https://doi.org/10.18593/r.v48.30133

Política afirmativa na Universidade Federal do Rio Grande do Sul: as ações de permanência estudantil na concepção

das gestoras e dos gestores

Política afirmativa en la Universidad Federal de Rio Grande do Sul: acciones de permanencia estudiantil en la concepción de las directivas y de los directivos

Affirmative policy at the Federal University of Rio Grande of Sul: student permanence actions in managers’ conceptions

Neusa Chaves Batista1

Universidade Federal do Rio Grande do Sul; Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação. http://orcid.org/0000-0003-4322-2829

Rita de Cássia Soares de Souza Bueno2

Universidade Federal do Rio Grande do Sul; Técnica em Assuntos Educacionais.

https://orcid.org/0000-0002-4254-5514

Resumo: O artigo analisa o processo de institucionalização da política afirmativa para a educação superior na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), dando foco à permanência das/dos acadêmicas/os cotistas a partir dos significados estabelecidos pelos atores que atuam na macrogestão da academia. Para tal, utiliza-se, como referencial teórico, uma noção de justiça social que incorpora a necessidade de reparação/transformação em três dimensões: socioeconômica (classe social), cultural (identidades e status) e política (participação política). A base epistemológica-metodológica centra-se nas premissas da análise crítica do discurso, a entender que o discurso não só está determinado pelas instituições e estruturas sociais, mas que é parte constitutiva delas, isto é, que o discurso constrói o social como prática, atuando tanto como reprodutor das estruturas sociais quanto seu transformador. Em termos de resultados, a pesquisa revela que a UFRGS carece de enfrentar desafios substanciais referentes à implementação de ações de permanência estudantil que considerem a diversidade social, econômica e cultural das/dos estudantes cotistas oriundas/os dos meios populares. Ademais, o estudo demonstra que a universidade ainda possui uma organização acadêmica bastante condicionada por bases institucionais voltadas para o ensino das elites brasileiras.

Palavras-chave: Política Afirmativa; Educação Superior; Permanência Estudantil.

Resumen: El artículo analiza el proceso de institucionalización de la política afirmativa para la educación universitaria en la Universidad Federal de Rio Grande do Sul (UFRGS), centrándose en la permanencia de las/los estudiantes ingresantes por cuotas a partir de los significados establecidos por los actores que actúan en la macro gestión de Academia. Para ello, se utiliza como marco teórico una noción de justicia social que incorpora la necesidad de reparación/transformación en tres dimensiones: socioeconómica (clase social), cultural (identidades y estatus) y política (participación política). La base epistemológica-metodológica se centra en las premisas del análisis crítico del discurso, entendiendo que el discurso no sólo está determinado por las instituciones y estructuras sociales, sino que es parte constitutiva de ellas, es decir, que el discurso construye lo social como práctica, actuando tanto como reproductor de estructuras sociales cuanto transformador de estas. En términos de resultados, la investigación revela que la UFRGS necesita enfrentar desafíos sustanciales en cuanto a la implementación de acciones de permanencia estudiantil que consideren la diversidad social, económica y cultural de las/los estudiantes de cuota provenientes de ambientes populares. Además, el estudio demuestra que la universidad todavía tiene una organización académica muy condicionada por las bases institucionales destinadas a la enseñanza de las élites brasileñas.

Palabras clave: Política Afirmativa; Educación Universitaria; Permanencia Estudiantil.

Abstract: The article analyzes the institutionalization process of the affirmative policy for higher education at Federal University of Rio Grande do Sul (UFRGS), focusing on the permanence of the student’s quota based on the meanings established by the actors who have worked in the academy’s macro-management. For this purpose, a notion of social justice is used as a theoretical reference which incorporates the need for reparation/transformation in three dimensions: socioeconomic (social class), cultural (identities and status) and political (political participation). The epistemological-methodological basis focuses on the premises of critical discourse analysis, understanding that discourse is not only determined by social institutions and structures, but that it is a constitutive part of them, that is, discourse constructs social as a practice, acting both as a reproducer of social structures and as its transformer. Taking the results into account, the research reveals that UFRGS needs to face substantial challenges regarding the implementation of student permanence actions that take into account the social, economic and cultural diversity of students from popular backgrounds. Furthermore, the study shows that the university still has an academic organization highly conditioned by institutional bases aimed at teaching Brazilian elites.

Keywords: Affirmative Policy; Higher Education; Student Permanence.

Recebido em 11 de abril de 2022

Aceito em 15 de agosto de 2023

1 INTRODUÇÃO

No Brasil, as políticas afirmativas em universidades públicas são fruto de problematizações coletivas iniciadas nas primeiras décadas do século XXI. Elas trazem para o terreno dos embates sociais questões referentes às injustiças que explicitam a exclusão social de estudantes em situação de desigualdade nas condições de acesso à educação superior. No contexto das sociedades capitalistas, produziu-se a noção de igualdade de oportunidades, com base na meritocracia, como preceito de justiça escolar e social (BATISTA; PEREYRA, 2020; DUBET, 2004). Assim, desde a emergência dos Estados-nações e dos sistemas de ensino ocidentais expandidos para as colônias europeias que se emanciparam, a justiça escolar, com base republicana, tem sido tratada como algo dado – natural. Contudo, na materialidade histórica dos sistemas de ensino ocidentais, esta noção de justiça educacional é contestada pelo fato de selecionar e classificar as/os estudantes com base na sua origem social e cultural, desconsiderando a noção de que o mérito é uma construção social relacionada com as possibilidades reais que cada pessoa ou grupo social possui para acessar o capital cultural dominante (BATISTA; PEREYRA, 2020; BOURDIEU, 2014).

No caso do Brasil, o desdobramento desta noção de justiça escolar como mérito, pode ser percebido em indicadores sociais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) que demonstram, persistentemente, a relação entre a desigualdade educacional e a desigualdade social (BRASIL, 2019b). Impactada por tal fenômeno, a sociedade brasileira organizada em coletivos dos mais diversos campos de atuação, exige a reparação da exclusão social mediante políticas públicas de ação afirmativa para o acesso à educação superior aos estudantes egressos de escolas públicas e oriundos dos meios populares (BATISTA, 2015; 2018).

No início dos anos 2000, muitas universidades públicas, no âmbito de sua autonomia, implantaram políticas afirmativas. No entanto, é somente em 2012, com a aprovação da Lei nº 12.711 (BRASIL, 2012), que a política se expande para toda a esfera federal, garantindo, no mínimo, 50% das vagas em todos os cursos de graduação das 110 Instituições Federais de Educação Superior (IFES) para egressos de escolas públicas. No percentual há subdivisões prevendo cotas com recortes socioeconômico, étnico-raciais e para pessoas com deficiência.

