https://doi.org/10.18593/r.v44i2.17496

Os saberes docentes de professores da educação de jovens e adultos indígenas

Teaching knowledges from teachers of indigenous youth and adults education

Los saberes docentes de profesores de la educación de jóvenes y adultos indígena

Maria Alda Tranquelino da Silva1

Rede pública de Educação Básica dos municípios de Capim e Baía da Traição, Paraíba, Brasil, Professora

https://orcid.org/0000-0002-1019-4430

Eduardo Jorge Lopes da Silva2

Universidade Federal da Paraíba, Departamento de Fundamentação da Educação, Programa de Pós-Graduação em Educação, Professor

https://orcid.org/0000-0002-5402-8880

Resumo: O presente artigo é um recorte de pesquisa realizada em nível de mestrado pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal da Paraíba. Objetivou conhecer como os professores da etnia potiguara, da Baía da Traição, Litoral Norte da Paraíba, constroem seus saberes docentes para atuarem na modalidade de educação de jovens e adultos indígena (EJA) e identificar como esses saberes são mobilizados em sua prática pedagógica. Por se tratar de uma pesquisa de abordagem qualitativa, recorremos à etnografia da prática escolar (ANDRÉ, 2005) e à análise documental. Como procedimentos para a coleta de dados, foram utilizadas as seguintes técnicas: entrevista semiestruturada e observação participante. Os dados coletados foram trabalhados com base na técnica de Análise de Conteúdo, preconizada por Bardin (2011). Assim, foi possível constatar, a partir dos relatos dos professores, diversos espaços formativos que contribuem para a construção dos saberes docentes: o contato com as lideranças indígenas, com os anciões que mantêm viva a história, visitas aos locais sagrados e rodas de diálogos com os professores promovidas pela escola. Esses espaços fomentam a reflexão sobre os saberes construídos no cotidiano da escola e mantêm viva a cultura, a identidade e a tradição indígena dos povos potiguaras. Apesar disso, ainda se faz necessária a adoção de políticas de formação inicial e continuada para os professores potiguaras, no sentido de poder oferecer uma educação escolar de mais qualidade para jovens e adultos indígenas.

Palavras-chave: Saberes docentes. Prática pedagógica. EJA. Indígenas.

Abstract: This article is a research cut conducted at a master’s level, by the Post-Graduate Program in Education of the Federal University of Paraíba. The objective was to learn how teachers from the Potiguara ethnic group, from Traição Bay, in the northern coast of Paraíba, construct their teaching knowledge to work in the youth and adult indigenous education (EJA) modality and to identify how these knowledge are mobilized in their pedagogical practice. Once it is a qualitative research, we resort to the ethnography of school practice (ANDRÉ, 2005) and the documentary analysis. As procedures for data collection, the following techniques were used: the semi-structured interview and the participant observation. The data collected were based on the technique of Content Analysis, advocated by Bardin (2011). Thus, it was possible to verify, from the teachers’ reports, several formative spaces that contribute to the construction of the teaching knowledge: the contact with indigenous leaderships, the elders who keep history alive, visits to sacred sites and the dialogues promoted by the school with the teachers. These spaces foster reflection on the knowledges built in the daily life of the school and keep alive the culture, identity and indigenous tradition of the Potiguaras people. In spite of this, it is still necessary to adopt policies of initial and continuing training for Potiguaras teachers, in the sense of being able to offer a better quality school education for indigenous youth and adults.

Keywords: Teachers’ knowledge. Pedagogical practice. EJA. Indigenous people.

