https://doi.org/10.18593/r.v47.28387

A redução do papel do professor-mestre à condição ilusória de empreendedor

The reduction of the role of the teacher-master to the illusional condition of an entrepreneur

La reducción del papel del profesor-maestro a la condición ilusional de emprendedor

Altair Alberto Fávero1

Universidade de Passo Fundo, Professor Titular

https://orcid.org/0000-0002-9187-7283

http://lattes.cnpq.br/5866881378328643

Ana Lúcia Vieiro2

Rede Municipal de Passo Fundo, Professora

https://orcid.org/0000-0002-3076-9238

http://lattes.cnpq.br/6754636061192819

Renata Cecília Estormovski3

Rede Estadual do Rio Grande do Sul, Professora

https://orcid.org/0000-0001-5714-8928

http://lattes.cnpq.br/5288825069833281

Resumo: No estudo em tela, problematiza-se a redução do papel do professor a condição de colaborador no meio educacional. Tal redução representa a destituição desse profissional de uma posição de mestre/educador engajado na formação humana para a de um empreendedor que submete sua autonomia e intelectualidade às demandas da escola que adota a dinâmica empresarial. Por meio do método analítico-hermenêutico, desenvolve-se a hipótese de que tal alteração de substantivos oculta a articulação com a racionalidade neoliberal, objetificando o mestre/educador e concebendo sua função como subordinada aos anseios do setor mercantil quanto à formação oferecida na educação básica. A partir disso, retoma-se ideário de John Dewey (1979a; 1979b) acerca do papel do professor no processo educativo, na busca pela formação de sujeitos ativos e reflexivos, capazes de compreender e agir na sociedade em que se situam, apontando-se perspectivas para o enfrentamento do viés que tenta torná-lo um mero reprodutor das expectativas capitalistas na educação. Organizado em três seções que seguem a sistemática indicada, o artigo se constitui como de natureza básica, qualitativo quanto à abordagem, exploratório em relação aos seus objetivos e bibliográfico no que se refere aos procedimentos.

Palavras-chave: Neoliberalismo Educacional. Docência na educação básica. Formação docente. Pensamento reflexivo.

Abstract: In the present study, the reduction of the role of the teacher to the condition of collaborator in the educational environment is problematized. This reduction represents the removal of this professional from a position of master/educator engaged in human training to that of an entrepreneur who submits his autonomy and intellectuality to the demands of the school that adopts the business dynamic. Through the analytical-hermeneutic method, the hypothesis is developed that such change of nouns hides the articulation with neoliberal rationality, objectifying the master/educator and conceiving his function as subordinate to the wishes of the commercial sector regarding the training offered on basic education. From this, we retake the ideas of John Dewey (1979) about the role of the teacher in the educational process, in the search for the formation of active and reflective subjects, capable of understanding and acting in the society in which they live, pointing out perspectives for facing the bias that tries to make them a mere reproducer of capitalist expectations in education. Organized in three sections that follow the system indicated, the article is of a basic nature, qualitative in terms of approach, exploratory in terms of its objectives, and bibliographical in terms of procedures.

Keywords: Educational Neoliberalism. Teaching on Basic Education. Teacher Training. Reflective Thinking.

Resumen: En el presente estudio, se problematiza la reducción del rol del profesor a la condición de colaborador en el ámbito educativo. Esta reducción representa la remoción de este profesional de una posición de maestro/educador comprometido con la formación humana a la de un emprendedor que somete su autonomía e intelectualidad a las exigencias de la escuela que adopta la dinámica empresarial. A través del método analítico-hermenéutico, se desarrolla la hipótesis de que tal cambio de sustantivos esconde la articulación con la racionalidad neoliberal, objetivando al maestro/educador y concibiendo su función como subordinada a los deseos del sector comercial en cuanto a la formación ofrecida en la educación básica. A partir de esto, se retoman las ideas de John Dewey (1979) sobre el rol del docente en el proceso educativo, en la búsqueda de la formación de sujetos activos y reflexivos, capaces de comprender y actuar en la sociedad en la que se ubican, señalando perspectivas de el enfrentamiento del sesgo que intenta convertirlo en un mero reproductor de las expectativas capitalistas en educación. Organizado en tres apartados que siguen el sistema indicado, el artículo es de carácter básico, cualitativo en cuanto a enfoque, exploratorio en cuanto a sus objetivos y bibliográfico en cuanto a procedimientos.

Palabras claves: Neoliberalismo Educativo. Docencia en Educación Básica. Formación de Profesores. Pensamiento Reflexivo.

Recebido 23 de agosto de 2021

Aceito 14 de março de 2022

1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Os princípios que orientam a esfera econômica alteram a cultura e os valores da sociedade na atualidade, com sua racionalidade neoliberal4 interferindo no modo como as relações sociais são forjadas. Até mesmo os mais discretos aspectos da vida cotidiana passam a sofrer interferências de preceitos que reforçam o individualismo e a competitividade. Na educação, objetivos práticos e racionais são delegados às escolas que, ao invés de se dedicarem a uma formação humana articulada a princípios de bem comum, precisam estimular competências pessoais que poderão ser utilizadas para uma rentabilidade futura (LAVAL, 2019).

A escola que se espera nesse cenário – e que é evocada nos discursos daqueles que são considerados os reformadores da educação – tem sua sistemática aproximada à dinâmica de uma empresa (LAVAL, 2019). A insistência na inovação dos métodos de ensino-aprendizagem, a busca por aquela que seria uma maior eficiência nos processos de gestão e os constantes ajustes para a tecnicização dos saberes escolares são alguns dos indícios que apontam essa aproximação. Além disso, a avaliação constante do desempenho dos alunos e sua sistematização em resultados mensuráveis quantitativamente favorecem a comparação entre as instituições e estimulam a competição entre elas, fazendo com que professores e gestores voltem seu trabalho ao alcance de metas pré-estabelecidas. Temendo a referenciação de sua escola como sendo de qualidade inferior em relação às demais, materializam-se sem crítica as prescrições de mercado que lhe são impostas.

A adoção dessa perspectiva, que orienta a educação a partir de objetivos econômicos, marca o fim da formação humanista clássica, baseada no altruísmo e na livre atividade humana, na qual o conhecimento era concebido como possibilidade de emancipação, capaz de tornar as pessoas melhores para o convívio social. O papel educativo da escola é reduzido a um produto de troca, imbuído de objetivos direcionados ao mercado de trabalho. Ao mesmo tempo, o professor deixa de ser referenciado como o mestre/educador, como o mediador de um processo formativo humano, para se tornar um colaborador, um profissional que reduz sua intelectualidade à reprodução daquilo que o mercado conceitua como necessário para seus alunos. Empreendendo, expressa seu mérito profissional por meio de instrumentos gerenciais e compete com seus pares a fim de se manter útil ao empregador, afastando-se dos princípios pedagógico-formativos.