Com a política afirmativa facultando acesso a estudantes dos meios populares, historicamente excluídos da universidade, uma outra questão social se faz presente após o ingresso: a permanência destas/es acadêmicas/os na universidade com garantia de conclusão do curso de graduação com sucesso. No caso da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a política afirmativa foi implementada no ano de 2008, portanto, antes da Lei de Cotas. Cumpre destacar, no entanto, que essa decisão foi uma consequência das demandas postas por representações do movimento negro, lideranças e interlocutores indígenas, ativistas discentes, técnicos e docentes que, no embate político, disputaram e demandaram a adesão da Universidade às ações afirmativas (BATISTA, 2015).

Este artigo analisa as ações de permanência para estudantes cotistas na UFRGS. Indagamos sobre as concepções dos atores (gestoras e gestores) da macroestrutura acadêmico-institucional no que diz respeito às políticas afirmativas, destacadamente, às ações de permanência estudantil. A investigação surge das seguintes observações: do objetivo constante das supras decisões do CONSUN, que propõem: “desenvolver ações visando a apoiar a permanência dos estudantes cotistas” (UFRGS, 2007; 2012); bem como do princípio legal prevendo que o ensino deve ser ministrado com base na “igualdade de condições para o acesso e permanência na escola” (BRASIL, 1988; 1996), pois, consideramos que este ordenamento está diretamente relacionado com o acesso e permanência à/na educação superior.

A base epistemológica-metodológica orienta-se pelos pressupostos da análise crítica do discurso (ACD), os quais dão ênfase ao estudo daquelas ações sociais que pomos em prática através do discurso, tais como: o abuso do poder, o controle social, a dominação, as desigualdades sociais e/ou a marginalização e as exclusões sociais. A operacionalização do corpus de pesquisa se deu, centralmente, a partir do texto de entrevistas semiestruturadas realizadas com seis gestoras/es da macroestrutura institucional da UFRGS3. As entrevistas foram realizadas em 2015, após a implementação da Lei de Cotas que aumentava o percentual de reserva de vagas para egressos de escolas públicas na UFRGS, de 30% para 50%. Foram selecionadas/os gestoras e gestores envolvidas/os diretamente com a formulação, implementação e avaliação das ações de permanência estudantil no escopo da política afirmativa. Outros textos, de cunho avaliativos e regulatórios sobre o programa de ações afirmativas (UFRGS, 2007; 2012; 2014; 2019), foram consultados de modo a observar-se a intertextualidade do fenômeno. Toma-se os enunciados dos atores (gestoras e gestores) a partir de posições determinadas, inscritos em um contexto interdiscursivo específico e reveladores de condições históricas, sociais, intelectuais, ideológicas, dentre outros (IÑIGUEZ, 2004; ORLANDI, 2015; FAIRCLOUGH, 2016).

Na disposição textual deste artigo, após esta introdução, segue uma breve discussão sobre o conceito de justiça social que permeia a nossa interpretação sobre as políticas afirmativas em contexto de desigualdades educacionais e sociais. Na seção subsequente, convergimos à análise do discurso dos atores (gestoras e gestores) da macroestrutura institucional da UFRGS. Por fim, retomamos o objetivo desta investigação, buscando dar tratamento analítico de cunho conclusivo, tendo como base os principais achados.

2 A JUSTIÇA SOCIAL COMO REFERÊNCIA PARA A POLÍTICA AFIRMATIVA NA EDUCAÇÃO

Em 2020 a “Constituição Cidadã” brasileira, completa mais de três décadas de existência. Na Carta, estão estabelecidos os dispositivos que demarcam a busca pela igualdade material ou substancial, que transcendem a também assegurada igualdade formal, perceptíveis em seu artigo 3º: Inciso I – construir uma sociedade justa livre e solidária; III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (BRASIL, 1988). Os direitos que garantem esses bens essenciais, os civis, sociais e políticos, estão igualmente expressos nos Artigos 5º, 6º e 14º, conforme segue:

Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade [...]. Art. 6º - São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição [...]. Art. 14 - A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei [...] (BRASIL, 1988).

Na atualidade, pode-se afirmar que todas as sociedades que têm como base o Estado Democrático de Direito, de base liberal e ocidental, incorporam às suas Cartas Constitucionais uma base jurídica para assegurar um mínimo de igualdade material, garantindo, assim, alguma equidade social; uma condição essencial frente às desigualdades sociais produzidas e reproduzidas pelos princípios econômicos e políticos do capitalismo (BATISTA; PEREYRA, 2020).

Em termos conceituais, as noções de justiça são inclusivas, abarcando concepções amplas de análises, de luta pelo controle de bens e discursos (BALL; MAINARDES, 2011). As teorias de Nancy Fraser (2001; 2007; 2010) põem em relevo uma noção de justiça social cujo escopo remete a questões relacionadas às injustiças socioeconômicas, culturais e política. Ao elaborar suas conceitualizações, a autora observa que a sociedade capitalista possui uma estrutura de classe que institucionaliza alguns mecanismos econômicos que negam sistematicamente para algumas pessoas e grupos os meios e as oportunidades que necessitam para participar na vida social paritariamente com os demais. De modo semelhante, assevera que o capitalismo, como modo de vida social, reproduz uma hierarquia de status que institucionaliza padrões de valor cultural, os quais negam por completo a algumas pessoas e grupos o reconhecimento para participar plenamente na interação social. Com base nesta observação a autora propõe o enfrentamento das injustiças sociais por meio da redistribuição socioeconômica e do reconhecimento cultural. Argumenta que estas dimensões são políticas por natureza, no sentido de serem contestadas e permeadas por poder e que, frequentemente, têm sido tratadas como elementos que demandam a tomada de decisão por parte do Estado – das instituições (FRASER, 2022; 2010).

Nesta concepção, a desvantagem econômica e o desrespeito cultural se entrelaçam e apoiam para piorar os quadros de desigualdade social. Ao distinguir e compreender que as diferentes injustiças estão enraizadas nas sociedades capitalistas, é possível pensar em distintas intercessões. O pressuposto de Fraser (2007; 2010; 2022) é de que as injustiças de redistribuição socioeconômica consistem na exploração do trabalho, na marginalização e na privação econômica, enquanto as de reconhecimento cultural ou simbólico estão alicerçadas na dominação do “outro”, na invisibilização e no desrespeito cultural. É possível formular soluções, projetos de justiça social, caso associem-se às formas de redistribuição e de reconhecimento, às de representação política na esfera pública.

No caso das elucidações encetadas por Pierre Bourdieu sobre a exclusão e as desigualdades sociais, estas reforçam a materialidade histórica das injustiças sociais produzidas e reproduzidas em sociedades orientadas pelos princípios do capitalismo; injustiças que Fraser (2001) identifica e propõe intervenção. Bourdieu (2014) reforça as argumentações de Nancy Fraser, ao apontar que o espaço social é algo definido conforme a ordem estatística da distribuição do capital econômico, cultural e simbólico. O autor considera que a estrutura social é um sistema hierarquizado de poder e privilégio, determinado tanto pelas relações econômicas, quanto pelas relações simbólicas e culturais entre os sujeitos. A essas relações ele intitula de conjunto de capitais, que são compreendidos a partir de um sistema de disposição de cultura, que envolvem as dimensões econômicas, simbólicas, culturais, sociais, dentre outras, que denomina de habitus. Para além das reproduções de desigualdades econômicas, compreende que existem os jogos de poder econômicos, culturais e sociais hierarquizantes na sociedade, sendo que as desigualdades são resultantes de imbricadas relações de forças e são reproduzidas no interior das instituições (BOURDIEU, 1996; 2011; 2014).

