https://doi.org/10.18593/r.v47.27913
Educação do campo em tempos de pandemia no município de Riacho de Santana
Education of the field in times of pandemic in the municipality of Riacho de Santana
Educación del campo en tiempos de pandemia en el municipio de Riacho de Santana
Antônio Domingos Moreira1
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, Educação, Docente.
https://orcid.org/0000-0002-2856-1219
Ramofly Bicalho2
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Educação, Docente.
http://orcid.org/0000-0003-0571-6481
Resumo: Este artigo tem como objetivo principal apresentar os efeitos da organização do trabalho docente e as discussões sobre a dinâmica da educação do campo em tempos de pandemia da Covid-19, no município de Riacho de Santana, Bahia, refletindo acerca do papel das políticas públicas neste processo de mudanças no novo formato educacional. A coleta de dados ocorreu através de um questionário pelo aplicativo WhatsApp com cinco (05) docentes que atuam nas escolas do campo do município de Riacho de Santana. As discussões são fruto de uma pesquisa empírica, contemplando o uso de levantamento bibliográfico-documental. Os resultados apontam que a pandemia introduziu novas demandas e intensificou esforços, aos docentes, diante da organização da dinâmica educativa, desde a adaptabilidade às ferramentas tecnológicas disponíveis, até a transposição de metodologias presenciais para o ambiente virtual, bem como, ocasionou a expansão da carga horária de trabalho, desmotivação e conflitos com as famílias dos estudantes. Assim, é notável que, além de ampliar os dilemas já existentes, a pandemia projetou ainda o desafio da (re)invenção do fazer docente numa conjuntura de crise na educação pública, com desarticulações entre as políticas públicas educacionais e o novo contexto, principalmente, na modalidade de educação do campo.
Palavras-chave: Covid-19; tecnologias educacionais; formação docente; políticas públicas.
Abstract: The main objective of this article is to present the effects of the organization of teaching work and the discussions on the dynamics of rural education in times of the Covid-19 pandemic, in the municipality of Riacho de Santana, Bahia, reflecting on the role of policies in this process of changes in the new educational format. Data collection took place through a questionnaire using the WhatsApp application with five (05) teachers who work in rural schools in the municipality of Riacho de Santana. The discussions are the result of an empirical research, contemplating the use of bibliographic-documentary survey. The results show that the pandemic introduced new demands and intensified efforts by teachers in the face of the organization of educational dynamics, from adaptability to available technological tools, to the transposition of face-to-face methodologies to the virtual environment, as well as causing the expansion of the load working hours, lack of motivation and conflicts with the students’ families. Thus, it is remarkable that, in addition to expanding the existing dilemmas, the pandemic also projected the challenge of the (re)invention of teaching practice in a context of crisis in public education, with disarticulation between educational public policies and the new context, especially in the modality of education in the countryside.
Keywords: Covid-19; educational technologies; teacher training; public policy.
Resumen: El objetivo principal de este artículo es presentar los efectos de la organización del trabajo docente y las discusiones sobre la dinámica de la educación rural en tiempos de la pandemia Covid-19, en el municipio de Riacho de Santana, Bahía, reflexionando sobre la papel de las políticas en este proceso de cambios en el nuevo formato educativo. La recolección de datos se realizó a través de un cuestionario mediante la aplicación WhatsApp con cinco (05) docentes que laboran en escuelas rurales del municipio de Riacho de Santana. Las discusiones son el resultado de una investigación empírica, contemplando el uso del relevamiento bibliográfico-documental. Los resultados muestran que la pandemia introdujo nuevas demandas e intensificó los esfuerzos de los docentes, ante la organización de las dinámicas educativas, desde la adaptabilidad a las herramientas tecnológicas disponibles, hasta la transposición de metodologías presenciales al entorno virtual, así como provocando la ampliación de la jornada laboral, desmotivación y conflictos con las familias de los estudiantes. Así, es destacable que, además de ampliar los dilemas existentes, la pandemia también proyectó el desafío de la (re) invención de la práctica docente en un contexto de crisis en la educación pública, con desarticulación entre las políticas públicas educativas y el nuevo contexto, especialmente en la modalidad de educación en el campo.
Palabras clave: Covid-19; Tecnologias educativas; formación de professores; políticas públicas.
Recebido em 26 de junho de 2021
Aceito em 09 de setembro de 2021
1 INTRODUÇÃO
O presente artigo traz uma discussão sobre o ano letivo escolar no município de Riacho de Santana, principalmente, as escolas do campo que são mais atingidas com a chegada do novo Coronavírus (Covid-19). Importante destacar que Riacho de Santana está localizado na Identidade do Território Velho Chico, no Oeste do estado da Bahia. As aulas que se iniciaram no dia primeiro de março de 2021 de forma remota, como foi evidenciado pela gestão municipal e secretaria de educação para os riachenses, em meio ao avanço da Covid-19.
Falar dos impactos da pandemia na educação brasileira do campo é uma tarefa extensa e complexa, muitos são os contextos profundamente prejudicados pela situação atual, os assentamentos, as áreas indígenas, os quilombos, as ocupações etc. Sabe-se que neste período ficam mais evidenciada as condições historicamente negadas para quem vive no campo.
Com a disseminação do novo Coronavírus (Covid-19) em diversas partes do globo, fez com que a Organização Mundial da Saúde (OMS) a caracterizasse como pandemia em março de 2020. Desde o surgimento do vírus, ainda no final de 2019 na China, líderes de diferentes países têm tomado medidas diversas para tentar barrar o alastramento da doença, optando por seguir ou não as recomendações da OMS ou de instituições supranacionais e nacionais que se debruçaram sobre a questão. Diante do contexto atual e pandêmico, as populações do campo ficaram esquecidas nas políticas públicas e nas discussões da área educacional por um longo período.
