https://doi.org/10.18593/r.v47.30200

Portfólios online no desenho didático da Pós-graduação Stricto Sensu

Online portfolio in the didactic design of the Stricto Sensu Postgraduate

Portafolio online en el diseño didáctico del Postgrado Stricto Sensu

Edmea Santos1

Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro; Professora Titular-Livre;

https://orcid.org/0000-0003-4978-9818

Kathia Marise Borges Sales2

Universidade do Estado da Bahia; Professora Titular;

https://orcid.org/0000-0002-0584-4996

Maristela Midlej Silva de Araújo Veloso3

Universidade Federal do Sul da Bahia; Professora Adjunta;

https://orcid.org/0000-0002-6386-1583

Resumo: O presente artigo relata uma experiência concreta de avaliação formativa online em três dimensões (auto/co e heteroavaliação) no contexto de um desenho didático online, num programa de pós-graduação stricto sensu. Tal experiência desenvolveu-se no contexto da Pandemia COVID-19, que condicionou a ressignificação de práticas educativas, tradicionalmente presenciais, para experiências remotas em plataformas digitais. Os programas de pós-graduação precisaram se reinventar e ir além dos encontros síncronos, mediados por interface de webconferência. Concluímos que, a partir dos diálogos assíncronos, mediados por docentes e discentes em espaçostempos forjados nas interfaces de ambientes virtuais, pode-se juntos criar práticas outras de avaliação processual e formativa online.

Palavras-chave: Portfólios online; Avaliação da aprendizagem online; Pós-graduação stricto sensu; Desenho didático online.

Abstract: This article reports a concrete experience of online formative assessment in three dimensions (self/co and heteroassessment) in the context of an online didactic design, in a stricto sensu postgraduate program. This experience was developed in the context of the COVID-19 Pandemic, which conditioned the re-signification of educational practices, traditionally face-to-face, for remote experiences on digital platforms. Graduate programs needed to reinvent themselves and go beyond synchronous meetings, mediated by a web conferencing interface. We conclude that, from the asynchronous dialogues, mediated by teachers and students in spaces-times forged in the interfaces of virtual environments, it is possible to create together other practices of online procedural and formative evaluation.

Keywords: Online portfolios; Assessment of online learning; Stricto sensu post-graduation; Online didactic drawing.

Resumen: Este artículo relata una experiencia concreta de evaluación formativa en línea en tres dimensiones (auto/coevaluación y heteroevaluación) en el contexto de un diseño didáctico en línea, en un programa de posgrado stricto sensu. Esta experiencia se desarrolló en el contexto de la Pandemia del COVID-19, que condicionó la resignificación de las prácticas educativas, tradicionalmente presenciales, por experiencias a distancia en plataformas digitales. Los programas de posgrado necesitaban reinventarse e ir más allá de las reuniones sincrónicas, mediadas por una interfaz de conferencia web. Concluimos que, a partir de los diálogos asincrónicos, mediados por docentes y estudiantes en espacios-tiempos forjados en las interfaces de los entornos virtuales, es posible construir en conjunto otras prácticas de evaluación procedimental y formativa en línea.

Palabras-clave: Portafolios en línea; Evaluación del aprendizaje en línea; Posgrado Stricto sensu; Dibujo didáctico en línea.

Recebido em 30 de abril de 2022

Aceito em 13 de julho de 2022

1 INTRODUÇÃO

Arquitetar práticas educativas, inclusive na pós-graduação stricto sensu, requer de docentes e discentes o planejamento de desenhos didáticos e curriculares. A partir dos primeiros meses de 2020, esse desafio tornou-se ainda mais singular, diante do que começamos a viver, uma situação na sociedade sem precedentes na nossa história, a pandemia causada pelo novo coronavírus. Este cenário nos obrigou a um estado de isolamento social, interrompendo as ações que demandavam encontros presenciais, incluindo as aulas nas escolas da educação básica e nas universidades.

Como alternativa para amenizar os prejuízos causados pela crise pandêmica, o Ministério da Educação (MEC) autorizou a substituição de componentes curriculares presenciais por aulas que utilizassem meios e tecnologias de informação e comunicação. A portaria de nº 343 (a), que regulamenta essa medida, foi publicada no dia 12 de março de 2020, do Diário Oficial da União (DOU). Conforme apontado no referido documento, “será de responsabilidade das instituições a definição das disciplinas que poderão ser substituídas, a disponibilização de ferramentas aos alunos que permitam o acompanhamento dos conteúdos ofertados bem como a realização de avaliações durante o período da autorização”. Esse período foi de 30 dias a partir de sua publicação. A medida foi prorrogada por mais 30 dias na portaria Nº 473 (b), que entrou em vigor a partir de 15 de maio de 2020. Depois dessas primeiras, outras portarias foram publicadas, prorrogando o prazo.

Em todas as instituições educacionais4, vivenciou-se uma preocupação e insegurança quanto ao retorno das aulas presenciais, por estarmos vivendo um momento de muitas incertezas, sem indicação de previsão para o fim da crise pandêmica. Neste contexto fez-se necessário criar espaçostempos de reflexão sobre o cenário e sobre a formação de professores para nele atuar, além da preparação dos estudantes para se engajarem nas novas estratégias educativas com práticas pedagógicas não presenciais. As instituições de ensino foram desafiadas a promover diferentes ambiências formativas que contemplassem atividades síncronas e assíncronas, um trabalho que considerasse as dimensões técnicas, teóricas e práticas de uma educação mediada por tecnologias digitais, nas ações de pesquisa, ensino e extensão.

