https://doi.org/10.18593/r.v48.30648

Empreendedor em festa: uma análise discursiva de coleções didáticas de Projeto de Vida

Entrepreneur in celebration: a discursive analysis of didactic collections from Projeto de Vida

Emprendedor en fiesta: un análisis discursivo de colecciones didácticas de Projeto de Vida

Francisco Vieira da Silva1

Universidade Federal Rural do Semi-Árido; Docente do Departamento de Linguagens e Ciências Humanas. https://orcid.org/0000-0003-4922-8826

Resumo: O texto analisa discursos presentes em três coleções didáticas de Projeto de Vida, com vistas a compreender o funcionamento de relações de saber-poder de natureza neoliberal que corporificam a figura do empreendedor na construção desses materiais, cotejando com as condições sociopolíticas e históricas que possibilitaram mudanças recentes nas políticas curriculares do ensino médio. Para isso, sustenta-se teoricamente nos postulados de Foucault (2010) Dardot e Laval (2016), Laval (2004), Macedo (2019) e Lopes (2019). Quanto à metodologia, trata-se de um trabalho documental de natureza qualitativa. As análises possibilitam constatar o funcionamento de relações de saber-poder que constroem de maneira positiva o sujeito empreendedor, como sendo atuante, inovador e ousado e, com isso, busca convencer os jovens a aderirem a esse perfil, operando, assim, um currículo em conformidade com o modus operandi do neoliberalismo.

Palavras-chave: discurso; projeto de Vida; empreendedor; currículo.

Abstract: The text analyzes discourses present in three didactic collections which books are named Life Project, with a view to understanding the operation of knowledge-power relations of neoliberal nature that embody the figure of the entrepreneur in the construction of these materials, collating with the socio-political and historical conditions that have enabled recent changes in curriculum policies of high school. To achieve that, our work is theoretically supported by Foucault’s postulates (2010) Dardot and Laval (2016), Laval (2004), Macedo (2019) and Lopes (2019). As for the methodology, this is a documentary work of a qualitative nature. The analyses make it possible to verify the operation of knowledge-power relations that positively construct the entrepreneurial subject as being active, innovative, and daring, and thus seek to convince young people to adhere to this profile, thus operating a curriculum in accordance with the modus operandi of neoliberalism.

Keywords: discourse. life project; entrepreneur; curriculum.

Resumen: El texto analiza discursos presentes en tres colecciones didácticas de Proyecto de Vida, a fin de comprender el funcionamiento de relaciones de saber-poder de naturaleza neoliberal, las cuales corporifican la figura del emprendedor en la construcción de esos materiales, confrontando con las condiciones sociopolíticas e históricas que posibilitaron cambios recientes en las políticas curriculares de la educación secundaria. Para ello, se sustenta teóricamente en los postulados de Foucault (2010) Dardot y Laval (2016), Laval (2004), Macedo (2019) y Lopes (2019). Con respecto a la metodología, se trata de un trabajo documental de naturaleza cualitativa. Los análisis posibilitan constatar el funcionamiento de relaciones de saber-poder que construyen de manera positiva el sujeto emprendedor, como siendo actuante, innovador y audaz y, con eso, busca convencer a los jóvenes a que se adhirieran a ese perfil, manejando así un plan de estudios de acuerdo con el modus operandi del neoliberalismo.

Palabras clave: discurso; proyecto de Vida; emprendedor; currículo.

Recebido em 14 de julho de 2022

Aceito em 18 de julho de 2023

1 INTRODUÇÃO

O objeto de estudo do presente artigo insere-se no âmbito das recentes modificações curriculares efetivadas na educação brasileira, particularmente no esteio do ensino médio. A partir da reforma do Novo Ensino Médio, corporificada por meio da Lei nº 13.415/2017, a qual altera a Lei de Diretrizes de Bases da Educação (LDB), 9.394/96, tem-se uma reformulação nessa etapa da educação básica, ao ampliar o tempo mínimo de permanência na escola e postular um currículo que se diz mais “flexível”, formado por uma parte mais geral e por outra diversificada, materializada nos itinerários formativos a serem “escolhidos” pelos estudantes. Tais itinerários compõem-se por área do conhecimento (Matemática, Linguagens, Ciências Humanas e Ciências Naturais), bem como pela formação técnico-profissional.

Para subsidiar essa formação mais ampla, foi implementada a partir de 2018, através da Resolução nº 4 do CNE/CP (Conselho Nacional de Educação/Conselho Pleno), a Base Nacional Comum Curricular do Ensino Médio (BNCC-EM), documento que busca definir os objetos de aprendizagem das áreas do conhecimento antes referidas. Convém sinalizar que a meta 7 do Plano Nacional de Educação (PNE) prevê a fixação de diretrizes didático-pedagógicas para a educação e a base nacional dos currículos, com direitos e objetivos de aprendizagem e desenvolvimentos dos alunos para cada ano do ensino fundamental e médio, levando em conta as particularidades regionais, estaduais e locais. Além disso, o texto da Resolução nº 4, do CNE/CP, pontua que a lei do novo ensino médio orienta e institui a implantação da base nacional, de modo a mostrar a interligação entre os arranjos dessas políticas curriculares. Conforme nos lembra Macedo (2019, p. 41), a aprovação da BNCC constitui uma inflexão na política pública curricular brasileira, pois “[...] ainda que tenha havido algum nível de centralização curricular no Brasil, ela nunca chegou à definição do que deveria ser ensinado em cada disciplina ao longo dos diferentes anos de escolarização em todo o território nacional”.

A partir dessas mudanças, preconiza-se o projeto de vida como um componente eletivo no desenho curricular do novo do ensino médio, levando em conta que os jovens necessitam planejar o futuro, no campo pessoal, social e profissional, através do protagonismo juvenil. A noção de projeto de vida ressoa de variadas inquietações acerca dos sentidos, concepções e críticas empreendidas por diversos agentes sociais a respeito da relação do jovem com o ensino médio. Nessa compreensão, o projeto de vida constitui uma possibilidade de desenvolver as variadas capacidades dos discentes do ensino médio, de modo a projetar os anseios, interesses, desejos e expectativas (ZANELLA; TREVISOL, 2018), num momento em que são instados a fazerem escolhas pessoais e profissionais e passam por transformações físicas, psíquicas e sociais relevantes. Em consonância com a tônica do Novo Ensino Médio, o projeto de vida representa uma âncora a partir do qual o jovem pode se balizar para fazer as suas escolhas, quase sempre difíceis, do itinerário formativo em que pretende se aprofundar.

Como corolário de toda a dinâmica sociopolítica que caracterizou a construção da reforma do ensino médio e da Base, podemos apontar a acentuada associação das políticas curriculares com as forças do setor privado, capitaneadas por uma série de fundações filantrópicas e ligadas a grandes conglomerados empresariais. Essa relação agudizou-se no contexto do esgarçamento do tecido democrático brasileiro, em virtude de três acontecimentos interconectados: a deposição da presidenta Dilma Rousseff, em 2016, a assunção de Michel Temer ao comando do país, no mesmo ano, e a vitória presidencial de um candidato de extrema direita em 2018. Como resultado deste último acontecimento, assistimos à curiosa conjugação de forças neoconservadores e religiosas com os interesses neoliberais, de modo a contribuir com o enfraquecimento do caráter gratuito, laico e republicano da escola brasileira (BARZOTTO; SEFFNER, 2020).

