https://doi.org/10.18593/r.v45i0.21265
Trajetória histórica da gestão das escolas públicas estaduais de Santa Catarina: pontos e contrapontos
Historical trajectory of management of Santa Catarina state public schools: pros and cons
Trayectoria histórica de la gestión de las escuelas públicas estatales de Santa Catarina: puntos y contrapuntos
Janete Palú1
Rede Estadual de Ensino do Estado de Santa Catarina, Professora e Assistente Técnica Pedagógica
https://orcid.org/0000-0002-5887-6246
Oto João Petry2
Universidade Federal da Fronteira Sul, Professor; Grupo de Pesquisa em Gestão e Inovação Educacional, Pesquisador e Líder
https://orcid.org/0000-0001-9216-5301
Resumo: Este artigo apresenta a trajetória histórica da gestão das escolas públicas estaduais catarinenses. Indicam-se disputas e tensionamentos suscitados a partir dos anos de 1980, estando no centro dessa questão a participação efetiva, elemento fundamental da democratização da educação. O texto destaca os principais acontecimentos e documentos que foram importantes para a construção do cenário atual, para a conformação do “novo” modo de escolha dos gestores e estratégia de gestão adotada por meio dos Planos de Gestão Escolar (PGEs), instituídos via Decreto Governamental em 2013. Para elucidar esses processos, realizou-se uma revisão bibliográfica em diálogo com a legislação e os documentos que são referência nesse campo. Como estratégia metodológica, foi utilizada a técnica de análise de conteúdo proposta por Bardin (2016). Observou-se que o principal tensionamento esteve relacionado às formas de escolha dos gestores escolares. Nas décadas de 1980 e 1990, a eleição foi conquistada, porém foi declarada inconstitucional; assim, a indicação voltou a ser utilizada como forma de escolha dos dirigentes escolares catarinenses. Nos anos 2000, evidenciou-se a influência internacional na formulação das políticas educacionais, que, por meio de suas recomendações, tem modificado a concepção de gestão, cujas proposições podem estar na origem dos PGEs. O Plano Estadual de Educação de Santa Catarina (PEE/SC 2015-2024) altera o foco da gestão democrática para além da escola, situando-a no sistema estadual de ensino. Apesar das lutas e das disputas presentes na trajetória da gestão, ainda são necessários avanços para que a gestão democrática se materialize no âmbito da educação pública catarinense.
Palavras-chave: Políticas educacionais. Gestão educacional e escolar. Formas de escolha do gestor escolar. Gestão Democrática. Planos de Gestão Escolar.
Abstract: This paper presents the historical trajectory of the management of Santa Catarina state public schools in Brazil. The disputes and the tensions aroused from the 1980s onwards are indicated, being at the center of this issue the effective participation, a fundamental element of the democratization of education. The text highlights the main events and documents that were important for the construction of the current scenario, for the shaping of the “new” mode of choice of managers and management strategy adopted through the School Management Plans, instituted via Government Decree in 2013. To elucidate these processes, a literature review was conducted in dialogue with the legislation and the documents that are reference in this field. As a methodological strategy, we used the content analysis technique proposed by Bardin (2016). It was observed that the main tensions were related to the ways of choosing school managers. In the 1980s and 1990s, the election commenced but later declared unconstitutional and void; thus, the indication was again used as a way of choosing the leaders of Santa Catarina’s schools. In the 2000s, the international influence in the formulation of education policies was evidenced, which, through its recommendations, has changed the conception of management, whose propositions may be the origin of the School Management Plans. The Santa Catarina State Education Plan (PEE/SC 2015-2024) changes the focus of democratic management beyond the school, placing it in the state educational system. Despite the struggles and disputes present in the management trajectory, advances are still needed for the democratic management to be materialized in the context of public education in Santa Catarina.
Keywords: Education policies. Educational and school management. Ways of choosing the school manager. Democratic management. School Management Plans.
Resumen: Este artículo presenta la trayectoria histórica de la gestión de las escuelas públicas estatales catarinenses. Se indican las disputas y las tensiones surgidas a partir de la década de 1980, estando en el centro de esa cuestión la participación efectiva, un elemento fundamental de la democratización de la educación. El texto destaca los principales eventos y documentos que fueron importantes para la construcción del escenario actual, para la conformación del “nuevo” modo de elección de los gestores y la estrategia de gestión adoptada por medio de los Planes de Gestión Escolar (PGE), instituidos vía Decreto Gubernamental. en 2013. Para dilucidar estos procesos, se realizó una revisión bibliográfica en diálogo con la legislación y los documentos que son referencia en este campo. Como estrategia metodológica, fue utilizada la técnica de análisis de contenido propuesta por Bardin (2016). Se observó que la tensión principal estuvo relacionada con las formas de elegir gestores escolares. En las décadas de 1980 y 1990, la elección fue conquistada, pero fue declarada inconstitucional; así, la indicación volvió a ser utilizada como forma de elección de los dirigentes escolares catarinenses. En los años 2000, se evidenció la influencia internacional en la formulación de las políticas educativas que, por medio de sus recomendaciones, ha modificado la concepción de gestión, cuyas proposiciones pueden estar en el origen de los PGEs. El Plan Estatal de Educación de Santa Catarina (PEE/SC 2015-2024) altera el enfoque de la gestión democrática más allá de la escuela, colocándolo en el sistema estatal de educación. A pesar de las luchas y de las disputas presentes en la trayectoria de la gestión, aún son necesarios avances para que la gestión democrática se materialice en el ámbito de la educación pública catarinense.
Palabras clave: Políticas educativas. Gestión educativa y escolar. Formas de elegir al gestor escolar. Gestión Democrática. Planes de Gestión Escolar.
Recebido em 27 de junho de 2019
Aceito em 21 de outubro de 2019
Publicado em 19 de maio de 2020
1 Introdução
O presente artigo3 tem por objetivo refletir sobre a trajetória histórica que culmina com o atual modo de escolha dos gestores e de gestão das escolas públicas estaduais catarinenses. Indicamos as disputas e os tensionamentos suscitados durante o processo de conformação desse novo modelo de gestão. Destacamos que o estudo em tela aborda um tema relevante na área da educação e dos estudos que compreendem as políticas educacionais, com destaque para a gestão educacional e escolar. Pretendemos enfocar a realidade desses domínios em relação à rede pública do Estado de Santa Catarina e, assim, contribuir com as pesquisas nesse campo.
Na construção da pesquisa, utilizamos um período temporal a contar dos anos de 1980. Já no que diz respeito à metodologia adotada, essa investigação caracteriza-se como uma pesquisa bibliográfico-documental, de natureza qualitativa. Para a leitura e interpretação dos dados, utilizou-se a técnica de análise de conteúdo de Bardin (2016). Dessa forma, inicialmente, coletamos os documentos que evidenciam e são o resultado das principais disputas vivenciadas no período em estudo. Tais documentos são apresentados no Quadro 1.