Resumen: El presente artículo es un recorte de investigación realizada a nivel de maestría, por el Programa de Postgrado en Educación de la Universidad Federal de Paraíba. Objetivó conocer como los profesores de la etnia potiguara, de la Bahía de la Traición, litoral norte de Paraíba, construyen sus saberes docentes para actuar en la modalidad de educación de jóvenes y adultos indígenas (EJA) e identificar cómo esos saberes son movilizados en su práctica pedagógica. Por tratarse de una investigación de abordaje cualitativo, recurrimos a la etnografía de la práctica escolar (ANDRÉ, 2005) y al análisis documental. Como procedimientos para la recolección de datos, se utilizaron las siguientes técnicas: la entrevista semiestructurada y la observación participante. Los datos recolectados fueron elaborados con base en la técnica de Análisis de Contenido, preconizada por Bardin (2011). Así, fue posible constatar, a partir de los relatos de los profesores, diversos espacios formativos que contribuyen a la construcción de los saberes docentes: el contacto con los líderes indígenas, con los ancianos que mantienen viva la historia, visitas a los lugares sagrados y ruedas de diálogos promovidos por la escuela con los profesores. Estos espacios fomentan la reflexión sobre los saberes construidos en el cotidiano de la escuela y mantienen viva la cultura, la identidad y la tradición indígena de los pueblos potiguaras. A pesar de ello, aún se hace necesaria la adopción de políticas de formación inicial y continuada para los profesores potiguaras, en el sentido de poder ofrecer una educación escolar de más calidad para jóvenes y adultos indígenas.

Palabras clave: Saberes docentes. Práctica pedagógica. EJA. Indígena.

Recebido em 9 de junho de 2018

Aceito em 6 de junho de 2019

Publicado em 05 de julho de 2019

1 INTRODUÇÃO

As práticas educativas são construções sociais oriundas, dentre outras, das experiências cotidianas do trabalho realizado com os educandos a partir do chão da sala de aula. A esse respeito, ressalta Tardif (2014, p. 38):

Os próprios professores, no exercício de sua prática de sua profissão, desenvolvem saberes específicos, baseados em seu trabalho cotidiano e no conhecimento do seu meio. Esses saberes brotam da experiência e são por ela validados. Eles incorporam-se a experiências individuais e coletivas sobre a forma de habitus e de habilidades, de saber-fazer de saber ser.

Assim, não se pode limitar a compreensão a respeito dos saberes e das práticas dos educadores apenas à formação adquirida nas universidades por intermédio da produção científica direcionada à formação profissional. É necessário compreender que o professor, em sua prática pedagógica diária, também produz conhecimentos legítimos para o exercício de sua profissão, os quais se fundamentam no trabalho constante que realiza no seu espaço de atuação: a escola.

O presente artigo é recorte de uma pesquisa, em nível de mestrado, que objetivou conhecer como os professores da etnia potiguara, da Baía da Traição, Litoral Norte da Paraíba, constroem seus saberes docentes para atuarem na modalidade de educação de jovens e adultos indígena (EJA) e identificar como esses saberes são mobilizados em sua prática pedagógica.

A pesquisa foi de natureza qualitativa, do tipo estudo de caso, uma vez que visa à descoberta, enfatiza a interpretação em contexto, busca retratar a realidade de forma completa e profunda e procura representar os diferentes e, às vezes, conflitantes pontos de vista presentes em uma situação social (LÜDKE; ANDRÉ, 2005). Ademais, encontra-se alicerçada no campo da etnografia da educação. Essa abordagem imprime as bases para a compreensão das diversas faces que envolvem os povos indígenas. O estudo, com abordagem etnográfica, pretende desenvolver vivências que aproximem o pesquisador do seu objeto de estudo. Para André (2005, p. 25),

A pesquisa etnográfica busca a formulação de hipóteses, conceitos, abstrações, teorias e não sua testagem. Para isso faz uso de um plano de trabalho aberto e flexível, em que os focos da investigação vão sendo constantemente revistos, as técnicas de coleta reavaliadas, os instrumentos reformulados e os fundamentos teóricos, repensados. O que esse tipo de pesquisa visa é a descoberta de novos conceitos, novas relações, novas formas de entendimento da realidade.