Certamente as inflexões do mercado na gestão pública não emergem hoje. Podemos, num rápido sobrevoo na história, recuperarmos o fortalecimento da atuação de forças neoliberais a partir da década de 70 do século passado e no decênio seguinte, tendo em vista as experiências de governos com matriz neoliberal em países como Chile, Estados Unidos e Inglaterra. No Brasil, vem à tona essa racionalidade em razão de políticas de privatização de empresas públicas e de enxugamento do Estado nas gestões presidenciais de Itamar Franco (1992-1994) e de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002). Todavia, é importante frisar que, conforme pontuam Dardot e Laval (2016), a lógica neoliberal não impacta apenas sobre a economia no sentido estrito, mas se trata de uma forma de governo que se alastra por toda a sociedade e modula as subjetividades contemporâneas, ao apostar na concorrência e na competividade em praticamente todos os âmbitos da vida. Sobre isso Rago (2017, p. 364) reforça: “[...] a governamentalidade neoliberal diz respeito a um modo particular de sujeição: a constituição do eu como empresa, ou do homo economicus”. Percorrendo, pois, essa entronização da governança do mercado na regulação da vida, aparece com ênfase na atualidade a figura do empreendedor como uma representação prototípica do regime de verdade neoliberal.

Nessa lógica, os discursos acerca do empreendedorismo e do empreendedor são dotados de saberes para os quais todos podem trilhar um caminho que supostamente levaria ao êxito na vida pessoal e profissional. Esse discurso de sucesso ampara-se em relações de poder que impelem os sujeitos a demandarem uma série de esforços para serem reconhecidos como vencedores. No âmbito educacional, a inserção dessa lógica está intrinsecamente relacionada com a participação cada vez mais ativa de setores da iniciativa privada, os quais enxergam na instituição escolar a oportunidade de concretizar os anseios do mercado financeiro. Partindo disso, gostaríamos de pensar neste trabalho sobre como, na constituição do projeto de vida, estão presentes estratégias de saber-poder com viés neoliberal, por compreendermos que vivemos numa sociedade profundamente marcada por essa racionalidade e por estarmos atentos às influências do capital na configuração das recentes mudanças públicas curriculares antes mencionadas. Ademais, seguimos o entendimento de Lopes (2019), para quem o currículo advém de práticas discursivas, de tentativas de representar uma dada realidade política, nas quais estamos imersos.

No alvo de tais alterações de cunho reformista, situamos alguns desdobramentos que delas resultam, tais como: a formação continuada de docentes, a transformação de materiais didático-pedagógicos, as reformulações de documentos norteadores em níveis estaduais e municipais, a atualização de Projetos Políticos Pedagógicos, dentre outros. Nesse sentido, consideramos as mudanças ocorridas no Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD), edição de 2021, denominada de PNLD Conectado Novo Ensino Médio. Para atender às novas feições do ensino médio e da Base, o edital de 2021 contempla duas fases que se voltam para a avaliação e escolha de cinco objetos, a saber: a) Fase 1 - objeto 1: projetos integradores e projeto de vida; b) b) Fase 2 - objeto 2 (livros didáticos por área do conhecimento); – objeto 3 (obras de formação para professores e gestores); objeto 4 (recursos digitais); objeto 5 (obras literárias). Para este estudo, tomaremos como objeto de análise coleções didáticas de Projeto de Vida que foram aprovadas pelo PNLD no objeto 1 da fase 1, cuja avaliação ocorreu no segundo semestre de 2020 e no primeiro trimestre de 2021. Conforme o calendário do programa, essas obras deverão chegar às escolas ainda no ano de 2021.

O objetivo deste trabalho consiste em analisar os discursos presentes em três coleções didáticas de Projeto de Vida, com vistas a compreender o funcionamento de relações de saber-poder de natureza neoliberal que corporificam a figura do empreendedor na construção desses materiais, cotejando com as condições sociopolíticas e históricas que possibilitaram mudanças recentes nas políticas curriculares do ensino médio. Para isso, amparamo-nos teoricamente nos postulados de Foucault (1995; 2008a; 2010) acerca do discurso, enunciado, saber, poder e governamentalidade neoliberal, em Dardot e Laval (2016) e Laval (2004), para pensarmos as atuais facetas da racionalidade neoliberal, nas problematizações de Macedo (2019) e Lopes (2019) a respeito da política do currículo. Quanto à metodologia, trata-se de um trabalho documental de natureza qualitativa.

Em relação à estrutura do texto, convém sinalizar que se encontra dividido da seguinte maneira: na seção adiante, discutem-se alguns pressupostos teóricos a serem mobilizados na análise das coleções didáticas; posteriormente, examinam-se as coleções de Projeto de vida selecionadas para, finalmente, serem tecidos alguns comentários com pretensões conclusivas.

2 ALGUNS PRESSUPOSTOS TEÓRICOS

Esta seção apresenta os conceitos nucleares a serem demandados para a análise do corpus. Uma vez que nos propomos a examinar o objeto de estudo sob o prisma discursivo, é indispensável situar o lugar de onde falamos, porque o conceito de discurso é múltiplo e, por isso, pode variar a depender da perspectiva investigativa adotada. Isso posto, estabelecemos a concepção de discurso que nos interessa. Trata-se do viés defendido por Michel Foucault (2010), na obra Arqueologia do Saber, originalmente publicada em 1969. O discurso é entendido como uma prática que define os objetos de que fala e como um conjunto de enunciados derivados de uma mesma formação discursiva. Profundamente marcado pela história, o discurso, embora possua uma existência material formada por signos, vai além dessa dimensão.

A interrelação do discurso com noções adjacentes nos leva a caracterizá-las, tais como enunciado e formação discursiva. De acordo com Foucault (2010), o enunciado constitui o átomo do discurso, a unidade mínima de análise, a função de existência dos signos. Considerado em sua estreiteza e singularidade, o enunciado representa uma função que cruza diferentes domínios e “[...] unidades possíveis e faz com que apareçam, com conteúdos concretos, no tempo e no espaço” (FOUCAULT, 2010, p. 98).

Uma vez que se trata de uma função, para identificar o enunciado, segundo Foucault (2010), torna-se necessário descrever as propriedades que o demarcam, quais sejam: a) referencial – diz respeito ao fato de o enunciado estar ligado a leis responsáveis pela sua emergência num tempo e num lugar específicos; b) posição de sujeito – tem a ver com a posição assumida pelo enunciado e não se confunde com o sujeito gramatical, o sujeito empírico autor de uma dada formulação; c) domínio associado – todo enunciado relaciona-se, através de uma rede, com enunciados já ditos e por dizer, pressupondo, desse modo, o funcionamento de uma memória; d) materialidade repetível – a irrupção de um enunciado carece de um suporte, uma data, um lugar e/ou de uma instituição específica. Quando se nota a conjunção de enunciados que apresenta uma dada recorrência, engendra-se o que Foucault (2010) entende como uma formação discursiva, ou seja, um conjunto de regularidades expressa a partir de escolhas temáticas, de estratégias, de objetos e de posicionamentos discursivos.