Essas conceitualizações podem, em alguma medida, explicar as razões para a (não)construção e (não)desdobramentos das políticas públicas educacionais em sucesso escolar para todas as pessoas. Tais políticas, fruto de um Estado social, supostamente deveriam atuar como mecanismos de garantia de justiça social (BATISTA, 2015; 2018). Com efeito, a noção de justiça proposta por Fraser (2001; 2010; 2022), que incorpora as dimensões de redistribuição socioeconômica, reconhecimento cultural ou simbólico e representação política, como fundamento para as políticas educacionais e, dentre estas, as políticas afirmativas, pode responder de forma mais adequada às demandas e justificativas dos grupos e/ou classes sociais excluídos do acesso de bens sociais, econômicos e culturais.

De modo a equacionar tal noção, propõem-se a operacionalização do conceito para o uso no campo da educação, com a finalidade de que este se constitua em contraponto à produção/reprodução social das desigualdades materiais e culturais e/ou simbólicas. No Quadro 1, expõe-se uma breve categorização dos conceitos de Nancy Fraser sobre justiça social, com o intento de explicitar uma perspectiva analítico-interpretativa para as políticas afirmativas.

Quadro 1 - Conceitualizações e dimensões de justiça social em Nancy Fraser

DIMENSÃO DA

REDISTRIBUIÇÃO

DIMENSÃO DO RECONHECIMENTO

DIMENSÃO DA

REPRESENTAÇÃO POLÍTICA

Requer a reestruturação político-econômica de algum tipo. Envolve redistribuição de renda, reorganização da divisão social do trabalho, destinação de investimentos à tomada de decisão democrática e/ou a transformação de outras estruturas econômicas básicas.

Requer mudanças culturais e/ou simbólicas. Envolve a reavaliação positiva de identidades desrespeitadas e dos produtos culturais de grupos marginalizados. Pode também envolver reconhecimento e valorização positiva da diversidade cultural.

Requer arranjos sociais que permitam a interação político-participativa horizontal, satisfazendo, pelo menos, duas condições: objetiva, na distribuição dos recursos materiais, assegurando a independência e voz aos participantes; e subjetiva, na valoração cultural, expressando igual respeito a todos os participantes e assegurando igual oportunidade para amenizar as injustiças sociais redistributiva e de reconhecimento.

Efeito

Afirmativo

Efeito Transformativo

Efeito Afirmativo

Efeito Transformativo

Efeito Universalista

Efeito de Especificidade

Repara as injustiças socioeconômicas como, por exemplo, as políticas de cotas com base na origem escolar e renda.

Repara as injustiças étnico-raciais na estrutura econômica, valendo-se de políticas de antirracismo.

Repara as injustiças socioculturais, através de políticas voltadas para a valorização de grupos étnico-raciais.

Repara as injustiças étnico-raciais na cultura, desestabilizando as diferenças e as dicotomias; ruptura com o racismo institucional.

Promove a humanização comum entre os participantes.

Reconhece aquilo que é distinto entre os participantes.

Fonte: Elaborado com base em Fraser (2001; 2010; 2022).

Esse referencial se faz pertinente porque as ações afirmativas para a educação superior abarcam os grupos sociais excluídos do acesso a tal nível de ensino, contudo, considerada a especificidade da produção/reprodução das desigualdades/injustiças na sociedade brasileira, as pessoas egressas de escolas públicas com direito de acesso às cotas não são homogêneas em sua origem social, identidades culturais, demandas e justificativas por justiça. Isto é, em uma sociedade, como a brasileira, que institucionaliza o racismo, fomentando a discriminação racial disfarçada em uma “democracia racial” (LÓPEZ, 2012), e invisibiliza as populações indígenas como se estas não fizessem parte da cidadania nacional, sem direito aos recursos do Estado social, a cota étnico-racial necessita de um tipo de justiça que inclua tanto a dimensão de redistribuição socioeconômica (que diz respeito à reparação das injustiças materiais) quanto a dimensão de reconhecimento (que atua sobre o respeito à diversidade cultural, alterando o status do grupo excluído na interação social, trata da reparação das injustiças culturais e/ou simbólicas). Já a cota para os egressos de escolas públicas de baixa renda, “brancos” e “mestiços”, a justiça de redistribuição socioeconômica parece ser a mais indicada, uma vez que atua sobre as desigualdades de classe social (tratando da reparação das injustiças materiais). Conforme Fraser (2001), às classes sociais o que interessa é a equalização do trabalho, oportunidades, condições sociais e de participação na vida pública, isto é, a redistribuição universal dos bens públicos para todos(as) os(as) trabalhadores(as). Com efeito, as duas dimensões estão imbricadas com a representação/participação política dos grupos excluídos no espaço público – trazendo suas demandas e justificativas por justiça às instituições deliberativas do Estado.

Atravessando as três dimensões citadas, Fraser (2010) coloca um imperativo moral para a justiça social – a participação paritária. Entende que a única forma de sobrepor a discursividade da ideologia dominante na esfera pública institucionalizada se dá por meio do desmascaramento e supressão das desigualdades sociais fora dela; caso contrário, os argumentos dos atores seguem os jogos de poder hierarquizantes das sociedades capitalistas (BOURDIEU, 2011; 2014), prevalecendo, no debate, o discurso e práticas daqueles que ocupam posição privilegiada no campo de disputa pela produção da norma institucional, que possui efeito direto sobre os direitos. Logo, a participação paritária é um imperativo que vai além da esfera pública institucionalizada, permeando todos os campos de interação social para que possa constituir-se em realidade efetiva nos processos deliberativos formais e/ou informais que subjazem a formação pública da vontade (FRASER, 2001; 2010).

Tal horizontalização discursiva, e de práticas inerentes à participação paritária, se daria em duas condições: uma de ordem objetiva, que diz respeito à distribuição de recursos materiais de maneira a se garantir a independência e a “voz” de todas/os as/os participantes; a outra, de ordem intersubjetiva, se relaciona aos padrões institucionalizados de valor cultural que devem expressar o mesmo respeito a todas pessoas participantes e garantir as mesmas condições de igualdade de oportunidades para que estas obtenham a estima social (FRASER, 2001; 2010). Somente com a participação paritária de todas as pessoas e coletivos na interação social, nos diversos campos de construção de sociabilidades e de relações de poder, pode-se produzir sentidos e significados para as demandas e justificativas por justiça social no debate público ampliado.