No Brasil, o Ministério da Saúde confirmou, em 26 de fevereiro de 2020, o primeiro caso de Coronavírus e, a partir daí, a doença alastrou-se por todo o território nacional, gerando medo e precaução em alguns e a negação da realidade desconfortante em outros. O fato é que nos meses seguintes assistimos aturdidos ao crescimento do número do contágio e dos mortos (BRASIL, 2020). O Brasil e o mundo enfrentam a mais grave crise sanitária e econômica dos últimos anos com a expansão da pandemia da Covid-19 que interrompeu o curso da vida das pessoas, desafiando a lógica individual e mercantil de organização da sociedade em escala local e global.
A imprevisibilidade da pandemia e a celeridade de implementação das medidas de distanciamento social demandaram dos sistemas educacionais alternativas para o desenvolvimento de atividades escolares remotas. Inexistia, até aquele momento, qualquer tipo de planejamento das redes de ensino para lidar com isso. Afinal, realizar atividades educacionais não presenciais exige dos professores e dos estudantes recursos tecnológicos e conhecimentos específicos para manejá-los.
Diante da realidade atual, as redes de ensino do município de Riacho de Santana, estão se esforçando para oferecer suporte institucional para facilitar a execução das novas práticas de ensino. Com a mesma rapidez com que as adaptações foram implementadas pelas redes e instituições de ensino em todo o país, Nessa premência, os desafios do trabalho docente em tempos de Pandemia, tem sido árduo e no formato do ensino emergencial, para seguir as recomendações dos órgãos públicos e especialistas na área sanitária para conter a propagação do novo Coronavírus os efeitos das medidas de distanciamento social em função da pandemia da Covid-19 sobre o trabalho dos (as professores(as) de educação básica nas redes públicas de ensino no Brasil.
Para tanto, discutir e abordar os aspectos legais sobre a Constituição Federal de 1988 a educação passa a ser direito fundamental garantido a todo e qualquer indivíduo, independentemente em que local esse indivíduo reside e vive. Desse modo, a educação fornecida à população deve ser garantida no mesmo patamar de igualdade para todos, seja nos centros urbanos como também nas escolas do campo. Após a CF/88 surge a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (9394/96) que vai delinear as principais ideias que norteiam as práticas educativas em todos os contextos (BRASIL, 1996).
Sobre a retomada das aulas presenciais e a preocupação com a saúde dos profissionais da educação e os estudantes, retomamos a Constituição Federal de 1988 assegura em seus artigos 205 e 206 que é direito de todos o acesso ao ensino público gratuito e com padrão de qualidade (BRASIL, 1988). Quando olhamos para a história de nosso país, vemos que o acesso à educação foi marcado por fortes desigualdades: ora pelo não acesso ao sistema escolar, ora pela exclusão dentro do próprio sistema ou, ainda, pelo acesso a padrões diferentes de qualidade educacional.
Além disso, as desigualdades educacionais podem contribuir para o aumento das desigualdades econômicas por meio da corrida entre educação e tecnologia: a tecnologia define a demanda por trabalho qualificado, enquanto a educação determina a oferta de pessoas com certas habilidades. Se a demanda por trabalhadores com certo nível de qualificação é grande, porém sua oferta pequena, o diferencial do salário desse grupo será grande em relação ao salário de outros grupos de trabalhadores (MENEZES FILHO; KIRSCHBAUM, 2015).
Diante de um cenário atípico, não bastasse as dificuldades já enfrentadas pela educação, no que se refere as políticas públicas e a falta de infraestruturas de qualidade, a pandemia da Covid-19 foi fundamental para piorar o sistema público, devido aos transtornos por ela proporcionados, está arraigando as desigualdades sociais existentes no país, impondo inúmeros desafios à educação pública brasileira - a qual nunca conseguiu resolver seus problemas históricos - e colocando os professores, frente a situações desafiadoras jamais imaginadas.
Nesse contexto, a presente pesquisa buscou conhecer os efeitos das medidas tomadas em função da pandemia da Covid-19 no trabalho docentes nas unidades de ensino no município de Riacho de Santana. A pesquisa procurou evidenciar as práticas dos professores e como as atividades estão sendo desenvolvidas pela secretaria de educação e as unidades escolares do município, e em que condições os estudantes estão realizando as tarefas de forma remotas, durante o período da disseminação do novo Coronavírus.
2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA
Para execução dessa pesquisa, adotamos a metodologia da pesquisa quali-quantitativa, pelos números e percentuais que serão apresentados e também no que trata-se de uma atividade da ciência, que visa a construção da realidade, mas que se preocupa com as ciências sociais em um nível de realidade que não pode ser quantificado, trabalhando com o universo de crenças, valores, significados e outros construtos profundos das relações que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis. Godoy (1995) explicita algumas características principais de uma pesquisa qualitativa, o qual embasam também este trabalho: considera o ambiente como fonte direta dos dados e o pesquisador como instrumento chave.
O referido estudo teve como partícipes os (as) docentes envolvidos (a) s no processo pedagógico das escolas no campo/roça do município de Riacho de Santana-Bahia. No Quadro 1, está exposto um breve perfil dos(as) entrevistados(as)
Quadro 1 – Perfil dos(as) entrevistados(as)
NOME FICTÍCIO |
FUNÇÃO |
SEXO |
ESCOLARIDADE |
Bráulio Carnaúba |
Docente |
Masculino |
Graduação completa |
João Umburana |
Docente |
Masculino |
Especialização completa |
Bromélia Rocha |
Docente |
Feminino |
Especialização completa |
Maria de Jitirana |
Docente |
Feminino |
Especialização completa |
Ipê de Ferreira |
Docente |
Feminino |
Graduação completa |
Fonte: os autores (2021).
De modo geral, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2018), o município de Riacho de Santana tem 277 docentes. O quantitativo de escolas municipais no campo, em 2018, era de 19 escolas, enquanto na cidade havia 6 escolas. Entretanto, não há dados oficiais disponíveis sobre quantos professores(as) atuam na sede do município e no campo. Vejamos o Quadro 2:
Quadro 2 – Escolas da rede municipal de Riacho de Santana
ÁREA |
ANO |
NÚMERO DE ESCOLAS |
Escolas na sede da rede municipal |
2018 |
06 |
Escolas no campo da rede municipal |
2018 |
19 |
Escolas de ensino médio na sede |
2018 |
04 |
Escolas de ensino médio no campo |
2018 |
00 |
Fonte: IBGE (2018).
