A visão bioética a respeito da vacinação
Resumo
Introdução: A aplicação da política de vacinação foi um dos maiores avanços no controle e erradicação de doenças infectocontagiosas; no entanto, aspectos, sobretudo relacionados à autonomia humana, tornaram-na uma das questões bioéticas mais polêmicas e contraditórias da atualidade. Objetivo: Com o presente trabalho objetivou-se apontar a visão bioética a respeito da vacinação no âmbito individual e coletivo. Metodologia: Trata-se de uma pesquisa bibliográfica em que se buscaram on-line nove artigos nas bases científicas Scielo e Pubmed, na revista The Lancet e nos boletins da OMS, no período de 2005 a 2017, em português, inglês e espanhol, utilizando as palavras-chave: imunização, autonomia, bioética e saúde pública, dos quais seis foram utilizados. Resultados: Embora a doença infecciosa deva ser reconhecida como um tópico de importância primordial para a bioética, percebe-se que o tema recebeu relativamente pouca atenção da disciplina de bioética em comparação com assuntos como aborto, eutanásia, genética, clonagem e pesquisa com células-tronco (SELGELIJD, 2005). No Brasil, o Programa Nacional de Imunizações ocasiona contradições na bioética principalista, uma vez que esta, em prol do bem comum, deixa de ser cumprida enquanto fere os princípios da autonomia, não maleficência, beneficência e justiça (LESSA; DÓREA, 2013). Esses princípios são seguidos na prática clínica; já na abrangência de saúde pública são menos valorizados a fim de preservar o interesse coletivo (IRIAT, 2017). Segundo Ramon e Cruz (2006), o êxito da ação médica, a partir do ponto de vista ético, está relacionado ao processo em si, e não depende do resultado que poderia ter para o paciente. O Conselho Econômico e Social das Nações Unidas declara que a saúde pública pode ser um motivo para limitar determinados direitos, a fim de permitir que o Estado tome medidas que tratem de uma séria ameaça à saúde da população ou dos membros individuais (MOODLEY et al., 2016). A saúde pública define seu êxito em função das consequências de seus objetivos; os métodos utilizados seriam adequados para alcançar esses objetivos. Sobre a vacinação, há divergência referente aos efeitos das vacinas em países com quadros socioeconômicos distintos; em países desenvolvidos, por vezes, a preocupação com os efeitos adversos se sobrepõe ao risco de contaminação pela doença infecciosa. Para Lessa e Dórea (2013), os riscos de exposição e/ou de adquirir certos tipos de doenças são diferenciados, já que sofrem a influência de vários fatores. Em países menos desenvolvidos não há tanta preocupação nesse aspecto, em razão da constante exposição aos problemas relacionados às doenças infectocontagiosas, e, nesse caso, os riscos de contaminação se sobrepõem, sim, aos de efeito adverso. Os profissionais de saúde visam cumprir os princípios da beneficência e não maleficência, visto que o custo/benefício da aplicação da vacina fica em jogo, sendo que, por um lado, visa-se prevenir o contágio e, por outro, expõe-se o paciente aos efeitos colaterais, e, a partir disso, a bioética torna-se ineficiente para a análise crítica nessa situação (LESSA; DÓREA, 2013). Conforme Lessa e Schramm (2014), não há como distribuir, de forma equitativa, tanto os benefícios quanto os riscos da vacinação entre a população. Conclusão: Conclui-se que, de modo geral, os bioeticistas e profissionais de saúde entendem que no interesse da saúde coletiva a proteção da população deve prevalecer sobre a autonomia do indivíduo.
Palavras-chave: Autonomia. Beneficência. Bem comum. Vacinação.
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Referências
IRIAT, J. A. B. Autonomia individual vs. proteção coletiva: a não vacinação infantil entre camadas de maior renda/escolaridade como desafio para a saúde pública. Cadernos de Saúde Pública, v. 33, n. 2, p. 1-3, 2017.
LESSA, S. de C.; SCHRAMM, F. R. Proteção individual versus proteção coletiva: análise bioética do programa nacional de vacinação infantil em massa. Ciência & Saúde Coletiva, v. 20, n. 1, p. 115-124, 2010.
LESSA, S. de C.; DÓREA, J. G. Bioética e vacinação infantil em massa. Revista Bioética, v. 21, n. 2, p. 226-236, 2010.
MOODLEY, K. et al. Ethical considerations for vaccination programmes in acute humanitarian emergencies. Bulletin of the World Health Organization, v. 91, p. 290-297, 2013.
SÁNCHEZ-RAMÓN, S.; FERNÁNDEZ-CRUZ, E. Reflexión bioética sobre la immunización de masas en Europa. Imnulogia, v. 25, n. 1, p. 67-71, 2006.
SELGELID, M. J. Ethics and infecticous disease. Bioethics, v. 19, i. 3, p. 272-289, 2005.