Trabalhar por meio das lentes foucaultianas, mais especificamente da arquegenealogia, redunda relativizar as origens, as tradições, a objetividade e linearidade da história e enxergar o discurso como um acontecimento que surge sob condições determinadas através de relações de saber e de poder. Nesse aspecto, o saber é conceituado menos como conhecimento e mais como posição no esteio de uma prática discursiva a qual faz surgir incessantemente novos objetos. Quando Foucault (2010, p. 220) discute os saberes da psiquiatria no século XX, destaca que “[...] não é soma do que se acreditava que fosse verdadeiro; é o conjunto das condutas das singularidades, dos desvios de que se pode falar no discurso psiquiátrico”. Seguindo essa visão, o autor francês nos permite pensar que o saber não é apenas de ordem constatativa e/ou demonstrativa, mas, em conformidade com os diferentes posicionamentos discursivos existentes, os saberes podem ser variados e estar presentes noutros tipos de discursos que não os científicos.

Essa dispersão dos saberes conecta-se com as diversas relações de poder presentes na sociedade. De acordo com Foucault (1999), toda relação de poder repousa sobre um efeito de saber e o inverso é verdadeiro. Trata-se de uma intricada conexão por meio da qual os discursos emergem. A percepção do poder na analítica foucaultiana difere sobremaneira de outras concepções como o marxismo e as teorias contratualistas, principalmente pelos seguintes pontos: o poder não se resume sob a figura do Estado, do capital e das instituições, embora, em momento algum de sua obra, Foucault tenha negado a relevância desse tipo de poder, inclusive na produção de toda sorte de explorações e submissões, bem como pelo fato de que o poder não se confunde como um bem ou um direito a quem é possível destituir ou entregar. Não se trata, consoante Calomeni (2018, p. 223), do poder como “[...] direito, mercadoria, privilégio de classes, propriedade do Estado, expressão da lei, fenômeno da violência”.

A analítica do poder busca mostrar, sobretudo, que o poder não é fixo, mas móvel, cambiante e se efetiva sobre as ações exercidas pelos sujeitos sobre os outros, com vistas não somente à repressão, mas também com o intuito de produzir comportamentos e subjetividades. Essas ações, por sua vez, sempre se efetuam num terreno passível de lutas, sublevações, resistências e espaços de liberdade. Para Foucault (1999), inexistem relações de poder onde não há a possibilidade de revoltas, de fugas, respostas e efeitos de invenções. As relações de poder aparecem entre homens livres, dirá o autor. Segundo Foucault (2006), a resistência é múltipla e integrável a estratégias globais e se forma onde se exercem as relações de poder. Ao pontuar essa questão, Foucault (2006) usa o termo “agitação perpétua”, com o objetivo de mostrar que se trata de uma combinação de forças cujo funcionamento supõe uma atuação que nunca cessa. Nesse aspecto, compactuamos com Machado (2007, p. 124), quando assinala que o poder “[...] busca gerir a vida dos homens, controlá-los em suas ações, para que seja possível e viável utilizá-los ao máximo, aproveitando suas potencialidades e utilizando um sistema gradual e contínuo de suas capacidades”.

Uma vez que o poder gere e administra a vida, Foucault (2007) discute os modos por meio dos quais as formas de governar se modificaram ao longo dos séculos. O autor propõe o conceito de governamentalidade, com o propósito de delinear um panorama histórico das chamadas artes de governar. Para isso, Foucault (2007) baseia-se em toda uma literatura contrária aos postulados de Nicolau Maquiavel (1469-1527), cujos conselhos eram voltados para auxiliar o príncipe a exercer o poder sobre o principado. Essa literatura anti-Maquiavel busca mostrar que o poder soberano não se baseia numa relação direta com os súditos, pois o príncipe recebe o trono por meio de herança e através de uma dada tradição, de maneira que é frágil a conexão com os súditos e, em razão disso, o príncipe está sempre preocupado com traições internas, com invasões externas e tramas de toda sorte a ameaçarem o governo. De acordo com Foucault (2007), o príncipe preocupa-se menos com a população em si e mais com os territórios, os quais encontram-se sob ameaça constante. Isso porque a população não constituía ainda um problema político e inexistia a compreensão de que havia várias formas de governo para além da gestão do soberano sobre os súditos, como o governo do pai de família, do professor em relação ao aluno, do mestre do ofício com o aprendiz e o governo de si mesmo.

Somente a partir do século XVIII, quando se toma o corpo populacional como um alvo do poder, é possível compreender a emergência das artes de governar, porquanto se produzem cálculos, táticas e dados estatísticos voltados à regulação da população, tendo em vista as taxas de natalidade, de mortalidade, de reprodução, de migração, dentre outros parâmetros de natureza biopolítica. Isso se dá graças a transformações cardinais ocorridas na própria concepção de Estado, a qual passa a ser inserida no esteio de uma racionalidade própria e distinta de argumentos religiosos, das leis naturais e dos preceitos de sabedoria e prudência que sustentavam as monarquias absolutistas e em conformidade com o poder disciplinar (FOUCAULT, 1999) e com os dispositivos de segurança (FOUCAULT, 2008b). Segundo Foucault (2008a, p. 9), “[...] o Estado [...] longe de ser uma espécie de dado histórico-social, não é um monstro frio, é o correlato de uma certa maneira de governar”.

Pensando assim, Foucault (2008a) reflete sobre as modificações incididas sobre as artes de governar, tece relevantes apontamentos acerca do neoliberalismo norte-americano, partindo de alguns ensinamentos do liberalismo clássico. Um primeiro aspecto apontado pelo autor diz respeito ao fato de o mercado ser considerado um regime de veridicção e de jurisdição da prática governamental, por meio do qual é possível estabelecer os limites da atuação do Estado em relação aos anseios do mercado e, ao mesmo tempo, postular que tipo de intervenção estatal é possível de ser efetuada. Noutros termos, o mercado surge como um elemento fundamental na gestão governamental, num movimento que não é sempre claro e que é matizado por determinados interesses, numa relação de utilidade.

De acordo com Foucault (2008a), o mercado dirige a regulação dos preços por meio da troca e essa racionalidade implica uma influência tenaz sobre a atuação do Estado, ao buscar fazer uma negociação entre os interesses individuais e as demandas coletivas dos governados, entre a utilidade social e os benefícios econômicos e entre o equilíbrio de mercado e os meandros do regime de poder político. Em síntese, “[...] o mercado é o que vai fazer que o bom governo já não seja somente o governo justo. O mercado é o que vai fazer com que o governo agora, para poder ser um bom governo, funcione com base na verdade” (FOUCAULT, 2008a, p. 45). Ora, essa verdade está condizente com a verdade do próprio mercado, com os princípios que postulam a ênfase na liberdade do comércio, consoante defendem o liberalismo clássico de Adam Smith, no campo econômico, e John Locke, no campo político, em contraposição à regulação do mercantilismo, da liberdade da propriedade privada, do indivíduo e da expressão, contrariando, assim, a tônica centralizadora do absolutismo.

Contudo, essa liberdade, seguindo as teorizações de Foucault (2008a), não é dada a priori, senão continuamente negociada. Para esse autor, o liberalismo não entende a liberdade como uma região já pronta, que se deveria respeitar, mas é algo a ser fabricado. Nos termos de Foucault (2008a, p. 88), “[...] O liberalismo não é o que aceita a liberdade. O liberalismo é o que propõe fabricá-la a cada instante, suscitá-la e produzi-la, como bem entendido [todo o conjunto] de injunções, de problemas de custo que essa fabricação levanta”.