Para a coleta de dados da realidade sobre as escolas do campo no município supracitado, com elevado quantitativo de profissionais vinculados (as) por contratos empregatícios temporários, tivemos pouco retorno dos convites de participação na pesquisa. Além disso, consideramos outros implicadores próprios e decorrentes da pandemia que sobrecarregou o trabalho desses (as) profissionais, desestimulando-os (as) à participação. De todo modo, tivemos o retorno de 05 Docentes, com o (Termo de Consentimento Livre e Esclarecido), que atuam nas escolas do campo do município.
Os (As) participantes são educadores (as) que trabalham em escolas distintas, mas todas localizadas no campo/roça do município de Riacho de Santana. Em vista disso, a partir das respostas, os (as) educadores (as) oferecem-nos pistas acerca das ações realizadas frente aos desafios enfrentados por essas escolas no contexto atual. A fim de resguardar as identidades dos (as) participantes, preferimos chamá-los (as) por nomes e sobrenomes fictícios retirados da flora da caatinga. Com a mesma preocupação, subtraímos informações que permitiam a associação direta às localidades e às escolas dos (as) profissionais.
Nesse sentido, o estudo propõe as seguintes questões: i) Quais os desafios e possibilidades que, no contexto de quarentena e da pandemia, se apresentam o trabalho docente no ensino básico da escola pública e, consequentemente às famílias para garantirem o ensino e a aprendizagem dos (as) estudantes? Obviamente que tal questão perpassa por problematizações em torno das condições de garantia do processo educativo escolar a partir da “do ensino emergencial”, as capacidades técnico-pedagógicas dos (as) educadores (as) e a família enquanto elo entre professores (as) escola e estudantes. No intuito de encontrar as respostas para as questões acima, por meio de uma plataforma de comunicação virtual (WhatsApp), entre os dias 05 a 20 de maio de 2021, sobre o processo educativo nas escolas no campo/roça no município de Riacho de Santana/BA.
As perguntas levantadas, assim, poderão ter, segundo ensina Gil (1999), conteúdo sobre fatos, atitudes, comportamentos, sentimentos, padrões de ação, comportamento presente ou passado, entre outros.
3 DESAFIOS E REFLEXÕES: EDUCAÇÃO DO CAMPO EM TEMPOS DE COVID-19
Refletir sobre a Educação do Campo requer analisar seus interesses, sua gênese e compreende-la enquanto campo de disputa entre modelos distintos de sociedade. Para tal, é preciso ser fiel aos seus objetivos de origem, e “nos exige um olhar de totalidade, em perspectiva, com uma preocupação metodológica, sobre como interpretá-la, combinada a uma preocupação política, de balanço do percurso e de compreensão das tendências de futuro para poder atuar sobre elas.” (CALDART, 2009, p. 36).
No cenário brasileiro atual, mais especificamente no campo, predominam as contradições entre campesinato e agronegócio, o primeiro constituído por pequenos produtores, e o agronegócio pelos latifundiários. Essa contradição é reflexo da luta de classes, por um lado a produção para subsistência, do outro o mercado capitalista feroz que a todo custa busca por lucro. Os antagonismos de classe são fundamentais para a manutenção do sistema, como afirmam Marx e Engels (1999, p. 7) “a história de todas as sociedades que existiram até nossos dias tem sido a história da luta de classes.”
Destarte, no Brasil predominou o modelo educativo alicerçado no modelo de sociedade, onde a educação para população camponesa era pensada de acordo os interesses da zona rural. A chamada educação rural, destinada aos sujeitos do campo, valorizava a cidade em detrimento a zona rural, e não reconhece o campo como ligar de vida. Assim, tivemos na história diversos movimentos que buscavam educar o campo aos interesses do capital, como o Ruralismo Pedagógico, em de 1920, onde os camponeses deixavam o campo à procura de melhores condições de trabalho e vida, e assim superlotando as cidades, coincidentemente, é pensada e difundida escolas no meio rural (LEITE, 2002).
No que se refere a sua gênese, os primeiros debates acerca da qualidade da educação no campo foram realizados no “I Encontro Nacional de Educadoras e Educadores da Reforma Agrária” (ENERA), promovido pelo Movimento Sem Terra (MST), com apoio da Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF); Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB); Universidade de Brasília (UnB), em 1997. Posteriormente, na Intitulada “I Conferência Nacional por uma Educação Básica do Campo”, realizada em Luziânia/GO, conferencistas elaboraram propostas de políticas públicas para Educação do Campo no Brasil (FERREIRA; BRANDÃO, 2011).
Nesse contexto, onde os movimentos sociais organizados, ao defenderem uma proposta educativa para o campo diferente da existente, que respeitasse e valorizasse os camponeses, surge a Educação do Campo. Segundo (CALDART, 2009, p. 38):
A educação do campo toma posição, age, desde uma particularidade e não abandona a perspectiva da universalidade, mas disputa sua inclusão nela. [...] a Educação do Campo tem se centrado na escola e luta para que a concepção de educação que oriente suas práticas se descentre da escola, não fique refém da sua lógica constitutiva, exatamente para poder ir bem além dela enquanto projeto educativo. [...] se coloca em luta pelo acesso dos trabalhadores ao conhecimento produzido na sociedade e ao mesmo tempo problematiza, faz crítica ao modo de conhecimento dominante [...].
Movidos por estes anseios, a constate luta dos movimentos socais alguns marcos normativos foram conquistadas, como as Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo, (CNE/CEB n. 01/2002, CNE/CEB n. 2/2008) (BRASIL, 2002; 2008). Também o Decreto n. 7.352, de 4 de novembro de 2010 que consolida o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera). Posteriormente outros programas foram consolidados, como o Programa de Apoio à Formação Superior em Licenciatura em Educação do Campo (Procampo) e o Programa Nacional de Educação do Campo (Pronacampo).