Quadro 1- Documentos examinados no estudo
DOCUMENTO |
AUTORIA |
ANO |
Plano Estadual de Educação (1985-1988) Democratização da educação: a opção dos catarinenses |
Secretaria da Educação/SC1 |
1984 |
Lei n. 6.709 |
Santa Catarina |
1985 |
Lei n. 6.884 |
Santa Catarina |
1986 |
Constituição Estadual |
Santa Catarina |
1989 |
Lei n. 8.040 |
Santa Catarina |
1990 |
Proposta Curricular |
Secretaria de Estado da Educação /SC |
1991 |
Lei Complementar n. 170 |
Santa Catarina |
1998 |
Decreto n. 3429 |
Santa Catarina |
1998 |
Plano Estadual de Educação: a sociedade construindo a educação dos catarinenses. |
Secretaria de Estado da Educação e Inovação |
2004 |
Avaliações de Políticas Nacionais de Educação: Estado de Santa Catarina, Brasil (OCDE). |
OCDE2 |
2010 |
Proposição de novos rumos para a qualidade da educação em Santa Catarina |
CEE/SC |
2012 |
Decreto n. 1.7943 |
Santa Catarina |
2013 |
Boletim n. 22 |
Sinte-SC |
2013 |
Plano Estadual de Educação (2015-2024) |
Secretaria de Estado da Educação /SC |
2015 |
Fonte: os autores.
Notas: 1 A atual Secretaria de Estado da Educação de Santa Catarina (SED/SC) possuiu denominações diferenciadas ao longo das últimas quatro décadas, como podem ser observadas nos documentos examinados.
2 Somente parte do documento foi submetido à análise. Analisamos o sumário (p. 15-22), capítulo 3 (p. 65-79), capítulo 8 (p. 244-246) e capítulo 11 (p. 357-359).
3 Esse Decreto sofreu alterações ao longo dos anos de 2015 e 2017.
Como suporte teórico, o estudo apoia-se em Arroyo (1983), Bobbio (2017), Bordenave (2013), Dourado (2013), Paro (2003, 2011), Souza (2007, 2012), Drabach e Souza (2014), entre outros. Também foram consultados documentos jurídicos e produções bibliográficas sobre a temática, principalmente de pesquisadores que têm como objeto de seus estudos a gestão educacional e escolar no âmbito de Santa Catarina, entre os quais destacamos: Amorim (1995), Daros (1999), Pacheco (2007), Thiesen, Staub e Maurício (2011).
A partir das contribuições dos autores em diálogo com os documentos apontados no Quadro 1, apresentamos a trajetória histórica da gestão das escolas públicas estaduais catarinenses. Partimos do pressuposto de que os Planos de Gestão Escolar (PGEs) , atual modo de escolha dos gestores e de governança das escolas públicas estaduais de Santa Catarina, adotado via Decreto Governamental, em 2013, é resultado de disputas e de tensionamentos que ocorreram ao longo de quatro décadas. Esses embates envolveram, de um lado, educadores e a sua entidade representativa, movimentos sociais que lutaram pela democratização da escola e da gestão, os quais concebiam a eleição de gestores como uma estratégia; e, de outro, o Governo Estadual que, em diferentes mandatos, procurou manter a velha política de indicação de gestores e arquivou ou ignorou documentos que viriam a contribuir com o processo de democratização da educação e da gestão, fato observável nas diferentes versões do Plano Estadual de Educação (PEE). Também, encontram-se na origem e na conformação da “nova política” influências internacionais e elementos gerenciais, muitas vezes anunciados como propagadores da gestão democrática.
Cury (2011, p. 493) afirma que: “Gestão é um termo que provém do latim e significa: levar sobre si, carregar, chamar a si, executar, exercer, gerar”. O autor destaca que “[...] o termo gestão tem sua raiz etimológica em ger que significa: fazer brotar, germinar, fazer nascer”. Vieira (2007, p. 61) sustenta que: “A gestão educacional refere-se ao âmbito dos sistemas educacionais; a gestão escolar diz respeito aos estabelecimentos de ensino; a gestão democrática, por sua vez, constitui-se num ‘eixo transversal’, podendo estar presente, ou não, em uma ou outra esfera”. Segundo Souza (2007), um importante aspecto a ser considerado em nossas tentativas de conhecermos mais sobre a gestão escolar é a sua dimensão política, e as disputas de poder que envolvem as pessoas que atuam na/sobre a escola. Nessa direção, apontamos que a história da gestão escolar catarinense é marcada por disputas; assim sendo, nossa investigação pretende evidenciar os principais pontos e contrapontos que permeiam essa trajetória.
Neste estudo, fazemos o esforço para responder aos seguintes questionamentos: Qual a trajetória histórica da gestão das escolas públicas estaduais catarinenses nas últimas quatro décadas? Quais as disputas evidenciadas na construção dos documentos e das legislações que são referência para a educação e a gestão das escolas públicas no estado catarinense? Quais as influências recentes que estão reconfigurando a forma de escolha dos gestores e o modelo de gestão das escolas? Qual a origem dos Planos de Gestão Escolar apresentados como a nova forma de governança das escolas públicas estaduais a partir de 2013? De que modo o PEE/SC (2015-2024)
aborda a gestão democrática?
Inicialmente, serão apresentadas contribuições teóricas de autores que analisam a democratização, a gestão democrática, a eleição de gestores e outros meios que contribuem para o fortalecimento dessa perspectiva de gestão no contexto nacional. Em seguida, abordamos, de forma breve, o cenário da educação estadual catarinense e sua trajetória nas décadas de 1980 e 1990, período em que se buscou a democratização da escola pública, influenciada pelo cenário nacional que vivenciava o processo de redemocratização. Na sequência, propomos uma reflexão sobre a educação catarinense no período que se segue ao ano de 2000, quando a mesma, a pedido do governo do estado, é objeto de estudo de organismos internacionais. Em suas recomendações, encontram-se possíveis indícios da origem dos Planos de Gestão Escolar (PGEs) implantados em Santa Catarina a partir de 2013, como a “nova” forma de escolha do gestor e de governança das escolas públicas estaduais catarinenses. Já em 2015, foi aprovado o PEE/SC (2015-2024) que traz uma concepção ampliada de gestão democrática, para além do espaço escolar, demonstrando avanços e a continuidade das disputas nesse campo. Por fim, serão apresentadas as considerações a partir da investigação realizada.
2 GESTÃO DEMOCRÁTICA DA ESCOLA PÚBLICA NO BRASIL: UM DIREITO ASSEGURADO NA LEGISLAÇÃO
No Brasil dos anos de 1980, com o fim da Ditadura Militar e o início do processo de redemocratização, os ventos da democracia passaram a soprar em espaços onde outrora esse princípio não havia sido vivenciado. Dessa forma, além do espaço político, surgiram lutas que buscavam a democratização de espaços sociais, entre os quais se destacam o setor educacional e a gestão escolar. Movimentos sociais, sindicatos e professores passaram a reivindicar a ampliação dos espaços de participação, bem como o direito de eleger os gestores escolares, embalados pelos acontecimentos que estavam vivenciando no cenário nacional. Diante desse contexto, podemos questionar qual o sentido das palavras democracia e democratização, e como esses conceitos foram incorporados à educação e às suas formas de gestão.
Para Bobbio (2017, p. 35, grifos do autor), a democracia pode ser entendida como “[...] contraposta a todas as formas de governo autocrático [...] e [...] caracterizada por um conjunto de regras (primárias ou fundamentais) que estabelecem quem está autorizado a tomar decisões coletivas e com quais procedimentos”. Segundo Bordenave (2013, p. 8), “[...] para um crescente número de pessoas, democracia não é apenas um método de governo onde existem eleições”. Para o autor, “[...] democracia é um estado de espírito e um modo de relacionamento entre as pessoas. Democracia é um estado de participação”. Em relação à democratização da sociedade, Bobbio (2017, p. 91-92) alerta para o fato de que “[...] uma coisa é a democratização do Estado [...], outra é a democratização da sociedade, donde se conclui que pode muito bem existir um Estado democrático numa sociedade em que a maior parte das instituições [...]”, dentre elas a escola, “[...] não são governados democraticamente”.