Essa negociação é arrefecida por meio dos desdobramentos do neoliberalismo – termo, em certo sentido autoexplicativo, que recupera dogmas da doutrina liberal, como a defesa da liberdade de mercado e a desburocratização e enxugamento da máquina pública, mas intensifica outros elementos, em consonâncias com as transformações por que passou o capitalismo, especialmente a partir das crises econômicas da década de 1970 e do esgotamento do modelo de bem-estar social, construído sob os moldes do keynesianismo após o crush da bolsa da Bolsa de Nova York, em 1929. A ênfase na concorrência e competividade numa lógica de guerra implacável (TURIN, 2019) e a introjeção de um ideário segundo o qual é necessário desenvolver o capital humano de cada sujeito constitui uma das principais características da racionalidade neoliberal.

Foucault (2008a) reforça que o neoliberalismo norte-americanofrisa a reconstituição de um perfil de homusoeconomicus diferente da concepção do liberalismo clássico, pois, enquanto nessa última teoria econômica o homusoeconomicus é o homem da troca, sendo um dos parceiros de um processo de troca e negociação comercial, no neoliberalismo essa figura transita para uma direção segundo a qual o sujeito é empresário de si mesmo, “[...] sendo ele próprio seu capital, sendo para si mesmo seu produtor, sendo para si mesmo a sua fonte de renda” (FOUCAULT, 2008a, p. 311). Mudanças substanciais derivam dessa visão, tais como: a) a necessidade premente de desenvolver o capital humano de cada indivíduo e a responsabilização deste pelo sucesso ou fracasso nesse processo de aprimoramento; b) formar um capital humano pressupõe engendrar competências-máquina que vão produzir renda; c) essa produção ocorre mediante investimentos educacionais que não se reduzem somente à aprendizagem escolar, mas envolve também o tempo dedicado pelos pais no cuidado com os filhos, a atenção à saúde e à higiene, o nível cultural dos pais, dentre outros aspectos, vistos como investimentos em uma relação pautada pela lógica do custo-benefício (FOUCAULT, 2008a) e d) pela ideia e que esse capital humano pode ser vendido, com vistas a obter uma renda necessária para o consumo (PAGNI, 2020).

A partir do que foi discutido no parágrafo precedente, podemos sinteticamente registrar os principais impactos da racionalidade neoliberal no campo da educação, conforme Laval (2004): a) a escola neoliberal compreende a educação como um bem privado cujo valor é econômico; b) a despesa educativa necessita ser rentável para as empresas detentoras do capital humano; c) a escola necessita ser gerida nos moldes empresariais os quais valorizam o rendimento e a avaliação contínua; d) como consequência, cria-se uma cultura do ranking e da performance a ser estimulada entre discentes, docentes e gerando uma disputa entre diferentes instituições, tendo em vista a gestão por metas, a avaliação por desempenho e o foco em resultados quantitativamente mensuráveis (DARDOT; LAVAL, 2016), especialmente por meio das avaliações em larga escala, promovidas por organismos internacionais como o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional (FMI) e a Organização para Cooperação do Desenvolvimento Econômico (OCDE); e) cada vez mais se prevê a entronização da chamada educação financeira no âmbito escolar e, com isso, transforma-se a escola num importante veículo de difusão do paradigma neoliberal; f) a figura do empreendedor e os discursos positivos em relação ao empreendedorismo se incrustam a prática escolar como uma necessidade premente; g) a ideia segundo a qual a formação é permanente (longlifetreining), porque uma vez mutáveis as dinâmicas do mercado, a construção do capital humano é ininterrupto; h) a crença de que a escola precisa preparar o jovem para ingressar num mundo do trabalho, mas uma vez que este é flexível e instável, devem-se desenvolver competências relativas à rápida adaptabilidade e ao desapego.

Ao ponderar sobre as políticas curriculares subjacentes à Base do ensino médio, Macedo (2019) adverte que o uso espraiado da noção de competências alinha-se aos interesses de governança da OCDE que, num movimento global, busca homogeneizar os currículos com finalidades econômicas. De acordo com a autora, essa noção de competências marca-se por uma exterioridade que não considera a heterogeneidade dos alunos e tende a responsabilizá-los pelo fracasso das políticas públicas seguindo, assim, a cartilha neoliberal em que o sujeito é o único responsável por seu sucesso ou malogro.

Nas palavras de Macedo (2019, p. 51), “[...] Com a entrada em cena das competências emocionais, sociais e culturais, tal culpabilização se torna ainda mais intensa, posto que a incapacidade parece localizar naquilo que é próprio do sujeito, suas emoções”. De maneira semelhante, Lopes (2019), ao analisar a proposta curricular da BNCC-EM, defende o argumento de que a chamada flexibilização aludida no citado documento não se mostra efetiva, pois limita as possibilidades de integração curricular, ao controlar o projeto de vida dos jovens por meio da fixação de metas.

Ainda acompanhando a leitura de Lopes (2019), observamos que ela questiona como, no escopo dos documentos da reforma do novo ensino médio e da BNCC-EM, pretende-se construir um projeto de vida e de que forma se pode antecipar um projeto de vida, tendo em vista uma espécie de pré-programação das experiências educativas no presente com um futuro incerto e nebuloso. Na percepção da estudiosa: “[...] submeter experiências imprevistas a um dado projeto de futuro que não faz obrigatoriamente sentido para as singularidades juvenis, mas está submetido aos anseios de grupos sociais que supõem saber dizer como o futuro do jovem deve (e pode) ser” (LOPES, 2019, p. 61).

Na seção a seguir, vejamos o funcionamento do discurso em materiais didáticos de projeto de vida e como se interseccionam as relações de saber e poder na constituição do empreendedor, a delinear faces do currículo cuja dimensão formativa, no entendimento de Veiga-Neto (2020), está relacionada com os modos de governar-se e de governar os outros.

3 ANÁLISE DISCURSIVA DE TRÊS COLEÇÕES DIDÁTICAS DE PROJETO DE VIDA

A análise compreende três coleções didáticas aprovadas no PNLD 2021. Para coletar o corpus, procedemos do seguinte modo: a) consultamos o Guia do PNLD 2021 na seção relativa ao Projeto de Vida constante no site do programa; c) selecionamos dez coleções que pudesse compor um corpus maior a partir do qual iríamos fazer um novo recorte; b) fizemos uma busca junto ao site das editoras para que pudéssemos fazer o download dos livros em formato pdf; c) selecionamos sete coleções que estavam disponíveis nesses sítios eletrônicos; d) fizemos uma leitura prévia do material, buscando identificar a recorrência de discursos sobre o sujeito empreendedor; e) escolhemos, para estudo, um total de três coleções que, a nosso ver, parecem representativas do conjunto de materiais didáticos de Projeto de Vida, no que toca às regularidades a respeito do empreendedor e do empreendedorismo. As coleções selecionadas foram as seguintes: Pensar, sentir e agir, de autoria de Leonardo de Perwin e Fraiman, publicada pela editora FTD; Eu posso: projeto de vida, de autoria de Iris Stern, publicada pela editora Pipoca Doce e Planejando a jornada: um guia para seu projeto de vida, escrita por Bia Monteiro, publicada pela editora Evoluir.