Destarte o adensamento teórico-epistemológico proposto, é importante ressaltar que as categorizações apresentadas no Quadro 1 não são estanques, nem fechadas. Podem representar, em seu tipo ideal, no sentido proposto por Weber (1992), um “ciclo de justiça social” para a análise das políticas afirmativas em universidades públicas. Entende-se que as referidas dimensões podem estar conjugadas entre si, contempladas em primeira ou em segunda ordem. Logo, as referências construídas para este artigo se constituem em categorizações conceituais, intencionando elucidar uma visão que entenda a justiça social como plural, ou, como intitulam Gewirtz e Cribb (2011), multidimensional, envolvendo questões de justiça nas dimensões socioeconômica, cultural e política. Nessa perspectiva, o princípio moral da participação paritária proposto por Fraser (2001; 2010) pode ser visto como um fim que se constrói todos os dias e para sempre.

3 AÇÕES DE PERMANÊNCIA PARA ESTUDANTES COTISTAS: A CONCEPÇÃO DOS GESTORES

Ao consultar os textos avaliativos e regulatórios não foram encontradas expressões institucionais sobre o que sejam as ações de permanência estudantil e as formas de implementá-las na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS, 2007; 2012; 2014). A partir dessa verificação, seis protagonistas da macroestrutura institucional, diretamente envolvidos com a formulação, implementação e avaliação das ações de permanência oferecidas no âmbito do programa de ações afirmativas, foram selecionados para entrevistas semiestruturadas. Nas entrevistas, realizadas em 2015, buscou-se identificar o significado das ações de permanência frente ao enunciado do CONSUN (UFRGS, 2007; 2012) e do ordenamento legal (BRASIL, 1988; 1996) sobre acesso e permanência.

A perspectiva epistemológica adotada para analisar o discurso dos atores (gestoras e gestores) da macroestrutura institucional tem como base os pressupostos de Bourdieu (2011; 1996). Identificamos as universidades como organizações da máxima representatividade do campo acadêmico; constituído por relações de poder institucionalmente hierarquizadas, conflitantes e em contínua disputa por sentidos. O campo, para Bourdieu (1996; 1998), é um microcosmo social dotado de certa autonomia, com leis e regras específicas, ao mesmo tempo que é influenciado e relacionado a um espaço social mais amplo. É um lugar de luta entre os agentes que o integram e que buscam manter ou alcançar determinadas posições. Essas posições são obtidas pela disputa de capitais específicos (cultural, econômico, social, simbólico), valorizados de acordo com as características de cada campo. Os capitais são possuídos em maior ou menor grau pelos agentes que os compõem, diferenças estas responsáveis pelas posições hierárquicas que tais agentes ocupam.

Desse modo, as/os gestoras/es entrevistadas/os ocupavam, no campo acadêmico e na estrutura institucional da universidade, as posições hierárquicas mais elevadas de tomada de decisões, sendo estas decisões dotadas de importante capital simbólico. Assim, as concepções desses atores podem ocupar destaque em pesquisas cujo interesse esteja relacionado a entender como as universidades (res)significam ou não seus discursos e práticas frente às mudanças no perfil das/dos acadêmicas/os. Com a reserva de, no mínimo, 50% das vagas nas Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) para egressos de escolas públicas, oriundos, em sua maioria, de meios populares, historicamente excluídos das universidades, há de se supor uma nova institucionalização que considere a diversidade cultural, étnico-racial e de classe social das/dos discentes.

No Quadro 2, apresenta-se alguns fragmentos do corpus dos textos dos discursos dos atores (gestoras e gestores) diretamente relacionados com o tema permanência das/os estudantes cotistas. É importante destacar que a eficácia simbólica do enunciado dos atores se produz na relação entre as propriedades do discurso, daquele que o pronuncia e da instituição que o autoriza a pronunciá-lo (BOURDIEU, 1996). Efetivamente, na origem do enunciado, quem enuncia não é considerado necessariamente como uma forma de subjetividade, e sim como um lugar. Nesse lugar de enunciação, as/os enunciadoras/es são substituíveis e intercambiáveis. Nessa noção, o enunciado é concebido como resultado, ou seja, como algo que possui memória, pois leva consigo as marcas de suas próprias condições de produção (IÑIGUEZ, 2004). A abordagem do tema das políticas afirmativas e as ações de permanência é polêmica e em disputa por sentidos, porque exige, também, um posicionamento político-ideológico e, nesse caso, desvelar o significado dessa política no discurso oficial é uma tarefa que não pode apartar o instrumento linguístico de suas condições de produção e utilização (BATISTA, 2015; BOURDIEU, 1996).

Quadro 2 – Ações de permanência para estudantes cotistas na UFRGS: concepções dos gestores

Lugar de enunciação

Discursos

Reitoria da UFRGS

As políticas de permanência são aquelas que, principalmente, através da PRAE estão focadas na permanência de alunos carentes, enfim... A PROGRAD também realiza uma série de programas que têm por finalidade a permanência dos alunos, dando auxílio didático-pedagógico em várias áreas e setores que, tradicionalmente, há mais dificuldade, como por exemplo, o cálculo, a física. Existe toda uma preocupação material e acadêmica com a permanência (ATOR/GESTOR 1, 2015).

Pró-Reitoria de Graduação (PROGRAD)

A política de permanência seria a que dá apoio para que o aluno consiga acompanhar o curso. É uma política de prevenção à evasão. O trabalho da PRAE é a permanência em função de garantia de bolsa, moradia etc. O trabalho da PROGRAD é mais focado nas questões de acompanhamento, para que o aluno possa, sem grandes percalços, acompanhar o curso. Há cursos que, historicamente ou até por tradição, possuem grandes reprovações. É preciso fortalecer os alunos para lidarem com isso, especialmente lidando com a questão das ações afirmativas (ATOR/GESTOR 2, 2015).

Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis (PRAE)

A permanência tem relação total com o ingresso e com as possibilidades, através dos seus programas, de o estudante ter as condições mínimas para desenvolver o seu curso e sair dentro dos prazos previstos. Os recursos, principalmente para estudantes vulneráveis socialmente e avaliados pela nossa equipe (ATOR/GESTOR 3, 2015).

Pró-Reitoria de Pesquisa (PROPESQ)

No geral, é o entendimento que dentro de uma universidade os alunos de graduação tenham como primeiro propósito fazer o seu curso. Para isso, dentro da integração: ensino, pesquisa e extensão, é interessante que, além das disciplinas do currículo propriamente dito, tenham essa integração. Isso favorece a questão da política de permanência, porque estando envolvidos com uma bolsa de iniciação científica, o nosso grande programa de bolsa, gera que se agreguem, dentro da pesquisa, dentro da universidade, e que fiquem interessados pelo seu curso como um todo, e isso fortalece a permanência (ATOR/GESTOR 4, 2015).