Contudo, o que foi garantido por lei nem sempre se efetiva na prática, e ainda predomina a negação de direitos a esses povos, como o fechamento das escolas do campo na comunidade. A quantidade de escolas do campo na Bahia, entre os anos de 2010 a 2018 diminuiu consideravelmente. A crescente diminuição dessas instituições ao longo dos anos, constitui-se um retrocesso para efetivação dos direitos dos sujeitos, individuais e coletivos, do campo.
As escolas do campo vêm sendo fechadas em todos municípios baianos e, com Riacho de Santana, no estado da Bahia, não é diferente. Ao longo dos anos esses números têm acentuados, entre 2010-2018, foram fechadas 4233 instituições dentro de todo estado. Logo, se torna evidente que esses estudantes devem agora se deslocar a cidade para ter acesso a escolarização, onde nem sempre seus modos de ser e de viver são respeitados. Além disso, em tempos de pandemia do Covid-19, esses estudantes ficam imersos ao ensino remoto, visto que, dentro dos diversos direitos que a eles são negados, além das escolas, estão também as tecnologias digitais (QEdu, 2020).
4 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA E AS DIFICULDADES NA PANDEMIA
A pandemia do novo Coronavírus acarretou diversas transformações em diferentes setores da sociedade. A recomendação de quarentena e isolamento social dada pela Organização Mundial da Saúde foi amplamente adotada pelos países afetados pelo vírus. No Brasil, os comércios não-essenciais foram fechados e as aulas suspensas em todas as modalidades de ensino.
A alternativa encontrada pelas instituições foi aderir amplamente a Educação a Distância (EaD). As aulas online passaram a fazer parte da rotina de milhares de estudantes brasileiros e até mesmo foram adotadas por profissionais autônomos como uma alternativa para driblar a atual crise. A EaD já experimentava um crescimento constante no país, mas, agora, tem sido uma prática comum na educação básica, ensino superior e outras modalidades.
Com a paralisação das aulas presenciais e a implantação do ensino a distância na educação no Brasil, nas modalidades de educação básica e superior, nas prerrogativas do Ministério da Educação, onde este estabeleceu a Portaria n. 343, de 17 de março de 2020 que dispõe sobre a substituição das aulas presenciais por aulas em meios digitais enquanto durar a situação de pandemia do novo Coronavírus onde, esclarece no seu artigo 1º que o período de autorização é de até trinta dias, prorrogáveis, a depender de orientação do Ministério da Saúde e dos órgãos de saúde estaduais, municipais e distrital.
Ainda nas orientações do Ministério da Educação (MEC) destaca que é de responsabilidade das instituições a definição das disciplinas que poderão ser substituídas, a disponibilização de ferramentas aos alunos que permitam o acompanhamento dos conteúdos ofertados bem como a realização de avaliações durante o período da autorização (MEC, 2020).
A educação a distância ganhou protagonismo em um momento de crise, não há dúvidas. Para a especialista em educação, Renata Costa (2020), conforme citado por Maria Eduarda Rabelo (2020) a professora de tecnologia do centro universitário Brazcubas, afirma que pode-se ressignificar esse período construindo novas perspectivas para a educação brasileira. No último ano, 1,5 milhão de alunos participaram de cursos superior no formato EaD no Brasil, de acordo com o censo da Associação Brasileira de Educação a Distância (Abed). Esse número será acachapante em 2020, considerando o cenário atual.
Nessa análise conjuntural implantada no sistema educacional a justificativa insere-se no papel do professor/tutor que planeja e propõe aos alunos as situações didáticas em torno de um saber a ser apropriado e discutido pelos mesmos, estabelecendo uma relação em torno do conteúdo de um saber. O ambiente virtual de aprendizagem proporciona ao docente elaborar uma situação de ensino, mediada pelos dispositivos tecnológicos. Essa nova forma de ensinar com recursos didáticos informáticos requer uma preparação e um planejamento da atividade que oportunize momentos de aprendizagem ativa que tenham significado tanto para o aluno quanto para o professor (CAMACHO et al., 2020).
Na execução da docência na EaD, a experiência do ensino presencial deve ser considerada na construção de saberes para o ensino não presencial. Por sua vez, o uso pedagógico das tecnologias digitais da informação e da comunicação (TDIC), desenvolvido no ensino a distância, poderá ajudar na inserção mais efetiva desses recursos no ensino presencial. Assim, à docência presencial e à docência online na modalidade a distância não devem ser vistas como antagônicas, mas como formas de ensinar com características próprias e que, nas suas diferenças, podem contribuir uma com a melhoria da outra (CARMO; FRANCO, 2019).
A educação à distância tem ocupado espaços nos últimos meses nas suas plataformas virtuais pela crise sanitária instalada. Para Campos (2007) destaca que o professor/tutor deve desenvolver competências como o uso de ferramentas de interação, a disponibilidade da Internet e um ambiente de aprendizagem que dê conta das atividades propostas; possuir um senso crítico e reflexivo sobre sua atuação, ou seja, fazer auto avaliações e atualizar-se constantemente; organização, não apenas para administrar as discussões e ajudar na construção do conhecimento dos alunos, mas também para orientar e viabilizar as atividades.
Após a propagação do Covid-19 por todo o planeta, cabe fazer algumas considerações relevantes sobre o sistema de ensino implantado: é necessário que as instituições de ensino e seus alunos tenham preparo, condições pedagógicas, humanas e tecnológicas. Conforme a Portaria n. 2.117, de 6 de dezembro de 2019, esta impõe limites para a apresentação da oferta desta modalidade de ensino, tais como: deve estar previsto nos Projetos Políticos Pedagógicos dos Cursos, estar condicionada às diretrizes curriculares nacionais e estar limitado a 40% da carga horária do curso.