Arroyo (1983) enfatiza que a luta pela democratização do Estado influenciou o processo de democratização da educação no país, a educação pública vivenciou, no início dos anos 1980, um momento histórico promissor, pois “[...] ela é um dos primeiros serviços que entram num debate político que ultrapassa tanto os particularismos e os mecanismos de manobra política, quanto à pretensa apoliticidade da administração racional” (ARROYO, 1983, p. 127). Diante dos acontecimentos nacionais, o autor profetizava que “[...] devemos esperar que essas classes subalternas exijam maior participação na administração de um serviço que lhes foi negado, ou que lhes chegou deteriorado e que nunca atendeu aos seus reais interesses de classe” (ARROYO, 1983, p. 127).
No âmbito Federal, inicia-se o processo de construção da nova Constituição, que corresponde à Constituição de 1988 (CF 1988). Conhecida como “Constituição Cidadã”,
o documento materializou o direito à educação dos Artigos 205 a 214, bem como os princípios sob os quais esse direito seria regido, dentre eles destacamos o Artigo 206, inciso VI, que consagra que a gestão democrática do ensino público deve orientar a organização da educação brasileira (BRASIL, 1988). Conforme Camargo (1997 apud DRABACH; SOUZA, 2014), essa foi a primeira Constituição a fazer menção ao princípio da gestão democrática na escola pública. Na opinião de Cury (2009), o capítulo da educação, presente na Magna Carta, incorporou em seu texto e traduziu, em preceitos legais, os clamores de educadores brasileiros que desejavam a democratização da sociedade e da escola pública, motivando, assim, o clima de “valorização da democracia como saída para as mazelas do país” (CURY, 2009, p. 200).
A Lei de Diretrizes e Bases (LDB) n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, reiterou o princípio da gestão democrática e delegou aos sistemas de ensino o estabelecimento de normas para sua efetivação. No Artigo 14, ficou estabelecido que a participação seria um dos instrumentos utilizados para garantir sua concretude:
Art. 14. Os sistemas de ensino definirão as normas de gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios: I – participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola; II – participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes. (BRASIL, 1996)
No entanto, a CF de 1988 e a LDB n. 9.394/96 não estabeleceram diretrizes específicas para a sua efetivação, transferindo para os sistemas de ensino essa responsabilidade. Por isso, julgamos importante esclarecer o que se considera como gestão democrática. Segundo Souza (2007):
A gestão democrática é entendida como um processo político através do qual as pessoas que atuam na/sobre a escola identificam problemas, discutem, avaliam, deliberam e planejam, encaminham, acompanham, controlam e avaliam o conjunto das ações voltadas ao desenvolvimento da própria escola na busca de soluções daqueles problemas. (SOUZA, 2007, p. 130).
Uma das estratégias que pode contribuir para a materialização da gestão democrática é a forma de escolha de seus dirigentes. Para Dourado (2013, p. 98), é necessário problematizar “[...] as formas de gestão e provimento ao cargo de dirigente escolar enquanto canal de democratização nas relações escolares”. Paro (2003) identificou, entre as modalidades de escolha do diretor de escola, três das quais derivam as outras: a indicação, o concurso público ou aferição de competência técnica e a eleição. Ademais, estudos recentes evidenciam o aparecimento de novas formas de escolha, chamadas de “mistas”, entre as quais se destacam: “[...] seleção seguida de eleição e a seleção seguida de indicação” (DRABACH; ADRIÃO, 2017, p. 5). A partir da literatura, as autoras classificam a eleição como o modelo “mais democrático”, e a indicação como o modelo “menos democrático” de escolha dos gestores escolares.
A indicação é uma das formas mais usuais de escolha e está relacionada ao clientelismo (DOURADO, 2013). Por meio dela, são perpetuadas antigas práticas de trocas de favores entre quem indica e o indicado. A indicação faz com que o trabalho do diretor esteja vinculado a quem o indicou (DRABACH; SOUZA, 2014). Contudo, o concurso público não é considerado pelos pesquisadores como forma ideal de escolha, uma vez que tem como base a comprovação de critérios técnicos e aferição de conhecimentos. Além disso, não tem nada a oferecer em termos democráticos, pois o candidato aprovado escolhe a escola, mas a escola não tem a liberdade de escolher o seu diretor (PARO, 2011). Já as eleições são historicamente tidas pelos movimentos sociais e dos professores como uma das formas mais democráticas de escolha dos dirigentes escolares (DOURADO, 2013). No entanto, não se pode “[...] imputar à eleição, por si só, a garantia de democratização da gestão, mas referendar essa tese enquanto instrumento para o exercício democrático” (DOURADO, 2013, p. 104).
Assim sendo, a eleição poderá constituir-se em um instrumento de democratização quando associada a outros, como a construção coletiva do projeto pedagógico e atuação efetiva do conselho escolar (DRABACH; SOUZA, 2014). Todavia, “[...] por si só estes instrumentos não são capazes de garantir que a democracia aconteça, mas, tampouco, sem eles a escola não poderá desenvolver uma gestão democrática” (DRABACH; SOUZA, 2014, p. 229). A eleição e outros instrumentos que foram destacados pelos autores estão referendados na legislação nacional e na legislação estadual catarinense, sua materialização pode representar um indicativo de avanço no que diz respeito à democratização da gestão e da escola.
O início dos anos de 1990 traz, porém, uma série de mudanças para o campo educacional. O Brasil, a exemplo de muitos países, sofre a influência do neoliberalismo. Os defensores do projeto neoliberal advogam uma nova concepção de Estado, entendido como “[...] uma esfera que também é regida por regras de concorrência e submetida a exigências de eficácia semelhantes àquelas a que se sujeitam as empresas privadas” (DARDOT; LAVAL, 2016, p. 272). Os autores também destacam que organizações internacionais, como o Banco Mundial e a OCDE propagaram valores, principalmente em países subdesenvolvidos, por meio de uma série de recomendações, que foram implementadas pelos países envolvidos (LIBÂNEO; OLIVEIRA; TOSCHI, 2012).
Diante desse cenário, as políticas públicas educacionais mudam de rumos e de direções. Uma nova perspectiva de gestão chega aos sistemas de ensino, caracterizada pelo modelo gerencial que, muitas vezes, utiliza conceitos e princípios defendidos pela perspectiva democrática, porém ressignificados; assim, passam a atender a outros propósitos, que se alinham à concepção neoliberal. Considerando esse contexto, na sequência, será analisado o cenário educacional catarinense, cujo desejo de democratização da educação e da gestão escolar esteve presente nos anos de 1980 e de 1990, fora alvo de muitas disputas, principalmente no que diz respeito às formas de escolha dos gestores das escolas públicas estaduais. Já os anos de 2000 revelam as influências nacionais e internacionais, que modificaram as formas de escolha dos gestores e de gestão das escolas públicas estaduais.