Fomos quase todos apartados dos territórios físicos nos quais comumente habitávamos. A sala de aula presencial de nossos programas de pós-graduação, ganharam materialidades outras. Arranjos espaços-temporais foram forjados online, graças às tecnologias digitais em rede por nós acionadas em diferentes contextos. Compreender suas dinâmicas e singularidades tornou-se um dos maiores desafios sociotécnicos para muitos educadores.

Muito mais do que apenas dinamizar e promover uma nova materialização da informação, a tecnologia digital permite a interconexão de docentes e discentes, de espaços e tempos de aprendizagem, exigindo destes diferentes ações curriculares e ações em rede. Desde o final do século passado, Lévy (1996) já nos alertava para a necessidade de “aprender com o movimento contemporâneo das técnicas”. Muitos são os trabalhos – antigos e mais recentes (SILVA, 2003; SILVA; SANTOS, 2006; ARAÚJO, 2007; SALES; ALBUQUERQUE, 2020; AMARAL et al., 2021; TORRES et al., 2021) e comunidades científicas (GT-16 da ANPED5, ABCiber6) que versam sobre este desafio, apresentando pesquisas e experiências educacionais mediadas por tecnologias digitais. Contudo, educar no contexto de uma pandemia, foi para quase todos nós um desafio ainda maior, uma vez que nossas universidades não contavam, ou contavam com limitações de infraestrutura tecnológica e ou de políticas de formação de docentes e discentes para o uso do digital em rede em situações didático curriculares.

As plataformas digitais são compostas por uma diversidade de elementos constitutivos (interfaces amigáveis) que permitem diversos modos de comunicação: um-um, um-todos e todos-todos em troca simultânea (comunicação síncrona) ou não (comunicação assíncrona) de mensagens. Tais possibilidades podem implicar mudanças diretas, nem melhores, nem piores, mas diferentes, na forma e no conteúdo das relações de aprendizagem do coletivo. É através do conjunto de interfaces que os usuários interagem com as plataformas digitais, compondo assim as salas de aulas online. Segundo Johnson (2001, p. 16):

A interface atua como uma espécie de tradutor, mediando entre as duas partes, tornando uma sensível para a outra. Em outras palavras, a relação governada pela interface atua como uma relação semântica, caracterizada por significado e expressão, não por força física. Os computadores digitais são “máquinas literárias”, [...] trabalham com sinais e símbolos (JOHNSON, 2001, p. 16).

Nesse sentido, podemos afirmar que as interfaces digitais são dispositivos que lidam com linguagens permitindo a arquitetura de diferentes novos processos de ensino e aprendizagem, inclusive na formação de mestres e doutores. Ao contrário do que muitos defendem, as interfaces e dispositivos digitais não são meras ferramentas. Concordamos com Castells (1999, p. 51) que “as novas tecnologias da informação não são simplesmente ferramentas a serem aplicadas, mas processos a serem desenvolvidos.” Assim, entendemos que currículos online devem ser processos a serem desenvolvidos pela comunidade que deve ser autora de novas arquiteturas, que preferimos nomear como desenhos didáticos online.

O desenho didático online parte de uma abordagem pedagógica que define desde o planejamento, a escolha das interfaces de comunicação e de conteúdos, a arquitetura de redes de situações de aprendizagem, as metodologias, dispositivos e interfaces de avaliação da aprendizagem. Numa perspectiva formativa e contínua, é preciso se apropriar de estratégias que potencializem a comunicação todos-todos, a construção colaborativa e avaliativa de conhecimentos. Nesse contexto que aqui apresentamos uma experiência didática com portfólio online, tal dispositivo não contempla apenas postagens de atividades individuais, mas um lócus de encontros interativos de docentes e discentes remotamente.

O presente artigo relata uma experiência concreta de avaliação formativa online no contexto de um desenho didático online que ocorreu de modo 100% remoto em função das exigências sanitárias da pandemia da COVID-19. Para tanto, além dessa apresentação, organizamos o nosso artigo em mais duas sessões a seguir. A primeira tematiza pedagogicamente sobre o portfólio online, apresentando princípios didáticos. Na segunda sessão, discorremos sobre a experiência empírica por nós mediada no contexto do Programa de Pós-graduação em Educação, Contextos Contemporâneos e Demandas Populares (PPGEduc), da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) oferecida no terceiro período acadêmico especial do ano de 20217.

2 PORTFÓLIO ONLINE: APRESENTANDO SEUS PRINCÍPIOS DIDÁTICOS

Em diálogo com as ideias da avaliação mediadora sugerida por Hoffmann (2000), que segue a linha de Freire (2005), o estudioso Marco Silva (2006) propõe uma prática de avaliação condizente com a dinâmica da sociedade do nosso tempo, a cibercultura (LEMOS, 2002; LÉVY, 2009) - que tem nas suas bases as potencialidades das tecnologias digitais em rede - uma avaliação formativa, construtivista, processual e libertadora, sustentada nos princípios da autonomia, dialógica, participação e colaboração. Um modelo de avaliação numa perspectiva dos fundamentos da interatividade, portanto, com práticas avaliativas que permitam a “participação-intervenção e bidirecionalidade-hibridação” (SILVA, 2000), ou seja, a comunicação é produção conjunta de todos, professores e estudantes.

Todos interferindo nas mensagens, participando, co-criando, constrõem coletivamente o conhecimento. Assim, no processo de ensino e aprendizagem, ambos – professor e estudantes – vão formando-se e se formando. Vale ressaltar que na avaliação mediadora, como Hoffmann (1994, p. 51) vem alertando, em oposição ao modelo da transmissão-verificação- registro, deve-se evoluir,

no sentido de uma ação avaliativa reflexiva e desafiadora do educador em termos de contribuir, elucidar, favorecer a troca de idéias entre e com seus alunos, num movimento de superação do saber transmitido a uma produção de saber enriquecido, construído a partir da compreensão dos fenômenos estudados.