Com base nessa exposição inicial, chegamos a nossa hipótese neste estudo, que diz respeito ao uso do termo colaborador em substituição a ideia de professor nas escolas que se tornam empresas com um possível propósito de docilizá-lo, tornando-o maleável aos anseios da incursão neoliberal na educação. Ressignificando a ideia de colaboração, a inserção dessa nova forma de nomear o docente faz com que ele se sinta participante, ativo e essencial à sua escola-empresa. Com esse entendimento, transforma sua práxis para garantir aquilo que é indicado como exitoso para sua escola. Com sua subjetividade dominada, o professor reduzido a condição de colaborador não mede esforços para atingir os propósitos delegados a ele por seu empregador (seja o Estado ou o empresário da educação privada), concebendo a inovação como forma de superar as dificuldades da realidade, vencendo pela concorrência e competindo consigo e com aqueles com os quais deveria trabalhar em coletividade. Com isso, torna-se um empreendedor de si,5 engajado no alcance dos objetivos mercantis que lhe são impostos e distanciado dos princípios e modos de vida humano-democráticos.

O que pretendemos, a partir da questão anunciada, é problematizar a substituição cada vez mais constante da ideia de professor pelo termo colaborador no meio educacional, discutindo a destituição desse profissional de uma posição de mestre engajado na formação humana para a de um empreendedor que deve submeter sua autonomia e intelectualidade às demandas da escola que adota a dinâmica empresarial. Intentamos a construção de uma argumentação que explicite a racionalidade oculta nessa troca de substantivos, que, acreditamos, denota como essa mudança vocabular objetifica o mestre/educador e concebe sua função como subordinada aos anseios do setor mercantil e da racionalidade que o orienta. Com base no entendimento de que o professor é o responsável pela condução do processo educativo, que almeja a constituição reflexiva e crítica dos estudantes, apontamos distinções entre esses modos de referenciar o docente, refletindo sobre as interferências do neoliberalismo no exercício da docência e indicando a teoria pedagógica de Dewey (١٩٧٩b) como possibilidade de preparação e resistência às adversidades impostas à escola e ao professor pelas demandas do capital.

Para dar conta do que nos propusemos, amparadas no movimento analítico-hermenêutico6, estruturamos essa argumentação em três seções. Nas duas primeiras, contextualizamos a inserção de princípios neoliberais nas escolas e suas implicações para a docência. Tendo como referenciais principais Laval (2019), Dardot e Laval (2016), Peroni (2015), Fávero, Tonieto e Consaltér (2020), Fávero, Consaltér e Pires (2020), Fávero e Trevisol (2020) e Ball (2014), também situamos a forma como, no Brasil, houve tal empresariamento na educação e como passaram a se materializar distintos processos de privatização nesse âmbito de ação do Estado. Debatemos, também, como o professor, nesse contexto, deixa de ser considerado uma referência formativa para se tornar um colaborador, um profissional cujos compromisso individual e potencial empreendedor devem se voltar ao alcance de metas e à efetivação das demandas das famílias dos estudantes, o que é considerado responsável pelo êxito de sua escola-empresa.

E, então, ancoradas no ideário de Dewey (1979b), trataremos do papel do professor no processo educativo, na busca pela formação de sujeitos ativos e reflexivos, capazes de compreender e agir na sociedade em que se situam. A partir disso, pretendemos apontar perspectivas ao professor, primeiramente afastando-o do estigma de colaborador e indicando, em Dewey, subsídios necessários ao enfrentamento dos vieses que tentam torná-lo um mero reprodutor das expectativas capitalistas na educação. No intuito de cumprir com nosso propósito neste construto, foi necessário fazer um recorte da versão portuguesa da obra de Dewey, denominada Como pensamos (1979), escolhendo seus quatro capítulos iniciais por acreditarmos que neles há elementos importantes para tratar a respeito do papel irrefutável do professor na formação do educando reflexivo, o que é complementado por algumas outras produções, como Experiência e Educação (1976). Para Dewey (1979b, p. 43), o professor “é um guia, um diretor, pilota a embarcação” para o educando que, bem conduzido, dispensa a sua energia, a sua iniciativa e o seu interesse para aprender, podendo então lidar melhor com as situações da vida em sociedade.

Antes de iniciar, contudo, cabe ressaltar que Dewey dialogou de modo expressivo com a tradição pedagógica clássica e, a partir de autores como John Locke (1632-1704), Jean-Jaques Rousseau (1712-1778), Immanuel Kant (1724-1804) e Johann Friedrich Herbart (1776-1841), formulou sua teoria educacional. Ao abordar a complexidade do fenômeno educativo, em especial no que refere ao problema da formação humana necessária para a vida em sociedade, se tornou fonte teórica importante para nosso trabalho. Porém, como outros teóricos, Dewey sofreu objeções e críticas – especialmente quanto à sua teoria pragmatista –, o que, para este estudo, não se constitui como empecilho, pois entendemos que as considerações utilizadas são convergentes com a problemática apresentada.

2 A ESCOLA INSTRUMENTALIZADA PELA SOCIEDADE NEOLIBERAL

O crescimento econômico, que vê a educação como um grande negócio, impulsiona a mudança da escola. Impele professor, aluno e família à apropriação dos discursos e práticas mercadológicas que se apresentam como uma preparação para a vida ou, ainda, um lifelong learning – aprendizado ao longo da vida. Na sociedade comercializada (LAVAL, 2019), essa tendência se torna dominante, sendo entendida como necessária para se alcançar o máximo desempenho e uma maior rentabilidade. Contudo, a ideia de aprendizagem contínua, além de retirar a escola de sua posição histórica de um espaço singular de formação, também dissemina discursos sobre sua ineficiência, exigindo sua atualização a fim de que sua atuação se mostre articulada às expectativas de empregabilidade futura dos estudantes.

Para dar conta das novas exigências que lhe são impostas, as escolas abandonam sua conceituação como instituições que priorizam o conhecimento historicamente acumulado, a reflexão crítica acerca da realidade e a articulação a princípios de humanidade, democracia e cidadania. Em nome da modernização e da necessidade de se manterem úteis nessa sociedade de mercado, passam a se pautar nas prescrições empresariais, que orientam seus processos de gestão, seus métodos, os conhecimentos abordados (entendidos como competências e habilidades a serem utilizadas posteriormente no trabalho) e até mesmo o modo como seus profissionais desenvolvem seu trabalho, já que precisam provar continuamente sua serventia à lógica do capital. As escolas, assim, estimulam condutas competitivas, individualistas, empreendedoras e que naturalizam a desigualdade (seja de talentos, social ou econômica), inserindo, por exemplo, novos componentes curriculares que materializam essas percepções, adotando dispositivos tecnológicos nos ambientes de forma a soarem inovadores, e diminuindo a carga horária de disciplinas como filosofia, sociologia e artes na educação básica.

Essas medidas são promovidas isoladamente, mas quando articuladas umas às outras constituem mudanças estruturais nos sistemas de ensino, subordinando-os a valores econômicos que entendem a educação e a cultura não como bens pelos quais a sociedade deve zelar, mas como meios de obter vantagens individuais (LAVAL, 2019). O neoliberalismo escolar se ampara em uma “monopolização progressiva do discurso” (LAVAL, 2019, p. 16), com reformas sendo propostas de modo a mitigar a autonomia da escola, estimulando, inclusive, a adoção de sistemas de gestão e de apostilamento padronizados. A transposição de projetos considerados de sucesso – as famosas boas práticas – para contextos distintos dos quais foram planejados também se tornam comuns, homogeneizando o trabalho pedagógico e tornando as escolas ambientes hostis à liberdade de pensamento e à criatividade (a não ser que esta sirva aos interesses de seus futuros empregadores).