Vale reforçar que tanto a BNCC-EM como os Referenciais Curriculares para Elaboração dos Itinerários Formativos assinalam a importância de desenvolver nos alunos do ensino médio competências empreendedoras na consecução dos seus projetos de vida. Podemos citar dois objetivos presentes dos Referenciais, que atestam tal necessidade: “ampliar habilidades relacionadas ao autoconhecimento, ao empreendedorismo e aos projetos de vida; utilizar esses conhecimentos e habilidades para estruturar estratégias empreendedoras com propósitos diversos [...]” (BRASIL, 2018b, p. 9).

Já BNCC-EM, quando discute a preparação para o mundo do trabalho, destaca: “[...] proporcionar uma cultura favorável ao desenvolvimento de atitudes, capacidades e valores que promovam o empreendedorismo” (BRASIL, 2018a, p. 466); o documento conceitua a prática empreendedora como “[...] criatividade, inovação, organização, planejamento, visão de futuro, assunção de riscos, resiliência e curiosidade científica, entre outros), entendida como competência essencial ao desenvolvimento pessoal, à cidadania ativa, à inclusão social e à empregabilidade” (BRASIL, 2018a, p. 466).

No rastro dessa tônica, as coleções de Projeto de Vida incluem um eixo ou módulo sobre o mundo do trabalho, geralmente o terceiro e último da coleção, junto com mais dois eixos que discutem o processo de autoconhecimento e a relação do jovem com o outro e com a comunidade. Passemos à análise das três coleções nas subseções que seguem.

3.1 ANÁLISE DA COLEÇÃO PENSAR, SENTIR E AGIR: PROJETO DE VIDA

A coleção, organizada em volume único, estrutura-se em três módulos intitulados Quem sou: uma descoberta, O encontro com o outro: vínculos e aprendizados e Meu futuro: caminhos e possibilidades. Cada um dos módulos encontra-se formado por cinco capítulos divididos em seções que envolvem reflexões teóricas e práticas e trazem exemplos específicos na seção Para inspirar, que contém exemplos de sujeitos que podem tornar-se exemplos para os jovens construírem seus projetos de vida. Percorrendo a coleção, pudemos identificar a menção explícita ao empreendedor e ao empreendedorismo em diversas ocasiões, das quais destacaremos as que julgamos mais conectadas com os interesses deste estudo. No capítulo 5 do primeiro módulo, denominado O cuidado com o outro e com o mundo, há uma discussão sobre como é possível relacionar as escolhas profissionais com as realizações pessoais e o cuidado com o outro. Após duas páginas de ponderações acerca dessa temática, o texto do material didático indaga:

No convívio com seus familiares e amigos, ou em suas navegações, você pensa em como garantir seus ganhos financeiros e, além disso, em como se pode realizar como ser humano? Pretende conciliar vida pessoal e profissional ou só se dedicará a vida pessoal somente quando tiver estabelecido profissionalmente? Quer ter um filho ou nem sequer pensa em ser mãe ou pai? Prefere trabalhar em uma corporação ou se tornar um empreendedor e construir seu próprio negócio? (FRAIMAN, 2020, p. 127).

Vemos neste excerto da coleção em análise que a posição de sujeitopropõe ao jovem fazer uma série de reflexões a respeito do futuro, de maneira a questioná-los acerca dos projetos de vida a se corporificarem no interior de certas decisões a serem tomadas pelo aluno. Uma regularidade discursiva presente neste fragmento aponta para o caráter complexo da tomada de decisões, tais como ter ou não filhos, conciliar as demandas da vida pessoal com o campo profissional, ser bem-sucedido do ponto de vista financeiro e sentir-se realizado. O saber a corroborar essa regularidade ancora-se no referencial da racionalidade neoliberal, cujas leis de possibilidade apregoam uma dada liberdade de “escolha” por parte dos sujeitos, sendo estes os responsáveis pelos caminhos que decidiram trilhar.

No funcionamento deste discurso, tem-se a constituição de um sujeito a quem é dada a oportunidade de selecionar o rumo a ser seguido e, como consequência, o apagamento das singularidades de discentes do ensino médio que, por uma miríade de razões, não é facultada a alternativa de decidir o futuro, porquanto demandas mais urgentes do presente os impedem de fazê-lo. Pensemos, por exemplo, nos jovens de famílias economicamente desassistidas que já conciliam os estudos com o trabalho no âmbito do ensino médio ou são levados a abandonar os bancos escolares para se dedicar exclusivamente às jornadas laborais, bem como os jovens que já são pais ou mães e para os quais não faz sentido indagá-los sobre um projeto relacionado a ter (ou não) filhos.

Quando a posição de sujeito da coleção didática reporta-se ao empreendedor, é curioso notar que subsiste uma valorização desse perfil, pois permite a construção de um negócio próprio e o verbo tornar indica uma mudança de estado, pressupondo, com isso, um processo de aprendizado, de transformação, de aprimoramento, em termos foucaultianos, de um processo de subjetivação. Trabalhar em uma corporação, por outro lado, sugere seguir um percurso pouco atrativo em relação ao empreendedor, porque supõe uma rigidez de horários, uma hierarquia e uma disciplina, incompatíveis, num primeiro momento, com a flexibilidade propalada pela racionalidade neoliberal sob a figura heroica do empreendedor como um sujeito que seria patrão de si mesmo.

É ainda relevante frisar que, ao construir a oposição trabalhador versus empreendedor, a posição de sujeito da coleção simplesmente não leva em conta outras possibilidades de imersão no âmbito do trabalho para além dessa dicotomia, de maneira a restringir o raio de atuação do jovem na elaboração de seus percursos formativos. Concebendo os materiais didáticos como artefatos culturais constitutivos das políticas do currículo, acompanhamos o raciocínio de Cunha e Lopes (2017, p. 37), para quem, a partir da Base, ergue-se “[...] uma promessa baseada no privilégio de interesses e projetos não vinculados diretamente aos múltiplos e diferentes contextos singulares dos estudantes como sujeitos da educação”.

Prosseguindo a análise da coletânea, observamos numa das seções Para inspirar, um texto reportado do site da Agência de Desenvolvimento Econômico Local (ADEL), uma organização não-governamental voltada ao desenvolvimento local de comunidades rurais do interior do Nordeste. O texto conta a história de Mikaele de Sousa Reis, de 13 anos, moradora de uma pequena comunidade do município de São Gonçalo do Amarante/CE. Levando em conta o fato de este texto tratar de um relato de uma jovem empreendedora, a escolha por inseri-lo numa seção da coletânea cujo princípio consiste em mostrar exemplos a serem seguidos, podemos constatar a presença flagrante de um discurso que valoriza a iniciativa e o protagonismo juvenil.

No caso de Mikaele, lemos que ela participou de um curso de Formação de Jovens Empreendedores, organizado pela ADEL e montou seu próprio negócio voltado à comercialização de roupas femininas. Ao descrever seu itinerário empreendedor, a adolescente confessa: “Quando decidi que queria empreender, inicialmente foi por necessidade. Minha mãe é sacoleira e, através do seu esforço, conseguiu segurar a barra que foi a separação do meu pai. Vendo isso eu vi que ela não sabia gerenciar bem o negócio e, como eu me identificava, resolvi investir na ideia de uma loja de roupas” (FRAIMAN, 2020, p. 87).