Nessa direção, uma das práticas avaliativas que pode fazer emergir uma avaliação formativa em ambientes virtuais e a concretização dos aspectos expostos são os portfólios online. Conforme Santos (2014, p. 107), o portfólio online “pode significar desde a mídia, o suporte que veicula a mensagem, até o seu conteúdo, a mensagem propriamente dita. Além da mídia e do conteúdo separadamente, o portfólio pode significar também a hibridação do suporte com o conteúdo, ou seja, mídia e mensagens juntas”. Segundo a autora, em se tratando da mídia, o portfólio pode ser construído em páginas ou sites publicados na internet ou nas interfaces que fazem parte dos ambientes virtuais de aprendizagem (AVA). Podendo agregar as produções do autor, permite o compartilhamento das atividades deste sujeito com a toda a comunidade de aprendizagem. Em uma experiência mais antiga, Santos (2006), já apresentava o potencial comunicacional do portfólio digital agregado a uma postura interativa de pesquisa e prática pedagógica que poderia contribuir significativamente para a formação dos educandos.

Inspiradas nas ideias de Villas Boas (2004)8, conforme Midlej Araújo e Santos (2012), podemos afirmar que o/a estudante, ao socializar suas produções, demonstra as evidências de suas aprendizagens. O portfólio pode ser organizado por ele próprio para que, em conjunto com seus colegas e professor, permita o acompanhamento de seus dilemas, dificuldades, avanços, conquistas, lacunas que precisam ser superadas. Ressaltamos que não reduzimos o portfólio a uma perspectiva instrumental, pois não o concebemos como um repositório no qual se acumulam as produções aleatórias, nem todas as atividades realizadas. O que propomos parte de uma perspectiva crítica, reflexiva e de autoria dos estudantes na sua organização, conforme Villas Boas (2004), quando o tratamos como um dispositivo que deve conter “uma coleção especial das melhores produções, das produções-síntese, das produções previamente analisadas e organizadas pelo autor por meio da autoavaliação” (SANTOS, 2006, p. 322).

Charréu e Oliveira (2015), ao relatar uma experiência de uso dos portfólios na formação docente, sinalizam como um dos principais benefícios a troca de informações e acolhimento de dúvidas uns dos outros, visto que esse intercâmbio é importante porque os diferentes acontecimentos não ficam presos ou relegados a uma única pessoa.

A escrita e a posterior leitura no coletivo possibilitam o fluxo das informações e a mobilidade das práticas, a fim de que cada um possa dividir seus medos, suas angústias. Essa prática promove a quebra de estereótipos e aponta novos caminhos para cada situação apresentada no grupo. Tudo o que foi escrito/descrito pelo professor – os entraves, os problemas, as dificuldades, todas as descrições das aulas, bem como as satisfações, as alegrias, as análises –, que era particular, torna-se público. (CHARRÉU E OLIVEIRA, 2015, p. 413)

Alguns princípios significativos para essa prática são apontados por Klenowski (2003) citada por Villas Boas (2004, p. 56), a saber: “promove nova perspectiva de aprendizagem (é um processo); incorpora análise do desenvolvimento da aprendizagem; requer autoavaliação; encoraja a seleção e a reflexão do aluno sobre o seu trabalho”. Nesse processo, o professor é um mediador de aprendizagens.

O portfólio coloca os cursistas em estado de movimento e reflexão, portanto ativos, pois podem comparar suas produções com os objetivos de aprendizagem e com os critérios de avaliação e, juntamente com o professor, podem definir as atividades seguintes, tornando-se parceiros desse processo. Possibilidades fundamentais do uso do portfólio no processo formativo são apontadas por Villas Boas (2005), ao citar Murphy (1997), a saber: a avaliação das capacidades de pensamento crítico, de articulação e busca de solução de problemas complexos, de trabalhar colaborativamente, de conduzir pesquisa e de desenvolver projetos.

Sendo um processo contínuo pode-se valorizar todas as produções e, a partir do que sugere a autora citada, percebemos que ao analisar as últimas e compará-las com as primeiras, o estudante pode perceber seus avanços, conquistas e dificuldades. Esse procedimento requer que “a construção do portfólio se baseie em propósitos de cuja formulação o aluno participe para que se desenvolva o sentido de pertencimento” (VILLAS BOAS, 2005, p. 295).

Santos (2006, p. 322) afirma que, ao mostrar e dar visibilidade ao seu processo de aprendizagens, o estudante “sente-se preparado para comunicar o que aprendeu, defender sua posição diante dos variados conteúdos estudados, fornecendo suporte para a dialógica com outros sujeitos envolvidos, sejam seus colegas ou professores”. Pode ser observado onde os cursistas utilizam as informações/discussões emergentes nas interações, como estas foram transformadas em conhecimento, onde foram encontradas (as fontes) e, por fim, como manifesta seus saberes e suas atitudes em relação ao conteúdo proposto.