Por mais que os casos listados acima pareçam muito recentes por se materializarem em nossas escolas na atualidade, dois recortes do capítulo VI, intitulado como O grande mercado da Educação, de Laval (2019), indicam ainda nas décadas passadas parte do trajeto insidioso percorrido pelo mercado em direção à educação. Em um deles, o presidente-diretor de uma suntuosa empresa de ensino europeia, o francês Bertrand Cluzel, em 1993, trouxe a ideia de educação na perspectiva de mercado afirmando que “temos de aprender a falar de dinheiro na educação, tanto em termos de rendimentos, como rentabilidade”, pois “em algum momento o ensino terá de entrar no setor mercantil” (LAVAL, 2019, p. 127). Em outro, o coordenador de ensino superior, Sandrine Blanchard, disse, em 2000, que “a educação é um negócio” (LAVAL, 2019, p. 127), referindo-se ao futuro domínio, tanto da educação básica, quanto do ensino superior

Na perspectiva apontada nessas falas, a educação não poderia mais se manter “como uma ilha isolada da sociedade e da economia” (LAVAL, 2019, p. 91), mas precisaria se tornar parte dos movimentos que orientam as relações econômicas. Por sinal, com o neoliberalismo (um período particular do capitalismo, conforme Peroni, 2015), normaliza-se que todas as relações sociais passem a ser conduzidas por tal lógica, com um plano para a educação que tem mostrado amplo e exitoso resultado desde 1980, quando a economia de livre mercado se tornou proeminente. De forma contínua, desde então, distintas estratégias são lançadas para a manutenção de tal racionalidade, tentando estabilizar crises sistêmicas (MÉSZÁROS, 2011) e envolvendo-se cada vez mais em contradições estruturais, como o fato de se buscar no aparelho estatal uma fórmula de disseminar suas prescrições.

Isso se constitui como controverso porque, no neoliberalismo, a inibição da ação do Estado é pregada como uma forma de dar eficiência aos serviços públicos – e de tornar a sociedade mais justa7 –, o que tem respaldado programas de privatização que se disseminam em diferentes países. Apoiando o Estado mínimo, mas utilizando-se de seu amplo aparato para alcançar seus objetivos, o capital tem assumido o controle de setores públicos, entre os quais está a educação. Por meio de contratos que permitem às empresas “auxiliarem” nos processos pedagógicos, nas estruturas curriculares e nos sistemas de avaliação educacional, tais grupos naturalizam não somente sua atuação na educação, mas também seus valores. Como com a competição, que promove a concorrência entre os alunos, os professores e as próprias escolas e que é entendida como um modo de qualificação de suas práticas (LAVAL, 2019; FÁVERO; TONIETO; CONSALTÉR, 2020). Testes e avaliações sistematizadas aceleraram a adequação das instituições a tais prescrições, já que o estabelecimento de rankings e a ampla visibilidade dada a seus resultados passaram a forjar padrões e conceitos particulares de qualidade quanto ao seu desempenho.

No Brasil, o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado, publicado em meados dos anos 1990, materializou as orientações neoliberais no serviço público, incluindo a educação dentre os setores sociais que precisariam sofrer adequações. O documento argumentava que o Estado não poderia se manter como o único responsável pela provisão de serviços essenciais, sendo necessário substituir sua burocracia e rigidez por flexibilidade e eficiência. Para isso, a terceirização, a privatização e a publicização se tornaram suas estratégias, sendo que parcerias em que o financiamento de iniciativas se mantinha público, mas sua execução era realizada por entidades privadas, se tornaram comuns (BRASIL, 1995).

O cidadão passou a ser entendido como um cliente e as fronteiras entre os âmbitos público e privado se tornaram tênues. Isso deu origem ao que Peroni (2015) menciona como distintos processos de privatização da educação e Fávero, Consaltér e Pires (2020) chamam de ideologia neoliberal na educação quando em estudo recente analisam de que forma os princípios neoliberais aceitos na escola estão cristalizando um novo senso comum pedagógico. Neste processo de privatização e de presença da ideologia neoliberal na educação, a propriedade das escolas permanecia como pública, mas a direção e/ou a execução de seu trabalho era delegada ao setor privado mercantil. Muitas vezes, contudo, esse âmbito passou a se travestir de filantropia, já que quem assume o comando de projetos educacionais são institutos e fundações que se autodenominam como sem fins lucrativos e que estão articulados a empresas privadas que possuem sua própria percepção quanto à educação pública e a seus objetivos - bem como a seus problemas e formas de resolução (BALL, 2014).

A Fundação Lemann, por exemplo, envolve-se em uma gama de iniciativas que afirmam auxiliar na qualificação da educação oferecida pelas escolas públicas do país, como o Prêmio Educador Nota 10 e o Movimento pela Base. Esses projetos buscam, respectivamente, dar destaque a docentes que desenvolvam práticas articuladas a padrões de êxito apontados por uma rede de instituições empresariais e filantrópicas; e defender a construção de uma base curricular única para o país, auxiliando na constituição do documento, que, depois de aprovado, é alvo de diferentes estratégias do Movimento para sua implementação. Além disso, desde 2015 a Lemann é a responsável pela Associação Nova Escola, que mantém a revista – muito popular entre os docentes – que leva o mesmo nome.

Os projetos mencionados, que são apenas uma pequena parte daqueles que a Fundação Lemann – aliada a muitas outras entidades similares – apoia, indicam a preocupação de grupos empresariais como o citado com o conteúdo da educação pública. Seja com o modo como o professor atua, com uma base curricular homogênea a ser seguida em todo o país ou com a elaboração de uma publicação pedagógica que oriente os docentes, a atuação de tais grupos ilustra a forma com que a escola tem tido suas diretrizes influenciadas por grupos externos, vinculados ao mercado. Convém frisar, ainda, que, para além de serem consideradas como uma forma de ajudar a comunidade, de obter dedução de impostos ou talvez até de divulgar uma imagem positiva de si (realizando uma espécie de publicidade indireta), essas parcerias difundem uma perspectiva societária, disseminando soluções para problemas complexos a partir de sua experiência no âmbito empresarial (BALL, 2014).

Assim, as “receitas pedagógicas” se propagam na educação, fomentando a produção de capital humano. As “novas tecnologias” aceleram esse processo e o tornam ainda mais tecnicizado, por meio de programas de multimídias e acessibilidade à informática, de capacitação na modalidade a distância e de home office. Além disso, o incentivo à pesquisa a partir de contratos entre universidades e grandes empresas, e as assessorias e os cursos suplementares denominados de “segunda escola” ou “educação por fora”, são outros exemplos, que são trazidos por Laval (2019, p. 140) e denotam o aprofundamento do quadro apresentado. E todas essas questões acabam interferindo no modo como o perfil do professor é constituído, com esse profissional se tornando não mais um mestre, um intelectual responsável por conduzir processos formativos humanos, mas um colaborador, como será abordado na seção seguinte.

3 A REDUÇÃO DA IDENTIDADE DE PROFESSOR À CONDIÇÃO DE COLABORADOR NA E PARA A SOCIEDADE NEOLIBERAL

No neoliberalismo, o indivíduo é concebido a partir de sua utilidade para o capital – é entendido menos como um sujeito e mais como um produto. Por meio de uma “subjetivação contábil e financeira” (DARDOT; LAVAL, 2016, p. 28), é constantemente levado a reproduzir consigo mesmo e com seus pares a relação mercantil que o capital estabelece com os sujeitos. Como Dardot e Laval (2016, p. 378) argumentam, “a empresa é promovida como modelo de subjetivação: cada indivíduo é uma empresa que deve se gerir e um capital que se deve fazer frutificar”. A individualização de êxitos e a autorresponsabilização quanto às dificuldades constitui um padrão de abnegação pessoal em que a busca por eficiência leva o empreendedor de si a superar quaisquer instabilidades e limitações contextuais.

