https://doi.org/10.18593/r.v48.27403

Recomendações dos organismos internacionais para a América Latina: inclusão escolar, sustentabilidade e desigualdade estrutural

Recomendaciones de los organismos internacionales para latinoamérica: inclusión escolar, sustentabilidad y desigualdad estructural

Recommendations of international organisms for latin america: school inclusion, sustainability and structural inequality

Sonia Mari Shima Barroco1

Universidade Estadual de Maringá; Professora Voluntária do Programa de Pós-Graduação em Psicologia.

https://orcid.org/0000-0002-4136-8915

Neide da Silveira Duarte de Matos2

Universidade Estadual do Oeste do Paraná; Professora do Curso de Pedagogia.

https://orcid.org/0000-0003-3855-2997

Gesilaine Mucio Ferreira3

Universidade Estadual de Maringá; Professora do Departamento de Pedagogia, Campus Regional de Cianorte.

https://orcid.org/0000-0002-2001-507X

Resumo: Objetiva-se discutir as recomendações de organismos internacionais para a Educação Especial e Inclusão na América Latina (AL) no século XXI, como resultado de pesquisa interinstitucional, de natureza bibliográfico-documental, sobre as políticas públicas para a Educação Especial e a inclusão educacional em países latino-americanos. À luz do materialismo histórico e da Teoria Histórico-cultural, as condições objetivas de desenvolvimento dos países são levantadas, pois a educação que ofertam depende da riqueza material e simbólica/cultural acumulada e da sua distribuição/fruição - em acordo com a classe social. A metodologia contou com a análise de documentos norteadores de organismos internacionais para a AL subsidiada por produções teóricas que possibilitam a compreensão da temática. Os resultados apontaram que a partir dos anos 2000 esses organismos orientam os governos a se atentarem à inclusão e à preservação/educação ambiental, entendendo que, pelo percentual de pessoas que abarca, o grupo da Educação Especial não pode ser ignorado, sobretudo num momento de notório crescimento da desigualdade econômico-social na América Latina. Nesta terceira década o discurso da inclusão escolar/educacional se dá em meio à desigualdade social que alcança índices estarrecedores, o que obstaculiza ainda mais o desenvolvimento do psiquismo do referido grupo. Conclui-se, ante esse quadro, pela necessidade de acompanhar como a desigualdade provocada pela deficiência e as NEE são enfrentadas pelos países com suas políticas educacionais ordinária e extraordinariamente. Esse acompanhamento deve implicar na participação efetiva desse grupo, considerando-o capaz de pensar sobre si e o mundo, e ser instrumentalizado/formado para tanto.

Palavras-chave: Políticas Educacionais; América Latina; Educação Especial; Teoria Histórico-Cultural.

Resumen: Se objetiva discutir las recomendaciones de organismos internacionales para la Educación Especial e Inclusión en Latinoamérica LA en el siglo XXI, como resultado de la investigación interinstitucional, de naturaleza bibliográfico-documental, sobre las políticas públicas para la Educación Especial y la inclusión educacional en países latinoamericanos. A la luz del materialismo histórico y de la Teoría Histórico-cultural, las condiciones objetivas de desarrollo de los países son levantadas, pues la educación que ofrecen depende de la riqueza material y simbólica/cultural acumulada y de su distribución/fruición – consonante con la clase social. La metodología contó con el análisis de documentos norteadores de organismos internacionales para LA subsidiada por producciones teóricas que posibilitan la comprensión de la temática. Los resultados apuntaron que, a partir de los años 2000, eses organismos orientan los gobiernos a interesarse para la inclusión y a la preservación/educación ambiental, entendiendo que, por el porcentaje de personas que abarca, el grupo de la Educación Especial no puede ser ignorado, sobre todo en un momento de notorio crecimiento de la desigualdad económico-social en Latinoamérica. En esta tercera década, el discurso de la inclusión escolar/educacional se da en medio a la desigualdad social que alcanza índices espantosos, lo que obstaculiza más aún el desarrollo del psiquismo del grupo mencionado. Se concluye, ante ese cuadro, por la necesidad de acompañar cómo la desigualdad provocada por la deficiencia y las NEE son enfrentadas por países con sus políticas educacionales ordinaria y extraordinariamente. Ese acompañamiento debe implicar en la participación efectiva de ese grupo, considerándolo capaz de pensar sobre sí y el mundo, y ser instrumentalizado/formado para tanto.

Palabras clave: Políticas Educacionales; Latinoamérica; Educación Especial; Teoría Histórico-cultural.

Abstract: Recommendations of international organisms for Special Education and Inclusion in Latin America in the 21st century are discussed. Current paper is the product of an inter-institution, bibliographical and documental research on public policies for Special Education and Educational Inclusion in Latin America. The countries´ objective development conditions are surveyed through Historical and Cultural Theory and Historical Materialism since education depends on accumulated material, symbolical and cultural richness and of its distribution and benefits according to social classes. Methodology comprised analysis of streamline documents by international organisms for Latin America and supplemented by theoretical productions for debating the theme. Results show that since the year 2000 such organisms recommend that governments should promote inclusion and environmental preservation and education. Due to the great number of people involved, Special Education should not be discarded, particularly within the context of high growth in social and economic inequality in Latin America. In the third decade of the century, school and educational inclusion occurs in the midst of social inequality with high percentages, impairing more and more the development of psychism of the group concerned. Within such a context, there is a dire need in making a follow-up as to the manner deficiency-caused inequality and SEGs are dealt with by countries within their ordinary and extraordinary educational policies. The group´s effective participation is mandatory due to its ability to reflect on itself and world conditions and as a tool for the task.

Keywords: Educational policies; Latin America; Special education; Historical and Cultural Theory.

Recebido em 31 de março de 2021

Aceito em 20 de dezembro de 2022

1 INTRODUÇÃO

Esse texto é decorrente de pesquisa interinstitucional (2019-2021), de natureza bibliográfico-documental, sobre as políticas públicas para a Educação Especial e a Inclusão Educacional em países latino-americanos. Objetiva-se discutir as recomendações de organismos internacionais (OIs) para a Educação Especial (EE) e a Inclusão na América Latina (AL) no século XXI. É preciso retomar o que os OIs preconizam neste terceiro milênio sobre a EE sob a perspectiva da inclusão visto que em relação as suas recomendações, as políticas e ações estratégicas são financiadas. Entende-se a sua pertinência quando se considera que as desigualdades sociais nos países latino-americanos têm ampliado de modo mais acelerado nesse novo século, sobretudo com a pandemia da Covid-19, fazendo-se mister tratar dos impactos da desigualdade econômico-social sobre a educação e a inclusão escolar.

Aborda-se os documentos à luz da perspectiva materialista histórico-dialética e da Teoria Histórico-Cultural (THC), o que implica em se considerar a educação preconizada pelos organismos internacionais para a AL diante das condições objetivas de desenvolvimento dessa região no contexto mundial do capitalismo.

Para a THC (LEONTIEV, 1978; LURIA, 1992; VIGOTSKI, 2018) um ponto crucial a se considerar é que a educação escolar depende da riqueza material e simbólica/cultural acumulada e a ser repassada às novas gerações. Na sociedade contemporânea isso tem ocorrido por meio da educação básica e superior, ao longo de suas etapas e modalidades e, também, na cotidianidade fora dos espaços da educação formal. Contudo, há que se considerar que se a transmissão às novas gerações (ensino) visa gerar apropriação (aprendizagem), isso não depende somente das condições dos sujeitos que aprendem (alunos) ou que ensinam (professores). Está em disputa a veiculação, a acessibilidade e a fruição dos conteúdos produzidos e acumulados que promovem desenvolvimento, e isso tem estreita relação com a classe social a que se pertence (VIGOTSKI, 2004).

Discute-se documentos elaborados pelos OIs para a AL (Quadro 1), sobretudo pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), com apoio de produções teóricas que possibilitam a sua compreensão.

Quadro 1 – Documentos internacionais do século XXI abordados

Organismo internacional

Título do documento

UNESCO

Orientação para a inclusão: garantindo o acesso à educação para todos

ONU

Convenção sobre os direitos das pessoas com deficiência

Escritório Regional de Educação para a América Latina e o Caribe da UNESCO (OREALC) UNESCO

Educação de qualidade para todos: um assunto de direitos humanos.