Ao relatar conceitualmente como operam com o portfólio como instrumento na formação de professores, tendo a perspectiva da cultura visual como pano de fundo, Charréu e Oliveira (2015) ressaltam que, atualmente, é inevitável o choque da formação desses profissionais com tal cultura. Afirmam que a maioria das áreas do conhecimento têm elaborado novos aportes didáticos, explorando formas persuasivas de abordagem, tendo as imagens como principal foco. Para os referidos autores, a cultura visual [para nós, também a cultura digital] possibilita explorar os portfólios não apenas no tocante ao campo imagético, mas também como nos relacionamos com as visualidades. É um posicionamento político e epistemológico, que é acionado quando:

estabelecemos relação entre uma imagem e outra, quando colocamos em diálogo um texto com um filme e problematizamos ambos. Fato esse que é muito diferente do que, simplesmente, elaborar perguntas ou questões sobre o filme. A contribuição da cultura visual para pensar [...] os portfólios, reside no que esse campo pode gerar como movimentação propulsora, ou seja, como campo conceitual adisciplinar que nos permite estabelecer inúmeras relações entre os conceitos, entre um conceito e a produção de uma imagem, entre uma imagem e outra [...] (CHARRÉU e OLIVEIRA, 2015, p. 418)

Conclui-se que tal relação está focada no olhar do observador, no objeto/visualidade observada, a partir do que foi construído no processo, na itinerância do cursista-pesquisador, envolvendo o que ele já sabia/conhecia e/ou que foi desvelado/aprendeu em um determinado momento nas ambiências formativas, no caso relatado nesse trabalho, em ambientes em que se materializam a educação online. Modalidade de educação defendida por Santos (2014, p. 63), como “o conjunto de ações de ensino-aprendizagem, ou atos de currículo mediados por interfaces digitais que potencializam práticas comunicacionais interativas, hipertextuais e em mobilidade”.

3 AVALIAÇÃO FORMATIVA ONLINE EM TRÊS DIMENSÕES

Para a concretização dos princípios teóricos da avaliação na educação online (SILVA, 2006) citados anteriormente, pautando-se na avaliação formativa/mediadora (HOFFMANN, 2000), é preciso se apropriar das vantagens do suporte digital online, em especial sua plasticidade, capaz de agregar vários tipos de linguagens (textos, sons, imagens estáticas e dinâmicas, hipermídias), permitindo que forjemos currículos online como espaços comunicacionais interativos de aprendizagem e formação. Podemos agregar em nossos dispositivos não só possibilidades de acesso, difusão de várias linguagens, mas sobretudo o compartilhamento desses sentidos. É preciso garantir a comunicação interativa entre conteúdos e seus autores, que podem estar fisicamente distantes e geograficamente dispersos. O potencial comunicacional do portfólio online agregado a uma postura interativa de pesquisa e prática pedagógica poderá contribuir significativamente na formação de pesquisadores nos programas de pós-graduação.

Nesse sentido, tratamos o portfólio aqui como interface assíncrona de comunicação, dispositivo de pesquisa e prática pedagógica e, sobretudo, dispositivo de avaliação formativa, conforme a reflexão de Santos (2014). O portfólio pode se materializar na combinatória com diferentes interfaces digitais no contexto de uma plataforma digital ou ambiente online. O processo formativo se constituiu nessa partilha reflexiva e dialogada de saberes.

Para os pesquisadores, docentes e discentes que interagem com práticas de avaliação formativa, é comum entendermos esse processo como um acontecimento que não o separa de seus produtos e autores. A prática de avaliação formativa é um ato interativo no qual docentes e discentes negociam estratégias de produção de conhecimento que são analisadas em atividades de diagnóstico e planejamento constantes de novas estratégias e tomadas de decisão, para que a aprendizagem seja de fato alcançada. Assim, são necessários procedimentos e dispositivos que ilustrem de forma significativa o processo. Nesse sentido, não devemos separar o processo de seus produtos e muito me nos das suas estratégias de produção.

Partindo desses pressupostos, é importante conceber o portfólio como um dispositivo que potencialize a visibilidade da produção de cada sujeito e que ele possa compartilhar com todo o coletivo sua produção, sendo simultaneamente autor e avaliador não só da sua própria autoria e produção como também da produção e autoria de seus pares. Quando afirmamos que a avaliação formativa é um ato interativo acreditamos que cada sujeito que é avaliado deve também ser um sujeito que pode e deve avaliar. Assim, para Santos (2014), o portfólio se constitui num dispositivo interativo que permite:

Dentre as três dimensões elencadas acima, compactuando com as ideias de Villas-Boas (2004, p. 53), ressaltamos a autoavaliação como uma das mais significativas, entendendo que é nesse processo que o estudante-pesquisador “analisa continuamente as atividades desenvolvidas e em desenvolvimento e registra suas percepções e seus sentimentos” a partir de critérios definidos anteriormente. As informações que são fornecidas pelos estudantes servem para a reorganização das próximas ações do trabalho pedagógico.

Em nossas pesquisas e experiências formativas criamos sempre portfólios online que permitam que cada estudante tenha sua área privada de trabalho (assim os trabalhos são postados e podem ser comentados por outros membros da turma e os docentes) e que esta seja aberta a interação com a turma como um todo. O dispositivo deve incentivar a autoavaliação, a heteroavaliação e, sobretudo, a coavaliação. A seguir partilharemos uma experiência empírica por nós vivenciada.

4 TRAJETÓRIA EMPÍRICA DO USO DO PORTFÓLIO ENQUANTO ESPAÇO FORMATIVO DE AUTO/CO/HETEROAVALIAÇÃO

Conforme já informado na apresentação desse texto, a experiência formativa aqui relatada desenvolveu-se na oferta do componente curricular “Pesquisa em Educação na Contemporaneidade (45h)”9, que ocorreu de modo 100% remoto em função das exigências sanitárias da pandemia da COVID 19. Esta disciplina faz parte do projeto curricular do Programa de Pós-graduação em Educação, Contextos Contemporâneos e Demandas Populares (PPGEduc) – UFRRJ e foi oferecida no terceiro período acadêmico especial do ano de 202110.

São praticantes desta pesquisa 26 (vinte e seis) estudantes regulares do Mestrado deste Programa, ingressos em 2021 e cursando seu 1º período acadêmico no curso. A docência desta disciplina deu-se de forma compartilhada entre uma professora titular da UFRJ credenciada no Programa e uma docente pesquisadora de outra IPES (a Universidade do Estado da Bahia - UNEB), em estágio de pós-doutoramento no PPGEduc/ UFRRJ.