Ainda segundo André (2005), uma das contribuições dessa abordagem para um trabalho de pesquisa diz respeito à riqueza de detalhes que é possível de ser utilizada em uma investigação. A partir dessa abordagem, foi possível descrever situações, pessoas, ambientes, depoimentos e diálogos, estes reconstruídos em forma de palavras, gestos, silêncios, choro, pausas, entre outras reações que surgiram na convivência cotidiana. Todos esses elementos presentes no campo de pesquisa nos ajudaram a compreender os saberes construídos na prática didático-pedagógica de indígenas que atuam na modalidade EJA em Baía da Traição. Esse município está localizado em território indígena, no Litoral Norte paraibano, juntamente com outros dois, Rio Tinto e Marcação. Os três juntos possuem 32 aldeias e encontram-se distantes 54 km da capital do Estado, João Pessoa. Essa região conta com uma população de 25 mil indígenas (IBGE, 2010).

O lócus da pesquisa foi a Escola Estadual Indígena de Ensino Fundamental e Médio Akajutibiró (em tupi, cajú azedo ou bravo), situada na aldeia de mesmo nome.3 Como procedimento, buscamos o apoio da análise documental, e como técnicas para a coleta de dados, utilizamos a entrevista semiestruturada e a observação participante.

Para o tratamento dos dados, optou-se pela técnica de Análise de Conteúdo (AC). A esse respeito, Bardin (2011) afirma que a sutileza dos métodos da análise de conteúdo colabora para a superação da incerteza das primeiras leituras. Nesse sentido, mediante a análise, de maneira coerente e sistemática, foram examinados os objetivos propostos na pesquisa que dizem respeito aos saberes docentes dos professores indígenas da EJA em Baía da Traição.

Os sujeitos da pesquisa foram oito professores indígenas potiguaras que atuavam na modalidade em foco: cinco mulheres e três homens. As entrevistas foram realizadas no segundo semestre de 2016. Quanto à formação e ao tempo de atuação na área educacional, essas informações são apresentadas no Quadro 1.

Quadro 1 – Sujeitos da Pesquisa, Professores da EJA Indígena

Oby-Eté. Azul, em Tupi. Professor graduado em Letras, com especialização em Psicopedagogia. Na época somava 20 anos de atuação na educação. Além da EJA, na escola trabalha com outras modalidades de ensino como prestador de serviço.

Pyranga. Vermelho, em Tupi. Na época cursava graduação em Letras e atuava há cinco anos na educação, três deles na EJA.

Íuba. Amarelo, em Tupi. Professor graduado em Geografia. Na época somava 20 anos de atuação na educação, quatro deles na EJA.

Tinga. Branco, em Tupi. Professor graduado em Matemática. Na época somava seis anos de atuação na educação, quatro deles na EJA.

Oby. Verde, em Tupi. Graduado em Pedagogia. Na época somava 18 anos de atuação na educação, três deles na EJA.

Uma. Preto, em Tupi. Graduado em História. Na época somava 19 anos de atuação na educação, três deles na EJA. Também cursava licenciatura indígena, pelo Prolind.

Yby. Marrom, em Tupi. Na época cursava licenciatura indígena, pelo Prolind. Somava 10 anos de atuação na educação, três deles na EJA.

Narã. Laranja, em Tupi. Na época graduada em Letras, com 10 anos de atuação na educação, quatro deles na EJA.

Fonte: os autores.

A seguir, proceder-se-á a uma breve reflexão sobre a educação indígena e sobre a educação escolar indígena. Na sequência, serão abordados os desafios da formação para os professores indígenas e não indígenas dessa modalidade de educação e, finalmente, o foco do presente artigo, a construção dos saberes na prática docente de professores indígenas.

2 A EDUCAÇÃO INDÍGENA E A EDUCAÇÃO ESCOLAR INDÍGENA: BREVE REFLEXÃO

Segundo Nascimento (2012, p. 75), a educação indígena potiguara em Baía da Tração, PB, acontece no cotidiano das aldeias, nas atividades práticas, com os anciões, e em diversos espaços e fases da vida:

Os curumins aprendem, desde a tenra idade, com os ‘parentes’ as atitudes de preservação da natureza, de forma que os lugares da mata, das furnas, dos mananciais são sagrados porque abrigam os espíritos dos ancestrais. Preservar os recursos naturais ainda significa cuidar de si mesmo, pois o indígena sente-se parte integrante da fauna e flora, dos rios e mares, das montanhas e vales.