Com todas essas mudanças que vem ocorrendo nesse ano de 2020, operacionalizar e contribuir positivamente para o sucesso acadêmico dos estudantes, a oferta de disciplinas em EaD requer planejamento, organização, disponibilidade tecnológica para atender as demandas e capacitação dos docentes. E claro, que também devem ser de visibilidade as necessidades do aluno em termos de preparo para lidar com tecnologias da informação e comunicação e, principalmente atentar para os alunos em situação de vulnerabilidade social que não dispõem de todos os recursos para acesso aos conteúdos ministrados na modalidade EaD.
Nessas análises são consideradas, as disparidades no acesso à internet e aos equipamentos tecnológicos e as diferenças já existentes nos níveis de aprendizado dos alunos, as estratégias do poder público devem lançar mão de ações que intencionalmente busquem reduzir, ao máximo, o risco de ampliação das desigualdades educacionais.
Esse novo formato de aprendizagem EaD gera comunidades de investigação, excluí muitas classes sociais do processo de ensino e aprendizagem, seja na partilha de dúvidas, no fortalecimento de pautas coletivas, enfim, não permitem a construção colaborativa de conhecimentos, que nos parece válido problematizar, com vistas à aquisição contextualizada e mobilizadora de benefícios formativos, profissionais e sociais (HABOWSKI; CONTE; JACOBI, 2020).
São tempos singulares que implicam em uma necessidade de maior empatia por parte das instituições de ensino e os profissionais de educação. Para os que tiveram que se adaptar repentinamente, não foi fácil - sem falar que não são todos que têm as ferramentas ou o espaço adequado para o desenvolvimento de atividades à distância. Isso, juntamente com o confinamento, pode trazer consequências negativas para a saúde mental e psicológica de qualquer um.
5 TRATAMENTO E ANÁLISE DOS DADOS
Com o objetivo de investigar e analisar os impactos da Educação do Campo com a implantação do ensino emergencial de forma remota em tempos de Covid-19 no contexto do município de Riacho de Santana, foram realizados questionários via WhatsApp com cinco (05) Docentes que atuam nas escolas do campo da rede municipal. A base de fundamentação partiu do princípio dos impactos das tecnologias educacionais por meio do ensino remoto nas atividades escolares no contexto da pandemia de Covid-19, que iniciou em março de 2020 e continua sem previsão até os dias atuais, (junho de 2021). Portanto, esse estudo foi realizado com base nas respostas dos questionários pelos educadores da rede de ensino que lecionam nas escolas do campo de Riacho de Santana.
Nessa análise, por causa do Covid-19, as aulas no município de Riacho de Santana vêm acontecendo de forma remotas por diversas ferramentas, como redes sociais, plataformas educativas, vídeo aulas gravadas, materiais impressos, dentre outras. Contudo, os profissionais da educação, em sua maioria, apontam as redes sociais como o meio pelo qual as atividades estão sendo desenvolvidas, principalmente, WhatsApp. Desse modo, como apontado anteriormente, a Educação do Campo é a modalidade mais contemplada pelos sujeitos, cabe então refletir se os estudantes do campo têm acesso as redes sociais e as atividades impressas.
Para às análises dos dados da pesquisa do município de Riacho de Santana, Bahia, as informações coletadas ocorreram também na plataforma QEdu, o sistema que avalia a qualidade do aprendizado de cada unidade escolar, tanto no município, como no estado e no Brasil. Nesse sentido, acredita-se que os dados são essenciais no processo de transformação da educação brasileira é o que tem movido a plataforma.
Nas análises dos dados coletados pela plataforma, considera-se as especificidades do município de Riacho de Santana, no que tange a modalidade da Educação do Campo, os (as) educadores (as) do campo/roça, da referida pesquisa os números coletados das escolas rurais, evidenciam dificuldades na infraestrutura da escola e falta de Políticas Públicas para o processo de ensino e aprendizagem aos educandos do campo. No Quadro 3, apresentamos dados das matrículas nas escolas do campo do município de Riacho de Santana:
Quadro 3 - Matrículas nas escolas do campo do município de Riacho de Santana
MATRÍCULAS DAS ESCOLAS DO CAMPO |
ANO 2020 |
Matrículas em creches |
00 Estudantes |
Matrículas em pré-escolas |
00 Estudantes |
Matrículas anos iniciais |
894 Estudantes |
Matrículas anos finais |
1.070 Estudantes |
Matrículas ensino médio |
00 Estudantes |
Matrículas em Educação de Jovens e Adultos - EJA |
61 Estudantes |
Matrículas educação especial |
76 Estudantes |
Fonte: QEdu - Censo Escolar/INEP (2020).
Os dados coletados pela plataforma QEdu, sobre o censo escolar no de 2020 que refere as matrículas nas escolas do campo do município de Riacho de Santana, identificamos 17 escolas localizadas na zona rural, com 2.101 matrículas efetuadas no referido ano. As matrículas foram computadas da seguinte maneira: 00 matriculados (nenhum) em creches; 00 estudantes matriculados (nenhum) em pré-escolas; 894 estudantes matriculados em anos iniciais; 1,070 estudantes matriculados em anos finais; 00 matriculado (nenhum) no ensino médio; 61 estudantes matriculados na Educação de Jovens e Adultos - EJA; 76 estudantes matriculados na Educação Especial.
Partindo das análises e das constatações dos questionários aplicados com os Docentes que atuam nas escolas do campo de Riacho de Santana, Bahia, ao questionar os educadores sobre os desafios e as maiores dificuldades para trabalhar nas escolas do campo em tempos da pandemia (Covid-19)? Se posicionaram da seguinte maneira?
Nesse momento tão difícil que estamos passando, os desafios são muitos, principalmente trabalhar com o ensino remoto, que depende de muitas demandas, acesso à internet, condições de um celular disponível para estudos, atividades impressas para chegar a todos os estudantes da instituição, aqueles alunos que nem energia na casa tem, o aumento de casos da covid-19 na região, os decretos que proíbem a entrega das atividades entre outras. (BRÁULIO CARNAÚBA, 2021). (informação verbal).3
A educação no meio rural, no Brasil, ainda tem muito a desenvolver. A falta de políticas educacionais voltadas para esse fim caracteriza a desvalorização do homem do campo, estabelecendo uma vida limitada aos seus filhos. Entre tantas dificuldades, destaca-se a falta de estrutura das escolas, o currículo escolar desvinculado da realidade do homem do campo, transportes escolares de péssima qualidade. Com a pandemia as dificuldades ampliaram, pois ainda temos famílias que não tem acesso à energia elétrica, internet, não possui computadores, notebooks ou celular. Com isso, essa parcela da população passa a ser excluída do processo educacional. (JOÃO UMBURANA, 2021). (informação verbal).