3 A BUSCA PELA DEMOCRATIZAÇÃO DA GESTÃO ESCOLAR EM SANTA CATARINA: CONQUISTAS E LIMITAÇÕES
Nesta seção, buscamos demonstrar em que medida houve avanços ou recuos no campo da gestão democrática no Estado de Santa Catarina nas últimas quatro décadas. Para tanto, apresentamos, inicialmente, de forma breve, o cenário educacional catarinense, para em seguida tratar da trajetória histórica da gestão escolar.
Santa Catarina localiza-se no sul do Brasil, conta com 295 municípios, uma população estimada em 7.075.494, e uma área territorial de cerca de 95 mil quilômetros quadrados (IBGE, 2017). Em relação à educação, são 5.273 escolas públicas (QEDU, 2018) e 1.311.967 alunos; a Rede Estadual de Ensino é formada por 1.073 escolas, sendo responsável pela educação de 516.559 alunos que frequentam os anos iniciais e finais do Ensino Fundamental e o Ensino Médio (SANTA CATARINA, 2018b). No que diz respeito à gestão da Rede Estadual de Ensino, a Secretaria do Estado da Educação (SED/SC) é o órgão governamental responsável pelas escolas estaduais e contava com o apoio de estruturas regionais chamadas Gerências Regionais de Educação (GEREDs). Por meio do Decreto SC n. 144, de 12 de junho de 2019, essas organizações passaram a ser denominadas Coordenadorias Regionais de Educação e Supervisões Regionais de Educação (SANTA CATARINA, 2019).
A trajetória histórica da gestão em Santa Catarina está associada à história política do estado, que, ao longo do século XX, foi marcada pelo autoritarismo, domínio de oligarquias, disputas e rivalidades entre famílias que se alternaram no poder, elitismo, clientelismo e favorecimentos políticos. A elite industrial e agrária sempre foi representada e teve seus interesses assegurados (DUWE, 2015). O autor, ainda, aponta que as práticas coronelistas e mandonistas estiveram presentes na história catarinense; no entanto, acredita que “[...] o clientelismo tenha permanecido enquanto prática social de relação entre as elites e o povo catarinense durante um período considerável de tempo para assim fazer parte de uma cultura política” (DUWE, 2015, p. 10).
Souza (2012, p. 169) enfatiza a natureza política da gestão escolar, pois: “A escola reverbera e reproduz, nesse sentido, ao menos em parte, as formas pelas quais a política opera na sociedade”. Em Santa Catarina, as práticas políticas estaduais influenciaram as políticas educacionais e o campo da gestão educacional e escolar. Em nome do favorecimento, conservadorismo, clientelismo e interesses dos grupos dominantes, a eleição para gestores escolares foi considerada inconstitucional, nas décadas de 1980 e 1990, para que esses grupos pudessem indicar como gestor escolar os seus apadrinhados políticos. Muitos desses interesses continuam presentes no campo educacional.
A gestão democrática das escolas públicas estaduais catarinenses foi pauta dos debates ao longo dos anos de 1980, marcados pela redemocratização da sociedade brasileira. Datam desse período grandes movimentos e encontros de educadores e sociedade civil organizada para a discussão e a elaboração do PEE (1985-1988), congressos e estudos para a elaboração da Proposta Curricular de Santa Catarina (PCSC) e aprovação de lei que garantiu a eleição de diretores, no âmbito das escolas estaduais. Contudo, alguns desses documentos foram arquivados ou ignorados, e as leis aprovadas foram declaradas inconstitucionais.
A primeira greve dos professores da rede pública estadual de Santa Catarina ocorreu no final de 1980, quando surgiram novas lideranças que vieram a compor a Associação dos Licenciados de Santa Catarina (ALISC)
. Entre as bandeiras de luta da entidade, estavam a “[...] luta pela participação na elaboração e gestão da política educacional do Estado, bem como as discussões da gestão da escola” (AMORIM, 1995, p. 89).
Datam do início da década de 1980 as primeiras eleições diretas para governadores de estado. Conforme Santos Filho (1992, p. 224): “Foi neste novo contexto político que surgiram experiências e práticas mais democráticas de planejamento e gestão da escola pública em alguns Estados da Federação”. Em Santa Catarina, o governador eleito, Esperidião Amim, estimulou a participação “[...] na definição de um plano estadual de educação e na implantação de um sistema de eleição direta dos diretores das escolas públicas, e de criação de conselhos escolares deliberativos constituídos por representantes de professores, alunos e pais”.
Em relação ao PEE, em 1983, o governador do Estado de Santa Catarina designou uma comissão para sua elaboração. “De sua constituição participavam, pela primeira vez, representantes eleitos das categorias do magistério”. Essa conquista ocorreu após a greve dos professores de 1983. No movimento, os educadores manifestaram “[...] o desejo de participar de forma ativa na formulação da política educacional catarinense”. A comissão contou, também, com a participação de entidades do magistério e estudantes. Nas discussões e no processo de elaboração do PEE, tomou-se “[...] como conceito base da Democratização a participação” (SANTA CATARINA, 1984, p. 15). A concepção de participação é anunciada no documento da seguinte forma:
É necessário que as pessoas que fazem acontecer a Educação, os professores, os pais, os especialistas, os alunos, os diretores e funcionários, em conjunto com outros segmentos da comunidade, entendam que qualquer solução para educação catarinense deve partir da escola e que eles são a escola. (SANTA CATARINA, 1984, p. 16).
Houve seminários municipais e regionais em quase todos os municípios catarinenses. Em 1984, foi realizado o Seminário Estadual na cidade de Lages-SC, que contou com a participação de “[...] 538 delegados das 20 regiões educacionais” (SANTA CATARINA, 1984, p. 19). Nesse encontro, foi eleita a Comissão Estadual, na qual foi acrescido um representante de cada uma das 20 regionais educacionais.
Conforme Pacheco (2007, p. 69), “[...] a comissão responsável pela redação do Novo Plano Estadual de Educação (1985-1988) centrou suas discussões na democratização da educação”. Em 1985, o Conselho Estadual de Educação de Santa Catarina (CEE/SC) promulgou a Resolução n. 02/1985, intitulada Democratização da Educação - A Opção dos Catarinenses. Esse documento ficou conhecido, também, como o Livro Verde. A gestão democrática da escola estava entre os desejos dos participantes desses movimentos, cujo “[...] sentimento de democratização da educação ultrapassava a ideia da universalização do acesso para todos, manifestando a necessidade da escola como um espaço coletivo, de exercício da democracia e gestão participativa” (PACHECO, 2007, p. 69).
Entre as deliberações do plano, destacamos a de número 39, que determina: “Democratização de todos os processos administrativos com eleições de todos os dirigentes educacionais” (SANTA CATARINA, 1984, p. 24). Embora o documento tenha sido arquivado, ele deixou marcas na educação catarinense, as quais evidenciam a necessidade de ampliar a participação da sociedade e das instâncias deliberativas, no sentido de contribuírem para a construção de uma escola mais democrática (PACHECO, 2007).
Em relação à democratização da gestão escolar, um importante avanço foi a promulgação da Lei n. 6.709, de 12 de dezembro de 1985, que instituiu eleições e estabeleceu normas para a escolha de diretores das escolas públicas estaduais (SANTA CATARINA, 1985). A primeira lei que garantiu as eleições diretas foi aprovada durante o governo de Esperidião Amim, que dirigiu o estado entre os anos de 1983 a 1987.