5 DESENHO DIDÁTICO ONLINE

A proposta formativa do desenho implementado na disciplina previu o híbrido das interações síncronas e assíncronas, em um contínuo de estudos/reflexões mediadas/construções colaborativas e produções autorais. Compreendendo que é na ação protagonista dos praticantes com a mediação docente dialógica e desafiadora que a aprendizagem se constrói, dois espaços/tempos foram definidos para o desenvolvimento dos objetivos: encontros síncronos semanais no Jitsi Meet (plataforma de webconferência) e atividades assíncronas contínuas na plataforma institucional do Sistema Integrado de Gestão de Atividades Acadêmicas - SIGAA11.

Dentre as atividades desenvolvidas no SIGAA, destacamos nesse texto a produção dos portfólios, enquanto atividade de aprendizagem, que se configurou com um diário permanente de todo o processo de elaborações desenvolvidas por cada praticante. Utilizando a interface “fórum” foi criado um tópico específico por discente. Neste espaço individual cada mestrando ia construindo registros e reflexões a partir das leituras realizadas e das discussões desenvolvidas nos encontros síncronos, em um processo integrado de estudo/reflexão/produção que vinculava o síncrono e o assíncrono. Como princípio de construção colaborativa e compartilhamento, todos eram convidados a visitar os espaços dos colegas e lá deixar suas impressões e registros sobre as construções neste espaço.

Compreendendo a função do docente na educação online, todo o processo foi mediado e acompanhado pelas docentes, que provocavam aprofundamento e novas reflexões em cada portfólio individual a partir do que estava ali construído pelos mestrandos e do fluxo de discussões e leituras que aconteciam nos encontros síncronos.

O Quadro 1 a seguir, sistematiza a apresentação dos formatos de interação/mediação ocorridas em cada espaço multirreferencial em que se organizaram as atividades formativas.

Quadro 1- Espaços/tempos formativos na disciplina Pesquisa em Educação na Contemporaneidade

Espaços Multirreferenciais de Aprendizagens

Interações/mediações nos Atos de Currículo

Plataforma institucional do SIGAA

Partilha de material de estudo em diversos formatos de mídia

Orientações para atividades de pesquisa e construção pré e pós atividade síncronas

Tópico específico criado na ferramenta fórum tendo um espaço por discente para registros e reflexões sobre leituras realizadas e atividades dos encontros síncronos buscando integrar estudo/reflexão/produção no síncrono e no assíncrono.

Plataforma Jitsi Meet

Encontros Síncronos semanais

Discussão de textos e vídeos previamente indicados

Reflexões e aprofundamento sobre temas e autores selecionados

Participação de convidados para socialização de produções específicas relacionadas ao conteúdo trabalhado na disciplina

Comentários e orientações gerais sobre as produções nos portifólios

Fonte: as autoras.

Compreendendo a ação formativa como promoção do protagonismo e da autoria, as atividades desenvolvidas no desenho didático aqui apresentado buscaram oportunizar e fomentar a produção dos praticantes na articulação dialética entre saberes já construídos e trajetórias vivenciadas com os novos marcos teóricos estudados e reflexões desenvolvidas na construção colaborativa.

Deste modo, como mostra o Esquema 1 a seguir, a intencionalidade pedagógica do uso do portfólio previu momentos e formatos de ações/intervenções dos estudantes.

Esquema 1 – Intencionalidades pedagógicas e formatos de produção discente

Diagrama

Descrição gerada automaticamente

Fonte: as autoras.

Convidados à construção no formato portfólio os discentes aderiram de forma intensa e rica à experiência de produção, em fluxos e momentos diferenciados de acordo com seus processos subjetivos e sua individualidade formativa. Alguns aderiram de pronto e já produziram com autoria e criticidade desde os primeiros momentos, outros foram chegando aos poucos, na medida que sentiam-se mais à vontade com a turma, as docentes e o processo. Vale destacar que este era o primeiro semestre da turma no mestrado e desenvolvido em modo 100% remoto por imposição da pandemia. Desta forma, o grupo foi criando laços e permitindo-se mostrar no processo.

Interessante também observar que enquanto alguns iniciaram sua atuação no portfólio com a produção em seu espaço individual12, outros iniciaram pela participação nos espaços dos demais. “Visitando” e interagindo com os portfólios dos colegas foram se familiarizando com o processo e arriscando-se nas produções em seus espaços individuais.

Nos registros dos portfólios eles expressaram também a autoavaliação do seu processo, seja relatando suas dificuldades com a escrita autoral, refletindo sobre as marcas que trazem de processos formativos anteriores ou descrevendo os fatores que impulsionaram sua inserção neste formato de produção e os momentos vivenciados.

O uso do portfólio no desenho didático aqui apresentado foi pensado desde sempre como processo avaliativo, na compreensão de que avaliação é formação, espaço de aprendizado e construção. O convite para a sua construção já explicitava esta função de auto/hetero/coavaliação. (Quadro 2).

Quadro 2 – O Portfólio como espaço de AUTO/HETERO/COAVALIAÇÃO

Aqui temos o portfólio coletivo da turma. Cada estudante terá uma área para postar suas tarefas (sínteses individuais). Neste espaço vivenciaremos a avaliação da aprendizagem online em três dimensões:

1) Coavaliação - avaliação entre pares, ou seja, ESTUDANTES comentando as produções de outros ESTUDANTES;

2) Heteroavaliação - PROFESSORES comentarão as produções de cada ESTUDANTE;

3) Autoavaliação - cada ESTUDANTE fará a avaliação de suas próprias produções, após terem feedbacks dos colegas de turma e das professoras.