No funcionamento discursivo do dizer da adolescente, figura uma posição de sujeito que realça o protagonismo juvenil como uma possibilidade de vencer as adversidades, por meio de um domínio associado que nos leva ao campo do aconselhamento e da autoajuda pela remissão à superação. No relato de Mikaele, é dado a ver um esforço por parte da jovem para encontrar uma solução criativa frente às dificuldades financeiras enfrentadas pela família e a constatação de que a mãe carecia de saberes relacionados à gestão de negócios. Conforme Dardot e Laval (2016), no cerne da razão neoliberal, todo sujeito possui um espírito empreendedor e a economia de mercado serve como um estímulo para o desenvolvimento desse empreendedorismo. O discurso direto de Mikaele situa-se no âmbito de um exemplo a ser encorajado, de um modelo a ser copiado pelos estudantes, pois, se numa comunidade rural de uma cidade interiorana, foi possível implementar a agenda empreendedora, não há desculpas para que jovens de centros urbanos também não exercitem suas potencialidades no campo do empreendedorismo.

É nessa direção que a coleção questiona: “Pensando na história de Mikaele, você acredita que tomaria a mesma atitude diante da mudança para algum lugar diferente de onde está acostumado a viver? Por quê?” (FRAIMAN, 2020, p. 87). A reflexão postulada na coleção parte da seguinte vontade de verdade: é necessário mobilizar os jovens para serem atuantes e participativos, especialmente quando as condições sociais não são, à primeira vista, estimulantes. Por meio de relações de saber-poder do campo neoliberal, essa pergunta propõe desenvolver a flexibilidade e adaptabilidade dos jovens na constituição de projetos de vida, em sintonia com as rápidas modificações encetadas no âmbito do mercado, de maneira a gerar uma docilização e controle dos corpos e subjetividades juvenis.

3.2 ANÁLISE DA COLEÇÃO EU POSSO: PROJETO DE VIDA

Também materializada em volume único, a coleção Eu posso: projeto de vida, encontra-se dividida em três unidades: Tempos de descoberta, Eu e os outros e O encontro com o futuro. Na primeira unidade, exploram-se diferentes temáticas como as emoções, a saúde e o autoconhecimento; a família, a escola e a violência, na segunda, e as dificuldades encontradas na construção de projeto de vida, o estabelecimento de metas, a ênfase nas profissões e no empreendedorismo, na unidade que encerra a coletânea.

Como nos importa observar mais detidamente o foco no empreendedor, situemos o tópico que antecede o final da coletânea, após ser mostrada, de maneira um tanto sumária, uma lista de profissões separadas por áreas de atuação. Para contextualizar o empreendedorismo, a coletânea delimita: “Mas, se você não quiser ser empregado e sonha em ter seu próprio negócio? Então talvez você seja um empreendedor. Empreender é uma tarefa que exige muito planejamento e senso de oportunidade” (STERN, 2020, p. 125). É conveniente sinalizar o foco dedicado ao empreendedorismo na constituição do discurso da coletânea a partir do qual poderíamos inquirir: por que a discussão sobre o empreendedor apareça após a enumeração de diferentes profissões? Como a coletânea dota o empreendedorismo de um efeito de novidade que o distingue das profissões comuns? Ao fazermos uma rápida comparação, logo iremos constatar que a coleção não dedica o mesmo espaço conferido ao empreendedorismo ao exame das demais profissões, revelando, portanto, um lugar de prestígio sobre o qual mais longamente se detém, porque os estudantes são impelidos a ocuparem essa posição divergente a ideia de “ser empregado” e disso resulta o efeito de novidade, de algo diferente do habitual. Em seguida, a coletânea pontua as aptidões necessárias para empreender, concernentes ao planejamento e ao senso de oportunidade.

Posteriormente, lemos: “Não é tarefa tão fácil, como imaginam alguns, por isso, muitos não alcançam o esperado. E como empreender? Uma dica é observar o ambiente que lhe é familiar e tentar responder perguntas como: o que as pessoas precisam? Há como suprir essa necessidade? Eu tenho recursos para isso?” (STERN, 2020, p. 125). A posição de sujeito desse enunciado ancora-se num dizer professoral no intuito de guiar os estudantes, levando-os a adotarem uma postura empreendedora. Diferentemente das demais profissões, há um estímulo para a emergência do espírito empreendedor já no âmbito do ensino médio e a coletânea busca atiçar tal postura. Isso nos faz ponderar junto com Laval (2004), como o currículo escolar passa a servir aos interesses do mercado. Conforme o autor francês, sob os auspícios do neoliberalismo, a lógica da competência prioriza capacidades mais diretamente relacionadas à utilidade do que se espera no mercado do que a outros conhecimentos os quais não absorvidos imediatamente pelo poder econômico.

Para encerrar essa reflexão sobre o empreendedorismo, a coleção propõe que o estudante faça uma entrevista com alguém considerado um/a empreendedor/a da comunidade onde vive o aluno. Entre as questões propostas pelo material didático, destacam-se “de onde veio a vontade de empreender; como ele/a começou; porque escolheu a área que atua; que dificuldades sentiu” (STERN, 2020, p. 125). A posição enunciativa, ao sinalizar para a necessidade de o aluno averiguar na prática como se configura a constituição de um sujeito empreendedor, pode possibilitar ao estudante identificar-se com essa imagem e, a partir disso, ingressar nesse campo, levando em conta certos saberes aliados às dicas presentes nos manuais e ao saber da prática do empreendedor entrevistado.

A escola acaba por se configurar, a partir das reformas curriculares a resultarem os materiais didáticos de projeto de vida, como um laboratório de empresários de si mesmos, conforme vimos na seção anterior, e urge investir no capital humano pela via da formação educacional. De acordo com Macedo (2014), o imaginário neoliberal cria uma tentativa de controle do imponderável, na medida em que busca governar a educação a partir da criação de fantasmas que fazem parte da lógica educacional, pois esta, regida por humanos e para humanos, é intrinsecamente suscetível de falhar. Disso parece resultar o enfoque empresarial ao domínio da escola, pois, aquele supostamente racional e controlável, melhoraria esta, tida como fracassada e anacrônica.

3.3 ANÁLISE DA COLEÇÃO PLANEJANDO A JORNADA: UM GUIA PARA SEU PROJETO DE VIDA

A terceira coleção a ser analisada, assim como as demais, estrutura-se em volume único. Constitui-se de três partes intituladas Jeitos de ser, O bem de todos nós e Agir no mundo. Cada parte é formada por diversos capítulos que apresentam, além do conceito a ser abordado, as seguintes seções: Pensar (explora a relação do conceito com a experiência de vida do discente), Sentir (o foco reside em atuar sobre os conhecimentos socioemocionais), Fazer (propõe uma atividade prática em torno do conceito trabalhado); Registrar (liga-se à produção de textos com o intuito de compor um portfólio do projeto de vida) e Saber mais (sugerem-se conhecimentos adicionais sob a forma de sugestões de leitura e/ou dicas de vídeos ou filmes).

A remissão ao empreendedorismo aparece na terceira parte num capítulo denominado de Abrindo o próprio negócio. Vejamos adiante como o tema é tratado pela coleção, a partir de alguns recortes de enunciados presentes nesse material didático.

Nos últimos anos, o sentido empresarial ou corporativo do termo empreendedorismo, ou seja, aquele ligado ao mundo dos negócios tem sido influente mesmo nos espaços não diretamente vinculados a empresas comerciais, como o da vida pessoal, devido à identificação da figura do empreendedor como um indivíduo ativo e inovador.

[...] Uma das possibilidades de realização do Projeto de Vida é optar pelo empreendedorismo – seja atuando de modo empreendedor numa empresa já existente, seja criando, individualmente, o próprio negócio.