OREALC; UNESCO

Consulta a países de Latinoamérica sobre información asociadas a las necesidades educativas especiales: sistematización de resultados

OREALC; UNESCO

Convivencia democrática, inclusión y cultura de paz: Lecciones desde la práctica educativa innovadora en América Latina

Organização Mundial de Saúde (OMS); Banco Mundial (BM)

Relatório mundial sobre a deficiência

UNESCO

Educação 2030: Declaração de Incheon e Marco de Ação da Educação: Rumo a uma educação de qualidade inclusiva e equitativa e à educação ao longo da vida para todos

OREALC; UNESCO

Reporte: Educación y habilidades para el siglo XXI. Reunión Regional de Ministros de Educación de América Latina y el Caribe

Fonte: as autoras, (2022).

Esses documentos que abordam sobre desigualdade, sustentabilidade e inclusão foram produzidos por/ou levam a chancela de OIs. Por seu caráter geopolítico, econômico e de implicações com a humanidade, algumas se destacam: UNESCO, Organização das Nações Unidas (ONU), Organização Mundial do Comércio (OMC), Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), Fundo Monetário Internacional (FMI), Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e Banco Mundial (BM).

Desde o final do século XX, os documentos produzidos por esses OIs chamaram a atenção para o avanço da desigualdade no mundo e a necessidade dos países se voltarem às políticas sociais inclusivas a fim de combater a pobreza e a exclusão. Em suas agendas e em fóruns multilaterais, há o apelo à inserção de todas as pessoas na escola como um elemento crucial ao desenvolvimento econômico das nações. Isso, por mais que pareça importante frente às desigualdades crescentes, está em consenso com os interesses dos países centrais do capitalismo mundial e sua subscrição produz políticas setoriais favoráveis ao novo padrão de acumulação econômica como estratégia às crises do capital, bem como a necessária mudança tecnológica na reorganização do trabalho produtivo. Assim, entra em operação a mediação do pacto social possível, segundo a correlação de forças das lutas de classes em cada país. Embora a determinação histórica das mudanças incida nos países centrais, cada formação social terá seu papel específico na recepção maior ou menor desses influxos internacionais. Essa política da pactuação como forma de garantir sustentabilidade às reformas na AL e às questões econômicas da própria relação social capitalista impele cada país, individualmente, a buscar sua inclusão nessa nova ordem mundial, oferecendo nacionalmente um adequado ambiente de negócios para investimentos externos, sobretudo um ambiente onde os países periféricos têm poucas condições para se opor geopolítica e economicamente.

A análise de tais documentos, que têm marcada nuance humanitária, é fundamental por desvelar como a gestão da pobreza, produzida sob o modo de produção capitalista, foi incorporada nas políticas públicas de Educação e Inclusão Escolar na AL.

2 DESIGUALDADE, INCLUSÃO ESCOLAR E SUSTENTABILIDADE NOS DISCURSOS DOS OIS

As bandeiras da inclusão social e da educação inclusiva são veementemente defendidas nos documentos internacionais desde 1990, sobretudo quando intensificam contradições e desigualdades decorrentes do processo de acumulação do capital sobre a égide da produção toyotista e da ideologia neoliberal. Desigualdades são neles postuladas como exclusão social a ser superada com medidas voltadas à inclusão social e a sustentabilidade, dentre elas, a promoção de um sistema educacional inclusivo que garanta o acesso e a aprendizagem de todas as pessoas na escola comum.

Dois documentos da década de 1990 têm balizado debates e publicações educacionais posteriores dos OIs: a Declaração Mundial sobre a Educação para Todos (1990) e a Declaração de Salamanca (1994). Produzidos pela Unesco, em parceria com o BM, o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e o Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas (PNUD), advogam o direito dos grupos marginalizados à escola comum e às mesmas oportunidades educacionais sem discriminações (UNESCO, 1998; 1994).

Para compreender a emergência desses documentos, há que se considerar que no final da década de 1980 deu-se o colapso do comunismo real, na União das Repúblicas Socialistas Soviéticas e na Alemanha. Desse modo, se a polarização capitalismo x comunismo não estaria mais na ordem do dia, parecia que a única opção para a sociedade seria o capitalismo. Assim, esse deveria ser revisto, pois vinha produzindo contraditoriamente o desenvolvimento e a miserabilidade.

Nesse contexto, a inclusão social de todas as pessoas vai se fortalecendo como pauta de luta e, em decorrência, várias áreas da sociedade são impactadas, um novo ciclo de preocupações governamentais e institucionais, plasmado em debates e novos marcos teóricos, políticos e legais no mundo, considerada assim como a constante atualização das forças produtivas no modo de produção de tipo capitalista. Assim, as imensas transformações nas condições de produção obrigaram, também, as políticas públicas, especialmente a educacional, a se adaptarem a novas condições criadas. Na educação, ganhou força a bandeira da inclusão escolar, com uma nova perspectiva à educação comum e à EE - que operava atendendo pessoas com deficiência em espaços substitutivos e paralelos à escola ou à classe comuns. Embora não trate apenas da EE, a Declaração de Salamanca marca a defesa do atendimento ao público-alvo da EE nas classes comuns do ensino regular.

Na direção do avanço do capitalismo em seus diferentes desdobramentos e com o acirramento da desigualdade, da pobreza, no limiar do século XXI, a Unesco aprova o documento “Educação para todos: o compromisso de Dakar (2000), e reafirma as recomendações da “Declaração Mundial sobre educação para todos” (1990). Após dez anos dessa, ainda havia milhões de crianças sem acesso ao ensino primário e milhões de adultos permaneciam analfabetos. Desse modo, concebe-se a educação como elemento chave à redução da pobreza e das desigualdades, à promoção do desenvolvimento sustentável e da estabilidade nacional e internacional. Aponta-se como uma das estratégias para a inclusão escolar de crianças com NEE e as oriundas de minorias étnicas, de populações migrantes e demais grupos excluídos da educação (UNESCO, 2001).

Em 2000, o debate acerca da inclusão social e escolar, bem como da sustentabilidade se intensifica, sendo comumente retomado pelos OIs. Destaca-se o documento “Orientação para a inclusão: garantindo o acesso à educação para todos” (2005), cuja finalidade é auxiliar na revisão e na formulação de planos nacionais de educação, subsidiar os debates acerca da inclusão e demonstrar a possibilidade da organização de sistemas educacionais inclusivos para o acesso a uma educação de qualidade a todas as crianças nos países signatários (UNESCO, 2005).

Embora reconheça que a população com deficiência seja o maior grupo excluído da escola, a Unesco (2005, p. 6) entende que “[...] o tema inclusão deveria ser visto como o elemento essencial de todo o movimento EPT [educação para todos]. [...]”. Aponta que a inclusão exige uma visão ampla de educação para todos, contemplando as necessidades de todos os alunos, inclusive dos vulneráveis à marginalização e à exclusão, como as crianças abusadas, refugiadas ou deslocadas, com deficiência, vítimas de pobreza, que vivem em zonas de conflitos, que trabalham, são de minorias étnicas, linguísticas e religiosas, migrantes etc.

A inclusão é vista como um processo de atender e de dar resposta à diversidade de necessidades de todos os alunos através de uma participação cada vez maior na aprendizagem, culturas e comunidades, e reduzir a exclusão da educação e dentro da educação. Isso envolve modificação de conteúdos, abordagens, estruturas e estratégias, com uma visão comum que abranja todas as crianças de um nível etário apropriado e a convicção de que educar todas as crianças é responsabilidade do sistema regular de ensino (UNESCO, 2005, p. 10-11).

Para a Unesco (2005), o movimento pela inclusão e pela EPT se orientam por ideias diferentes, pois o princípio orientador da inclusão é o de que todas as crianças devem aprender juntas no sistema regular de ensino e não apenas ter oportunidades de aprender como preconiza a educação para todos. Afirma que a oferta de educação para todos não incorre, necessariamente, em inclusão, sendo impossível garantir a primeira se houver exclusão educacional. No entanto, ambas “[...] preconizam o acesso à educação, contudo, a inclusão deseja conseguir esse acesso sem que haja discriminação ou exclusão para qualquer indivíduo ou grupo dentro ou fora do sistema educativo” (UNESCO, 2005, p. 28).