Pró-Reitoria de Extensão (PROREXT)

Às vezes se pode pensar que permanência é o aluno passar em todas as disciplinas e cumprir o seu trajeto dentro da universidade. Na verdade, permanência é o aluno não só cumprir seus créditos do curso, mas amadurecer dentro da universidade. Para isso, a universidade precisa ter outros atrativos, quando se fala em políticas educacionais é preciso ter moradia, restaurantes universitários, precisa ter apoio. Mas, talvez a universidade precisasse ter esses setores de orientação para dar acompanhamento ao estudante, para um apoio integrador, acolhedor (ATOR/GESTOR 5, 2015).

Coordenadoria de Acompanhamento do Programa de Ações Afirmativas (CAF)

A permanência se divide em dois campos: pedagógico e material. A parte material é basicamente aquilo que a PRAE faz. Na outra ponta, está a permanência pedagógica. Quem precisa se reinventar é o cotista, e, para isso, esse cotista precisa dar sentido e entender as práticas acadêmicas. Precisamos de uma política daquilo que chamo de socialização para prática acadêmica em momento prematuro, com a criação de bolsas de iniciação acadêmica em que os cotistas precisariam fazer uma pesquisa, um trabalho de pesquisa ou extensão, tímido e temático, já no seu primeiro ano de curso. Sem ser fisgado pela prática acadêmica, o estudante não tem condições de permanência (ATOR/GESTOR 6, 2015).

Fonte: Elaborado com base em autor (2015).

Do Quadro 2, uma primeira inferência pode ser feita em relação à ausência, na maior parte dos discursos, de uma reflexão sobre a ressignificação do papel da universidade frente ao novo perfil estudantil. Há poucos vestígios discursivos que apontem o papel da universidade no processo de mudança ante ao acesso de estudantes cotistas. Não são poucos os estudos acadêmicos a demonstrar que a universidade pública brasileira foi apropriada por grupos sociais privilegiados na estrutura social e que toda a sua organização acadêmica e curricular foi adaptada para essa realidade (BATISTA, 2018; SILVA, 2017; PAULA, 2017).

O fenômeno da democratização do acesso à educação superior é indicado por Santos (2019) como concebido por um movimento de base que, ao relacionar as lutas sociais pelo direito à educação universitária, expõe o elitismo acadêmico como exemplo cabal de discriminação de classe, raça e gênero na sociedade e na cultura em geral. Contudo, grande parte dos enunciados dos atores (gestoras e gestores) estão centrados em como as ações de permanência devem “adaptar” os estudantes à universidade, sejam por razões de ordem material e pedagógico e/ou cultural. Poucos discursos em seus enunciados permitiram identificar a ideia de que a universidade necessita mudar, com vistas a promover um efeito universalista de humanização comum a todas/os as/os estudantes, conforme indica Fraser (2010) na dimensão política da justiça social (Quadro 1).

No que diz respeito ao tipo de justiça que as ações de permanência promovem como ação afirmativa, há algumas definições diretamente relacionadas à finalidade do órgão institucional no qual o ator/gestora/or ocupa a posição hierárquica máxima de enunciação. Logo, espera-se que, discursivamente, responda aos objetivos do próprio órgão em seu envolvimento com a estrutura organizacional acadêmica e as expectativas externas sobre quem o representa, reprimindo, muitas vezes, as suas próprias concepções sobre determinados temas ou fenômenos sociais polêmicos.

O ator/gestor 1, que atua no órgão executivo da universidade, acentua em seu enunciado a dimensão de justiça social redistributiva de cunho apenas afirmativa (cf. Quadro 1), isto é, de reparação das injustiças socioeconômicas a todas/os as/os estudantes da universidade; contudo, sem tocar na especificidade, quer dizer, de garantir ações de permanência aos estudantes cotistas, considerados na sua diversidade material e cultural ou simbólica. Nesse sentido, sem o efeito transformativo, o qual exigiria a reparação, por meio de ações de permanência, considerando as injustiças de classe, raça, etnia, gênero.

Já o ator/gestor 2, que, dentre outros, ocupa um lugar responsável por planejar, coordenar e acompanhar todas as atividades de ensino nos cursos de graduação, ressalta o seu papel de “apoio para que o aluno consiga acompanhar o curso” com vistas a não evasão. Esse enunciado está mais próximo de uma justiça redistributiva de cunho afirmativa com algum efeito transformativo (cf. Quadro 1), uma vez que, supostamente, a conclusão do curso pela/o cotista de baixa renda, pretas/os, pardas/os e indígenas, lhe abre maiores oportunidades de acesso ao emprego e melhor renda, conforme indicam dados do IBGE (BRASIL, 2019b).

O ator/gestor 3, que atua em um lugar responsável pelo desenvolvimento de programas voltados aos estudantes com situação financeira insuficiente, está diretamente relacionado com a justiça redistributiva de cunho afirmativa, sem, no entanto, prever, na ordem do discurso e das práticas, ações de cunho transformativas. Isto é, esse órgão age diretamente sobre as injustiças socioeconômicas para todos/as os estudantes ingressantes na universidade, sem reparação específica aos estudantes cotistas que se valesse de políticas antirracismo (étnico-racial), que poderiam ter efeito sobre a estrutura econômica da sociedade.

Já o ator/gestor 4, que tem seu lugar de enunciação no órgão responsável por coordenar programas de fomento, intercâmbio e divulgação de pesquisas, da mesma maneira que os demais, reforça a dimensão redistributiva da justiça social, focando na reparação afirmativa, como garantir a integração do estudante por meio de bolsa de iniciação científica, que lhe proporcionaria renda e acesso à pesquisa acadêmica. Contudo, os relatórios da Coordenadoria de Ações Afirmativas (UFRGS, 2014; 2019) demonstram, recorrentemente, que a maioria das bolsas de pesquisa, ensino ou extensão são de acesso universal e com base no mérito acadêmico. Sob essas condições, as/os estudantes cotistas (baixa renda, pretas/os, pardas/os e indígenas) concorrem em “pé de igualdade” com os/as demais estudantes, já beneficiados pela herança cultural da classe dominante.

No caso do ator/gestor 5, que ocupa lugar de enunciação com responsabilidade de estabelecer relações sociais e culturais com diferentes segmentos da sociedade, contribuindo com o processo formativo integral dos estudantes, pode-se perceber uma discursividade que incorpora a justiça social redistributiva com alguns traços transformativos (cf. Quadro 1). Em outro enunciado afirma que “a política de permanência precisa ser mais abrangente do que simplesmente ter recursos financeiros para manter o restaurante universitário, a casa do estudante, um transporte”. No discurso, se percebe uma intencionalidade que vai além da justiça redistributiva de cunho afirmativa, de reparo às injustiças socioeconômicas, remetendo a ações mais amplas, que poderiam ser políticas acadêmicas antirracistas (étnico-raciais).