O cuidado e o respeito para com o Planeta são elementos significativos para a consciência ecológica e a educação dos potiguaras, sendo incorporados na sua prática diária. É importante salientar que, entre os indígenas, não existe quem saiba mais ou saiba menos. Trata-se de saberes diferentes, havendo a participação de todos no processo educativo, durante toda a sua vida. Os indígenas possuíam um modelo educacional próprio, segundo o qual se pode fazer a seguinte consideração:

os conhecimentos e técnicas sociais eram acessíveis a todos, não se notando qualquer forma de monopólio. A cultura transmite-se por processos diretos, oralmente, por meio de contatos primários no interior da vida cotidiana. E isso não apenas nas relações entre os adultos e as crianças e jovens. Em qualquer idade e tipo de relação social era possível aprender, convertendo a todos, de algum modo, à posição de mestres. (SAVIANI, 2013, p. 38).

Percebe-se, claramente, que os indígenas adotavam um modelo educacional em que os interesses se pautavam nas necessidades comuns ao grupo, realizando-se igualitariamente, de forma espontânea e integral, em vários momentos da vida.

No entanto, com a chegada dos colonizadores, esse modelo educacional deixou de existir. Grande parte da população indígena foi dizimada, sua cultura silenciada e sua identidade apagada. O genocídio impetrado pelos invasores provocou quase a sua extinção, além de os indígenas terem sido submetidos a trabalhos forçados.

Após três séculos de resistência, os indígenas ressurgem, no cenário nacional, como um grupo social que precisa ser respeitado e valorizado. Isso vale também para a área educacional. A educação escolar indígena é uma conquista que ocorreu após anos de lutas e mobilizações. Trata-se de uma modalidade de ensino que vem recebendo um tratamento diferenciado por parte dos governos federal, estadual e municipal. Ela encontra-se alicerçada em um novo paradigma educacional de respeito e valorização à interculturalidade, ao multilinguísmo e à etnicidade.

Desde a década de 1970 os movimentos indígenas vêm discutindo a necessidade de escolas que possam atender a essa população. A Constituição Federal de 1988, todavia, nos seus artigos 210 e 215, assegura, aos povos indígenas, o direito à educação diferenciada (BRASIL, 1988). No entanto, não basta apenas construir escolas nos territórios e nas aldeias, faz-se necessário também refletir acerca do tipo de escola ofertada pelo Estado e do tipo de educação escolar almejado pelos indígenas, ou seja, “[...] uma escola que faça com que o índio queira continuar a ser índio e não ficar desejando abandonar a aldeia.” (SILVA, 2007, p. 382).

O movimento indígena teve um papel fundamental na implementação da educação escolar indígena, sendo o responsável pelos primeiros passos na organização das escolas gestadas a partir das especificidades e das necessidades do público-alvo. De acordo com Silva (2007, p. 382), na implantação das escolas indígenas,

O que define e delimita essa nova fase histórica é a questão da criação e autogestão dos processos de educação escolar indígena. Essa é sua especificidade: os próprios povos indígenas discutirem, proporem e procurarem, não sem dificuldades, realizar seus modelos e ideais de escola, segundo seus interesses e necessidades imediatas e futuras. Seria, de fato, a tentativa concreta de transformar a ‘educação escolar para o índio’ em ‘educação escolar do índio’.

A educação escolar indígena é uma pauta política permanente e relevante tanto para os índios quanto para os movimentos que defendem essa causa. Deixou de ser um tema secundário e tornou-se o centro das discussões, na medida em que mobiliza diferentes atores, instituições e recursos, na construção de um modelo de escola gestada a partir dessa realidade.

Atualmente, não se discute se os índios devem ter ou não escolas nas áreas indígenas, mas, sim, o modelo de escola. Como deve ser a educação dos indígenas? Que tipo de formação é oferecida aos professores? Essas e outras questões são pertinentes e frequentes nas discussões sobre a educação escolar indígena no País.