A inclusão, nos termos do documento, não visa apenas reformar a EE e atender os alunos com deficiência, mas promover uma reforma em todo o sistema de educação escolar e não escolar para garantir o acesso e a educação de qualidade a todas as crianças no sistema regular de ensino (UNESCO, 2005). A qualidade da educação não é definida como sinônimo de resultados positivos mensuráveis em exames e avaliações quantitativas, mas relacionada a uma educação inclusiva que assegure oportunidades de aprendizagem que contribuam para a plena participação de todos os alunos na sociedade. Aponta que a efetivação da inclusão depende de professores, pais, comunidades, autoridades escolares, orientadores curriculares, escolas de formação de educadores e empresários como atores desse processo, sendo professores, pais e comunidade elementos chaves. Atribui ao Ministério da Educação a responsabilidade de “[...] assegurar a elaboração, implementação e avaliação de programas centrados na criança e que tornem a escola acessível para todos. [...]” (UNESCO, 2005, p. 18).

Por outro lado, a “[...] implementação de sistemas mais inclusivos de educação é possível se as próprias escolas estiverem interessadas em se tornar mais inclusivas. [...]” (UNESCO, 2005, p. 21). Outrossim, ao realçar que “Olhar para a educação através de uma lente de inclusão implica deixar de ver a criança como um problema para passar a ver o sistema educativo como um problema. [...]” (UNESCO, 2005, p. 24).

Referente aos custos, concebe a educação inclusiva como mais eficiente e eficaz, sendo que “[...] os sistemas necessitam ter em conta a diminuição de desperdício de recursos e a optimização da sua utilização para melhorar os resultados em vez de tomar medidas para diminuir os custos” (UNESCO, 2005, p. 16). É preciso melhor gestão dos recursos financeiros e de ações que evitem desperdícios, como medidas preventivas contra a reprovação escolar, gerando menos gastos que a repetência de alunos por vários anos.

Como apontado, se o desenvolvimento sustentável e a inclusão social e educacional/escolar já estavam no radar da Unesco no início deste século, ainda havia muito a tratar sobre a vida e os direitos humanos (DH). Nessa direção, em 2006 a ONU (2007) adota a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (BRASIL, 2009), concebendo a deficiência como resultado da interação entre as pessoas com deficiência e as barreiras atitudinais e ambientais que obstaculizam sua plena e efetiva participação na sociedade em igualdade de oportunidades com as demais. Assim, o pleno exercício da promoção dos DH e das liberdades fundamentais pelas pessoas com deficiência (PCD) contribuiria para a produção de sua percepção de pertença social, bem como para o desenvolvimento humano, social e econômico da sociedade e para a erradicação da pobreza (ONU, 2007). Como a maioria das PCD vive em condições de pobreza, conforme a Convenção de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência (ONU, 2007), este OI apregoa a importância de corrigir as desvantagens sociais delas e de garantir sua participação na vida econômica, social e cultural, em igualdade de oportunidades. A ONU (2007) propala como princípios gerais, entre outros, o respeito pela dignidade, a autonomia individual, a liberdade de fazer as próprias escolhas, a independência e a plena e efetiva participação e inclusão na sociedade, e o “[...] respeito pela diferença e pela aceitação das pessoas com deficiência como parte da diversidade humana e da humanidade” (ONU, 2007, p. 17).

Referente à educação, a Convenção reconhece o direito das PCD à educação e para garanti-lo, ressalta que “[...] os Estados Partes assegurarão um sistema educacional inclusivo em todos os níveis, bem como o aprendizado ao longo de toda a vida [...]” (ONU, 2007, p. 28), delegando aos Estados a responsabilidade de evitar a exclusão do sistema educacional geral sob alegação de deficiência, bem como adaptações razoáveis às suas necessidades individuais. Proclama a importância da cooperação internacional, e da parceria estatal com os OIs e regionais, a sociedade civil e as organizações de PCD.

Fica evidenciado que era preciso cuidar da vida, do mundo e dos seres humanos que o habitam, tornando-se inadmissível a exclusão escolar/educacional. Defendem que todos contribuam com o desenvolvimento sustentável, o que requer que todos sejam educados, reconhecendo seus direitos inalienáveis a se desenvolverem como humanos.

Essas concepções tomam corpo, mas não necessariamente se tornam hegemônicas. Ao contrário, em 2007, o OREALC produziu o documento “Educação de qualidade para todos: um assunto de direitos humanos”, com objetivo de subsidiar/auxiliar nas deliberações da Segunda Reunião Intergovernamental de Ministros de Educação do Projeto Regional de Educação para a América Latina e o Caribe - PRELAC (OREALC; UNESCO, 2008a).

Para a CEPAL (2006 apud OREALC; UNESCO, 2008a), os países da AL e do Caribe reafirmaram o compromisso com a redução da pobreza, porém, os esforços realizados pela região até 2008 eram inferiores aos níveis esperados. Em 2005, 209 milhões de pessoas (39,8% da população latino-americana), ainda viviam em condições de pobreza, embora a porcentagem fosse pouco menor em relação a 2002, que chegava aos 44%. A desigualdade na distribuição de renda na região era uma preocupação, posto que a renda dos 10% mais ricos superava em 20 vezes ou mais os rendimentos dos 40% mais pobres. AL e Caribe compunham a região com maior desigualdade de renda no mundo, cujo hiato entre pobreza e riqueza, somava-se à polarização entre indígenas e não indígenas, brancos e afrodescendentes. Sobre as causas da distribuição tão desigual, apontam para a injusta distribuição do patrimônio; os domicílios com famílias de menores recursos tendo mais filhos; a educação de pessoas pobres com um limiar educacional que lhes permite superar a pobreza; os domicílios pobres com mais pessoas, mas menor rendimentos; a despesa social quando não cumpre com o seu papel redistributivo. Destaca a contribuição das políticas públicas educacionais ante essa polarização, ao afirmar que os sistemas educacionais “[...] transformaram-se cada vez mais em circuitos segmentados para pobres e ricos, criando-se com isso um perigoso circuito de reprodução intergeracional da desigualdade” (OREALC; UNESCO, 2008a, p. 25).

Em função dos períodos ditatoriais que ocorreram nessa região, os DH e a inclusão social são tidos como elementos chaves para o desenvolvimento da AL e do Caribe, sendo que a promoção da educação de qualidade para todos ao longo da vida deve enfrentar quatro desafios na região: redução da pobreza e promoção do crescimento econômico; redução das desigualdades sociais; combate à discriminação cultural e à exclusão social e prevenção da violência e da corrupção; garantia de maior coesão social e fortalecimento dos valores democráticos (OREALC; UNESCO, 2008a).

No entanto, o OREALC/UNESCO (2008a) discute as desigualdades sociais sem relacioná-las com as crises e as desigualdades estruturais da sociedade capitalista. Aponta as consequências das desigualdades como causas, sendo que recai na educação escolar ou extraescolar parte da responsabilidade pelos problemas sociais, bem como pela solução dos mesmos. Embora aparente uma crítica às relações econômicas produzidas na sociedade capitalista, suas proposições se apresentam como alternativas reformistas que reproduzem tal lógica sob novas roupagens, anunciando que a exclusão se refere a uma questão de sentidos relacionados “[...] mais a uma maneira de viver juntos do que a um assunto de pobreza material. [...]” (OREALC; UNESCO, 2008a, p. 26). Daí advogar a necessidade de incentivo ao capital social, ao fortalecimento da cidadania e ao desenvolvimento da consciência das funções dos diferentes atores na dinâmica social na qual o conceito de público não deve ser tomado sinônimo de espaço estatal, mas espaço de interesse coletivo para favorecer a convivência social alicerçada na tolerância e no respeito às diferenças. Cabe ao Estado facilitar a participação social nos espaços públicos, fomentar o capital social dos setores sociais menos favorecidos. Em suma, defende a melhoria do funcionamento dos mecanismos estatais e a expansão de espaços para a participação da sociedade civil.