[...] Para ser realmente um empreendedor de sucesso, são necessárias características pessoais adequadas, capacitação e, na maior parte das vezes, crédito.

Algumas dessas iniciativas são: iniciativa, pensamento estratégico, autoconfiança e resiliência [...] (MONTEIRO, 2020, p. 148).

A posição assumida no discurso da coletânea reconhece a incorporação do ethos empreendedor noutros setores da vida social não imediatamente articulados com o campo da economia. Ora, na verdade isso constituiu o modus operandi do regime neoliberal do qual o empreendedor faz parte, ao instalar a lógica concorrencial na formação da subjetividade e, com isso, atingir não somente a economia, como a política e a construção dos sujeitos. No discurso presente no material didático, notamos um tratamento positivo em relação à figura do empreendedor, tido como inovador e criativo, perfil a ser buscado e desenvolvido no cerne dos projetos de vida. Para emoldurar o sujeito empreendedor, são demandados saberes de diversos como a administração, por meio de termos como planejamento estratégico, e dos saberes e práticas médico-psi (GADELHA, 2018), especialmente da psicologia positiva (BINKLEY, 2010), assinalados linguisticamente pelos vocábulos iniciativa, resiliência e autoconfiança. Tais saberes vinculam-se a relações de poder responsáveis por administrar os modos de existência daqueles interessados em tornar-se empreendedores. Para tanto, convém controlar os ímpetos, as emoções, os fracassos e os desânimos, pela via da resiliência, exercer a confiança em si mesmo, ser proativo e dinâmico.

Sobre isso, Sant’Anna (2019) expressa as inflexões do neoliberalismo na dimensão subjetiva, ao frisar como essa racionalidade acentua a concorrência não apenas sobre o outro, como sobre si mesmo, exigindo, para isso, a autossuperação de problemas num curto espaço de tempo, a percepção segundo a qual o outro constitui uma oportunidade, bem como um investimento sobre si mesmo na tentativa de ser sempre o melhor, o mais bem-sucedido, o mais aberto e flexível e “[...] até mesmo a vida precária tende a ser interpretada como um modo de descobrir novas chances de autoconhecimento e autossuperação” (SANT’ANNA, 2019, p. 165). Sob essa perspectiva, ancora-se o discurso a circular na coleção em estudo, pois, ao apostar nas características valorativas do empreendedor, instaura-se um modelo a ser seguido, com vistas a emoldurar projetos de vida matizados a partir desse posicionamento.

Após mostrar os requisitos necessários para se tornar um empreendedor, a coleção questiona o discente sobre os sentimentos expressados por ele quando pensa em ser um empreendedor e como ele nota distinções entre o empreendedor e um trabalhador comum, vejamos: “Que sentimentos a ideia de ter o próprio negócio provoca em você? A seu ver, quais são as principais entre ser um empreendedor e funcionário de carteira assinada?” (MONTEIRO, 2020, p. 150). Considerando os argumentos demandados pela coleção para convencer os estudantes a ingressarem no campo do empreendedorismo, a posição a enunciar na coleção busca respostas compatíveis com essa cenografia otimista. Ao apelar para o nível da emoção, erguem-se relações de poder e efeitos do saber responsáveis por atuar no âmbito da subjetividade do jovem, na relação dele consigo mesmo, na consecução de sonhos e desejos. A segunda interrogação propõe ao jovem reconhecer as diferenças existentes entre o empreendedor e um funcionário de “carteira assinada”, de modo encontrar eco nas regularidades discursivas constatadas nos livros didáticos anteriormente analisados, nos quais observamos que o outro do empreendedor constitui um empregado e/oi um funcionário, pois ser empreendedor é esgarçar as relações entre patrão e empregado e nisso residiria o fascínio pelo empreendedorismo.

Esse questionamento, no fim das contas, negligencia as recentes modificações jurídicas as quais provocaram a drástica diminuição do emprego formal e o aumento exponencial da informalidade, levando, assim, a precarização das relações trabalhistas. Ao se alinhar à cartilha neoliberal, a posição enunciativa desse discurso tende a reconhecer os direitos do trabalhador, duramente conquistados por meio de lutas intensas, como barreiras a dificultar a flexibilidade do empreendedor. Acerca desse ponto, é importante mencionar o posicionamento de Gadelha (2018), ao sublinhar que o neoliberalismo molda-se sob uma extrema positivação de valores como eficácia, inovação, capacidade de criação e ação, de modo a produzir uma concorrência desmedida a partir da qual os sujeitos são levados a abrir mão de garantias, como a carteira assinada, em prol da “flexibilidade” proclamada pela matriz do mercado.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

No decorrer deste texto, almejamos, a partir de uma análise discursiva, investigar as relações de saber-poder que emolduram o sujeito empreendedor no interior de coleções didáticas de Projeto de Vida, atentando para o cenário de modificações das políticas curriculares do ensino médio, tendo em vista a reforma do novo ensino e a BNCC-EM.

Ao longo da análise, constamos que as três coleções estudadas, em maior ou menor grau, constroem enunciados positivos acerca do empreendedor, especialmente através das seguintes estratégias: a) o empreendedor é situado num lugar que o afasta do funcionário comum, porquanto se trata de uma modalidade de inserção no mercado pautada pela nulidade das relações de poder entre patrão e empregado e, por conta desse aspecto, torna-se atrativa e desejada; b) para construir um projeto de vida com foco no empreendedorismo, convém desenvolver uma série de habilidades a convocarem mudanças subjetivas importantes, tais como observar de modo diferente o cotidiano, exercer um planejamento estratégico, ser resiliente, transformar desafios em oportunidades, dentre outras práticas cristalizadas no mundo na retórica gerencial; c) as coleções matizam-se pela lógica neoliberal, ao propugnarem que, em potencial, todos podem ser empreendedores, basta instrumentalizarem-se de um saber específico e se dotarem de um diferencial, de modo a desconsiderar as singularidades que caracterizam as juventudes no país, particularmente num momento histórico pautado por uma quantidade assustadora de jovens que não tem qualquer ocupação quanto mais ainda um emprego fixo e por uma política de estrangulamento dos direitos trabalhistas.

Em linhas gerais, pudemos observar a estreita conexão dos discursos que circulam nas coleções com os modos de existência da racionalidade neoliberal, com os anseios empresariais que alicerçam as políticas curriculares atuais e os rumos por elas tomados, ao vislumbrarmos o emparelhamento da educação pública pelos interesses do mercado. Decerto, acreditamos que não se trata de conceber a escola como uma ilha, apartada das demandas sociais; todavia, preocupa-nos essa celebrização do empreendedorismo e o tratamento acrítico a ele conferido. A escola como um espaço republicano e democrático necessita problematizar os diversos jogos de poder existentes na sociedade e não ser porta-voz de agenciamentos que reiteradamente geram a desigualdade e a exclusão. Conforme alerta Safatle (2021, p. 21), “[...] submeter-se à pretensa racionalidade da economia exige uma despolitização radical da sociedade, uma recusa violenta de seus questionamentos a respeito da autonomia do discurso econômico em relação aos interesses políticos”.