Falta de formação, principalmente com a tecnologia. (BROMÉLIA ROCHA, 2021). (informação verbal).
Aliar emoções e estudar com as novas ferramentas de trabalho, muitas cobranças em um curto período de tempo. Para muitos professores, um dos maiores desafios é aprender a utilizar novas ferramentas de trabalho, também aprender adaptar as aulas presenciais em aulas remotas. (MARIA DE JITIRANA, 2021). (informação verbal).
Acesso total a internet. Às vezes, quando possuí, geralmente um único celular é usado para mais de um aluno, dificultando assim o acesso em tempo real aos conteúdos. (IPÊ DE FERREIRA, 2021). (informação verbal).
Nas análises dos Docentes que atuam nas escolas do campo de Riacho de Santana, há diversas dificuldades para as execuções das aulas de forma remota. Além da falta de uma formação continuada para adaptar as novas tecnologias, a falta de infraestrutura em todos aspectos para lecionar. Importante um olhar necessário da secretaria de educação municipal para esses docentes que atuam no campo. É preciso implantar políticas públicas, principalmente de acessibilidade as tecnologias digitais em tempos de pandemia e dar suporte aos docentes e discentes para amenizar as desigualdades educacionais.
Corroborando com Santos e Nunes (2020), afirmam que muitos professores no Brasil têm dificuldade em acessar as ferramentas tecnológicas, pois não estudaram sobre isso na formação inicial, e tão pouco na formação continuada, o que evidencia uma falta de investimento dos entes federados em políticas públicas para a formação de professores sobre tecnologias educacionais. Outro fator que merece ser analisado é o fato de muitos professores não terem condições de acesso, e também, econômicas para adquirir equipamentos eletrônicos.
Sabendo as dificuldades dos alunos da zona rural acompanhar as aulas de forma remota, perguntamos como estão sendo executadas suas aulas e quantos alunos acompanham aproximadamente as aulas? Responderam o seguinte:
As aulas estão sendo de forma virtual para Todos os alunos da rede Municipal, mas o acesso de acordo um mapeamento realizado pelos profissionais da instituição, não tá chegando a 40% dos estudantes...dificultando assim, um trabalho a distância de qualidade. (BRÁULIO CARNAÚBA, 2021). (informação verbal).
Trabalho em duas escolas no município de Riacho de Santana, na Escola Arnaldo Cardoso aqui mesmo na sede e a Escola João Meira no povoado do Cedro. Parece até contraditório, mas a realidade é que na Escola João Meira localizada na zona rural estamos conseguindo alcançar quase 90% dos alunos, enquanto que na Escola Arnaldo Cardoso que fica na nossa sede, e que o acesso teoricamente é mais fácil, estamos alcançando aproximadamente 50%. O desafio é enorme para o professor motivar os alunos e buscar atingir o máximo de alunos possível. É importante destacar a tristeza de nós professores de saber que não estamos conseguindo alcançar a todos, e o pior, estamos deixando de fora os alunos de família mais carente.
As minhas aulas estão acontecendo de forma remota, estou usando a plataforma google meet para expor os conteúdos e atividades, essa ferramenta possibilita apresentar vídeos, slides, músicas, ... Além disso, uso outras ferramentas como o google forms, paint, padlet. Através do google forms fazemos a avaliação da nossa aula com questões objetivas e/ou discursiva. O padlet uso para postar atividades e vídeos produzidos e o paint uso para fazer cálculos matemáticos e explorar as formas geométricas. (JOÃO UMBURANA, 2021). (informação verbal).
As aulas remotas estão sendo executados por vídeo aulas, explicação pelo WhatsApp, meet. Acompanham um percentual de 60%. (BROMÉLIA ROCHA, 2021). (informação verbal).
As aulas estão sendo executada de forma remota, onde o professor (a) ministra aula através do grupo de WhatsApp 4 horas por dia no turno normal com atividades extras formando assim uma carga horária de 30 horas uma vez que o ano será continuam 2020/2021. (MARIA DE JITIRANA, 2021). (informação verbal).
Estou ministrando as aulas com planejamento de acordo ao público alvo, estou trabalhando em uma turma multisseriada, 80% dos alunos estão participando ativamente das aulas. Que está sendo ministrada no horário de quatro horas por dia. (IPÊ DE FERREIRA, 2021). (informação verbal).
Observando com atenção as falas dos Docentes, com o advento da pandemia, escancarou-se as contradições e antecipou-se rapidamente processos que poderiam levar anos para o enfrentamento direto e cru. Aproveitando as brechas abertas pela pandemia os grandes defensores da educação à distância e suas novas formas com nomes diferentes, tentam enfiar de goela abaixo as propostas de atividades que tem sua materialização na venda dos grandes pacotes mercadológicos das TICs.
Portanto, considerando as disparidades no acesso à internet e aos equipamentos tecnológicos e as diferenças já existentes nos níveis de aprendizado dos alunos, as estratégias do poder público devem lançar mão de ações que intencionalmente busquem reduzir, ao máximo, o risco de ampliação das desigualdades educacionais. Elevar emergencialmente o acesso das famílias mais pobres aos recursos tecnológicos e adotar, em caráter adicional, medidas de ensino a distância que não exigem uso da tecnologia (como o envio de livros e materiais impressos e orientações às famílias para estímulo das crianças e jovens) devem ser considerados. Os alunos de nível socioeconômico mais baixo, que já deveriam receber maior foco da política educacional em situações normais, devem ganhar atenção ainda mais especial neste momento de crise.