Para tanto, cada estudante terá um tópico específico no portfólio da turma, onde partilhará as atividades propostas durante as unidades temáticas.

Beijos!

XXX e XXXXXX

Fonte: Trecho transcrito do AVA utilizado na disciplina.

As intervenções/participações dos praticantes nos espaços do portfólio dos colegas traziam naturalmente esse aspecto da co/heteroavaliação. Sempre de modo respeitoso e cuidadoso, eles comentavam as produções dos demais utilizando muitas vezes comentários com juízos sobre a pertinência das produções, profundidade e originalidade, comentando por vezes também os estilos de linguagem.

As interações dos praticantes nos portfólios dos colegas foram significativas e riquíssimas, marcadas por uma respeitosa troca de impressões e motivações, trazendo vivências individuais, momentos dos encontros síncronos e o aporte teórico em estudo. O “anfitrião” do espaço, respondia a todas as intervenções dos colegas e por vezes eles estabeleciam diálogos entre quatro, cinco participantes ao mesmo tempo. (Quadro 3 – transcrição do AVA).

Quadro 3 – Construção colaborativa: trocas e aprendizado

Re: PORTFÓLIO DE Praticante 1

por Praticante 1 05/10/2021 13:43:08

A pesquisa como heurística - cap. I

A carta que antecede o primeiro capítulo é muito interessante e promoveu vários tópicos de discussão. Algumas frases são marcantes, como por exemplo:

Desconfio de professores que acham que sabem tudo e, infelizmente, no meu meio de trabalho (prof II da SME/RJ) isso é comum.

Fiquei com dúvida quanto ao título, pois não sabia o que significava heurítica e fui procurar no dicionário, onde achei a seguinte resposta: arte de inventar, de fazer descobertas; ciência que tem por objeto a descoberta dos fatos. Sendo assim, o título seria a pesquisa como a arte de fazer descobertas? Me pareceu meio óbvio. O que é então a pesquisa como heurística?

Término o meu registro de hoje da mesma forma que o Nóvoa terminou a carta:

Re: Re: PORTFÓLIO DE Praticante 1

Por Praticante 2 06/10/2021 18:10:02

Também procurei o que seria Heurística e ai após ler, ver alguns vídeos eu defini em minha mente como “expressão do conhecimento”. Talvez ainda não seja a melhor forma, porém é a forma que penso quando tentamos resolver problemas, inventar coisas, dentre outras formas de como usar nosso conhecimento para melhorar nossas vidas.

Re: Re: PORTFÓLIO DE Praticante 1

Por Praticante 3 09/10/2021 10:57:09

Estou aiviada em saber que não fui a únca envolvida nessa implicação formacional, pois também fui buscar no dicionário o conceito de heurística. A obra de Roberto Macedo muito tem a contribuir em nossa formação universitária pois nos faz entender a pesquisa a partir do olhar sobrre o que é educação universitária. Nessa ótica, Macedo nos faz perceber que esse espço universitário é principal núcleo de prdução de conhecimento e desenvolvimento crítico que vem sendo “Calado” nos últimos tempos, com excesso de normatização e redução de sua autonomia. Essa troca de dilogo nos ajuda a valorizar as histórias heurísticas e formacionais de nosso grupo.

Fonte: Trecho transcrito do AVA utilizado na disciplina.

6 MEDIAÇÃO DOCENTE: DIÁLOGO, ORIENTAÇÃO E DESAFIO ENQUANTO INTENCIONALIDADES PEDAGÓGICAS

Como atividade formativa e espaço de construção colaborativa, os portfólios tiveram permanente mediação docente, instigando, orientando, provocando os novos passos na construção. Com a intencionalidade pedagógica de promover o diálogo entre os diferentes espaços/tempos multirreferenciais adotados no desenho didático, o fluxo das produções registradas no portfólio seguia o fluxo das temáticas e dos acontecimentos dos encontros síncronos, com um intervalo de uma a duas semanas de reverberação entre eles. A maior parte do grupo “entrou no fluxo” produzindo e comentando de forma articulada com o que acontecia semanalmente no síncrono, alguns perdiam esse fluxo em momentos pontuais por questões conjunturais de seus contextos de vida, mas retomavam em tempo relativamente curto o fluxo.

Apenas três discentes perderam completamente este fluxo, apesar dos reiterados convites e orientações das docentes no AVA e nos encontros síncronos. Compreendendo que o sentido pedagógico do portfólio online implica na construção colaborativa com os pares e na articulação das atividades formativas do síncrono e do assíncrono, esses discentes foram convidados a construir um relatório das suas elaborações pessoais como formato alternativo ao portfólio – que não conseguiram acompanhar o fluxo. A avaliação deve promover a produção, o desafio, registrar o processo, e não constituir-se como instrumento de punição ou exclusão, assim, após diálogo individual com esses discentes, e considerando a participação regular dos mesmos nos encontros síncronos foi lhes oferecida essa alternativa de produção, esclarecido aos mesmos o que perderam por não participarem da dinâmica formativa do portfólio.

Para Piaget (1990) o desenvolvimento e consequentemente o aprendizado ocorrem em um continum de processos de desequilíbrio/equilíbrio/reequílibrio. Para Vygotsky (1993; 1994) o sujeito aprende e se desenvolve no desafio que se coloca em sua (Zona de Desenvolvimento Proximal - ZDP). As duas perspectivas subsidiam a defesa que aqui fazemos do papel do docente enquanto mediador da aprendizagem, compreendendo o sujeito que aprende como autor e protagonista do seu processo, que constrói seu conhecimento na relação com o ambiente, mediado pelos pares e, como acrescentado por Vygotsky (1993; 1994), pela cultura na qual está inserido. Podemos dizer, utilizando agora especificamente os conceitos vygotskianos, que a mediação docente deve partir do que o indivíduo já sabe (conhecimento real) para o que ainda não sabe, mas tem condições de aprender (conhecimento potencial). Buscamos essa interface entre o real e o potencial para a atuação pedagógica na mediação aos portfólios.