Para o OREALC/UNESCO (2008a), um dos desafios da educação é combater a discriminação cultural e exclusão social com ações que valorizem a diversidade, promovam a inclusão social, a integração cultural e o desenvolvimento das liberdades e capacidades individuais e, por conseguinte, o desenvolvimento humano e nacional sustentável. Concebe que tal desenvolvimento salienta a importância do crescimento econômico, o imperativo de se redistribuir equitativamente a riqueza para a superação da pobreza, a integração da mulher nos espaços da vida pública, a autodeterminação dos vários povos, como os indígenas, o cuidado com o meio ambiente. Ante esse desafio, o documento reconhece a educação/escola como instrumento de reprodução da exclusão, das desigualdades sociais, por meio de práticas discriminatórias, ponderando sobre a dificuldade da escola em garantir igualdade e a mobilidade social. Assim, apregoa: “[...] por sua natureza, a escola pública deve ser inclusiva e favorecer o encontro entre diversos grupos sociais.” (OREALC; UNESCO, 2008a, p. 13).

Parece tratar da proposição de uma nova escola e uma nova sociedade, todavia, nos termos de Garcia (2014), o adjetivo sociedade “inclusiva” remete a uma nova forma de se abordar a sociedade capitalista, por meio do qual camufla-se a luta de classes e suas contradições pelo discurso de harmonia, inclusão, responsabilidade e coesão social.

Nota-se que as políticas de inclusão não se restringem à EE, mas visa assegurar o direito educacional de todos os alunos, sobretudo daqueles em risco de marginalização ou exclusão - o que requer que se fortaleça “[...] o desenvolvimento da escola pública, porquanto ela tem como função não só facilitar o acesso à educação das crianças de ambiente mais desfavorecidos mas também integrar a diversidade”, sendo que, na “[...] perspectiva da inclusão, as dificuldades de aprendizagem não se atribuem principalmente ao indivíduo (suas competências, sua origem social, o capital cultural de sua família), senão à escola e ao sistema. [...]” (OREALC; UNESCO, 2008a, p. 47).

Como o Estado torna-se fiador do direito de todos à educação e os repasses de recursos públicos são insuficientes, por um lado, recomenda o incremento do financiamento público da educação mediante outras alternativas como: maior participação de agentes não-estatais, operações de conversão da dívida e a cooperação internacional. Por outro, apregoa a adoção de políticas públicas e práticas pedagógicas adequadas com medidas para prevenir a reprovação escolar (responsável por desperdícios de recursos), bem como a flexibilização da gestão financeira. Em relação aos docentes, defende a flexibilidade para remanejar vagas, realizar pagamentos diferenciados, instituir a ótica meritocrática na contratação e promoção desses profissionais, a responsabilidade pelos resultados, avaliações periódicas do desempenho etc. Pondera que os alunos se diferenciam em características e necessidades, o que pressupõe custos diferenciados. Do mesmo modo, as habilidades e competências exigidas dos professores também são diferentes para atender à diversidade dos educandos e implicando em custos diferenciados no orçamento salarial docente (OREALC; UNESCO, 2008a).

Em “Consulta a países de Latinoamérica sobre información asociadas a las necesidades educativas especiales: sistematización de resultados”, de 2007, nota-se que há a preocupação de a AL garantir o direito de todos a uma educação de qualidade, sem discriminação, com foco nos grupos mais vulneráveis, como são aqueles com NEE, que segundo eles, ainda enfrentam práticas exclusivas (OREALC; UNESCO, 2007).

O documento aponta a falta de dados estatísticos e indicadores em relação às necessidades educacionais especiais (NEE) na AL, motivo pelo qual os países criaram o Sistema de Informação Regional sobre NEE, o SIRNEE, para a construção de indicadores significativos que pudessem diagnosticar a situação dos envolvidos, elaborando uma ferramenta para formular e monitorar políticas ativas integrais e a distribuição equitativa de recursos (OREAL; UNESCO, 2007). Isso permitiu resgatar informações derivadas de enquete aos países a respeito das NEE na América Latina4, contando com as definições e categorias: EE, NEE, e, recursos e apoios. Diante da identificação de não coincidência de definições e classificações entre os países, recomenda a investigação do que os países empregam e as barreiras que os impede de compartilhar informações para o monitoramento das NEE e a definição de políticas adequadas (OREAL; UNESCO, 2007).

Em “Convivencia democrática, inclusión y cultura de paz: lecciones desde la práctica educativa innovadora en América Latina”, de 2008, reitera-se a existência de práticas educacionais exclusivas na região e defende-se a educação para a democracia e a paz, o que supõe, dentre outros fatores, uma educação que promova a inclusão de muitos “[...] estudiantes tradicionalmente excluidos, que comienzan a ser tenidos en cuenta en la escuela, desde el punto de vista de la responsabilidad por su desarrollo” (OREALC; UNESCO, 2008b, p. 13). Uma escola inclusiva não seria apenas aquela que recebe diversos alunos, mas a que promove uma convivência efetiva e, por conseguinte, uma experiência inclusiva e de oportunidades para todos (OREALC; UNESCO, 2008b).

O documento compreende a inclusão, a convivência democrática e a cultura de paz como caminho para aperfeiçoar as relações humanas, resolver conflitos, prevenir a violência ou o fracasso escolar e como a missão da escola a ação educativa. A construção de uma cultura de paz não é possível “[...] si se produce el fracaso escolar y la exclusión de ciertos estudiantes que no se ajustan a los marcos académicos y comportamentales que la escuela establece. [...]” (OREALC; UNESCO, 2008b, p. 18).

No Relatório Mundial sobre a Deficiência (2011), a OMS e o BM alertaram para a questão das desigualdades sociais afirmando que as PCD e suas famílias têm maior probabilidade de enfrentarem problemas de acesso ao/à emprego, renda, saúde, educação, transporte e informação, principalmente nas comunidades mais pobres. Tendem a apresentar maiores desvantagens socioeconômicas e condições de pobreza (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE; BANCO MUNDIAL, 2012).

A OMS e o BM (2012) defendem a inclusão educacional pessoas com deficiência por compreendê-las como importantes à formação do capital humano, ao bem-estar e à riqueza pessoal. Assevera que a exclusão dessas crianças das oportunidades educacionais e de trabalho tende a resultar em altos custos econômicos e sociais, levando à pobreza e subempregos. Destacam que essa condição pode ser equilibrada via educação e, preocupados com a relação custo-benefício, propõem a garantia de uma educação inclusiva mediante a adoção de medidas acessíveis e sustentáveis. Dentre as medidas, recomendam a parceria público privada e a terceirização:

Os serviços públicos existentes para pessoas com deficiências são geralmente financiados de maneira inadequada, o que afeta sua disponibilidade e qualidade. O financiamento adequado e sustentável dos serviços públicos é necessário para garantir que sejam de boa qualidade e atinjam o público-alvo. A terceirização de serviços, o incentivo a parcerias público-privadas, principalmente com organizações sem fins lucrativos, e o desenvolvimento de orçamentos de cuidados orientados ao usuário quando estes são pessoas com deficiências são fatores que contribuem para aperfeiçoar a oferta de serviços (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE; BANCO MUNDIAL, 2012, p. 274).

Por esses documentos analisados nota-se o reconhecimento do contexto de grande desigualdade socioeconômica na AL e Caribe, a não universalização das matrículas na Educação Básica, a exclusão e o fracasso escolar de pessoas pobres, marginalizadas por suas etnias, marcações linguísticas etc. Neles são assinaladas as contradições que o capitalismo gera, levando ao não desenvolvimento pleno dos sujeitos. Contudo, sugerem que os enfrentamentos a essas questões se dão por meio de planos governamentais e institucionais das escolas e dos compromissos individuais de professores e alunos. Conforme a desigualdade estrutural e as contradições se avolumam, as correlações de forças sociais também vão se apresentando; evidencia-se a urgência de inclusão social e a inclusão educacional/escolar de pessoas excluídas por diferentes motivos, dentre eles devido à deficiência ou NEE, apresenta-se como pauta reconhecida para se ter uma sociedade democrática.

3 AGENDA ATÉ 2030

Já reconhecidos esses conteúdos defendidos, em 2015, a Unesco, juntamente com a/o Unicef, Banco Mundial, UNFPA, PNUD, ONU e ACNUR, organizou o Fórum Mundial de Educação (Incheon), dando continuidade ao trabalho iniciado em 1990 (Jomtien) e reiterado em 2000 (Dakar, resultando no documento Rumo a uma educação de qualidade, inclusiva e equitativa e à educação ao longo da vida para todos, doravante designado como Educação 2030 (UNESCO, 2016). Nele há forte defesa pelo desenvolvimento sustentável e do papel protagonista da educação para tanto - já contemplada anteriormente, de outro modo, enfocando o ODS 4 “Assegurar a educação inclusiva e equitativa de qualidade, e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos”.