No início da década de 1980, os gestores das escolas públicas estaduais catarinenses eram indicados mediante a livre escolha do governador, com base na Lei n. 4.425, de 16 de fevereiro de 1970. No entanto, de 1948 a 1970, o acesso à função deu-se por meio de concurso público. “A lei 234 de 10 de dezembro de 1948 criara a carreira de Diretor de Grupo Escolar, determinando que o ingresso na carreira fosse feito por Concurso de Títulos e Provas (Art. 2º)” (DAROS, 1999, p. 91). Contudo, a realização do concurso público “[...] durante mais de 20 anos, não eliminou por completo o clientelismo político na indicação dos administradores das escolas públicas estaduais, até porque os concursos públicos deixaram de existir a partir de 1970 (Lei 4.424 de 16/02/1970)” (DAROS, 1999, p. 91). Diante do exposto, destacamos que a conquista da eleição como forma de escolha dos dirigentes escolares em 1985 representou um grande avanço, resultado da mobilização dos educadores que buscavam a democratização das escolas e a ampliação da participação
da comunidade escolar nos processos decisórios. Conforme Daros (1999), entre as bandeiras de luta, figuravam questões como o estatuto do magistério, o plano de carreira e a avaliação escolar que vinha sendo utilizada em Santa Catarina, no entanto, o tema que mais mereceu destaque foi a eleição de diretores.
Na concepção dos educadores, a natureza da função do diretor era “[...] entendida como política e, por isso, a alternativa de concurso público não apareceu, pois, a percepção social da função do diretor era política e não técnica” (DAROS, 1999, p. 143). De acordo com a autora: “A eleição de diretor respondia a uma tarefa considerada prioritária pelo movimento de professores - a democratização da escola - uma vez que se a transformação deste País não depende só da escola, é certo que não há de acontecer sem passar por ela” (DAROS, 1999, p. 143, grifos do autor).
No que tange ao magistério público do Estado, ressaltamos que, em 1986, foi promulgada a Lei No 6.884, de 29 de julho, que institui o “Estatuto do Magistério Público Estadual do Estado de Santa Catarina” (SANTA CATARINA, 1986). Este se constituiu em um marco importante no que diz respeito aos avanços conquistados no período e, também, estava entre os pontos considerados prioritários pelos educadores catarinenses.
Após o fim do governo Amim (1983 - 1987), inicia-se o governo de Pedro Ivo Campos (1987-1990). “Vale lembrar que a instituição de eleição para diretor foi facilitada pelas ambiguidades do governador Amin, já que, ao apoiar as eleições diretas para Presidente da República, acabou utilizando as eleições de diretor de escola como marketing político [...]”. Essa questão fica evidente em propaganda governamental “[...] cujo título era: Em Santa Catarina, eleição direta começa na escola” (AMORIM, 1995, p. 91, grifos do autor). Já Pedro Ivo Campos, ao assumir, questionou a constitucionalidade da lei e obteve ganho de causa; no entanto, a ALISC garantiu a permanência nos cargos dos diretores eleitos, por meio de liminar de reintegração dos diretores exonerados no início de 1988 (AMORIM, 1995).
Os professores e a entidade que os representava continuaram as mobilizações. Em 1989, um ano após a promulgação da Constituição Cidadã no Brasil, Santa Catarina promulgou sua nova Constituição. Os educadores pressionaram os deputados e conseguiram consagrar, por meio da legislação, o princípio da gestão democrática e a eleição de diretores (AMORIM, 1995). O Artigo 162 assegurou:
VI - gestão democrática do ensino público, adotado o sistema eletivo, mediante voto direto e secreto, para escolha dos dirigentes dos estabelecimentos de ensino, nos termos da lei; ADI STF 123 (inciso VI, do art. 162). Decisão final: procedente em parte. DJ. 12.09.1997. EC/38, de 2004. Ante julgamentos de mérito, do STF, o art. 5º da EC/38, revoga expressões do inciso VI, art. 162. (SANTA CATARINA, 1989).
No entanto, esse dispositivo foi novamente objeto de ação direta de inconstitucionalidade movida pelo governo do estado, que alegou violação do “[...] Artigo 37, caput e inciso II da Constituição Federal” (PACHECO, 2007, p. 73). Para a declaração da inconstitucionalidade das eleições para dirigentes escolares, o governo também se firmou na Lei Estadual n. 6.844, de 29 de julho de 1986, que estabelece: “Art. 10 - Os cargos de provimento em comissão se destinam a atender as atividades de direção, Chefia e Assessoramento” (SANTA CATARINA, 1986 apud PACHECO, 2007, p. 73).
Para finalizar a análise desse período histórico, verificamos que, dos marcos evidenciados na década de 1980, se destaca a elaboração da Proposta Curricular, hoje a PCSC. Embora a primeira versão da PCSC tenha sido publicada em 1991 (SANTA CATARINA, 1991), inúmeros debates, encontros, estudos entre educadores marcaram a sua elaboração e antecederam a publicação. O processo “[...] foi coordenado pela Secretaria de Estado da Educação a partir de 1988, que contou com a participação de expressiva parcela dos educadores da Rede e que teve por objetivo a formulação de diretrizes curriculares para o sistema estadual de ensino” (THIESEN; STAUB; MAURÍCIO, 2011, p. 116). O documento foi sendo modificado ao longo do tempo diante das novas demandas que surgiram no âmbito educacional, curricular e social, por isso, a PCSC foi atualizada “[...] em 1998, 2005 e 2014, mantendo a mesma base teórico-metodológica de 1991” (BORIN, 2017, p. 97). Para Thiesen, Staub e Maurício (2011, p. 131), “[...] o movimento histórico-político de constituição da Proposta Curricular de Santa Catarina expressou as marcas ideológicas de um período em que limitações, contradições, ousadia, conflitos e desejos estiveram profundamente imbricados”. Mesmo diante das contradições, a elaboração da primeira versão da PCSC é um dos grandes marcos da educação no Estado.
Dando sequência à análise da trajetória histórica da gestão escolar catarinense e às lutas pela ampliação dos espaços participativos nesse campo, destacamos, que no início dos anos de 1990, as eleições para gestores escolares foram novamente conquistadas por meio de dispositivo legal. Em 1990, o então vice-governador Casildo Maldaner assume o mandato até 1991, em substituição ao então governador Pedro Ivo Campos (BORIN, 2017). Durante seu governo, foi aprovada uma nova legislação, a Lei n. 8.040, de 26 de julho de 1990, que: “Dispõe sobre as funções de direção de escolas públicas, forma de escolha de diretores e dá outras providências” (SANTA CATARINA, 1990). A lei legitimava o desejo de democratização das escolas manifestado pelos educadores.
Todavia, em 1990, Vilson Pedro Kleinübing venceu as eleições para governador do Estado, assumindo, em 1991, o mandato até 1994. “No primeiro ano de mandato, o então governador solicitou a suspensão da Lei n. 8.040, acabando com a eleição para diretores, novamente o discurso autoritário do governador dava conta de que essa lei era inconstitucional.” (BORIN, 2017, p. 135). Com a declaração de inconstitucionalidade da lei, coube, novamente, ao Poder Executivo, o poder de escolha e a indicação dos dirigentes escolares. Dessa forma, a eleição direta como um dos meios para garantir a democratização nas escolas públicas revela um jogo de forças entre educadores, sociedade civil organizada e os governos que entendiam que a eleição não vinha ao encontro de seus interesses. Esses últimos prezavam pela indicação do gestor de escola pelo Poder Executivo, dando continuidade aos favorecimentos político-partidários e ao clientelismo.