Quadro 4 – Mediação Docente no desafio da construção autoral

Re: Praticante 4

por Praticante 4 08/11/2021 22:13:04

Confesso que termino a aula de hoje com um nó na garganta, um pouco angustiada. Discutir decolonialidade, para mim, sempre é um tema sensível, onde sinto-me insuficiente frente à demanda que é preciso ter para repensar nossa sociedade que é cruelmente colonial. Ao mesmo tempo que o texto de Boaventura de Sousa Santos atiça nossos modos de pensar a pesquisa enquanto um constructo que aparecerá materializada na dissertação, também remete-me à realidade imediata, de marginalização e violência em um Brasil tomado pela matança explícita de alguns corpos, matança física e subjetiva. Essa linha de fronteira entre o texto e a realidade me angustia, mesmo que me alimente a pensar estratégias de resistência. Além de todo o arcabouço teórico, gostaria de compartilhar isso do campo íntimo, emocional. Por mais que às vezes, algumas palavras nos lembre de coisas duras, ao meu ver, um texto só faz sentido se mexer profundamente conosco.

Re: Re: PORTFÓLIO DE Praticante 4

por Docente mediadora 15/11/2021 19:55:51

Concordo Florence! O estudo, a pesquisa, a construção de conhecimento precisam fazer sentido para nós de forma intrínseca, viscderal até.

A consciência que nos permite ampliar a leitura de mundo (na persepctiva freiriana) traz inexoravelmente a dor e angustia frente a realidades sobre as quais precisamos nos indignar. Olhar para elas e perceber a crueldade que as forja e alimenta, é dificil, mas necessário. Não temos outra alternativa

Como eu trouxe Freire, trago aqui tbm um verbo cunhado por ele: “esperançar”, que não é no sentindo da espera, mas da ação. Que nossa ação sobre o mundo possa contribuir para denunciar e anunciar novos caminhoas

Fonte: Trecho transcrito do AVA utilizado na disciplina.

É importante ressaltar o que entendemos por mediação pedagógica/docente, concordando com Maseto (2000). Para o autor citado, em linhas gerais, a mediação pedagógica é a atitude do professor colocar-se como incentivador ou motivador da aprendizagem, colaborando para que o aprendiz chegue a seus objetivos. São as formas de tratar um conteúdo que ajudam o cursista a buscar informações, relacioná-las, organizá-las, discuti-las com seus pares, com o professor e com outros (interaprendizagem), até que alcance produzir um conhecimento significativo para ele e/ou para o grupo. Assim, sistematicamente, nos intervalos semanais dos encontros síncronos, a mediação docente nos espaços de cada praticante no portfólio da turma tinha como intencionalidades:

  1. Verificar o acompanhamento do fluxo das produções na articulação com o assíncrono, provocando os praticantes a avançarem nas produções sobre os temas já trabalhados no síncrono
  2. Identificar possíveis dificuldades ou distorções conceituais no trato dos temas em estudo, intervindo em diálogo esclarecedor e/ou indicando leituras complementares
  3. Estimular/motivar as produções através da presença do docente e dos comentários que somavam à reflexão ou simplesmente traziam um feedback sobre estas produções.

A seguir alguns exemplos das intervenções/mediações utilizadas pelas docentes mediadoras com as intencionalidades acima apresentadas:

Vc traz reflexões bastante pertinentes e autorais sobre o trecho da obra que trabalhamos em nosso último encontro. Provocando um pouco mais um aspecto que vc tbm trouxe em suas considerações, te convido a pensar: Ainda na introdução, Macedo tece considerações sobre o que chama “aplicacionismo tecnicista”, defendendo uma outra perspectiva sobre o estudo e a compreensão da pesquisa. Como ele defende essa outra perspectiva?

O belo e o desafiador do estudo e da pesquisa é exatamente essa busca, esse dar-se conta da incompletude, reconhecer-se e colocar-se sempre na perspectiva do aprendiz, do questionador. E partindo das reflexões postas por vcs aqui neste espaço, as convido a pensarmos juntas a partir da seguinte provocação: Ainda na introdução, Macedo tece considerações sobre o que chama “aplicacionismo tecnicista”, defendendo uma outra perspectiva sobre o estudo e a compreensão da pesquisa. Qual a defesa apresentada pelo autor?

Gostei muito que vc já traz aqui a vivência do Diário de Pesquisa em seu processo de construção em nossa disciplina! Como falamos no encontro síncrono, todas as experiências que vivenciamos enquanto sujeitos em nossas andanças pelo mundo, vamos trazendo como aporte, como repertório para nos fazer pesquisadores.

Por vezes, o diálogo entre mais de um praticante era tão amplo em um único espaço no portfólio que a mediação direcionava-se para todos que ali interagiam:

Prosseguindo na reflexão que vêm fazendo, consideremos que o diário tem como uma das suas principais características o registro do cotidiano vivido e refletido pelo autor, configurando-se como um ato de fala. Os diários online incorporam aspectos comunicacionais e pedagógicos, trazendo em potência a possibilidade de que este conteúdo seja compartilhado de forma síncrona ou assíncrona. Como as autoras justificam a afirmação de que o diário online é um fenômeno da ciberultura? (Docente mediadora 1)

Assim, as produções no portfólio foram se constituindo a partir das trocas com os pares e com as docentes, das reflexões individuais, dos estudos e pesquisas orientados, do olhar reflexivo sobre suas próprias vivências e saberes prévios e da participação nas atividades síncronas – além de múltiplos outros espaços de aprendizagem do contexto individual e das escolhas subjetivas de cada um. O Equema 2 a seguir sistematiza a dinâmica dessa produção.