Essa racionalidade consome também a escola e exige inovações para que essa instituição se torne útil diante do modo de vida que imprime à sociedade, postulando a aprendizagem ao longo da vida e a preocupação com a rentabilidade individual dos estudantes como sua prioridade. Os alunos são submetidos à apropriação superficial dos conhecimentos, tidos como desnecessários caso não apresentem aplicabilidade prática, além de serem subordinados a distorções de teorias e concepções pedagógicas que tornam os estudantes responsáveis pela própria aprendizagem (LAVAL, 2019). As relações que são construídas nesse ambiente são pautadas pela competitividade e pela meritocracia, com a homogeneização do discurso de que o sucesso está ao alcance apenas dos mais dedicados, sendo que seu colega ao lado é sempre um concorrente perigoso – mesmo que ainda faltem muitos anos para competirem no mercado de trabalho.

Nesse contexto, o professor tem seu papel comparado ao de um coach, que precisa motivar os estudantes a empregarem esforços em sua jornada individual de estudos. Os saberes que aborda, seus métodos e a própria forma como se relaciona com seus alunos são pautados nas expectativas das famílias, que são consideradas clientes e exigem aquilo que concebem como mais adequado para o sucesso futuro dos filhos. Sendo a escola um objeto de consumo, para que a instituição siga sendo a escolha das famílias (LAVAL, 2019) o professor precisa comprovar cotidianamente sua utilidade e seus resultados, sendo avaliado a todo momento a partir de critérios variáveis, mas sempre estabelecidos por aqueles que – ou ao pagarem as mensalidades escolares, ou ao manterem seus filhos em dada escola (em uma constante disputa entre as instituições públicas por matrículas) – garantem seu emprego.

A estabilidade profissional do professor da escola pública não é vista com bons olhos por (na tese neoliberal) limitar o potencial dos servidores que, sem terem motivos para mostrarem sua utilidade e manterem sua posição, adeririam à sistemática burocrática e ineficiente do serviço estatal. Do mesmo modo, sua sindicalização e organização coletiva são vistas com desconfiança (LAVAL, 2019), já que é o empenho do docente e sua capacidade de autogestão como empresa de si (como mencionado por Dardot e Laval, (2016)) que devem indicar seus ganhos, com direitos garantidos em políticas sendo entendidos como formas de melindrar sua efetividade. Ilustrando essa tendência estão os mecanismos de bonificação docente (sejam vantagens salariais ou períodos de licenciamento) atrelados a resultados discentes em avaliações externas que se multiplicam nas redes públicas de ensino.

O professor, nesse contexto, além de ter sua carreira comprometida, também é destituído de sua autonomia e de sua intelectualidade na escola que passa a funcionar como uma empresa e precisa assumir uma postura que favoreça a dinâmica mercantil adotada por ela, tendo seu perfil profissional relacionado não mais ao de mestre, mas reduzido ao papel de colaborador. Esse termo, que passou a ser mais comum a partir de 1990, substitui nos discursos expressões como trabalhador, funcionário ou empregado, embora não exista na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). A palavra colaborar tem raiz no latim laborare (trabalhar, fatigar-se, sentir dor) e, aliada à preposição com, ganha o sentido de ajudar, trabalhar junto. Para o trabalhador, que passou a ser considerado colaborador, uma nova consciência se forma; ele passa a se perceber como agente ativo, comprometido com o êxito da empresa. Para tanto, alcançará metas, enfrentará a concorrência e competirá até vencê-la; afinal, ele é um empreendedor também, que começa por fazer o empresariamento de si, sem notar qualquer engodo.

Essa interpretação ilusória, que se torna cada vez mais fortalecida na sociedade e atinge a todos os sujeitos, alcança o professor e se utiliza da educação constituída por meio dele para naturalizar nos jovens, condutas em que se identifiquem, se envolvam e busquem internalizar essa concepção neoliberal de empregabilidade. A capacitação dos estudantes deve objetivar apenas o alcance de rentabilidade, custe isso o que custar de sua saúde emocional ou física. Sem se importar com as desigualdades sociais e sem ser estimulado a denunciar qualquer tipo de subserviência e arbitrariedade, o êxito profissional depende do mérito demonstrado por cada um em sua jornada empregatícia, em que o número de desempregados anunciado na mídia cotidianamente é um lembrete de sua necessidade constante de se mostrar competitivo.

Assim, toda a experiência profissional do professor passa a ser articulada a esse novo papel que assimila. Aliás, o termo colaborador tem sido usado explicitamente pelas instituições de ensino, ressignificando a experiência do docente e fazendo com que se sinta “dono” da escola – entendida como um negócio – e desempenhe sua função de acordo com aquilo que seus clientes e empregadores (seja o empresário da rede privada ou o Estado, já que sua estrutura é usada para favorecer a estabilidade do capital) esperam dele. Em uma perspectiva romantizada da docência e utilizando-se da semântica do termo para favorecer a docilização desse profissional, os anseios da incursão neoliberal na educação se materializam. A percepção de que se deve colaborar com o sucesso de sua escola, sem discordar ou decepcionar aqueles que dão a ele a “oportunidade” de desenvolver seu trabalho, difunde uma postura de abnegação e de perseverança diante das dificuldades, com a responsabilização individual sendo acrescida de uma motivação incessante.

Movido pelo empreendedorismo de si, o docente adota essa posição ao se entender como o “sujeito unitário”, que Dardot e Laval (2016, p. 322) conceituam como “o sujeito do envolvimento total de si mesmo”, tomado pelo desejo de realizar, de fazer os projetos darem certo e se entendendo como o único responsável por isso. Motivado por ser referenciado como um colaborador, o professor não compreende a alienação a que se submete por estar arrebatado pela sensação de que, ao atuar em sua escola-empresa, trabalha para si, satisfazendo uma espécie de “ordem imperiosa de seu próprio desejo, à qual ele não pode resistir” (DARDOT; LAVAL, 2016, p. 322). Por isso, “não tem medo de ir contra a corrente: cria, desarranja, rompe o curso ordinário das coisas” (DARDOT; LAVAL, 2016, p. 151) e encara a mudança como uma oportunidade, mesmo que isso implique aceitar o constante processo de flexibilização de seu trabalho, no qual, aliás, deve estar envolvido integralmente e que exige aprimoramento incessante.

Sentindo-se essencial para a escola com funcionamento empresarial na qual atua, participa ativamente e faz com que sua práxis se volte àquilo que a dinâmica institucional impõe como necessário e exitoso, adaptando métodos, condutas e saberes. Dominado subjetivamente, age guiado pela competição, que não se limita aos outros, mas atinge também a si mesmo: precisa se mostrar continuamente mais adequado e mais dedicado ao alcance das metas que lhe são impostas. Seu papel de mestre e de condutor do processo formativo transforma-se no de um profissional que precisa ser sensível aos anseios de seus clientes, sendo facilmente substituído por outro caso não dê conta das necessidades e ambições esperadas por seus contratantes.