Continuando o processo de análise, destacamos que, após a promulgação da CF de 1988 e da LDB n. 9.394/1996, Santa Catarina publicou a Lei Complementar n. 170, de 7 de agosto de 1998. Nesse contexto, a gestão democrática das escolas foi referendada entre os princípios da educação escolar no Estado, conforme estabeleceu o Artigo 3º: “A educação escolar, no Estado de Santa Catarina, obedece aos seguintes princípios: [...] VI - gestão democrática do ensino, na forma desta Lei Complementar e da legislação específica” (SANTA CATARINA, 1998b). A legislação estadual no capítulo V estabeleceu que a Gestão Democrática da Educação Pública, “[...] entendida como ação coletiva e prática político-filosófica, norteará todas as ações de planejamento, formulação, implementação e avaliação das políticas educacionais e alcançará todas as entidades e organismos integrantes do Sistema Estadual de Educação” (SANTA CATARINA, 1998b). Diferentemente dos demais aportes legais, a Lei Complementar n. 170/1998 definiu mecanismos e instrumentos para a consolidação da gestão democrática, como determina o Artigo 19:
Art. 19. Além de outros previstos em lei ou instituídos pelo Poder Executivo, são instrumentos destinados a assegurar a gestão democrática da educação pública:
I - a descentralização do processo educacional;
II - a adoção de mecanismos que garantam precisão, segurança e confiabilidade nos procedimentos de registro dos atos relativos à vida escolar, nos aspectos pedagógico, administrativo, contábil e financeiro, de forma a permitir a eficácia da participação da comunidade escolar e extra-escolar diretamente interessadas no funcionamento da instituição;
III - o funcionamento, em cada instituição de educação básica pública, de Conselho Deliberativo Escolar, com a participação de representantes da respectiva comunidade escolar, local e regional;
IV - o funcionamento, no âmbito do órgão central do Sistema, do Fórum Estadual de Educação, com a participação de representantes das entidades que congreguem os diversos segmentos da sociedade catarinense com interesse na educação. (SANTA CATARINA, 1998b).
O documento afirma que a participação da comunidade escolar e extraescolar se constituiu em um instrumento para assegurar a gestão democrática da educação pública. Além disso, o Artigo 20 da Lei Complementar n. 170/1998 evidencia o valor de outro documento, importante mecanismo de democratização da gestão, quando elaborado e reelaborado coletivamente: o Projeto Político-Pedagógico (PPP).
Em relação ao Conselho Deliberativo Escolar (CDE), em Santa Catarina, seu funcionamento e suas funções foram regulamentados pelo Decreto No 3.429, de 8 de dezembro de 1998. Segundo o dispositivo, o CDE é um “[...] Órgão Colegiado de caráter consultivo, normativo e avaliativo, que atuará em assuntos referentes à gestão pedagógica, administrativa e financeira da Unidade Escolar” (SANTA CATARINA, 1998a, p. 1).
Ainda, na esteira dos avanços no campo da gestão democrática, destacamos o PEE de Santa Catarina (PEE/SC-2004). O PEE/SC de 2004, em sua Meta 14, contemplava o “Financiamento e a Gestão” da educação no Estado. No que diz respeito à “Autonomia e Gestão Democrática”, no primeiro item dos seus “Objetivos e Metas”, está a eleição de diretores, entendida como importante para a democratização da gestão, associada a outros instrumentos.
Contudo, o Plano também foi arquivado, apesar de intensa movimentação para sua elaboração. Assim, a eleição de diretores não foi materializada no âmbito das escolas públicas estaduais de Santa Catarina, e a forma de escolha do gestor escolar continuou sendo realizada por meio de indicação do poder executivo. Entretanto, o desejo da realização de eleições, da democratização da gestão, ainda estava presente na pauta dos educadores, de seu sindicato e dos movimentos da sociedade civil organizada. Esse anseio está presente no texto do PEE/SC (2015-2024) que apresenta uma concepção de gestão democrática que ultrapassa os limites da escola. Essa questão será apresentada na próxima seção.
4 PLANOS DE GESTÃO ESCOLAR: INFLUÊNCIAS E NASCEDOURO DO “NOVO MODELO DE GOVERNANÇA” DAS ESCOLAS PÚBLICAS ESTADUAIS DE SANTA CATARINA
Na seção anterior, evidenciamos que os anseios por uma gestão democrática e participativa no âmbito das escolas públicas estaduais de Santa Catarina se fizeram presentes nos debates, nos movimentos e nos documentos construídos ao longo do período destacado no cenário nacional e estadual. Algumas iniciativas que contribuem para a materialização dessa perspectiva de gestão foram sendo implementadas, entre as quais está a eleição para gestores de escola (declarada inconstitucional), a atuação do CDE e a elaboração do PPP.
No entanto, nas primeiras décadas dos anos de 2000, podemos observar a influência internacional na educação catarinense. A OCDE, em 2009, a pedido do Governo Estadual e da SED/SC, realizou um estudo que, em 2010, resultou em uma publicação chamada Avaliações de Políticas Nacionais de Educação: Estado de Santa Catarina, Brasil. O documento faz uma análise e recomendações sobre a política educacional. O relatório foi objeto de exame do CEE/SC, que emitiu em 2012 o documento chamado Proposições de novos rumos para a qualidade da educação em Santa Catarina: visão do CEE sobre a avaliação da OCDE.
O documento da OCDE abordou a temática da Governança: Gestão do Sistema e da Qualidade. O texto fez referência à forma como eram escolhidos os gestores (diretores) no Estado de Santa Catarina: “[...] os diretores das escolas são nomeados de duas maneiras. Em alguns casos, são eleitos pela comunidade escolar. Na maioria das vezes, são designados por nomeação política. Ambos os sistemas apresentam desvantagens” (OCDE, 2010 p. 244). A análise do CEE/SC também se referiu a essa questão e, diante do estudo da OCDE e suas recomendações, fez as seguintes proposições sobre a gestão escolar:
a) definição de requisitos para candidatos ao exercício de cargos de direção de escola com base em elevada qualificação pedagógica e técnica;
b) seleção de diretores de escola com base em formação e compromisso específicos com a gestão pedagógica e administrativa, mediante avaliação de competências e habilidades para o exercício do cargo e de apresentação de plano de gestão;
c) criação de programa de formação continuada com base em diagnóstico do perfil dos gestores e da performance da gestão do sistema escolar e das escolas;
d) criação de programa de avaliação da gestão das escolas, associando desempenho em relação ao plano de metas, desenvolvimento e inovação das práticas pedagógicas, resultados da aprendizagem e do compromisso com a comunidade [...]. (SANTA CATARINA, 2012, p. 30-31, grifo nosso).
