos, São Paulo, v. 6, n. 6, jul./set., 2012. Disponível em: <http://www.saocamilo-sp.br/pdf/bioethikos/96/1.pdf>. Acesso em 03/05/2016.
CHEHUEN NETO, José Antônio et al.Testamento vital: o que pensam profissionais de saúde?, Revista Bioética, Brasília, v. 123, n. 3, set./dez., 2015. Disponível em:<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1983-80422015000300572>. Acesso em: 03/07/2016.
NUNES, Maria Inês; ANJOS, Marcio Fabri dos. Diretivas anrecipadas de vontade: benefícios, obstáculos e limites. Revista Bioética, Brasília, v.22, n.2, maio/ago., 2014. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1983-80422014000200006>. Acesso em: 06/05/2016.
DADALTO, Luciana, TUPINAMBÁM, Unai; GRECO, Dirceu Bartolomeu. Diretivas antecipadas de vontade: um modelo brasileiro. Revista Bioética, Brasília, v.21, n.3, set./dez., 2013. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1983-80422013000300011>. Acesso em: 07/05/21016.
ROCHA, Andréia Ribeiro da. Declaração prévia da vontade do paciente terminal: reflexão bioética. Revista Bioética, Brasília, v.21, n.1, set./dez., 2013. Disponível em: <http://revistabioetica.cfm.org.br/index.php/revista_bioetica/article/view/790/859>. Acesso em: 08/05/2016.
LINGERFELT, David et al. Terminalidade da vida e diretivas antecipadas de vontade do paciente. Revista UNIFACS, Salvador, 2013. Disponível em:<http://www.revistas.unifacs.br/index.php/redu/article/viewFile/2470/1813>. Acesso em: 09/05/2016.