3 O DESAFIO PARA OS PROFESSORES INDÍGENAS E NÃO INDÍGENAS

Os dados do Censo do INEP/MEC, de 2006, mostram que a oferta da educação escolar indígena cresceu 48,7%. Para atender a esse crescimento, na época, a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI) procurou garantir investimentos específicos para a formação de professores indígenas, tanto em nível médio quanto em nível superior nas licenciaturas interculturais (BRASIL, 2006). De acordo com esse mesmo Censo, “nos últimos dez anos foram formados (ou ainda estão em formação) em cursos especiais de magistério indígena cerca de 9.100 professores indígenas em quase todos os estados do Brasil.” (BRASIL, 2006). Ademais,

Os programas para o Magistério Indígena destinam-se a formar um tipo de professor que, na maior parte dos casos, já atua na escola de sua comunidade e tem pouca experiência de escolarização formal: ele sempre traz em sua bagagem um amplo domínio dos conhecimentos acumulados por seu povo, mas seu conhecimento sobre os nossos saberes acadêmicos é restrito. (MAHER, 2006, p. 25).

Aqueles que não possuem formação específica e atuam nos territórios indígenas buscam qualificação profissional em outras licenciaturas não específicas, em universidades púbicas ou privadas, uma vez que o número de vagas nas licenciaturas interculturais é insuficiente.

Nesse sentido, identificou-se que a formação de professores na educação escolar indígena também é um desafio que precisa ser superado. O professor indígena com formação em nível de licenciatura, para atuar na educação básica e nos espaços da educação superior, necessita de uma formação específica que acompanhe os princípios da escola indígena, para que de fato seja respeitado o modelo de escola almejado, e que sejam, ainda, contemplados seus saberes culturais, sua tradição e seus conhecimentos. A escola precisa incorporar pedagogias indígenas no seu processo de ensino e aprendizagem. Isso só será possível se a formação dos professores seguir a mesma linha de raciocínio e princípios que orientam a educação escolar indígena.

A esse respeito, Pimenta (2012, p. 33) afirma: “Trata-se de pensar a formação do professor como um projeto único englobando a inicial e a contínua.” Portanto, é preciso pensar não apenas na formação inicial, mas, também, em que tipo de formação continuada se deve oferecer aos professores indígenas que já estão na docência. Não é possível pensar na formação do professor no singular, como única, genérica e com um currículo aplicável em qualquer contexto. As maneiras de educar são distintas, como também são distintas as culturas. Logo, é para essa diferença que a instituição escolar e a formação ofertada aos docentes precisam estar abertas.

Em 2002, na região Nordeste, segundo o Referencial para Professores Indígenas, os professores que atuavam nas escolas dessa modalidade representavam 87,7%. Com referência ao gênero, o número de professores do sexo masculino, 52%, predominava sobre o do sexo feminino, 48%. O quadro muda quando se toma como referência os professores não índios: nesse caso, a presença feminina era de 81,6%, constituindo maioria em todas as modalidades de ensino (BRASIL, 2002).

A realidade educacional de escolaridade vivenciada pelos indígenas no Brasil repercute na docência, na qual os homens têm uma escolaridade superior à das mulheres, o que evidencia um aumento no número de professores homens em detrimento do número de professoras. Concernente à formação desses professores, as situações são diversas: certos educadores possuem magistério na modalidade normal; outros possuem magistério para atuar nas escolas indígenas, nos anos iniciais e na educação infantil; outros, ainda, possuem licenciatura em disciplinas específicas; enquanto outros estão em processo de formação, como pode ser comprovado pelo Censo Escolar Indígena (BRASIL, 2008).

Contudo, essa realidade do professor sem formação atuando em áreas indígenas ainda persiste, como se pode observar na Tabela 1 a seguir. Entretanto, não se pode deixar de reconhecer os avanços atinentes à titulação e à formação desses professores, considerando que houve crescimento na profissionalização, com a obtenção do grau de licenciatura plena.