A adoção do termo colaborador, nessa relação, denota como a sistemática empresarial tem interferido na organização da escola e na forma como o trabalho docente é entendido. Submetendo-se, mesmo que não de forma consciente, aos anseios empregatícios do capital, o docente abre mão de suas garantias profissionais, mas principalmente de sua posição de professor e de sua autonomia intelectual. Tem sua subjetividade dominada e reproduz as exigências da racionalidade neoliberal, não se tornando apenas um empreendedor de si, mas fortalecendo também na formação de seus alunos essa mesma concepção. Torna-se, assim, acima de tudo, um colaborador para a manutenção da sociedade neoliberal.

Nessa relação, a utilização de um léxico distinto também simboliza o enfraquecimento do trabalho como um direito humano e social e sua transformação em mercadoria. Como Antunes (2018) discute, resiliência, parceria, empreendedorismo e colaboração são expressões incorporadas ao cotidiano a fim de mascarar a exploração sofrida pelos trabalhadores, tornando sutil a precariedade infligida a diferentes classes profissionais, como a docente, e promovendo, inclusive, sua responsabilização pelas contradições e crises do capital. Resistir a tal vocabulário, assim, é parte dos enfrentamentos a serem realizados, como Antunes (2018) destaca, e, no campo educativo, não se pode prescindir de se contrapor essa perspectiva. É por isso que, na seção seguinte, direcionaremos a discussão para John Dewey, debatendo como suas contribuições podem se constituir como uma perspectiva de enfrentamento a esse viés, abordando a atuação docente como articulada à reflexividade e à autonomia.

4 O PROFESSOR DIRIGENTE COMO POSSIBILIDADE DE RESSIGNIFICAÇÃO FORMATIVA

A teoria pragmatista do filósofo e pedagogo americano John Dewey (1859-1952) repercutiu mundialmente pelas contribuições quanto à compreensão da tradição intelectual passada e, sobretudo, por despertar para uma nova visão, mais crítica e criativa em relação à formação escolar. De modo sensato e articulado, ele conquistou notoriedade ao elaborar sua crítica aos métodos pedagógicos que predominavam na educação de sua época, expondo as divergências entre o modelo em curso e a sua teoria progressiva. No capítulo I da obra Experiência e Educação (1971), Dewey trata da Educação tradicional versus educação “nova” ou “progressiva”, exibindo os contrastes entre as propostas formativas. Dentre suas divergências estão:

À imposição de cima para baixo, opondo-se à expressão e o cultivo da individualidade; a disciplina externa contrária à atividade livre; a aprendizagem por livros e professores opondo-se à aprendizagem pela experiência; a aquisição por exercício e treino de habilidades e técnicas isoladas contrariando a sua aquisição como meios para atingir fins que respondem a apelos diretos e vitais do aluno; a preparação para um futuro mais ou menos remoto contrariando o aproveitamento máximo das oportunidades do presente; conhecimentos estáticos e afins opondo-se à tomada de contacto com um mundo em mudança (DEWEY, 1976, p. 6-7).

Dito de outro modo, as evidências do afastamento entre as vertentes pedagógicas podem ser constatadas pelo fato de, por exemplo, se ignorar a condição de crescimento e o universo experiencial do educando, além da desconsideração quanto à sua capacidade de perceber e interagir no mundo. Ainda, engendram-se movimentos que obstaculizam sua participação no processo de aprendizagem, o que suscita, na interpretação do pensador, a impossibilidade do seu pensamento reflexivo e, por conseguinte, a sua incapacidade executiva no contexto onde vive. Dewey (1979b, p. 13) diz que o pensar reflexivo é uma “espécie de pensamento que consiste em examinar mentalmente o assunto e dar-lhe consideração séria e consecutiva”. O ato de pensar suscita a ação transformadora. Tal perspectiva pode se mostrar promissora para articular “a formação do professor reflexivo à luz da concepção pragmática deweyana de Educação” (FÁVERO; TONIETO, 2011), bem como compreender a formação do professor reflexivo a partir de “uma integração entre teoria e prática” (FONTANA; FÁVERO, 2013), ou articular a formação de professores reflexivos tomando a “docência como objeto de investigação” (FÁVERO; TONIETO; ROMAN, 2013) e apostando na ideia de uma educação democrática tomando “a relação entre educação escolar e democracia” a partir de uma perspectiva deweyana (FÁVERO; TONIETO, 2015).

Em uma passagem da obra A escola e a sociedade e a criança e o currículo, Dewey (2002) relata que em certa ocasião, no tempo que trabalhava na Escola Elementar da Universidade de Chicago, precisou percorrer as lojas em busca de classes e cadeiras que possibilitassem o trabalho artístico e fossem educativas, com base no que era proposto às crianças na referida escola. Teve dificuldades para encontrar o que procurava, até que um comerciante, que Dewey caracterizou como mais inteligente do que os restantes, teceu o seguinte comentário: “Receio bem não ter o que vocês desejam. Vocês querem carteiras onde as crianças possam trabalhar; todas estas são para ouvir.” (DEWEY, 2002, p. 38).

Este trecho resume o problema educacional exposto por Dewey que se refere à dificuldade quanto ao modo como se instrui e conduz o educando na sua formação que, ao se mostrar direcionada para cumprir certos objetivos, não permite a sua atitude participante, deixando-o à margem do processo, em papel de mero observador distante. O produto desse distanciamento é a indiferença do estudante em relação aos acontecimentos, também ausência de emoção e sensibilidade, atributos necessários para o cultivo do interesse, da disciplina e da vontade de aprender.

Em outras palavras, a educação, como possibilidade de crescimento do sujeito, que provém da reorganização da experiência, fica comprometida, pois em ambiente restritivo, o ser humano decai, deixa de pensar por conta própria e coletivamente, embrutecendo seu modo de vida, o que torna mais dificultoso, ou praticamente impossível, a concretização de uma sociedade cooperativa e equânime, pois ele não desenvolve a capacidade humana da ação, que permitiria as transformações essenciais do contexto.

Cabe-nos retomar, mesmo que de modo sucinto, alguns aspectos do cenário do século XX, marcado por mudanças estruturais expressivas, período em que Dewey lançou suas ideias no esforço de recuperar o papel formativo da instituição escolar. A conjuntura instável na qual estava inserido, provocada pela primeira guerra mundial (1914-1918), a expansão dos sistemas de ensino, sob a ótica da vertente capitalista, oriunda da industrialização e a segunda guerra mundial (1939-1945), colocaram em jogo os ideais democráticos, levando o autor a fundamentar sua teoria educacional. Essa rememoração nos permite notar que, embora as objeções de Dewey em relação ao sistema escolar tenham sido proferidas no século XX, ainda são pertinentes à nossa conjuntura, visto que a problemática da educação exposta por ele se assemelha à nossa, que por estar acometida pelo viés neoliberal, reforça práticas pedagógicas reduzidas aos propósitos econômicos, sendo assim bastante parecidas com a da sociedade examinada pelo educador americano há mais de um século.

Contrariando as tradições cartesiana (psicologia introspeccionista amparada em conceito metafísico que enfatiza o uso da razão-mente-consciência) e behaviorista (teoria psicológica positivista do comportamento, orientada exclusivamente pelo mecanismo estímulo-resposta), o movimento pragmatista de Dewey evidenciou preocupação em considerar os avanços científicos, mas estes em consonância com a Arte e às Humanidades. O filósofo americano chama a atenção para a necessidade de no currículo estarem coisas essenciais, sendo que o mais elaborado deveria ser abordado numa etapa posterior. Para ele, o essencial é o que é comum, compartido entre os grupos extensos, e o que é secundário são as coisas que representam as necessidades de grupos especializados e trabalhos técnicos. Ainda enfatiza que “existe verdade no dizer-se que a educação deve primeiro ser humana e só depois profissional” (DEWEY, 1979b, p. 211).