Por fim, abordamos sobre o trabalho da gestão municipal e as políticas públicas: O que é preciso melhorar para que a educação continue sendo prioridades dos governantes?
É necessário q os governantes, dê suporte com recursos para o bom desempenho dos docentes, uma formação para q os professores, possam ter domínio dos recursos tecnológicos, internet de qualidade nas instituições de ensino, principalmente nos povoados das zonas rurais, q são de muitos km da sede do município, dificultando assim, o trabalho de qualidade dos profissionais da educação do município de R de Santana BA. (BRÁULIO CARNAÚBA, 2021). (informação verbal).
O primeiro passo é elegermos para os cargos políticos pessoas que acreditam no poder da educação. Além disso, a população tem que mudar de postura e fiscalizar os recursos públicos. É importante lembra que hoje os municípios recebem os recursos já direcionando, ou seja, recurso da educação, da saúde, da segurança e outros. Será que esses recursos não são suficientes para termos educação, saúde, ... de qualidade ou não estão sendo bem geridos? A população está preocupada com o gerenciamento desses recursos?
Portanto, é preciso lutar e persistir na luta para que as coisas aconteçam, nós não merecemos mais esse tipo de governo que faz do município um puxadinho da sua casa, é preciso governar para todos. (JOÃO UMBURANA, 2021). (informação verbal).
Conscientização da população em termo de política, escolha de bons representantes, para o vestir na educação. (BROMÉLIA ROCHA, 2021). (informação verbal).
Para melhoria, seria o acesso internet, o acompanhamento dos alunos com uma pessoa que tivesse um grau de escolaridade mais avançado uma vez que a maioria dos pais ou responsáveis são analfabetos e não conseguem acompanhar as atividades com os alunos. A educação do campo pode não ter o mesmo avanço da cidade porque a maioria dos mesmos não tem acesso à internet, com isso acaba regredindo e não evolui tanto quantos alunos da cidade. (MARIA DE JITIRANA, 2021). (informação verbal).
No meu ponto de vista falta mais um pouco de engajamento por parte de boa parte dos professores, onde alguns apenas fingem está fazendo seu papel, isso é um agravante sério, por outro lado está sim trabalhando dentro das medidas possíveis, todas as semanas são enviadas aos alunos atividades xerocopiada para assim acompanhar melhor a realização das atividades no decorrer da semana. E até o momento o retorno tem sido satisfatório.
Na escola a qual trabalho não tenho notado muita diferença da forma de conduzir as atividades das que são realizadas na cidade não, inclusive há métodos até mais elevados que na cidade. (IPÊ DE FERREIRA, 2021). (informação verbal).
É importante uma reflexão dos questionamentos dos Docentes que atuam nas unidades escolares do campo de Riacho de Santana, sobre a falta de políticas públicas e os direitos sociais no processo educacional. Nessa análise, fica em risco nesta realidade que nos é proposta pelo governo como estratégia para o desenvolvimento das aulas com nossos alunos do campo neste contexto de pandemia.
As escolas do campo são um espaço representativo e muito importante para a garantia dos direitos das comunidades onde estão inseridas. O modelo de educação rural, que hoje ainda é presente em diversas escolas, reproduz a cidade como o ideal a ser conquistado, colocando o campo como algo inferior, a escola onde trabalho, por exemplo, tem suas turmas do ensino fundamental organizadas de forma multisseriada, os professores além das já presentes diferenças nos níveis de aprendizagem atendem diferentes níveis de ensino em uma mesma sala.
Se esta situação já é complicada em uma realidade escolar normal, pode-se imaginar o quanto se potencializa quando o único modo de ensino apresentado aos alunos é o EaD. Apesar de sabermos que neste momento é a alternativa que temos não podemos deixar de refletir o quanto esse modelo de ensino pode ser excludente.
Segundo a LDB no Art. 32 § 4º, “O ensino fundamental será presencial, sendo o ensino a distância utilizado como complementação da aprendizagem ou em situações emergenciais.” (BRASIL, 1996). Desta forma, o ensino proposto por meio de mídias digitais em tempos de Covid-19, tem sido denominado de ensino remoto, cuja finalidade é de complementação, considerando o contexto e a disponibilização das mídias tecnológicas. Nesta forma de ensino que acontece remotamente, sendo disponibilizada como principal meio para a tentativa de propagação do ensino, adicionado a amplitude dos prejuízos que poderão ser evidenciados referentes à aprendizagem educacional em particular aos povos do Campo, uma vez que desvela o índice deficitário ao acesso as mídias tecnológicas para o acesso as atividades pedagógicas básicas e elementares.
Nessa análise constada pelos professores em tempos do Covid-19 e as desigualdades educacionais, um sistema adotado do estado mínimo, numa discussão mais ampla é abordada por Mészáros (2008 p. 16):
No reino do capital, a educação é ela mesma, uma mercadoria. Daí a crise, do sistema público de ensino, pressionando pelas demandas do capital e pelo esmagamento dos cortes de recursos dos orçamentos públicos. Talvez nada exemplifique melhor o universo instaurado pelo neoliberalismo, em que “tudo se vende, tudo se compra”, “tudo tem preço”, do que uma a mercantilização da educação. Uma sociedade que impede a emancipação só pode transformar os espaços educacionais em shopping centers, funcionais à sua lógica do consumo e do lucro.
Desse modo, a educação do campo em tempos de Covid-19 se torna um grande desafio, devido as desigualdades sociais pré-existentes em nossa sociedade. O desafio não se configura na forma de ensino, mas sim nas problemáticas já existentes que impossibilitam que os estudantes tenham acesso a bens e serviços essenciais.
A pandemia vivenciada no contexto que fez necessário o ensino remoto, potencializa as desigualdades na sociedade, desigualdades estas que são características essenciais do sistema capitalista vigente. Nesse sentido, afirma Mészáros (2008, p. 12): “O capital é irreformável porque pela sua própria natureza, como totalidade reguladora sistêmica, é totalmente incorrigível”, logo, é impossível pensar uma sociedade justa, igualitária e democrática, dentro da lógica incorrigível do capital que vive justamente da desigualdade social e da exploração.