Tabela 1 – Formação dos professores na educação indígena

Etapas

Total

Professores na Educação Indígena

Escolaridade

Fundamental

Média

Superior

Ensino Médio

Normal/Magistério

Magistério Indígena

Com Licenciatura

Sem Licenciatura

%

%

%

%

%

%

Educação Básica

10.924

2.026

18,5

2.015

18,4

3.579

32,8

1.046

9,6

2.135

19,5

123

1,5

Creche

63

16

25,4

10

15,9

31

49,2

4

6,3

2

3,2

-

-

Pré-escola

1.005

188

18,7

237

23,6

438

43,6

64

6,4

76

7,6

2

0,5

Fundamental – Anos Iniciais

4.332

936

21,6

809

18,7

1.579

36,4

456

10,5

541

125

11

0,5

Fundamental – Anos Finais

5.371

967

180

986

18,4

1.679

31,3

545

10,1

1.141

21,2

53

1,0

Ensino Médio

1.129

16

1,4

183

16,2

231

20,5

93

8,2

576

51,0

30

2,7

Fonte: Brasil (2006).

Os dados demonstram que, nos anos iniciais do ensino fundamental, 21,6% dos professores possuem ensino fundamental; 18,7%, o ensino médio; 36,4%, o ensino médio – magistério na modalidade normal; enquanto 12,5% possuem licenciaturas.

Quanto aos professores que atuam no ensino fundamental, nos anos finais, eles têm a seguinte formação: 18,0% possuem o ensino fundamental; 18,4%, o ensino médio; 31,3%, o ensino médio – magistério na modalidade normal; e 21,2% possuem licenciaturas. Dos professores do ensino médio: 1,4% tem apenas o ensino fundamental; 16,2%, o ensino médio; 20,5%, o ensino médio na modalidade normal; e 51,0% possuem licenciatura.

Os percentuais alusivos à formação dos professores no magistério indígena nas modalidades diversas são os seguintes: no ensino fundamental, anos iniciais, 10,5% dos professores possuem formação no magistério indígena; no ensino fundamental, anos finais, 10,1% e, no ensino médio, 8,2% dos professores.

Os dados apresentados demonstram, ainda, que em relação à formação profissional para atuar nos anos iniciais e finais do ensino fundamental e do ensino médio, existe um contingente de professores que não alcançou o que determina a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN n. 9394/96, Art. 62). Por outro lado, como dado positivo, constata-se o aumento no número de professores com licenciatura. Esse fator evidencia, portanto, o aumento na qualificação dos professores indígenas para atuarem nessa modalidade. Segue a análise dos dados obtidos.

4 OS DIFERENTES ESPAÇOS DE CONSTRUÇÃO DOS SABERES DOCENTES DOS PROFESSORES DA EJA INDÍGENA

A construção dos saberes docentes imprescindíveis para se trabalhar na EJA indígena ocorre a partir das relações do cotidiano da sala de aula, do contato com os colegas de profissão e com os alunos, por meio de troca de experiências nos espaços de planejamento escolar, com os anciões, e, ainda, por meio do Programa de Apoio à Formação Superior e Licenciaturas Interculturais Indígenas (PROLIND), como se constata nos depoimentos a seguir.

A gente nunca recebeu formação voltada para EJA Indígena. Eu fiz minha graduação na Universidade, mas lá a gente vê mais como trabalhar com criança; eu mesmo, faz quatro anos que estou trabalhando na EJA. Me identifico muito, mas muita coisa a gente aprendeu no dia a dia mesmo, na prática. Como eu falei, eu procuro e pesquiso [...] De início eu comecei a ver o perfil dos meus alunos, que é essencial para qualquer trabalho que você queira desenvolver [...] (Oby-Eté, grifo nosso, informação verbal).