Esquema 2 - Dinâmica de construção no Portfólio

Diagrama

Descrição gerada automaticamente

Fonte: Elaborada pelas autoras.

Embora reconheçamos que a avaliação formativa e interativa é ainda uma utopia na realidade educacional brasileira, acreditamos que há muitas vivências significativas para sua construção nas diversas instâncias da educação formal, a exemplo da experiência analisada neste texto.

Destacamos neste ponto a articulação entre as imagens 1 e 2, por nós elaboradas, apontando que as intencionalidades pedagógicas almejadas quando da definição por este caminho de avaliação formativa através do portifólio online traduziram-se em resultados bastante positivos, alcançando construções multireferenciais autorais originadas das reflexões individuais de cada praticante e enriquecidas com as partilhas do grupo e a mediação docente.

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Apresentamos e refletimos aqui sobre experiência concreta de avaliação formativa online em três dimensões (auto/co e heteroavaliação) no contexto de um desenho didático online, que concebeu o portfólio como interface assíncrona de comunicação, dispositivo de pesquisa e prática pedagógica e, sobretudo, dispositivo de avaliação formativa.

Como ato interativo, a avaliação formativa acredita que cada sujeito que é avaliado deve também ser um sujeito que pode e deve avaliar. Na perspectiva aqui adotada o portfólio se constitui num dispositivo interativo que permite Autoavaliação, ecoavaliação e Heteroavaliação.

Convidados à construção de portfólios, os discentes de pós-graduação aderiram de forma intensa e rica a esse formato de produção, em fluxos e momentos diferenciados de acordo com seus processos subjetivos e sua individualidade formativa. Nos portfólios expressaram a autoavaliação do seu processo, interagiram com os colegas em ricas significativas interações, produzindo a partir dessas trocas com os pares e com as docentes, das reflexões individuais, dos estudos e pesquisas orientados, do olhar reflexivo sobre suas próprias vivências, dos saberes prévios e da participação nas atividades síncronas.

Concluímos que, a partir dos diálogos assíncronos, mediados por docentes e discentes em espaçostempos forjados nas interfaces de ambientes virtuais, pode-se juntos criar práticas outras de avaliação processual e formativa online.

A avaliação formativa e interativa ainda é uma utopia. Mas como toda utopia sugere uma possibilidade de acontecimento, não percamos a esperança e ensaiemos novas estratégias e ousadias pedagógicas também nos Programas de Pós-graduação stricto sensu.

REFERÊNCIAS

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BRASIL. Ministério da Educação. Gabinete do Ministro. Portaria nº 343, de 17 de março de 2020. Dispõe sobre a substituição das aulas presenciais por aulas em meios digitais enquanto durar a situação de pandemia do Novo Coronavírus - COVID-19. Diário Oficial da União, Brasília, DF, ed. 53, 18 mar. 2020. Seção 01, p. 39. (a)

BRASIL. Ministério da Educação. Gabinete do Ministro. Portaria nº 473, de 12 de maio de 2020. Prorroga o prazo previsto no § 1º do art. 1º da Portaria nº 343, de 17 de março de 2020. Diário Oficial da União, Brasília, DF, ed. 90, 13 maio 2020. Seção 01, p. 55. (b)

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VYGOTSKY, L. S. Pensamento e linguagem. São Paulo, Martins Fontes, 1993.


1 Doutora e Mestre em Educação pela Universidade Federal da Bahia.

2 Doutora em Difusão do Conhecimento pela Universidade Federal da Bahia; Mestre na área de Mídia e Conhecimento pela Universidade Federal de Santa Catarina.

3 Doutora e Mestre em Educação pela Universidade Federal da Bahia.

4 As instituições educacionais criaram vários materiais para auxiliar os docentes nas práticas pedagógicas, a exemplo da cartilha criada pelo Grupo de Pesquisa Educação e Comunicação – GEC-Faculdade de Educação – UFA – Disponível em: https://blog.ufba.br/gec/files/2020/05/GEC_livro_final_imprensa.pdf.

5 Grupo de Trabalho Educação e Comunicação da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação.

6 Associação Brasileira de Pesquisadores em cibercultura.

7 Como uma das estratégias da gestão universitária para minimizar os efeitos das restrições impostas pela pandemia e recuperar o tempo perdido com a paralisação total das atividades no início dessas restrições, a Universidade em foco organizou períodos acadêmicos especiais em substituição à organização semestral de modo que foi possível desenvolver três períodos acadêmicos no ano de 2021.

8 Villas Boas (2004) apresenta o porta-fólio ou portfólio como, segundo Ferreira, “uma pasta de cartão usada para guardar papéis, desenhos, estampas etc”. A autora traz outro conceito a partir de Houaiss e Villar: [...] conjunto de trabalhos de um artista (designer, desenhista, cartunista, fotógrafo etc.) ou de fotos de autor ou modelo, usadas para divulgação entre clientes prospectivos, editores etc.; porta-fólio (cartão) contendo material publicitário (sugestões de leiautes, artes-finais, provas etc.) que se leva a um cliente para aprovação.” (VILLAS BOAS, 2004, p. 37).

9 Disciplina optativa da matriz curricular do Programa, ofertada regularmente aos discentes.

10 Vide nota de rodapé 6.

11 Sistema digital adotado pela Universidade em foco para registro e acompanhamento das atividades acadêmicas oferecidas e do fluxo de cumprimento destas pelos discentes.

12 Individuais no sentido que cada um tinha um espaço definido para seus registros e impressões, mas esses espaços eras abertos à visitação e interação de todos e contava com a mediação permanente das docentes.