Importante trazer em destaque que os sujeitos pesquisados, identificaram que na escola, a maioria dos alunos não tem acesso à internet e nem a tecnologia necessária para participar das aulas, muitos estão em defasagem no que se refere a idade e ano e por este motivo eram trabalhados de forma diferenciada de acordo com suas necessidades particulares de aprendizagem. Muitos dos pais são analfabetos e os que não são não tem pouco conhecimento ou conhecimento algum das tecnologias, as alternativas de entregar material impresso são negadas para muitos por não conseguirem chegar até a escola para acessarem essas atividades.
Têm diversas situações no dia a dia dos alunos, que precisam ir à casa do vizinho para assistir às aulas online, os que andam quilômetros a pé ou de bicicleta para pegar as atividades impressas na escola, os que gastam toda a internet 3G em meia hora para assistir pelo menos parte de uma aula via Meet, os que usam celulares emprestados dos pais somente no fim de semana, porque os pais trabalham em serviços distantes de casa e só tem contato com a criança em curtos períodos.
Esse artigo teve com proposito trazer reflexões sobre a execução das atividades escolares do novo formato emergencial (ensino remoto) na rede municipal de educação, principalmente, a Educação do Campo em tempos da Covid-19, no município de Riacho de Santana, Bahia. Nesse sentido, foi realizado o questionário entre os dias 05 a 20 de maio de 2021, com cinco docentes da rede municipal de educação que atua nas escolas do campo, do município de Riacho de Santana.
Além disso, utilizamos como análise metodológica da pesquisa, a partir da constatação com objeto quali/quantitativo, no sentido que, quanto mais pesquisamos mais apropriamos do objeto de pesquisa, na perspectiva de números, detalhes, sentidos, melhor se torna a compreensão da experiência que foi compartilhada pelo sujeito.
Partindo desses pressupostos, iniciamos o debate acerca da Educação do Campo em tempos de Covid-19, pontuando qual a realidade das unidades escolares no campo de Riacho de Santana, posteriormente, destacamos o ensino remoto e à distância, trazendo alguns dados estatísticos e como este vem sendo utilizado na atualidade. Em seguida, apresentamos os dados colhidos através de questionários realizados com cinco (05) docentes da educação, atuantes em unidades escolares do campo. Assim, os dados revelaram que as desigualdades sociais se tornam ainda mais evidenciadas em tempos de ensino remoto.
Outrossim, as principais problemáticas reveladas pelos docentes, enfrentadas no ensino a distância, é a falta de acesso dos estudantes as atividades, sejam virtuais ou impressas. Isso acontece devido à ausência de direitos básicos desses estudantes, principalmente no campo, a materiais e serviços necessários para o processo de ensino. Portanto, esse estudo ao destacar essas questões traz a importância do debate sobre a negação de direitos dos povos do campo as tecnologias digitais.
A pandemia já tem apontado uma série de contradições em torno do modelo neoliberal. Não distante disso, evidenciará ainda mais as falhas do sistema educacional, ficando evidente não só no campo, como em todos os setores onde estamos inseridos, que além de não retroceder nossas conquistas, temos que avançar na construção de uma educação popular, ou seja, pública, democrática e libertadora.
Nesse sentido, podemos dizer que o ano de 2021 em Riacho de Santana, está sendo um ano de intensos desafios e dificuldades não apenas nas esferas sociais, políticas e econômicas, mas também, educação, que demandam ainda mais atenção do poder público para essa área, no sentido que avance e possa continuar contribuindo para o desenvolvimento da sociedade. Isso é importante, pois resistir contra as mazelas que assolam o campo educacional e outros setores fundamentais, é uma forma de defender a educação pública e gratuita, fundamental para se seguir em frente e cumprir o papel social com a divulgação do saber e o aprender de forma democrática e acessível a todos (as).
Portanto, as análises apresentadas nesse período de pandemia do Covid-19 no sistema educacional voltada para a rede de educação em Riacho de Santana, na modalidade de Educação do Campo, transpuseram os muros da escola, uma vez que, deve evidenciar o respeito à diversidade dos camponeses, vinculando as propostas pedagógicas a questões inerentes em sua realidade, pensando as relações em suas dinâmicas históricas e, prioritariamente, em suas singularidades.
Para isso, faz-se necessário trazer para a reflexão as singularidades e seus fatores determinantes a partir das realidades evidenciadas que devem ser pensadas para um posicionamento que minimize as desigualdades educacionais com a educação à distância. Pois, a priori, torna-se inviável a possibilidade de estabelecer “vínculos” com sujeitos que inicialmente não dispõem de acesso às tecnologias digitais, adicionando a isto a necessidade de condições estruturais que influenciam na garantia da Educação do/no Campo.
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Endereço para correspondência: Rua Hermenegildo Cardoso de Castro, n. 616, Mato Verde – Riacho de Santana, Bahia; tony.dom1987@gmail.com
1 Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Educação - Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia - PPGEd/UESB; Especialista em Agroecologia pelo IF/Baiano e Supervisão Escolar e Coordenação Pedagógica - Faculdade Montenegro; Professor da Rede Municipal de Riacho de Santana - BA; Membro do Grupo de Estudos e Pesquisas em Movimentos Sociais, Diversidade e Educação do Campo e da Cidade – GEPEMDECC.
2 Professor Associado III na UFRRJ - Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Campus Seropédica. Lotado no Departamento de Educação do Campo, Movimentos Sociais e Diversidade. Docente na Licenciatura em Educação do Campo, no PPGEA – Programa de Pós-Graduação em Educação Agrícola e no PPGEduc – Programa de Pós-Graduação em Educação, Contextos Contemporâneos e Demandas Populares. Atua com as seguintes temáticas: Políticas Públicas de Educação do Campo, Movimentos Sociais e Educação Popular.
3 Esta citação é resultado de entrevista realizada no ano de 2021, assim como todas as outras que apresentam a expressão “informação verbal”.