O ator/gestor 5 é o único a ressaltar a importância de que, em termos de ações de permanência, os/as estudantes cotistas deveriam ser tratados, no âmbito das políticas da universidade, em sua especificidade de modo a garantir as condições de universalidade do sucesso escolar para todas/os as/os acadêmicas/os. Ao reportar sobre essa especificidade, o ator/gestor pontua elementos relativos à relação professora/or e aluna/o cotista como um complicador na busca de dar condições de igualdade de oportunidades, “[...] na essência, os docentes desta universidade, com raras exceções, são todos com outro viés, que não é o viés da compreensão. São de outra origem social, possuem outros interesses”. Essa é uma visão crítica que desmascara a realidade elitista da universidade, expondo uma faceta de seus problemas. Esse ator/gestor propõe, discursivamente, a justiça afirmativa e transformativa; no entanto, tendo em vista as atribuições desse lugar enunciação, poder-se-ia esperar um discurso que ressaltasse, além das dimensões de justiça social citadas, aquelas de reconhecimento e de representação política, com vistas a promover a participação paritária dos estudantes cotistas na construção de novos sentidos à universidade (cf. Quadro 1).

Por último, abordamos com maior profundidade o discurso do ator/gestor 6, que atua em um órgão responsável por realizar a avaliação, acompanhamento e monitoramento da política afirmativa na UFRGS. A criação desse lugar de enunciação pode ser reputada como um avanço na institucionalização e fortalecimento da política afirmativa no âmbito da universidade (BATISTA, 2018).Conquanto, como os outros atores (gestoras e gestores), apresente em seu discurso a ideia de integração adaptativa dos estudantes cotistas à universidade (Cf. Quadro 2), ainda organizada para uma realidade elitista; esse lugar de enunciação tem ocupado um papel fundamental na disputa pela manutenção da política afirmativa na universidade. Conforme Silva (2017), a primeira universidade brasileira, a Universidade do Brasil, é criada em 1920, sendo considerada como signo de prestígio e poder, bem como disputada entre elites e classes médias brancas. A criação da universidade tinha por objetivo reunir formalmente as escolas superiores já existentes. Depois disso, no transcorrer de todo o século XX, a universidade brasileira se constituiu num projeto de interesses das elites e camadas médias, fundamentada por uma lógica de desenvolvimento centrada nos seus interesses econômicos e pelas suas ideias de raça e classe.

No que tange ao papel desse lugar de enunciação, o ator/gestor 6 o reconhece como articulador e mediador da política afirmativa e as ações de permanência com as outras instâncias gestoras e as/os estudantes cotistas. Ao reconhecer as dificuldades desse papel, retrata aspectos, numa perspectiva crítica, que revelam o quanto os discursos e práticas acadêmicas ainda precisam mudar a fim de garantir uma integração emancipatória das/dos estudantes cotistas à universidade, baseada na justiça social tridimensional: de redistribuição socioeconômica, de reconhecimento cultural e de representação política (cf. Quadro 1).

Destacamos três enunciados do ator/gestor 6, no Quadro 3, que tangem os seguintes temas relacionados à permanência dos/das estudantes cotistas: processo de ensino e aprendizagem; recursos financeiros para ações de permanência; as políticas educacionais e a Lei de Cotas.

Quadro 3 – Ações de permanência para estudantes cotistas na concepção da CAF/UFRGS - 2015

TEMAS

Processo de ensino e aprendizagem

Recursos financeiros para ações de permanência

Políticas educacionais e a Lei de Cotas

“[...] o professor diz que o estudante fez uma pergunta e que ele não entendeu. Então, pediu para que explicasse a pergunta pela terceira vez, mesmo assim não conseguia entender o que estava perguntando. Até que ele chegou à conclusão de que o estudante não sabia o que era seno. Ficou implícito na fala do professor que ele não poderia falar com uma pessoa que não sabe o que é seno”.

***

“As disciplinas são, para mim, uma caricatura do que é isso aqui (universidade), que tem que ser vencida e esta estrutura não vai ser superada tão rapidamente quanto precisaria. Nas disciplinas, os estudantes não têm condições de permanência, porque não acho que os docentes vão mudar tão cedo”.

***

“[...] as pessoas não querem nem olhar para o aluno, ficam dando aula de costas para o aluno e enchendo o quadro de contas. Uma singela pergunta (ao aluno) poderia estabelecer toda uma cadeia de comunicações, alterando completamente as condições de permanência de um estudante, essa singela pergunta que, muitas vezes, não é feita”.

“Aquilo que chamamos de permanência material, as bolsas PRAE [...] eu acho que a PRAE é subutilizada pelos estudantes, porque existem problemas de comunicação e porque existe um problema de que essa comunicação fica muito entravada pelas dificuldades burocráticas. A PRAE emite editais que são extremamente burocráticos na linguagem, não tem documentos tradutórios, não tem uma boa equipe de recepção. O acesso aos direitos e ao dinheiro da PRAE é praticamente igual entre alunos do universal e os cotistas e não deveria ser assim”.

***

“O orçamento vindo da mantenedora (MEC) não existe (para política afirmativa), o que existe são políticas de graduação, extensão e pesquisas universalistas. [...] tem 120 bolsas de ações afirmativas relacionadas à permanência em um universo de nove mil cotistas e nada mais [...] são para estudantes negros e indígenas, para os cotistas não-autodeclarados não existe”.

***

“Então, assim, nenhuma pró-reitoria tem um orçamento, mas tem uma rubrica dentro da pró-reitoria de planejamento que escoa o orçamento para lá, nós (CAF) não temos orçamento, o nosso orçamento é o do gabinete”.

“[...] olhando para trás, pode-se ver uma série de movimentos governamentais que eram uma preparação de bastidores porque vejo o projeto REUNI como um ‘toma lá dá cá’. Nós queremos cotas, então, toma as vagas para a classe média alta. A universidade se expandiu, se olhar o número de vagas no sistema nacional. Se desprivatizou a universidade pública em termos de quais grupos sociais teriam acesso, mas, ao mesmo tempo, se aumentou as vagas de forma que tem mais ou menos uma estabilidade dos números absolutos de vagas a oferecer para as camadas elitizadas. Isso é um movimento que pode ser lido da frente para trás, e os recursos vieram amarrados ao REUNI, eles não vieram amarrados às cotas”.

***

“[...] não sei o que seria desta universidade se não tivesse a segurança da Lei de Cotas. [...] as pessoas dizem horrores, os piores horrores racistas possíveis, inclusive, no Conselho Universitário e em vários outros fóruns. A Lei de Cotas é uma garantia, mas, seja como for, veio amarrada a esta expansão de número de vagas, na proporção de vagas que é democratizada”.

Fonte: as autoras (2020).