A publicação da OCDE (2010) e a análise feita pelo CEE/SC (SANTA CATARINA, 2012) apresentam indícios de uma possível origem dos PGEs em Santa Catarina e outras ações sendo realizadas no âmbito da Rede Estadual de Ensino. As propostas feitas pelo CEE/SC foram implementadas a partir do ano de 2013, gradativamente: seleção de gestores com base em critérios técnicos e apresentação de um plano de gestão escolar (2013); formação continuada para os gestores, a partir do ano de 2013 e, de maneira mais incisiva, nos anos de 2016, 2017 e 2018; e avaliação da gestão, por meio da Sistemática de Avaliação da Gestão Escolar de Santa Catarina (SAGE-SC), realizada no âmbito das escolas públicas estaduais nos anos de 2017 e 2018 (SANTA CATARINA, 2018b).
A mudança na forma de escolha dos gestores no Estado de Santa Catarina foi promovida via Decreto Governamental anunciado no dia 15 de outubro de 2013 (Dia do Professor). O Decreto SC n. 1.794/2013, que dispõe sobre a Gestão Escolar da Educação Básica e Profissional da Rede Estadual de Ensino, em todos os níveis e modalidades, prevê uma nova forma de escolha do gestor, por meio do Plano de Gestão Escolar (SANTA CATARINA, 2013), anunciado pelo Governo Estadual como um instrumento democrático que colocaria fim à indicação como forma de escolha dos dirigentes escolares por muito tempo praticada no estado catarinense. Nesse sentido, a Figura 1 que segue procurou sintetizar as principais formas de escolha dos gestores das escolas públicas estaduais,
relacionadas às formas de escolhas vigentes no Brasil e seu caráter democrático.
Figura 1- Formas de escolha dos gestores das escolas públicas estaduais de Santa Catarina
Fonte: os autores.
Nota: Elaboração a partir de Daros (1999), Drabach e Adrião (2017), Scalabrin (2018) e a legislação catarinense.
As formas consideradas “menos democráticas” predominaram no período temporal analisado. Já o Plano de Gestão Escolar pode ser associado às formas mistas de escolha evidenciadas por Drabach e Adrião (2017), pois combina critérios de seleção e escolha. No modelo proposto pelos PGEs, o candidato deve obedecer a critérios, entre os quais destacamos possuir curso de formação ou especialização em gestão escolar e não possuir mais de cinco faltas injustificadas nos três anos anteriores à inscrição do PGE. Somente os candidatos que se enquadraram nos critérios puderam se inscrever na plataforma WEBGESC, os quais tiveram seus planos analisados por consultores ad hoc e, após aprovação, foram submetidos à escolha da comunidade escolar (SANTA CATARINA, 2013).
Como o “novo” modelo de escolha do gestor e de governança das escolas públicas estaduais não foi discutido com a comunidade, não contou com a participação dos sujeitos que atuam no espaço escolar, sendo implantado por um Decreto, foi alvo de críticas do Sinte-SC, que, no Boletim N. 22, divulgado em 2013, chamado de Gestão anti-democrática: governo impõe sua vontade via decreto, declarou seu descontentamento. Para a entidade, o projeto deveria ter sido discutido com a sociedade e se transformar em lei, dando mais garantia de continuidade à política de gestão escolar, alvo de muitas disputas no Estado ao longo das últimas décadas. Segundo o Sindicato:
O Decreto é de competência do Chefe do Poder Executivo, ou seja, Presidente, Governador ou Prefeito e pode ser revogado a qualquer tempo. Já o projeto de Lei pode sofrer emendas e só será revogado por outra Lei. Sendo assim, o Decreto não dá garantia nenhuma de continuidade nos próximos governos, o que defendemos é um projeto de lei elaborado com a participação da sociedade. (SINDICATO DOS TRABALHADORES EM EDUCAÇÃO NA REDE PÚBLICA DE ENSINO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, 2013, p. 1).
O boletim do Sinte manifestava a insatisfação da entidade em relação ao modelo de indicação de gestores escolares, realizado pelo Poder Executivo, e afirmava ser este um desastre. Declarava que a iniciativa governamental se constituía em um “[...] golpe não apenas na categoria, mas também em toda a comunidade escolar, pois não é de fato um projeto democrático de gestão” (SINDICATO DOS TRABALHADORES EM EDUCAÇÃO NA REDE PÚBLICA DE ENSINO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, 2013, p. 1). O sindicato não via, no Decreto, a possibilidade de efetivação de uma gestão democrática e participativa, declarando ser esta “[...] apenas mais uma forma encontrada pelo governo de mascarar a realidade para que as escolas da rede pública estadual continuem como feudos, nas mãos dos partidos políticos que leiloam seu espaço, acobertando desmandos e perseguições” (SINDICATO DOS TRABALHADORES EM EDUCAÇÃO NA REDE PÚBLICA DE ENSINO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, 2013, p. 1).
Já a SED/SC (SANTA CATARINA, 2018b) anunciava a publicação do Decreto como um meio legal que possibilitaria a mudança na gestão das escolas públicas estaduais, “[...] valorizando a participação da comunidade escolar nos processos de planejamento e decisão, no aperfeiçoamento da gestão democrática e na transparência das ações pedagógica e administrativa” (SANTA CATARINA, 2018b). Defendia que o novo modelo de escolha de um plano de gestão era “[...] fundamental no sentido de planejar a priori a gestão, de submetê-lo à apreciação da comunidade em processo democrático de escolha de direção de escola” (SANTA CATARINA, 2018b).
Diante das contradições evidenciadas pelo posicionamento do Sinte-SC e da SED/SC, percebemos que a gestão escolar é mais uma vez objeto de disputas e de tensionamentos no Estado, visto que os educadores e o sindicato que os representa defendiam a aprovação de um projeto de lei, o qual deveria ser discutido com a comunidade. Já o Governo implantou a mudança no meio/na forma de escolha do gestor escolar e do modelo de gestão escolar por meio de Decreto, causando descontentamento entre os profissionais da educação.
Os primeiros PGEs foram selecionados em 2014, quando os gestores que desempenhavam a função, por meio de indicação, apresentaram seu plano, passaram pelas etapas previstas no Decreto permanecendo no cargo até o final de 2015. Nesse ano, aconteceu um novo processo de escolha dos gestores por meio dos PGEs com vigência para o período de 2016 a 2019. Estes possibilitaram ao proponente assumir a função de gestor escolar e estão orientando a gestão das escolas públicas da Rede Estadual na atualidade, apesar das contradições que envolveram a origem.
Recentemente, foi construído, divulgado e aprovado um importante documento da educação catarinense que corresponde ao PEE/SC (2015-2024). Na introdução do documento, evidencia-se que, além dos marcos legais nacionais e estaduais, a Comissão Estadual na construção do texto base também se apoiou no relatório da OCDE (2010) e no estudo desse documento realizado pelo CEE/SC (SANTA CATARINA, 2012), apresentando indícios da influência das recomendações da OCDE na educação do Estado na atualidade e para a próxima década (SANTA CATARINA, 2015b).
A Meta 18 do PEE/SC (2015-2025), que trata da gestão democrática, propõe 18 estratégias, destaca a importância das entidades democráticas da escola, do PPP, porém a eleição de diretores, importante instrumento de democratização, não está entre as estratégias, apenas o Plano de Gestão Escolar é mencionado pelo documento:
18.8. Garantir a participação efetiva da comunidade escolar e local na formulação e acompanhamento dos projetos políticos-pedagógicos, currículos escolares, planos de gestão escolar e regimentos escolares, possibilitando as condições objetivas necessárias à operacionalização desta participação.