Eis aí o ponto central de nosso trabalho. Se a educação, conforme Dewey (1979a, p. 211), “deve tomar em conta a adaptação dos estudos às necessidades da vida atual em sociedade; a escolha deve ser feita com o fito de melhorar a vida que levamos em comum, de modo que o futuro seja melhor que o passado”; se a tarefa da escola, representada pela ação docente, seria conduzir o educando para apropriações formativas necessárias para dar conta do viver coletivo e superar as possíveis adversidades, por outro lado, a lógica empresarial afasta os indivíduos entre si, porque tem como pano de fundo a competição. A escola, o professor e o educando são afastados dos valores humano-democráticos, em detrimento da lucratividade.

Então, diante desse cenário, como o profissional em exercício da docência, retratado como colaborador, por ter sido deformado enquanto professor, pode se afastar ao máximo da lógica neoliberal, deixar de colaborar com ela e se aproximar dos preceitos democráticos deweyanos? Que atributos esse profissional teria que abarcar para cultivar a essencialidade do professor enquanto responsável e condutor da formação do educando e por consequência, ser defensor da sociedade humano-democrática como forma de vida, em contexto de doutrina ideológica mercantil? Também surge o questionamento quanto às reais possibilidades de convergência entre os princípios democráticos defendidos por Dewey e as sociedades neoliberais, visto que as desigualdades tendem a se acentuar com tal incursão, já que os sujeitos competem entre si, o que diverge de cooperar.

Para o pensador, os problemas educacionais não são superados porque a escola não tem como objetivo a educação para o pensar. Não sendo um dos objetivos escolares o desenvolvimento do pensamento, o estudante permanece inapto para lidar com as demandas do cotidiano, já que a sua capacidade executiva é afetada. Aquele que exercita o pensamento aprende a buscar, questionar e investigar em vez de, passivamente reproduzir, esperar ou aceitar o que lhe é apresentado ou estabelecido. Ora, parece que nosso atual contexto pode estar deixando de lado o propósito de educar para o pensar. Nossas crianças e jovens podem estar em condição de imobilismo, conduzidos a “desenvolver o bícipite”, analogia construída por Dewey (1979a) para se referir à formação escolar mecanizada que contemplava as demandas econômicas, treinando apenas parte do todo, como um aparelho de ginástica a desenvolver de forma automática determinado músculo.

Diante do supracitado, fica evidente a dificuldade em estabelecer as premissas que venham subsidiar a práxis docente com vistas ao desencadeamento de ideias. Nossa hipótese, fundamentada na função primordial do professor, com base no ideário deweyano, insiste que ele não pode ser confundido com um simples colaborador, pois desta forma estaria em concordância com a incursão neoliberal. Apostamos nele enquanto sujeito que resiste à investida, quando para isso desempenha o papel de dirigente responsável pela formação do educando, mobilizando-o ao pensar e à apropriação cultural polida, insuflada de princípios éticos-democráticos.

Para guiar o processo formativo nesta perspectiva, quanto mais o professor “conhecer as experiências anteriores do educando, suas esperanças, desejos e principais interesses, melhor compreenderá as forças em ação que lhe cabe dirigir e utilizar, para formar os hábitos de reflexão” (DEWEY, 1979a, p. 44). Essa seria condição central para favorecer o exercício do pensamento do sujeito aprendente, este que inicialmente contribui com ideias, hipóteses e crenças espontâneas, que devem ser acolhidas pelo mestre, pois servem como ponto de partida para o professor dirigente.

No entanto, se o professor desconsiderar os saberes prévios do estudante, requisitando que ele se cale; ou considere inconvenientes as atividades que envolvem exploração e investigação, tratando-as como inoportunas; ou escolha propostas associadas à decoração e associações verbais, estará ele desfavorecendo as conexões variadas e flexíveis, e o estudante não pode nestas condições, olhar para a frente, prever, planejar e executar sua ação que, provavelmente o levaria para outras novas ideias (DEWEY, 1979a). Essa postura não transforma o professor em um profissional reflexivo e tampouco capacita o aluno à autonomia, ou seja, não se gera uma conformidade de investigação reflexiva que desenvolva e estabeleça um diálogo permanente com o exercício do pensamento.

Neste ponto, Dewey (1979a) acentua para dupla problemática na qual o professor transita, sendo por um lado a necessidade de estudar os traços e hábitos individuais dos educandos e por outro estudar as condições que modificam, para melhor ou pior, as direções em que se expressam os anseios individuais. O método, neste sentido, abrange o que o professor intenciona e também o que ele faz sem referência consciente. Em outros termos, a curiosidade, a reatividade e atividade do estudante dependem da concepção do professor. Aquele que tem conhecimento acerca das operações mentais individuais e os efeitos das condições escolares sobre essas operações, estará mais preparado para escolher métodos e adaptá-los quando necessário. Ao contrário do professor despreparado, que não está ciente do modo como o educando aprende, tampouco sabe da importância do ambiente, da interação, da experiência para a aprendizagem e, desta forma originará maus hábitos, que serão arraigados e persistentes, com vistas somente para produção imediata de saberes técnicos.

Certamente um dos grandes desafios do professor é o de possibilitar condições para que os alunos construam hábitos de estudo, sem que uma determinada área do conhecimento fique esquecida em detrimento de outra, o que já acontece na sociedade de mercado, que enfatiza a importância de certas áreas e despreza outras. É um risco que o professor corre, ao fixar a atenção em um campo específico, pois o aluno estará progredindo em determinado tópico, enquanto abandona outros. Ao conduzir dessa forma o processo educativo, o professor abdica do processo de formar hábitos, atitudes e interesses, formação que, como vimos, é mais importante para a vida cooperativa-democrática. Com essa postura, fica claro também que o professor está a ignorar as condições do pensamento reflexivo como espírito aberto, devotamento de todo coração e responsabilidade (DEWEY, 1979a).

O professor, com base no preceito deweyano, é estímulo para as reações dos estudantes, o seu modo de ação condiciona o modo de agir do aluno. Dito de outra forma, “tudo que o mestre faz, bem como o modo por que o faz, incita o aluno a reagir de uma ou de outra forma e cada uma das suas reações tende a determinar uma atitude em certo sentido” (DEWEY, 1979a, p. 65). Um exemplo, muito comum na infância, é a criança que na ação de brincar, revela certos aspectos das situações do contexto escolar e da práxis do professor. Mais adiante, ela tende a relacionar a matéria com o professor, podendo, de acordo com essa fusão, se afastar ou se aproximar, ter simpatia ou aversão, prazer ou desprazer. É o caso do comum “Eu odeio matemática”, por exemplo. A figura do mestre também é passiva dessa ótica quando ele se centra exclusivamente em determinadas metodologias, impossibilitando, desse modo, uma abertura a novos procedimentos. É desastroso ver o professor se apegar e adotar métodos estereotipados, que não admitem reparos e convertem-se em hábitos desleixados de falar, inferências sem ordem, respostas secas e literais (DEWEY, 1979a).

