Morte encefálica: perspectiva familiar frente à doação de orgãos
Resumo
Introdução: Morte encefálica é o comprometimento irreversível das funções do cérebro e tronco encefálico cujo diagnóstico ocorre após identificação da causa e da irreversibilidade do coma, exclusão de causas metabólicas e de intoxicação exógena (MORATTO, 2009). Entretanto, em razão da manutenção hemodinâmica, para os familiares há dificuldade de aceitação de morte encefálica como morte do organismo (RODRIGUES, 2015). Objetivo: Analisar os motivos quanto à dificuldade de aceitação da doação de órgãos pelos pacientes, sobretudo diante das diferentes orientações éticas e legais existentes, e propor estratégias de incentivo. Metodologia: Utilizou-se referencial de pesquisa descritiva com abordagem qualitativa revisando publicações na área da saúde com base em dados científicos do Scielo, Google Acadêmico e legislação pertinente. Resultados: Segundo o Artigo 4º da Lei n. 10.211 (2001), a retirada de tecidos, órgãos e partes do corpo de pessoas falecidas para transplantes ou outra finalidade terapêutica dependerá da autorização do cônjuge ou parente, maior de idade, obedecida a linha sucessória, reta ou colateral, até o segundo grau inclusive. Entretanto, a resolução CFM n. 1.995/12 determina aos médicos que as diretivas antecipadas do paciente prevalecerão sobre qualquer outro parecer não médico, inclusive sobre os desejos dos familiares. Para reforçar essa ideia de autonomia, a Lei n. 10.406/2002 (BRASIL, 2002), por meio do artigo 14, permite que o indivíduo disponha, gratuitamente, com objetivo científico ou altruístico, de seu próprio corpo, no todo ou em parte, para depois da morte. Segundo Morais (2012), após diagnosticar a morte encefálica, um dos principais focos dos profissionais da saúde, além do acolhimento da família, é consultá-la sobre a possibilidade de doação de órgãos. A recusa familiar mostra-se como empecilho à realidade dos transplantes na morte encefálica, o que reduz o número de doadores para atender à demanda progressiva de receptores em espera. Conforme descreve Santos (2005), os motivos que colaboram para essa rejeição provêm do fato de o paciente apresentar batimentos cardíacos, movimentos respiratórios e temperatura corpórea, uma vez que muitas famílias acreditam que a morte ocorre apenas após a parada cardíaca. Ademais, crença religiosa, falta de empatia dos profissionais, esperança na reversão do quadro, recusa à manipulação do corpo e falta de informação a respeito do processo são fatores que acentuam a negativa ao transplante. Algumas estratégias de incentivo podem ser utilizadas para reverter essa aflição, como educação para profissionais da área, direcionada à comunicação de más notícias, ao acolhimento e respeito à família enlutada e ao esclarecimento da irreversibilidade da morte encefálica e do processo de transplante dos órgãos (MORAIS, 2012). Além disso, a discussão prévia dentro das famílias é favorável ao consentimento da doação. Conclusão: Conclui-se que a pouca clareza da legislação sobre doação de órgãos, além da questão cultural, pode gerar interpretações equivocadas e dificultar a compreensão das famílias quanto à morte encefálica, resultando em recusa à doação de órgãos. Dessa forma, levando-se em consideração tanto o bem comum quanto o direito de decisão do paciente sobre seu próprio corpo após a morte, infere-se a necessidade de se ampliar o esclarecimento à população sobre a irreversibilidade clínica da morte encefálica e sobre os benefícios advindos do transplante, sem deixar de respeitar a autonomia que é conferida ao paciente nessa decisão.
Palavras-chave: Morte. Morte encefálica. Doação de órgãos.
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Referências
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