[...] 18.16 Implantar avaliação institucional com a participação efetiva da comunidade escolar incorporando seus resultados no Projeto Político Pedagógico e no Plano de Gestão. (SANTA CATARINA, 2015b, p. 138, grifo nosso).
Em que pese a utilização do documento da OCDE (2010) e do CEE (SANTA CATARINA, 2012) como referências na elaboração do PEE/SC (2015-2024), é preciso destacar que a ideia de gestão democrática apresentada na Meta 18 e suas estratégias não se restringe ao espaço escolar, pois são tratadas questões no âmbito do sistema estadual de educação, percebendo a gestão como uma política pública. Nessa direção, Souza e Pires (2018) já indicavam um avanço significativo no texto do PEE/SC (2015-2024), uma vez que, diferentemente da maioria das legislações estaduais que focalizam a gestão no âmbito da escola, o plano trata da gestão democrática do sistema de ensino.
Consideramos que o envolvimento e a participação mais ampliada de segmentos da sociedade civil na Conferência Nacional de Educação (Conae), edição de 2010 e 2014, cujas contribuições serviram como referência para a elaboração do texto do PEE/SC (2015-2024) anunciadas no introdução do texto do plano (SANTA CATARINA, 2015b), podem ter sido decisivas na compreensão da gestão democrática inscrita no PEE, que não se restringe à escola, abarca o sistema e associa o compromisso da implementação da gestão democrática com o acesso, a permanência e o êxito na aprendizagem do estudante, o que demanda outras políticas e a própria compreensão da gestão democrática como política pública.
Contudo, enfatizamos a necessidade de atenção para os rumos e os direcionamentos da educação e da gestão das escolas públicas estaduais catarinenses, a partir da adoção dos Planos de Gestão Escolar e das influências internacionais que cada vez mais estão presentes na educação e nas políticas educacionais. Nos tempos que se avizinham, é importante refletirmos sobre os avanços conquistados em quatro décadas, cujos movimentos sempre tiveram como ideais a implementação de uma gestão democrática e participativa, no âmbito das escolas públicas estaduais, propostas que devem ser preservadas em sua essência e precisam ser fortalecidas.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste artigo, buscamos refletir sobre a trajetória histórica da gestão das escolas públicas da Rede Estadual de Ensino de Santa Catarina a contar da década de 1980. Para isso, utilizamos importantes documentos, a saber: o PEE (1985-1988), o primeiro a fazer referência à gestão democrática como princípio orientador da educação e da gestão no estado; legislações estaduais que tratam da temática; a PCSC m suas diferentes versões; o PEE (2004); o estudo Avaliações de Políticas Nacionais de Educação: Estado de Santa Catarina, Brasil (OCDE, 2010); e, a partir dele, a Proposição de novos rumos para a qualidade da educação em Santa Catarina (SANTA CATARINA, 2012); o Decreto que institui os PGEs como o “novo modelo” de escolha do gestor e de gestão das escolas públicas estaduais; o boletim divulgado pelo Sinte-SC; e, por fim, o PEE de Santa Catarina (2015-2024).
A revisão bibliográfica em diálogo com a leitura dos documentos tornou possível traçar um panorama da trajetória histórica da gestão das escolas públicas estaduais catarinenses nas últimas quatro décadas, marcada por tensionamentos, pela busca por mais participação e democratização da escola e dos seus processos de gestão. Reconstituir esse percurso histórico permitiu-nos apontar o quanto essa busca envolveu os educadores, suas entidades representativas e a sociedade civil, sendo muitas as discussões e as disputas materializadas na conformação da legislação e dos documentos que foram e são referenciais importantes na educação catarinense.
Evidenciamos que as principais disputas envolveram as eleições para gestores escolares, em especial nos anos de 1980 e de 1990, que, após conquistadas por meio de lei, foram declaradas inconstitucionais, sendo a indicação como forma de escolha dos dirigentes escolares mantida por muito tempo, demonstrando que a tradição conservadora estava presente na política de gestão educacional e escolar no estado catarinense.
No que tange às influências recentes na elaboração das políticas educacionais catarinenses, em especial daquelas que tratam da gestão educacional e escolar, constatamos a influência do contexto internacional marcado pelo avanço neoliberal, pela presença dos atores hegemônicos globais, com destaque para a OCDE, que esteve em Santa Catarina em 2009. Por meio de uma série de recomendações, a OCDE propôs mudanças nas formas de gestão adotadas no Estado, as quais estão associadas aos preceitos da nova gestão pública, do gerencialismo, que concebem a educação com base em valores de mercado, modificando e ressignificando importantes princípios que integram a gestão democrática, com destaque para a participação, que passa a ser entendida como responsabilização dos atores locais. Os documentos analisados apresentam elementos que sinalizam para a influência das recomendações da OCDE (2010) e do CEE/SC (SANTA CATARINA, 2012) na origem dos Planos de Gestão Escolar, adotados a partir de 2013, como a nova forma de escolha do gestor e estratégia de governança das escolas públicas estaduais catarinenses, anunciados e proclamados como possibilitadores de uma gestão democrática, mas que podem ter sido concebidos dentro de uma outra lógica de gestão.
Já o PEE/SC (2015-2024), embora tenha se pautado no documento e nas recomendações da OCDE (2010) e do CEE/SC (SANTA CATARINA, 2012), apresenta aspectos inovadores no que diz respeito à gestão democrática, pois ela é concebida para além do espaço da escola, em nível do sistema de ensino, por meio de estratégias que demandam outras ações, o que pressupõe uma ideia de gestão democrática como política pública.
Contudo, ainda precisamos estar atentos e vigilantes para as mudanças que estão sendo implementadas no tempo presente, para a influência do contexto internacional e nacional na formulação das políticas educacionais, que, muitas vezes, trazem consigo valores que se contrapõem à gestão democrática. Sendo assim, destacamos que, apesar dos avanços, ainda há limitações para que a gestão democrática e participativa legalmente instituída e anunciada dos discursos dos novos modelos de governança se fortaleça e se materialize no âmbito das escolas públicas estaduais catarinenses. Esse é um ideal que precisa continuar no horizonte das aspirações de educadores e educadoras, enfim, de todos que acreditam nessa perspectiva de gestão como possibilitadora de uma escola pública de qualidade.
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Endereço para correspondência: Rua Sete de Setembro, 1975, 89900-000, Edifício Paulina, Apartamento 301, Centro, São Miguel do Oeste, Santa Catarina, Brasil; janetepalu@yahoo.com.br
Roteiro, Joaçaba, v. 45, p. 1-26, jan./dez. 2020 | e21265 |E-ISSN 2177-6059
1 Doutoranda em Educação pelo Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal do Paraná; Mestra em Educação pela Universidade Federal da Fronteira Sul Campus Chapecó; Especialista em Educação na Cultura Digital pela Universidade Federal de Santa Catarina; janetepalu@yahoo.com.br
2 Doutor em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul; Mestre em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul; oto.petry@uffs.edu.br
3 O artigo apresenta um recorte de capítulo da dissertação intitulada Planos de Gestão Escolar em Santa Catarina: a gestão democrática em questão, submetida e aprovada a exame de defesa em 20 de agosto de 2019 no âmbito do Programa de Pós-graduação em Educação (PPGE) da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), Campus Chapecó, Santa Catarina.