Dewey apresenta ainda três riscos que precisam ser observados, pois podem configurar impedimento ao pensamento reflexivo que, como já assinalamos, é condição basilar para ação. O primeiro risco está relacionado ao ato do julgamento. É comum julgarmos os outros por nós mesmos e a periculosidade disso reside no fato de que se presume que certo modo de pensar seja a regra para todos, sem a abertura para as outras mentalidades. Vincula-se aqui o procedimento de adestramento mental. O segundo risco se refere à indevida confiança no influxo pessoal. Neste ponto, os professores mais incisivos inclinam-se à uma atitude ríspida frente aos alunos. Essa atuação acaba por inserir e inquirir no aluno um respeito forçado e ineficaz em relação à matéria. Quando isso acontece, “a personalidade do professor pode transformar-se para o discípulo, em fonte de dependência, de debilidade pessoal, em influência que o torna indiferente pelo valor da matéria em si mesma” (DEWEY, 1979a, p. 67). A conduta docente deve primar por propósitos verdadeiramente educativos e éticos e não unicamente impositivos ou utilitários. O terceiro risco está ligado à preocupação em satisfazer ao professor e não ao problema. Aqui o aluno se adapta ao que o professor dele almeja ou espera. O pensamento do aluno enreda-se nas seguintes questões: “isto será assim?”; esta resposta ou este trabalho satisfará a meu professor?” em vez de “satisfará às condições impostas pela questão a resolver?”. Essa postura é uma temeridade educacional. O risco é submergir o aluno às ideias e preceitos do professor e, não a uma autonomia de pensar por conta própria.

Além de evitar os riscos mencionados, alguns recursos são imprescindíveis para que ocorra o exercício do pensamento. Assim, considerando o professor como responsável pela condução formativa do aprendiz, a atenção, o entendimento e a consciência são fulcrais por parte dele. As condições que levam ao desenvolvimento do hábito de pensar precisam ser constantes em sua práxis. Só é possível desenvolver o hábito de pensar, e pensar bem quando as capacidades, ou tendências inatas do aluno forem acolhidas e entendidas como constituintes do pensamento, por meio do processo contínuo de experiências. Em contexto escolar, cabe ao professor, que deseja bem educar, conhecer as experiências passadas (tendências inatas originais), os desejos e os principais interesses. Também cabe a ele dirigir essas forças para formar o hábito da reflexão, observando a curiosidade, as sugestões e a ordem no ato de educar.

A curiosidade se desenvolve pelo processo de interação envolvendo o uso dos sentidos e a experimentação com o ambiente. Dewey aponta três graus da curiosidade: A orgânica, que é instintiva, fisiológica e não tem características reflexivas. Mas algo que devemos observar nesse grau é que ele demonstra uma inquietude, um espanto, um incômodo fisiológico que põe a criança em movimento de procura. Antes de pensar há um ato de vitalidade e energia. No caso da criança, ela está sempre explorando e verificando o ambiente. “A observação dos atos de uma criança nos revela uma contínua atividade de exploração e verificação” (DEWEY, 1979a, p. 45). Mais tarde, a curiosidade é social, momento em que surgem as perguntas, os porquês dentro de uma situação. Configura-se em um princípio de linguagem, mas não em linguagem lógica e reflexiva. O ser também demonstra ansiedade e uma necessidade de revelar o que está escondido, necessidade de sair de si e encontrar os outros e o mundo, “ânsia de familiarizar-se com o mundo misterioso em que se encontra” (DEWEY, 1979a, p. 46). No entanto, a pergunta está mais ligada à formulação da dúvida do que pela busca da solução, por isso, a curiosidade ainda não é intelectual. Finalmente chega-se ao alcance da curiosidade intelectual, condição em que a curiosidade passa do ambiente social para um sistema intelectual, e de modo organizado leva em conta uma sequência de investigação e organização. Nas palavras de Dewey, há uma metamorfose em querer descobrir por si mesmo a resposta.

A função do professor em relação aos níveis de curiosidade, é utilizar todas as experiências orgânicas e sociais, com o propósito de fazer o aluno alcançar nível intelectual. No entanto, cabe-nos destacar sobre o risco da perda da curiosidade. O professor, neste sentido, precisa estar atento no processo, com cuidado para orientar a curiosidade até o agir reflexivo. Primeiro tem de defender e proteger os alunos das simples excitações desprovidas de efeito cumulativo (DEWEY, 1979a). Segundo, cabe a ele observar que a curiosidade não se desenvolva só a partir de interesses pessoais, o que configuraria uma curiosidade egoísta. Terceiro, tem de evitar o dogmatismo que faz crer que tudo já está acabado e definido. Também existe um uso de curiosidade que exige cuidados, a curiosidade que está ligada à bisbilhotices e espionagem do que pertence a vida do outro é uma curiosidade nociva ao pensamento reflexivo. Da mesma forma que nos maravilhamos com o mundo também nos desmaravilhamos, ou seja, sofremos o processo de desencantamento e retração da curiosidade. Os motivos são os mais variados: indiferença, descuido, frívolas loquacidades, rotina (DEWEY, 1979a).

No que se refere a sugestão, podemos destacar que quanto mais limitadas forem as possibilidades experienciais, também serão limitadas as sugestões de ideias, de criatividade e consequentemente da atitude reflexiva. Por outro lado, se forem amplas as condições, a dimensão da sugestão é alargada, gerando no aluno facilidade ou prontidão em relação ao foco de estudo. Dewey, no entanto, chama a atenção para a extensão e variedade das sugestões, dizendo que não há um padrão de proporção e variedade ou uniformidade de sugestões para que o pensamento reflexivo se desenvolva. Isso pode estar ligado à multiplicidade de tendências inatas originais. Se faz necessária, entretanto, a constante avaliação por parte do professor, diante da realidade do aluno. “O melhor hábito mental é o que encontra sua posição de equilíbrio entre a pobreza e a superabundância de sugestões” (DEWEY, 1979a, p. 52). Outro ponto diz respeito à altura e profundidade da sugestão. Aqui Dewey elenca a necessidade do bem pensar e do tempo necessário para a qualidade intrínseca que exige o pensamento. Assim, a altura e a profundidade em responder uma sugestão no âmbito reflexivo está intimamente ligado ao tempo que debruçamos sobre a questão que é proposta.

O pensamento reflexivo subentende a consecutividade, a continuidade e a ordem das sugestões. Dewey diz que há uma diferença entre pensar e pensar reflexivamente, “um simples perpassar de ideias ou sugestões é pensar, mas não pensar reflexivo” (DEWEY, 1979a, p. 54). O método e a direção ao objeto do conhecimento determinam se há ou não o pensar reflexivo. Este, por sua vez, se apoia e se sustenta em bases e evidências fundamentadas em crença ordenada e justificada. Assim, não há pensamento reflexivo sem método e direção ao objeto, tampouco ancorados em crenças espontâneas. Nós nos chacoalhamos, reviramos, remexemos, retorcemos dentro do próprio pensamento, da própria matéria que pensamos, mas sem perder a consecutividade/sequencialidade. O pensamento nasce, muitas vezes, de forma indireta a vontade de pensar, mas forçado pelas exigências da vida. Essas necessidades querem uma eficiência da ação, o que acaba por desenvolver o pensar ordenado. Ordenado não por amor ao pensar, mas pela necessidade de eficiência. O pensamento permeado pela ordem, tende a ser reflexivo e pode ter múltiplas ramificações, desde que as ramificações permaneçam conectadas ao objeto e a sugestão em intensa concentração que “significa variedade e mudança de ideias, combinada num movimento uno e constante para uma conclusão una” (DEWEY, 1979a, p. 55).