Muita coisa a gente aprende na prática, no dia a dia e com os colegas que têm experiência, mais tempo na escola e mais tempo na profissão; tem professor que é muito criativo. Tem os planejamentos [...] Nesse momento, cada um coloca suas ideias [...] Aí vê as melhores. E todos crescem juntos porque cada um sabe de alguma coisa, e, quando não sabemos, vamos procurar quem sabe, perguntamos aos anciões da comunidade. (Pyranga, grifo nosso, informação verbal).

A gente aprende muito através de troca de experiências com os colegas, e nas pesquisas nas aulas de campo, com os anciões, a partir de algumas formações sobre educação escolar indígena que a gente já teve pelo Estado. A partir daí, eu comecei a adaptar o que eu sabia ao meu público da EJA Indígena. As formações oferecidas pelo Estado é sempre a nível geral para educação indígena, só para o ensino regular, até hoje nunca participei de uma formação voltada para EJA. (Una, grifo nosso, informação verbal).

Os depoimentos dos professores denunciam, entre outras coisas, a ausência de formação para trabalhar na EJA indígena. Esse é um fato comum à modalidade, como afirmam Arroyo (2006), Soares (2008) e Oliveira e Freire (1998). Por exemplo, no depoimento de Oby-Eté, é ressaltado que ainda existe uma lacuna no que tange à formação do professor para atuar na EJA indígena, uma realidade comum em várias regiões do Brasil, como destaca Arroyo (2006, p. 17), ao discutir sobre a formação do professor para essa modalidade.

Uma das características da EJA foi, durante muito tempo, construir-se um pouco às margens, ou ‘à outra margem do rio’ [...] a formação do educador e da educadora de jovens e adultos sempre foi um pouco pelas bordas, nas próprias fronteiras onde estava acontecendo a EJA.

Logo, a partir da constatação da ausência de formação para o professor que atua na modalidade, “a compreensão das especificidades da EJA, das necessidades e possibilidades dos seus alunos, será construída no processo de trabalho.” (VARGAS; FANTINATO, 2011, p. 4). Isso porque o ingresso de professores na modalidade sem preparação é algo recorrente, sendo necessário que eles busquem capacitação teórico-metodológica para se instrumentalizar e construir uma identidade própria de educador da EJA.

Ao fazer referência aos saberes construídos na prática pedagógica dos professores, percebe-se que, a partir do contato com seus educandos, e também com outros professores da modalidade, vão se construindo saberes para melhorar suas atividades pedagógicas. Como destaca a professora Pyranga, “Muita coisa a gente aprende na prática, no dia a dia e com os colegas que têm experiência, mais tempo na escola e mais tempo na profissão.” (informação verbal). Esses saberes dizem respeito aos saberes experienciais mencionados por Tardif (2014) e Pimenta (2012), ou seja, são aqueles obtidos no cotidiano da prática escolar de sala de aula, bem como no contato com os colegas professores mais experientes.

Logo entendemos que o processo de construção de saberes dos professores indígenas da EJA é permeado por um movimento também de ação-reflexão-ação, que busca, a partir das especificidades desse público, pensar possibilidades, estratégias e metodologias para a ação pedagógica no espaço escolar. Nesse movimento reflexivo a ação docente torna-se um espaço de aprendizagem no qual, ao ensinar, o professor também aprende e constrói saberes, como enfatiza Freire (1996, p. 23): “Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender.”

Embora se reconheçam os saberes experenciais como um elemento importante na prática pedagógica dos professores da EJA indígena, não se pode negar a importância da formação inicial e continuada para esses profissionais, uma vez que a primeira propicia ao futuro educador as “condições para o exercício da profissão docente, a partir da aquisição de saberes e competências considerados básicos para este exercício” (SILVA, 2011, p. 48), enquanto a segunda apresenta como um de seus propósitos o desenvolvimento “tanto pessoal como profissional, capaz de atender às expectativas de uma escola e de uma sociedade, em um novo contexto de informação, comunicação e interculturalidade, bem como de espaço produtivo cada vez mais complexo.” (SILVA, 2011, p. 52). No entanto, não se deve esquecer que essas experiências vivenciadas na prática por esses professores devem estar aliadas à teoria e aos conceitos que lhes possibilitem construir novos conhecimentos.