Aborda a meta de expansão da educação básica (primária e secundária), gratuita, equitativa, de qualidade e com financiamento público por 12 anos. Trata da educação com inclusão e equidade - alicerce para uma agenda de educação transformadora, igualdade de gênero, com oportunidades de educação ao longo da vida. Isto inclui a formação técnica e profissional de qualidade, bem como o acesso ao ensino superior e à pesquisa. Assume uma “[...] visão holística e humanista, que contribui para um novo modelo de desenvolvimento. Essa visão vai além de uma abordagem utilitária da educação e integra múltiplas dimensões da existência humana” (UNESCO, 2016, p. 7). Considera a “[...] educação como inclusiva e crucial na promoção da democracia e dos direitos humanos, da cidadania global, da tolerância e do engajamento civil, bem como do desenvolvimento sustentável. A educação facilita o diálogo intercultural e fomenta o respeito pela diversidade cultural, religiosa e linguística, aspectos vitais para alcançar a coesão e a justiça social” (UNESCO, 2016, p.7). Como consta:

Comprometemo-nos a desenvolver sistemas educacionais mais inclusivos, com melhor capacidade de resposta e mais resilientes para atender às necessidades de crianças, jovens e adultos nesses contextos, inclusive de deslocados internos e refugiados. Destacamos a necessidade de que a educação seja oferecida em ambientes de aprendizagem saudáveis, acolhedores e seguros, livres de violência. Recomendamos uma resposta satisfatória a crises, que abranja desde a resposta de emergência até a recuperação e a reconstrução; melhor coordenação das respostas nacionais, regionais e globais; e o desenvolvimento de capacidade para ampla redução e mitigação de risco, para assegurar, assim, que a educação seja mantida em situações de conflito, emergência, pós-conflito e nas fases iniciais de recuperação (UNESCO, 2016, p. V).

Nota-se que há o reconhecimento do contexto muito difícil dos países signatários, que conta com deslocados internos e refugiados, cabendo aos governos a implementação bem-sucedida de tal agenda. Contudo, por ser tarefa difícil, pondera:

Reconhecemos que o sucesso da agenda de educação 2030 exige políticas e planejamento sólidos, bem como acordos de implementação eficientes. Também está claro que as aspirações compreendidas pelo ODS [objetivos de desenvolvimento sustentável] proposto 4 não podem ser realizadas sem um aumento significativo e bem orientado do financiamento, particularmente nos países que estão mais distantes de alcançar a educação de qualidade para todos, em todos os níveis. Assim, estamos determinados a aumentar a despesa pública em educação, de acordo com o contexto do país, e a estimular a adesão aos indicadores internacionais e regionais, para que haja uma reserva eficiente de pelo menos 4% a 6% do Produto Interno Bruto (PIB) e/ou de pelo menos 15% a 20% do total das despesas (UNESCO, 2016, p. V).

Também salienta ser

[...] crucial o cumprimento de todos os compromissos relacionados à assistência oficial para o desenvolvimento (AOD), inclusive os compromissos assumidos por muitos países desenvolvidos de atingir a meta de 0,7% do PIB para a AOD nos países em desenvolvimento. [...] instamos aos países desenvolvidos que ainda não o fizeram que realizem esforços adicionais concretos para alcançar a meta de 0,7% do PIB para a AOD nos países em desenvolvimento. Além disso, comprometemo-nos a aumentar nosso apoio aos países menos desenvolvidos. (UNESCO, 2016, p. V).

Contudo, com a instalação da pandemia mundial da Covid-19, reconhecida como tal em 11/03/2020 pela OMS, essas metas de crescimento do PIB foram impactadas no mundo todo. Segundo o Banco Mundial (2020, n. p.), a pandemia levará a maioria dos países à recessão, com a renda per capita se contraindo na maior fração dos países em todo o mundo desde 1870. As economias avançadas deverão encolher 7%. Essa fraqueza afetará as perspectivas dos mercados emergentes e das economias em desenvolvimento, que devem se contrair em 2,5 por cento ao lidar com seus próprios surtos domésticos do vírus. Isso representaria o desempenho mais fraco deste grupo de economias em pelo menos sessenta anos.

Para o Banco Mundial (2020, n.p.), as diversas regiões do mundo estão sujeitas a regressões significativas no crescimento: “O Leste Asiático e o Pacífico crescerão escassos 0,5%. O Sul da Ásia contrairá 2,7%, a África Subsaariana 2,8%, o Oriente Médio e o Norte da África 4,2%, a Europa e a Ásia Central 4,7% e a América Latina 7,2%”. A previsão é de que dezenas de milhões de pessoas retornem à pobreza extrema enquanto uma parcela desproporcionalmente bem menor da sociedade concentra mais riqueza em suas mãos.

Lembra-se que em 2019, antes da pandemia da covid-19, o Brasil foi considerado o segundo país com maior concentração de renda, perdendo para o Catar, quando analisados os 1% mais ricos, e estes concentravam 28,3%, quase um terço da renda total do país (PNUD, 2019). Certo é que a lógica da reprodução estrutural da distância socioeconômica das pessoas entre si e entre as classes sociais não deixou de existir com a pandemia; muito pelo contrário. Na lógica capitalista, tudo vira mercadoria: a doença, aquilo que pode preveni-la, curá-la, remediá-la, ou, o que dela resultar. E é importante que não se esqueça que o processo de reprodução de concentração de riquezas e de desigualdades não cessa.

Isso é extremamente sério, e leva ao questionamento: em uma sociedade desigual, há, de fato, o interesse de garantir uma educação de qualidade para todos como têm preconizado os documentos internacionais? Lembra-se que, no Brasil, pela Constituição, estados e municípios devem ter gastos mínimos de 25% em educação da receita oriunda de impostos e de recursos advindos por transferência, somando-se aos 18% sobre o valor arrecadado por impostos advindo da União. No entanto, se os percentuais são fixos, o volume que representam não o é, e levou o Brasil, assim como demais países da AL, a implicar menos recursos para a educação pública - da qual depende a maior da parte população que vive na pobreza. Além disso, em uma sociedade em que a prioridade é o acúmulo privado de capital, em tempos de crise econômica agravada pela pandemia, a tendência é garantir a reprodução do capital pela intensificação da exploração da classe trabalhadora, o que resulta na redução de seus direitos e na precarização de suas condições de sua existência, dentre eles, o acesso à educação.

Faz-se referência à pandemia e aos seus saldos porque os princípios elencados na Agenda 2030 dizem respeito ao que se segue.

- A educação é um direito humano fundamental e um direito catalisador, que depende da garantia de acesso universal igualitário à educação e à aprendizagem de qualidade, inclusiva, equitativa, gratuita e compulsória, e para todas as pessoas. Visa ao desenvolvimento completo da personalidade humana, devendo “[...] promover a compreensão mútua, a tolerância, a amizade e a paz” (UNESCO, 2016, p. 8).

- A educação trata-se de um bem público, e está sob a responsabilidade do Estado. Ela demanda a formulação e implementação de modos inclusivos de políticas públicas, e reconhece que a sociedade civil e os envolvidos diretamente com a escola desempenham papéis importantes na efetivação desse direito (UNESCO, 2016).

- O direito à educação para todos implica no reconhecimento da igualdade de gênero, permitindo a todas as pessoas o seu acesso, de modo a iniciar e concluir os ciclos educacionais.

- A educação deve ser de qualidade, com resultados de aprendizagem relevantes, equitativos e eficientes - o que implica em se trabalhar com métodos e conteúdos relevantes de ensino e aprendizagem, para atender as necessidades de todos os alunos. Isso também requer “[...professores bem qualificados, treinados, motivados e bem pagos, que usem abordagens pedagógicas adequadas e apoiem-se em tecnologias da informação e comunicação (TIC) apropriadas” (UNESCO, 2016, p. 9)

- O direito à educação se estende do nascimento ao longo da vida; e para se ter complementação e suplementação da escolarização formal devem ser oferecidas oportunidades amplas e flexíveis de aprendizagem por diferentes meios, incluindo os não formais, contando com o emprego das TIC (UNESCO, 2016).