Assim, quando o currículo oficial não reflete e refrata a função precípua do ensino público, senão compactua integralmente com a agenda do mercado, convém engendrar forças de resistência e arranjos micropolíticos que possam burlar as prescrições e construir currículos outros no fazer pedagógico cotidiano. Sobre isso, mobilizamos Carvalho (2020, p. 87), quando defende “[...] Trata-se também de sustentar o lugar da escola como res publica, ou seja, como instituição fundamental e necessária que só funcione na contramão das demandas do próprio sistema neoliberal”.

REFERÊNCIAS

BARZOTTO, C. E.; SEFFNER, F. Escola sem partido e sem gênero: redefinições dos espaços público e privado na educação, Rev. FAEEBA – Ed. e Contemp., Salvador, v. 29, n. 58, p. 150-167, abr./jun. 2020.

BRASIL. Resolução nº 4, de 17 de dezembro de 2018. Institui a Base Nacional Comum Curricular do Ensino Médio (BNCC-EM), como etapa final da educação básica, nos termos do artigo 35 da LDB, completando o conjunto constituído pela BNCC do Ensino Infantil e do Ensino Fundamental com na Resolução CNE/CP nº 2/2017, fundamentada no Parecer CNE/CP nº 15/20217. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, p. 120-122, 18 dez. 2018.

BRASIL. Base Nacional Comum Curricular – BNCC do Ensino Médio. Brasília, DF: MEC, 2018a.

BRASIL. Referenciais Curriculares para elaboração dos itinerários formativos. Brasília, DF: MEC, 2018b.

BINKLEY, S. A felicidade e o programa de governamentalidade neoliberal. In: FILHO, J. F. (org.). Ser feliz hoje: reflexões sobre o imperativo da felicidade. Rio de Janeiro: FVG, 2010, p.83-104.

CALOMENI, T. O ronco surdo da batalha: poder disciplinar e biopolítica. In: RESENDE, H. (org.). Michel Foucault: o ronco surdo da batalha. São Paulo: Intermeios, 2018. p. 215-239.

CARVALHO, A. F. A escola contemporânea e a desertificação institucional: o demérito da res publica. In: GALLO, S.; MENDONÇA, S. A escola: uma questão pública. São Paulo: Parábola, 2020. p. 85-101.

CUNHA, E.; LOPES, A. C. Base Nacional Comum Curricular: regularidade na dispersão. Investigación Cualitativa, Urbana, IL, USA, International Association of Qualitative Inquiry v. 2, p. 23-35, 2017.

DARDOT, P.; LAVAL, C. A nova razão do mundo: ensaios sobre a sociedade neoliberal. Trad. Mariana Echalar. São Paulo: Boitempo, 2016.

LAVAL, C. A escola não é uma empresa: o neo-liberalismo como ataque ao ensino público. Trad. Maria Luiza M. de Carvalho e Silva. Londrina: Editora Planta, 2004.

FOUCAULT, M. O sujeito e o poder. In: RABINOW, P.; DREYFUS, H. Foucault: uma trajetória filosófica para além do estruturalismo e da hermenêutica. Trad. Vera Porto Carrero. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1995. p. 231-250.

FOUCAULT, M. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Trad. Raquel Ramalhete. Petrópolis: Vozes, 1999.

FOUCAULT, M. Microfísica do poder. Trad. Roberto Machado. Rio de Janeiro: Edições Graal, 2007.

FOUCAULT. M. Ditos e Escritos IV: Estratégia, Poder-Saber. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006.

FOUCAULT, M. Microfísica do poder. 25. ed. Trad. Roberto Machado. São Paulo: Graal Edições, 2008a.

FOUCAULT, M.O nascimento da biopolítica: curso dado no Collège de France: (1978-1979). Trad. Eduardo Brandão. São Paulo: Martins Fontes, 2008b.

FOUCAULT, M. A arqueologia do saber. Trad. Luiz Neves. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2010.

GADELHA, S. Empresariamento da sociedade e da educação: o complexo corpo-subjetividade do homo economicus neoliberal, o imperativo da alta performance e seus efeitos. In: RESENDE, H. (org.). Michel Foucault: a arte neoliberal de governar a educação. São Paulo: Intermeios; Brasília: Capes/CNPq, 2018. p. 227-245.

FRAIMAN, L. P. Pensar, sentir e agir. São Paulo: FTD, 2020.

LOPES, A. C. Itinerários formativos da BNCC do Ensino Médio: identificações e projetos de vida juvenis, Retratos da Escola, Brasília, v. 13, n. 25, p. 39-58, jan./mai. 2019.

MACEDO, E. F. Base Nacional Curricular Comum: novas formas de sociabilidade produzindo sentidos para educação, Revista e-Curriculum, São Paulo, v. 12, n. 3, p. 1530-1555, 2014.

MACEDO, E. F. Fazendo a Base virar a realidade: competências e germe da comparação, Retratos da escola, Brasília, v. 13, n. 25, p. 39-58, jan./mai. 2019.

MACHADO, Roberto. Foucault, a ciência, o saber. Rio de Janeiro: Zahar Ed., 2007.

MONTEIRO, B. Planejando a jornada: um guia para seu projeto de vida. São Paulo: Evoluir, 2020.

PAGNI, P. A. Resistências ao cotidiano escolar de exceção: o ingovernável, a desobediência e o julgar reflexivo. In: GALLO, S.; MENDONÇA, S. A escola: uma questão pública. São Paulo: Parábola, 2020. p. 39-66.

RAGO, M. Foucault, o neoliberalismo e as insurreições feministas. In: RAGO, M.; GALLO, S. (org.). Michel Foucault e as insurreições: é inútil revoltar-se? São Paulo: CNPq, Capes, Fapesp, Intermeios, ٢٠١٧. p. ٣٦٣-٣٧٤.

SAFATLE, V. A economia é a continuação da economia por outros meios: sofrimento psíquico e neoliberalismo como economia moral. In: SAFATLE, V.; SILVA JUNIOR, N.; DUNKER, C. (org.). Neoliberalismo como gestão do sofrimento psíquico. Belo Horizonte: Autêntica, 2021. p. 11-38.

SANT’ANNA, D. B. Hayek na praia. In: BUTTURI JUNIOR, A.; CANDIOTO, C.; SOUZA, P.; CAPONI, S. Foucault & as práticas de liberdade I: o vivo & os seus limites. Campinas: Pontes, 2019. p. 161-174.

STERN, I. Eu posso: projeto de vida. Pinhais: Pipoca Doce Casa Editorial, 2020.

TURIN, R. Tempos precários: aceleração, historicidade e semântica neoliberal. Rio de Janeiro: Zazie Edições, 2019.

VEIGA-NETO, A. Mais uma lição: sindemia covídica e educação. Educação e Realidade, Porto Alegre, v. 45, n. 4, e109337, 2020.

ZANELLA, T.; TREVISOL, M. T. C. Projetos de vida e processos de ensino-aprendizagem: compreensão de alunos do ensino médio, Cadernos de Educação, Pelotas, v. 17, n. 34, jan./jun. p. 107-130, 2018.

Endereços para correspondência: Avenida Universitária Leto Fernandes, KM 01, Sítio Esperança II, Zona Rural, Caraúbas, Rio Grande do Norte-RN, 59870-000; francisco.vieiras@ufersa.edu.br


1 Doutor em Linguística pela Universidade Federal da Paraíba. Avenida Universitária Leto Fernandes, KM 01, Sítio Esperança II, Zona Rural, Caraúbas, Rio Grande do Norte-RN, 59870-000. francisco.vieiras@ufersa.edu.br.