Analisando os enunciados, pode-se depreender no caso do tema processo de ensino e aprendizagem, uma discursividade que salienta o distanciamento pedagógico, interativo e empático entre professoras/es e estudantes cotistas; com a ressalva do ator/gestor 6, de que este problema é maior nos cursos de graduação em ciências exatas e tecnologias. Esse dado pode ser atestado, em termos estatísticos, nos Relatórios públicos de avaliação das ações afirmativas da Coordenadoria de Acompanhamento do Programa de Ações Afirmativas (CAF) (UFRGS, 2012; 2014; 2019), que demonstram maior evasão pelas/os cotistas nas duas áreas mencionadas. Gómez (1998) pode elucidar, neste processo, o que seria integrar de modo emancipatório as/os estudantes cotistas à universidade. Para o autor, a/o aluna/o entra progressivamente em contato com os produtos mais elaborados da ciência, do pensamento e da arte, com a finalidade de incorporá-los como instrumentos valiosos para a análise e solução de problemas. Contudo, se queremos que esses conhecimentos se incorporem como ferramentas mentais, não apenas nem fundamentalmente na estrutura semântica acadêmica que a aluna/o emprega para resolver com êxito demandas de aula, mas em sua estrutura semântica experiencial, a aprendizagem deve resolver-se num processo de negociação de significados. Dessa forma, estimula-se que as/os estudantes ativem esquemas e pré-concepções de sua estrutura semântica experiencial, para reafirmá-los ou reconstruí-los à luz do potencial cognitivo que representa os novos conceitos da cultura e dos conhecimentos públicos com os quais somente agora entra em contato.

No que tange ao tema recursos financeiros para ações de permanência, nota-se no enunciado o quanto o orçamento público desconsidera as especificidades das ações afirmativas frente ao universal. Há uma precarização, para o acesso das/os estudantes cotistas aos recursos para permanência, de duas ordens: primeiro, pela burocratização para acessar os recursos, mais facilitado aos estudantes (não cotistas) com maior conhecimento dos procedimentos burocráticos; segundo, não existe na universidade um orçamento especificamente para ações de permanência das/os estudantes cotistas. Nesse caso, vale reforçar que as desvantagens econômicas e culturais, mesmo sendo demandas distintas, são resultados de imbricadas relações de forças, que se entrelaçam para agravar os quadros de injustiça e desigualdade (BOURDIEU, 1998; FRASER, 2010); podendo, portanto, reforçar as situações de vulnerabilidade social e cultural das/dos estudantes cotistas no interior das universidades, forçando a sua evasão.

No tema políticas educacionais e a Lei de Cotas, o enunciado expõe as correlações de forças político-ideológicas presentes na política afirmativa. Tal política estaria atrelada a uma política de expansão das universidades federais que a antecedeu, o programa REUNI (Reestruturação e Expansão das Universidades Federais). Essa expansão, frente a um pacto político de diferentes correntes políticas ideológicas, daria conta de continuar oferecendo as vagas para as elites e garantir vagas para os egressos de escolas públicas oriundos dos meios populares. É dessa relação político-ideológica que também se explica a razão de os recursos para a permanência das/os estudantes nas universidades federais virem coadunados à política de expansão e não à política afirmativa, garantida pela Lei de Cotas de 2012.

Resta ainda salientar a característica processual desse lugar de enunciação, que aponta no relatório de acompanhamento e avaliação da política afirmativa, de 2019, ações de permanência que apresentam muitos elementos de justiça social de reparação afirmativa e transformativa (cf. Quadro 1), das quais os/as estudantes cotistas participam ativamente através de rodas de conversas e projetos-piloto com o objetivo de inclusão étnico-racial. Ressalta-se, ainda, que, em 2019, as ações de permanência já apresentam indícios de justiça social, como reconhecimento de cunho afirmativo (cf. Quadro 1), através de ações especificamente voltadas para os indígenas, nas quais ocorrem diálogos interculturais, não obstante se constituírem em experiências não institucionalizadas, portanto, passíveis de descontinuidade (UFRGS, 2019). O relatório também aponta a continuidade do problema em relação aos processos de ensino e aprendizagem, conforme avultado no enunciado abaixo.

[…] estamos trabalhando com uma grande concentração de alunos indígenas que se dirigem à área da Saúde. […] nas áreas de Saúde não estão disponíveis as disciplinas de Ensino das Relações Étnico-raciais (ERER), nem para os indígenas nem para o corpo docente e discente debaterem a diversidade étnico-racial e suas repercussões em sua profissionalização.

[…] nosso trabalho, ao longo do ano, apontou a preocupação de que é justamente nessa área de conhecimento que os alunos indígenas mais recorrerem para sua formação superior. E justo nos cursos da Saúde, as grades curriculares, não dispõem de disciplinas ou práticas direcionadas à capacitação de profissionais para as relações étnico-raciais, ou ao cuidado com a diferença de compreensões sobre saúde/doença e entendimento de corpos por outros grupos sociais, mas especialmente os espaços de debate sobre o que aprendemos com as diferenças culturais na formação de profissionais da saúde (UFRGS, 2019, p. 33).

Em 2004, de acordo com a Resolução nº 1 do Conselho Nacional de Educação (CNE), o ensino das relações Étnico-Raciais e de “História e Cultura Afro-Brasileira e Africana” (ERER) tornou-se obrigatório nos currículos (grade curricular e outras atividades de ensino, pesquisa e extensão) dos cursos de educação superior e em todos os níveis e modalidades da educação brasileira (BRASIL, 2004). Na educação superior, a partir da implementação do REUNI, nas avaliações externas para autorização, credenciamento e recredenciamento dos cursos de graduação, o ERER era/é um parâmetro avaliado, isto é, a constância do ERER nas grades curriculares ou não influenciava/influencia nas notas finais dos cursos. Essa normatividade provocou na educação superior (a UFRGS é um caso) a inserção dessa disciplina apenas para cumprimento da Lei, porque foram colocadas como disciplinas eletivas e raramente ofertadas.

Por fim, retomando os enunciados dos atores (gestoras e gestores), de modo geral, é perceptível que as ações de permanência para estudantes cotistas inexistem formalmente, porquanto os recursos financeiros, que se fazem necessários para ações pedagógicas e de promoção de interculturalidades, possuem destinação universal, ficando os critérios para o seu acesso para o âmbito da universidade, que se comprova ainda fortemente elitizada e focada na justiça escolar como igualdade de oportunidades, tendo como base o mérito acadêmico (DUBET, 2004).

Conforme indica Bourdieu (2014), visões e práticas que atribuem o sucesso escolar ao “dom” (mérito acadêmico) inato ao indivíduo desconsideram o caráter de construção social das aptidões, sobretudo, que essas construções acontecem a partir do acúmulo do capital cultural dominante. No campo acadêmico, os estudantes de baixa renda, os pretas/os, os pardas/os e os indígenas, que jamais tiveram acesso a bens culturais ou normas culturais (legitimados como universais nas sociedades capitalistas), são compelidos a entender o fracasso escolar como incapacidade individual, não se vendo como um indivíduo que parte de condições desiguais de disputa (DUBET, 2004; BOURDIEU, 2014). A esse mascaramento da realidade escolar, Bourdieu (2014) denomina como ideologia da “escola libertadora” burguesa.