Em 2015 estimava-se que para o alcance de objetivos de desenvolvimento sustentável – ODS 4, sobre educação e metas educacionais, que são específicas e mensuráveis, teria que se implicar esforços em nível global, nacional e regional, para:

[...] estabelecer parcerias eficazes e inclusivas; -aprimorar políticas educacionais e a forma como elas funcionam em conjunto; - garantir sistemas educacionais equitativos, inclusivos e de qualidade para todos; mobilizar recursos para um financiamento adequado da educação; e, -garantir monitoramento, acompanhamento e revisão de todas as metas. (UNESCO, 2016, p. 9).

A Educação 2030 prevê algumas metas - e sugere estratégias um tanto genéricas, justificadas pelos princípios já expostos. Cabendo ainda destacar um deles: cuidar da educação em situações de emergência. Isso abrange “[...] desastres naturais, pandemias e conflitos, além dos consequentes deslocamentos internos e transfronteiriços, pode deixar gerações inteiras traumatizadas, sem acesso à educação e despreparadas para contribuir com a recuperação social e econômica de seu país ou região” (UNESCO, 2016, p. 12). Destaca que a

[...] educação em contextos de emergência é, em primeiro lugar, protetora, ao oferecer conhecimentos e habilidades que podem salvar vidas, além de apoio psicossocial àqueles afetados pela crise. A educação também instrumentaliza crianças, jovens e adultos com habilidades para prevenir desastres, conflitos e doenças, rumo a um futuro sustentável. (UNESCO, 2016, p. 12).

Com a situação de pandemia mundial diferentes proposições de educação básica e superior foram implementadas, mas, o certo é que as “modalidades” de ensino remoto emergencial, presencial e/ou híbrido tiveram resultados muito diferentes. A promoção de séries não é o mais importante, mas o modo como os alunos foram encaminhados para o novo ano letivo de 2021 é o que preocupa. As famílias que puderam/podem pagar por profissionais para acompanharem seus filhos, ou que contam com agentes mediadores que os auxiliem, conseguem que eles tenham uma apropriação dos conteúdos escolares que dificilmente será alcançada pelos alunos mais pobres. (A Agenda 2030 não trata disso, não vaticinou sobre 2020-2021.)

Ante os limites reais dos governos darem encaminhamento ao proposto, aponta para a necessidade de se estabelecer “[...] padrões de excelência intermediários adequados (por exemplo, para 2020 e 2025), por meio de um processo inclusivo, com total transparência e responsabilização, de forma a engajar todos os parceiros, para que o governo assuma a liderança e haja um entendimento comum” (UNESCO, 2016, p. 12). Tais padrões podem ser estabelecidos para cada meta, servindo como “parâmetros” quantitativos para se acompanhar a proposta da agenda a longo prazo.

Em 2017, o Orealc/Unesco, em parceria com o Ministério da Educação e do Desporto da Argentina, organizou a Reunião Regional de Ministros da Educação da América Latina e Caribe intitulada E2030: Educação e habilidades para o século XXI, qual resultou um relatório com o mesmo título da reunião. Além dos ministros da educação, participaram, representantes importantes do setor educacional dos Estados Membros da AL e Caribe; organizações multilaterais, bilaterais, regionais, agências da ONU, representantes da sociedade civil, partes interessadas e experts da UNESCO. Refere-se à primeira reunião ministerial organizada para discutir a Agenda 2030 e os 17 (dezessete) Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), principalmente o ODS 4 descrito anteriormente. Essa reunião teve como objetivos:

• Adoptar una Declaración Ministerial sobre un enfoque común para lograr la Agenda ODS4-E2030 en la región, incluyendo los medios de implementación, los instrumentos técnicos de apoyo y los mecanismos de monitoreo.

• Acordar una hoja de ruta para la implementación de la E2030, incluyendo un mecanismo de seguimiento contextualizado que responda a los desafíos y expectativas educacionales de la región (OREALC; UNESCO, 2017, p. 4).

Trataram da situação da educação na região, do enfoque inovador da educação, das políticas e da formação docente, da aprendizagem inclusiva e de qualidade com vistas à redução das desigualdades e à promoção do desenvolvimento sustentável e à formação de alianças para a implementação da Educação 2030 (OREALC; UNESCO, 2017).

Em consonância com as recomendações da Unesco, no conjunto das mensagens e ações chaves, desafios, políticas e estratégias debatidos com o objetivo de garantir o ODS 4, destacam-se: 1. a promoção de oportunidades de aprendizagem e de reforma educacionais inclusivas direcionadas à promoção da igualdade de gênero, da paz, da cidadania, dos direitos humanos e da “transformação” e da coesão social; 2. conteúdos educativos relacionados ao contexto e às necessidades dos alunos, o que implica educar para a criticidade, cidadania, democracia, o mundo do trabalho, isto é, aprender a aprender para além dos conteúdos tradicionais de alfabetização e aritmética; 3. aliança entre governo, sociedade civil e setor privado para a formulação e implementação de políticas; 4. decisões políticas pautadas em evidências e investimento em educação; 5. aumento do financiamento para a educação, direcionamento de mais recursos para os grupos vulneráveis, mediante responsabilidade coletiva, eficiência e transparência no uso dos recursos e na prestação de contas; 6. revisão das políticas de formação e capacitação de professores, bem como reformar a carreira docente com base na meritocracia e em padrões regionais para certificação; 7. avaliação e monitoramento dos resultados de aprendizagem via organização de sistemas nacionais, regionais e mundiais; 8. gratuidade na educação de modo a atender a diversidade e as diferentes realidades (OREALC; UNESCO, 2017).

As metas do ODS 4 são muito importantes e as sugestões de aplicabilidade das estratégias também instigam, visto envolverem os diferentes agentes da vida pública e da sociedade civil, em prol de uma outra sociedade, de um outro mundo, mais sustentável e menos desigual. Nele, as pessoas teriam o acesso à educação escolar e não escolar, como direito e como fato.

A Agenda Educação 2030 apresenta um clima esperançoso para a humanidade e conclama que os países signatários deveriam estar envolvidos realmente com os propósitos anunciados. O que não se anuncia é que tudo isso – proposição e implementação – da Educação 2030 se dá em meio a contradições capitalistas de toda ordem. É possível de se acompanhar o que tem se tornado a educação diante da pandemia, aliás, antes dela, da garantia de vida.

Tratar da Educação 2030, com suas metas de curto e longo prazos em torno da sustentabilidade, parece estar meio fora de lugar, em um país da AL como o Brasil, que chegou em 27/02/2021, a 254.221 óbitos (BRASIL..., 2021). Nele, há vários estados em alerta máximo, com crise alarmante pela não disponibilização em número mínimo de vacinas à população, pela ausência de insumos necessários para os tratamentos em casos moderados e graves, revelando problemas seríssimos de gestão do governo federal, com sua recorrente prática de suspeição da ciência. A crise na saúde brasileira no governo Bolsonaro não está garantindo os direitos fundamentais, assim, o debate sobre a educação cede lugar à luta literal pela vida.

E daí? Lamento. Quer que eu faça o quê?” foi a declaração proferida pelo presidente da república que marcou o período do crescimento ascendente do número de óbitos pela epidemia de Covid-19 no Brasil. A frase foi colocada como descaso, ou desdém, diante de um momento de incertezas frente ao aumento de casos confirmados e óbitos por Covid-19 em todo o território brasileiro (Soares, 2020). A perplexidade foi a reação imediata vivenciada pela população diante da declaração do dirigente máximo do poder executivo. No entanto, o que não havia ainda sido compreendido é que o ‘E daí?’ seria o método de gestão adotado pelo Ministério da Saúde como forma de enfrentamento da epidemia (SODRÉ, 2020, p. 2).

Não à toa que foi avaliado pelo Lowy Institute, um centro de estudos com sede em Sydney, Austrália, como o país de pior gestão da pandemia, com 4,3 pontos nos quesitos estabelecidos e ocupando o 98º lugar, o último no ranking. O estudo abarcou 98 países, sendo computados dados de 36 semanas após o 100º caso confirmado até 09/01/2021, considerando-se: mortes confirmadas, casos confirmados por milhão de pessoas, mortes confirmadas por milhão de pessoas, casos confirmados com a proporção de testes, testes por milhão de pessoas. Envolveu países com sistemas autoritários, democráticos e híbridos, com economias avançadas e em desenvolvimento, de diferentes dimensões territoriais e populacionais, sem a inclusão da China, ficando os EUA em 94º lugar, com 17,3 pontos, e a Nova Zelândia em 1º lugar com 94,4 pontos, e o vizinho Uruguai em 12º, com 75,8 pontos (LOWY INSTITUTE, 2021).