Em relação à etapa da infância nos cabe ressaltar que a educação reflexiva não é uma exclusividade da vida adulta. “Desde tenra idade as crianças têm de selecionar atos e objetos com meios para alcançar fins” (DEWEY, 1979a, p. 57). No entanto, as crianças não têm o estado, a carreira fixa e as obrigações dos adultos, também não têm motivações acentuadas. Por terem uma diversidade de situações e múltiplas particularidades, as dificuldades do ordenamento reflexivo na criança se acentuam. Para que alcancem o pensamento reflexivo necessitam de condução assertiva continuada, para tanto, dependem do educador, que faz as escolhas de propostas e atividades educativas. Em se tratando do ser imaturo, o problema, bem como a oportunidade, reside na seleção criteriosa dos modos de ocupação ordenados e contínuos, que possam conduzir, preparar para as atividades indispensáveis à vida adulta sem desconsiderar a própria condição infantil.

Talvez outro grande desafio da docência seja justamente encontrar o tempo pedagógico do aluno, isto é, quando lhe é proposto algo para além das suas possibilidades, o aprendiz tende a ficar desmotivado, frustrado e, sem conseguir progresso frente ao excesso de desafios, ou situação problema que ainda não tem condições de solucionar acaba por desistir da proposta. Por outro lado, se o professor desenvolver um encaminhamento acerca de algo que o aluno já domina, poderá causar a mesma desmotivação e frustração, pois será uma abordagem pouco desafiadora. A probabilidade de desistência do aluno em relação à tarefa é tão provável quanto na situação anterior e, em ambas, não há o exercício do pensamento reflexivo. Encontrar o tempo certo, o tempo mais apropriado para intervir ou deixar livre é tarefa essencial do professor dirigente, que é responsável pela condução formativa do aluno. Todavia, talvez não seja tarefa primordial do profissional da educação que se deixou transformar em colaborador, visto que os propósitos educacionais são diferentes. Para o primeiro, a formação humana, os princípios democráticos, a vida cooperativa são centrais, sendo imprescindível o pensar reflexivo. Para o segundo, as determinações da sociedade de mercado regulam sua prática, provavelmente são outros interesses e certamente o pensamento reflexivo é dispensável.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Assim como Dewey apontou contradições e fragilidades de tendências pedagógicas, a sua também foi exposta às objeções por outros pesquisadores, o que evidencia a dimensão de incompletude, a necessidade de complementaridade e reformulações constantes, em conformidade com as problemáticas presentes na sociedade. O próprio autor, no prefácio da obra Experiência e Educação (1976), mostra-se aberto aos movimentos da educação e sugere que eles sejam adaptados ao presente, sem que haja apego aos “ismos” – inclusive ao seu próprio movimento, o progressivismo –, pois, segundo ele, é necessário um exame constante da realidade para dar conta do que ela exige. O apego a determinada vertente pode configurar dogmas e práticas autoritárias, características da educação que ele examinou e construiu as suas objeções. Para Dewey, há sempre o perigo em um novo movimento de que, ao rejeitar os fins e métodos da situação que visa suplantar, desenvolva seus princípios negativamente e não de maneira positiva e construtiva (DEWEY, 1979a, p. 6-7).

O recorte da obra Como pensamos (DEWEY, 1979a) que utilizamos para mostrar o papel central do professor no processo formativo do aluno não foi explorado por completo, pois o refinamento presente na escrita de Dewey exige minuciosa análise de cada frase, para que todos os conceitos e ideias sejam contemplados, o que não foi do nosso propósito neste trabalho. Procuramos, neste artigo, problematizar o papel do professor e, ao mesmo tempo, trazer luzes, a partir do ideário deweyano, à centralidade docente que por ora se mostra fragilizada pela incursão neoliberal na educação. Como dito anteriormente, o autor acredita na abertura em relação aos diferentes movimentos da educação e sugere adaptações em conformidade com as transformações da sociedade. No entanto, alguns aspectos da educação, provindos das raízes clássicas, as quais o autor tomou conhecimento para fundamentar sua teoria educacional, precisam ser preservadas para que a vida cooperativa-democrática seja mantida.

Com a transformação do professor em colaborador, os ideais democráticos são postos em risco, já que a formação que favorece, a partir da dinâmica empresarial adotada pela escola, não prioriza que os indivíduos pensem criticamente, que cooperem entre si ou que ajam para melhorar o lugar onde vivem. Voltada a objetivos práticos e racionais, a práxis do colaborador restringe as perspectivas formativas à disponibilização de capital humano ao mercado de modo que, mais do que colaborar com a planificação da sistemática neoliberal na educação, os docentes se tornem colaboradores com a manutenção da conciliação capitalista na sociedade. Contrariar esse movimento implica em exercer resistência quanto a ele e de assumir seu papel como dirigente de um processo de formação reflexivo e democrático.

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Endereço para correspondência: Rua Alfredo Chaves, 34, Bairro Lucas Araújo, 99074-270, Passo Fundo, RS; altairfavero@gmail.com


1 Doutor em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS); Mestre em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS); altairfavero@gmail.com

2 Mestre em Educação pela Universidade de Passo Fundo (UPF); Graduada em Pedagogia pela Universidade de Passo Fundo (UPF); analucia.vieira32@gmail.com

3 Mestre em Educação pela Universidade de Passo Fundo (UPF); Graduada em Pedagogia pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM); renataestomovski@gmail.com

4 Esta expressão é utilizada por Dardot e Laval (2016, p. 15) para denominar “o conjunto de discursos, práticas e dispositivos que determinam um novo modo de governo dos homens segundo o princípio universal da concorrência.”

5 O termo empreendedor de si, que dá origem a outras expressões como a mencionada, remonta a Foucault, referindo-se ao sujeito subjetivado pela biopolítica na governamentalidade neoliberal. Outros autores desenvolvem discussões articuladas a essa percepção, como Dardot e Laval (2016) utilizados neste estudo.

6 Baseando-se na Fenomenologia como corrente de pensamento, pautada em Heiddeger, o movimento analítico-hermenêutico intenta compreender e interpretar eventos cotidianos, construindo significados e sentidos para os fenômenos. A investigação é deflagrada pelos problemas que emergem na realidade, constituindo interrogações a serem respondidas a partir da análise. Duas instâncias possuem centralidade na pesquisa: a ôntica, que se refere à descrição do fato conhecido, àquilo que já é entendido; e a ontológica, que remete ao que precisa ser descoberto na relação entre o ser e o mundo (PAULA et al., 2012). Nessa trajetória, parte-se do questionamento em direção à interpretação dos sentidos, percurso delineado para este estudo e para a resolução de seu problema de pesquisa.

7 Como Dardot e Laval explicam, a justiça é encarada no neoliberalismo como “a justa recompensa do mérito” (2016, p. 51), o que faz com que cada cidadão deva receber aquilo que seria resultado de seu próprio esforço. O Estado, assim, não deveria ter gastos com programas sociais, pois o fracasso ou o êxito são vinculados à responsabilidade individual, ao esforço empregado por cada um na busca por seus objetivos.