Logo, é possível dizer que a/o ingressante por política afirmativa, além de enfrentar as dificuldades de igualdade nas condições para o acesso, pois as universidades públicas brasileiras cobrem apenas 24,7% do total de matrículas, sendo o setor privado dominante nesse nível de ensino, com 75,3% das matrículas (BRASIL, 2019a), com a oferta de ações de permanência universalistas e escassas, também enfrenta expressivas dificuldades de igualdade nas condições para a permanência.

Ademais, é importante ressaltar que a maioria dos discursos, dos atores (gestoras e gestores) da macroestrutura institucional da universidade, reforça a justiça social redistributiva de cunho predominantemente afirmativa e não transformativa (cf. Quadro 1), fato que demonstra um avanço bastante tímido em relação à justiça social tridimensional, de redistribuição (socioeconômica), de reconhecimento (cultural) e política (representação política), que poderia garantir mudanças institucionais e estruturais na universalidade brasileira frente à política afirmativa. Para Fraser (2008), a redistribuição socioeconômica tende a não diferenciar os grupos demandantes por justiça, já o reconhecimento cultural tende a diferenciar tais grupos sociais. Por isso, a autora defende que a justiça social precisa associar redistribuição socioeconômica e reconhecimento cultural por meio de políticas universalistas que considerem a particularidade dos demandantes por justiça social. Tais dimensões de justiça social só podem ser alcançadas pela participação paritária dos sujeitos que reclamam por justiça nas instituições formais de deliberação pública (dimensão política) e em todas as instâncias de interação social.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A investigação proposta pretendeu, de forma substancial, problematizar e discutir questões conceituais e empíricas sobre o tema das ações de permanência para as/os acadêmicas/os ingressantes por política afirmativa na educação superior pública brasileira – observando o caso da UFRGS. Na digressão, procurou tecer relações entre os contextos de institucionalização das ações de permanência para as/os estudantes cotistas e suas interseções com os conceitos de justiça social, desigualdade e exclusão social, com destaque às conceitualizações de Nancy Fraser. Propôs uma análise crítica do discurso de textos institucionais, concentrando-se especialmente no significado atribuído às ações de permanência estudantil pelas/os gestoras/es da macroestrutura institucional da UFRGS.

Os resultados apontaram que a UFRGS necessita enfrentar desafios expressivos na implementação de ações de permanência estudantil, visando a mudanças estruturais frente ao novo perfil das/os acadêmicas/os. Existe uma predominância nas ações de permanência estudantil que remetem à justiça social de redistribuição socioeconômica de cunho afirmativa, com alguns indícios discursivos de práticas transformativas. Se considerarmos a justiça social tridimensional (redistribuição socioeconômica, reconhecimento cultural e representação política), o significado de ações de permanência para os estudantes cotistas, exalado dos discursos dos atores (gestoras e gestores), é de tipo redistributivo, de reparo das injustiças socioeconômicas por meio da política de cotas, que é insuficiente para reconhecer a diferença social e cultural entre cotistas. Os poucos vestígios discursivos sobre ações redistributivas de cunho transformativas (por meio de políticas acadêmicas antirracismo) demonstram que, mesmo a justiça redistributiva, ainda está bastante restrita ao aspecto apenas compensatório das políticas afirmativas e das ações de permanência. Há ainda o agravante de que as ações de permanência para as/os estudantes da UFRGS, além de serem escassas, estão fortemente calcadas na universalização (para cotistas e não cotistas) e no mérito acadêmico. As tradições dos sistemas escolares, que se baseiam por ideias de universalidade, permanecem a se dirigir, sobretudo, aos educandos que detêm uma herança cultural privilegiada. Dessa forma, não só excluem as interrogações sobre os meios mais eficazes para tratar os diferentes, mas reproduzem as desigualdades no interior das instituições (BOURDIEU, 2014).

Por fim, destacamos a nossa adesão a uma perspectiva de(s)colonial (QUIJANO, 2014; SILVA, 2017) para pensar a universidade brasileira do século XXI, a qual acolhe esses novos sujeitos universitários, as/os cotistas. Nesse sentido, aponta-se que é preciso romper com os fortes traços da colonialidade que ainda permanecem da experiência colonizadora europeia; da submissão dos povos originários e da escravização de pessoas negras no Brasil. Ainda que as universidades brasileiras estejam adotando políticas afirmativas que ampliam o acesso de grupos de baixa renda e étnico-racial, há uma grande dificuldade na operação de mudanças epistemológicas que valorizem a diversidade socioeconômica e de status cultural, contemplando os saberes e fazeres da cosmovisão africana e indígena e suas diásporas na produção de conhecimento (SILVA, 2017). A política afirmativa oferece uma oportunidade de mudança nas políticas acadêmicas, uma vez que as intervenções descolonizadoras têm sempre lugar em contextos de turbulência e conflito. Por um lado, desestabilizam as inércias institucionais, por outro, refletem conflitos sociais de longo prazo que ocorrem noutros setores da sociedade, quer de forma dissimulada quer abertamente, e que, em alguns casos, podem se transformar em conflitos universitários com possibilidade de criar brechas institucionais (SEGATO, 2015) potencializando processos de mudança social.

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Endereços para correspondência:

NEUSA CHAVES BATISTA

Avenida Paulo Gama, s/n., prédio 12201, 7° andar, Faculdade de Educação, 90046-900, Bairro Farroupilha, Porto Alegre-RS; neuchaves@gmail.com

RITA DE CÁSSIA SOARES DE SOUZA BUENO

Avenida Paulo Gama, s/n., prédio 12201, 7° andar, Faculdade de Educação, 90046-900, Bairro Farroupilha, Porto Alegre-RS; rita.bueno@ufrgs.br


1 Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul; Mestra em Sociologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

2 Doutora e Mestra em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

3 Este artigo utiliza-se de dados (entrevistas) com gestoras/gestores da UFRGS que assinaram o “Termo de Consentimento Informado - Livre e Esclarecido”. O modelo do termo utilizado e a íntegra dos dados coletados estão publicizados, encontram-se no apêndice da Dissertação de Mestrado em Educação de autoria de Rita de Cassia Soares de Souza Bueno (2015). Atenta-se ao fato de que a publicação foi autorizada pelas/os gestoras/es da UFRGS e antecede a Resolução nº 510 do Conselho Nacional de Saúde, de abril de 2016, a qual propõe que todas as pesquisas que envolvem seres humanos sejam submetidas ao Comitê de Ética das Universidades. Na Resolução 510/2016, a ética em pesquisa implica o respeito pela dignidade humana e a proteção devida aos participantes de pesquisas científicas (BRASIL, 2016). Nesse sentido, o agir ético da pesquisadora e do pesquisador demanda ação consciente e livre da/do participante. Também salientamos as recentes orientações sobre algumas medidas de ética em pesquisa em ambientes virtuais indicadas pelo Ofício Circular nº 2/2021/CONEP/SECNS/MS. Tais medidas visam preservar a proteção, segurança e direitos das/dos participantes de pesquisas (BRASIL, 2021).