Assim, as situações dramáticas que os brasileiros enfrentam desde março de 2020 são noticiadas pelo mundo, pelos mais reconhecidos órgãos de imprensa e por organismos internacionais ligados à saúde. Debate-se os fortes indícios da corrupção e do autoritarismo, com a blindagem da sociedade pela disseminação da contrainformação ou de Fake News a respeito de tudo, inclusive da veracidade da pandemia (!).

Diante de tamanha tragédia, ao se recuperar as metas e as estratégias propostas em Educação 2030 nota-se a relevância que poderiam ter, desde que não se tivesse que lutar cotidianamente pela manutenção do já conquistado, como foi o caso de toda a mobilização social em torno da aprovação da Lei nº 14.113, de 25/12/2020, que regulamenta o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb)5, e da suspensão do Decreto nº 10.502, 30/09/2020, que institui a Política Nacional de Educação Especial: Equitativa, Inclusiva e com Aprendizado ao Longo da Vida, em substituição à Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL, 2008).

No entanto, em meio a tudo isso, certo é que foi destinado um protagonismo aos professores na Agenda 2030, o que pode ser notado com a recorrência em que esse profissional é citado (professores 56 vezes e professor 02 vezes). Assim, na Meta 4c tem-se:

Até 2030, aumentar substancialmente a oferta de professores qualificados, inclusive por meio da cooperação internacional para a formação de professores nos países em desenvolvimento, principalmente os países de menor desenvolvimento relativo e os pequenos Estados insulares em desenvolvimento (UNESCO, 2016, p. 24).

Ela é comentada com o seguinte texto:

Os professores são a chave para se alcançar a agenda completa da Educação 2030, assim, essa meta é crucial. Ela requer atenção urgente, com um prazo mais imediato, porque a lacuna de qualidade na educação é exacerbada pela falta e pela distribuição desigual de professores profissionalmente qualificados, sobretudo em áreas desfavorecidas. Como os professores são condição fundamental para garantir uma educação de qualidade, professores e educadores deveriam ser empoderados, adequadamente contratados e remunerados, motivados, profissionalmente qualificados, além de contar com o apoio de sistemas bem financiados, eficientes e governados de forma eficaz. (UNESCO, 2016, p. 25).

Essa citação expressa a relevância dos professores. Contudo, há que se explicitar que não se deve responsabilizá-los por problemas ou questões que são anteriores e transcendem suas atuações – conforme o contexto e a lógica já expostos anteriormente. É inquestionável a importância da formação e do protagonismo docente para a garantia de uma educação de qualidade para todos e não apenas para as PCD. Com base nisso tudo, e com foco na inclusão escolar, indaga-se: o que dizer dos professores que atendem alunos com deficiências, transtornos do espectro autista, superdotação e/ou com necessidades especiais? Esta e outras indagações são mescladas com reflexões sobre a implementação da Agenda Educação 2030, sobretudo a respeito do projeto de educação e de sociedade que pretende viabilizar. O desafio se torna maior quando se observa que a educação inclusiva, nela proposta, está vinculada a um projeto de educação pautado no desenvolvimento de habilidades e competências cognitivas e não cognitivas com foco nos resultados e não no processo de aprendizagem, com vistas à preparação dos sujeitos para um mercado de trabalho instável e uma sociedade em conflito que precisa ser gerida a fim de garantir a coesão social (UNESCO, 2016). Em suma, trata-se de um projeto social e educacional que não visa a superação das mazelas sociais, mas a sua administração de modo a garantir a perpetuação da sociedade capitalista.

Quando se retoma as políticas educacionais do Brasil nos últimos anos, como um exemplo latino-americano, pode se ter maior clareza do real. Nas duas últimas décadas as políticas de educação e inclusão escolar no Brasil, para não se dimensionar de modo tão severo o presente, foram disputadas no que se refere à condução, ao financiamento, bem como às dimensões formativas para os professores e alunos. Tais disputas travadas entre diferentes forças, compõe a luta dos que por um lado reivindicam o acesso à educação e por outro aqueles que lutam para que essa formação escolar, destinada à classe trabalhadora, se configure em um projeto de dominação e consentimento acerca do modo de produção capitalista e das desigualdades por este engendrada.

Resguardados os condicionantes mais gerais, as mudanças na legislação educacional brasileira demonstram intrínseca relação com a reestruturação das forças produtivas, que demandam requisitos diversificados de educação e qualificação profissional. Tomou proporções consideráveis o debate sobre a inclusão na educação básica; democratização do acesso à educação e inclusão social, quando da análise do insuficiente desempenho da educação frente aos indicadores nacionais e internacionais. Por isso, o Brasil precisava propor medidas de financiamento e gestão, além da adoção de políticas de inclusão social e de respeito à diversidade; políticas de formação inicial e continuada dos trabalhadores em educação voltada para um projeto social para além daquele disseminado pela

Em sua essência, o combate ao analfabetismo, sempre perseguido pelas políticas públicas no Brasil, ainda se colocava como meta até 2020. Isto porque o país, em 2013, tinha taxa de 91,7% de alfabetização da população com 15 anos ou mais e, em correspondência, a escolarização das pessoas com deficiência, mesmo evidenciando alguns avanços apresentava sistemáticos descompassos.

Em termos legais, pode-se dizer que houve avanços nas políticas públicas quando se propõe uma educação inclusiva, com a Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva, de 2008, a Resolução CNE/CEB n° 04/2009, que estabelece as Diretrizes Operacionais para o Atendimento Educacional Especializado na Educação Básica, modalidade Educação Especial e a promulgação da Lei nº 13.146, de 06 de julho de 2015, que institui a LBI, Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, também denominada Estatuto da Pessoa com Deficiência. Contudo, é inegável que o avanço legal não se traduz automaticamente em avanço na implementação do processo de inclusão escolar, posto que a correlações de forças sociais e a reprodução da polarização riqueza e pobreza, como condição fundamental da existência da sociedade capitalista vigente, inviabilizam a socialização dos bens materiais e não-materiais, educacionais. Ademais, não se pode negar que, paralelamente, a legislação garante a atuação do setor privado na promoção da inclusão escolar via subsídio público às organizações privadas sem fins lucrativos para oferta do Atendimento Educacional Especializado (AEE), em detrimento de sua expansão na rede pública de ensino.

Em que pesem os avanços ocorridos nessas últimas décadas na materialização de direitos em políticas educacionais, a disputa pelo conteúdo da política recrudesce com a elaboração do Plano Nacional de Educação - PNE (2014-2024) por ele valorizar a parceria público-privado e legitimar no âmbito do financiamento recursos públicos para ensino privado. Isso enfraquece a possibilidade de formação de professores, melhoria e ampliação da qualidade da educação pública.

O documento, aprovado em 2014, fixa em seu Art ٢º:

[...] I - erradicação do analfabetismo; II - universalização do atendimento escolar; III- superação das desigualdades educacionais, com ênfase na promoção da cidadania e na erradicação de todas as formas de discriminação; IV- melhoria da qualidade da educação; V- formação para o trabalho e para a cidadania, com ênfase nos valores morais e éticos em que se fundamenta a sociedade; VI - promoção do princípio da gestão democrática da educação pública; VII - promoção humanística, científica, e cultural e tecnológica do País; VIII – estabelecimento de meta de aplicação de recursos públicos em educação como proporção do Produto Interno Bruto – PIB, que assegure atendimento às necessidades de expansão, com padrão de qualidade e equidade; IX- valorização dos (as) profissionais da educação; X promoção dos princípios do respeito aos direito humanos, à diversidade e à sustentabilidade socioambiental] (BRASIL, 2014, p. 1).

Observa-se nas diretrizes do PNE uma articulação aos objetivos de desenvolvimento do milênio. Tais objetivos fazem parte das recomendações e acordos que os OIs, especialmente a ONU, traçaram para o ciclo social delineado desde a década de 1990. Ainda nessa direção, é importante destacar que, mesmo depois de sancionado o novo PNE, muitos limites foram interpostos no cenário político e econômico, oriundos das políticas de ajuste fiscal adotadas pelo Estado brasileiro a partir de 2015, convertendo-se em mecanismos que reduziram ainda mais o financiamento da educação pública. Conforme Saviani, quando o Senado “[...] retirou da meta 20 a restrição à educação pública, admitindo que a destinação da ampliação dos investimentos em até 7% do PIB no quinto ano e até 10% no décimo ano, poderá se estender também em determinados casos ao ensino privado” (SAVIANI, 2016, p. 331), enfraqueceu-se a luta pela ampliação dos investimentos e avanços na educação pública.

Isso demonstra o contrassenso, especialmente a estratégia da meta 20 do PNE, cujo objetivo era o de alcançar 10% do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil a ser investido em educação. Ainda, com o golpe jurídico impetrado contra a ex-presidenta Dilma Rousseff (2011-2016) e a entrada do governo de Michel Temer (2016-2019), emerge uma série de medidas econômicas que retiram direitos básicos dos trabalhadores e da população em geral, como por exemplo a Emenda Constitucional (EC) nº 95/2016 que congela investimentos nas políticas públicas de saúde, educação e assistência social, por 20 anos.

É inegável que as metas dos ODS ٤, foram incorporadas nas políticas educacionais no Brasil e o PNE evidencia essa orientação. Proporcionalmente a esse movimento de expansão do serviço público, se constituiu um movimento de ataque com inúmeras propostas para reduzir o direito à educação, tais como: privatização da oferta de educação básica, redução de disciplinas de Ciências Humanas, lobby do setor privado para oferta de educação à distância e a mais recente foi o ataque ao financiamento da Educação Básica por meio do FUNDEB. Diante disso, fica-se claro que

[...] a mercadificação da educação pública não é uma abstração, mas ocorre via sujeitos e processos. Trata-se de sujeitos individuais e coletivos que estão cada vez mais organizados, em redes do local ao global, com diferentes graus de influência e que falam de diferentes lugares: setor financeiro, organismos internacionais, setor governamental (PERONI, 2018, p. 214-215).

Assim sendo, esse processo tensiona e produz as reformas do Estado, que em forma de ajustes estruturais minimizam o alcance das políticas públicas. Com o aumento do desemprego e a exacerbação da competitividade e do individualismo, parece-nos evidente que tais políticas neoliberais e neoconservadoras podem provocar na AL o avesso do preconizado pelos OIs instalando-se, muito provavelmente, o caos social e civilizatório.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pode-se notar que a partir dos anos 2000 os organismos internacionais reforçam orientações para os governos a se atentarem à inclusão social e educacional. A educação destinada às pessoas excluídas ou vulneráveis, que estão à margem de uma vida com dignidade propiciada pela observação dos direitos fundamentais avança numa direção outrora pouco provável de ser recomendada: a preservação/educação ambiental. Entende-se que, pelo percentual de pessoas que abarca, o público-alvo da Educação Especial não pode ser ignorado nos documentos desses organismos, nas políticas públicas da educação ou mesmo em recomendações aos países, sobretudo num momento de notório crescimento da desigualdade econômico-social e de acirramento de crises.

A AL, por sua riqueza natural e pelo que representa no jogo econômico mundial, não fica esquecida dessas recomendações. Nesta terceira década do terceiro milênio o discurso da inclusão escolar/educacional se dá em meio à constatação da concentração da riqueza e do acirramento da desigualdade social que alcança índices estarrecedores, o que obstaculiza ainda mais o acesso à matrícula, à permanência na escola, à aprendizagem, à terminalidade dos estudos com certificação/habilitação e à apropriação dos conteúdos das disciplinas. Notadamente, como defendido por autores da teoria histórico-cultural, a formação do psiquismo e o seu desenvolvimento é de ordem social. Conclui-se, ante esse quadro exposto ao longo do texto, que há a necessidade de se acompanhar como a desigualdade provocada pela deficiência e as NEE são enfrentadas pelos países com suas políticas educacionais ordinária e extraordinariamente. Esse acompanhamento deve implicar na participação efetiva desse público-alvo da EE, considerando-o capaz de pensar sobre si e o mundo, e ser instrumentalizado/formado para tanto. Atingir as metas da Educação 2030 não se constitui em tarefa fácil visto que antes delas é preciso que se enfrente o alinhamento dos governos a concepções de ultradireita – visto que nelas prevalece a naturalização da prevalência de um povo ou uma cultura sobre outra, da sagração ou da primazia da herança biológica sobre o edifício cultural.

Ao se levar essas metas em conta e ao se voltar para o Brasil desses últimos 06 anos (que no âmbito político teve o impeachment da presidenta Dilma Rousseff, a instituição de um governo provisório, assumido pelo vice-presidente Michel Temer e, depois, uma eleição que deixou sequelas profundas – não pelo resultado – que poderia eleger quaisquer dos candidatos, mas por todo o processo instituído e o que dele, a cada dia, se desvenda – como a mídia e os trabalhos do próprio Supremo Tribunal Federal correntemente têm apontado) há que se trabalhar muito.

A agenda do Brasil frente aos OIs tem sido contrária à política diplomática que vinha sendo seguida há muitos anos, posicionando-se avessa às propostas que estão em curso, como a Educação 2030, que mesmo não tendo um prisma revolucionário, é ignorada. O país tem se posicionado ao lado de países com votações contrárias em matérias afetas aos direitos humanos. Com esse cenário, o trabalho formativo educativo dos profissionais deve mirar uma escola pública, gratuita, presencial, de qualidade para todos e todas.

REFERÊNCIAS

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BRASIL bate novo recorde e registra maior média de mortes da pandemia. UOL, São Paulo, 27 de fevereiro de 2021. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/saude/ultimas-noticias/redacao/2021/02/27/covid-19-coronavirus-casos-mortes-27-de-fevereiro.htm?cmpid=copiaecola. Acesso em: 28 fev. 2021.

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Endereços para correspondência: Av. Colombo, 5790 - Zona 7, Maringá - PR, 87020-900; smsbarroco@uem.br


1 Doutora em Educação Escolar pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Araraquara; Mestra em Educação pela Universidade Estadual de Maringá; Professora aposentada do Programa de Pós-Graduação em Psicologia (PPI/UEM-PR) e Professora do Programa de Pós-Graduação em Psicologia (PPGPSI/UNIR-RO – CAPES). Membro da ABRAPEE, ANPED (GT 20) e ANPEPP (GT 59). E-mail: smsbarroco@uem.br.

2 Doutora em Psicologia pela Universidade Estadual de Maringá; Mestra em Educação pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná; Integrante do Grupo de Pesquisa HISTEDOPR e GEPESPHC. Membro do GT Psicologia e Políticas Educacionais da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Psicologia-ANPEPP e da Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional - ABRAPEE. E-mail: nds.matos@gmail.com.

3 Doutora e Mestra em Educação e Graduada em Pedagogia pela Universidade Estadual de Maringá; Pesquisadora do Grupo de Estudos e Pesquisa em Políticas Educacionais, Gestão e Financiamento da Educação (GEPEFI/CNPq). E-mail: gesimf@gmail.com.

4 Dezenove países foram consultados, sendo que apenas treze responderam: Argentina, Bolívia, Brasil, Colômbia, Costa Rica, Cuba, Equador, El Salvador, Guatemala, México, Nicarágua, República Dominicana e Uruguai (OREALC; UNESCO, 2007).

5 Foram realizados vários estudos e debates por diferentes associações/instituições, como podem ser localizados em sites da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPED), da Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (ANFOPE), do Conselho Federal de Psicologia (CFP), entre outros. Além disso, a implementação do Decreto n° 10.502/2020 resultaria numa série de mudanças que impactariam aspectos estruturais e conceituais da política de educação especial brasileira. Assim, as reações motivadas pelas organizações que atuam em defesa dos direitos das pessoas com deficiência e sua educação exerceram um importante papel ao pressionar parlamentares do Congresso Nacional. Tamanha foi a articulação dos inúmeros movimentos sociais que, após audiências públicas, os efeitos do conteúdo do referido documento foram suspensos por força de liminar no Supremo Tribunal Federal (STF) (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, 2021).