Nessa perspectiva, Alves (2010) assegura que a formação inicial e continuada precisa estar voltada para a racionalidade crítica, indo além das bases dos conhecimentos científico e cultural. A racionalidade crítica deve promover, aos atuais e futuros professores, uma formação que articule os conhecimentos científicos e os práticos, de modo que eles estejam preparados para enfrentar a complexidade do ambiente escolar e dos sistemas educativos, utilizando-se do contexto e do local de trabalho para, em um exercício de reflexão coletiva e de pesquisa e ação colaborativa, produzirem saberes necessários à superação dos problemas que afetam o trabalho e a prática docente.

Outro aspecto mencionado se faz presente na fala do professor Oby-Eté e tem relação com a valorização do perfil do educando como critério para se construir conhecimento na prática pedagógica. É certo que compreender a realidade do educando é algo muito significativo na EJA indígena, pois, a partir daí, o professor extrairá dos alunos os conhecimentos que cada um traz, afim de articular melhor os conteúdos curriculares, gerando aprendizagens significativas e contextualizadas que, segundo Freire (2011), possibilitam a inserção dos sujeitos nas discussões corajosas sobre sua realidade.

Ainda em se tratando dos saberes construídos na prática pelos professores da Educação de Jovens e Adultos indígena, verifica-se, com base nas falas dos entrevistados, que os conhecimentos informais são valorizados a partir da interação com os anciões, os quais fazem emergir a tradição e a cultura do povo potiguara. São conhecimentos tradicionais que dizem respeito à história de luta e resistência que os potiguaras tiveram de suportar para permanecer em seu território. Esses ensinamentos são repassados às novas gerações e inseridos nas práticas pedagógicas dos professores. Os anciões foram citados como figuras expressivas no processo de construção dos conhecimentos tradicionais. Seguem os depoimentos:

Entramos em campo, pesquisando, fazendo entrevistas, com o nosso povo, pais e avós, trazendo os conhecimentos deles para sala de aula. Tentamos discutir temas atuais sobre política indigenista e temas que fazem parte do cotidiano. Trazemos lideranças das aldeias [caciques] para conversar sobre algum tema, membros do Conselho de saúde indígena, anciões. Têm também outros eventos importantes na escola: a marcha cultural e a feira cultural. (Oby-Eté, grifo nosso, informação verbal).

Quando não sabemos, vamos procurar quem sabe; perguntamos aos anciões da comunidade. As experiências dos caciques, anciões, artesãos, lideranças indígenas são muito importantes; são eles que repassam esses valores que foram adquiridos através dos avós, tataravós, para manter viva a cultura indígena. (Pyranga, grifo nosso, informação verbal).

A gente pede que os alunos tragam para escola, através de pesquisas, depoimentos, os conhecimentos e as experiências dos mais velhos das aldeias, lideranças indígenas, e repassem esses valores para manter viva a cultura indígena. Não é apenas você usar um cocar e se pintar, caracterizar-se, não! Mas, você vestir de fato a garra e coragem de autodenominar indígena. (Una, grifo nosso, informação verbal).

Portanto, os anciões exercem papel importante na construção dos saberes dos professores da EJA indígena, bem como na formação das futuras gerações. Eles são os responsáveis por transmitir ensinamentos alusivos aos costumes e às tradições indígenas. De acordo com Nascimento e Silva (2012, p. 76), “[...] entre os potiguaras ocorre a valorização das pessoas idosas, aquelas que são consideradas ‘guardiões da memória’ e das tradições [...] As novas gerações são estimuladas a reverenciar os que possuem maiores experiências socioculturais.”

Os professores indígenas reconhecem os anciões como figuras importantes e detentoras de um saber cultural, por meio do qual se discutem temas ligados à saúde indígena, aos direitos, aos costumes e às tradições. Esses conteúdos são de extrema importância para fortalecer a cultura e a identidade dos potiguaras, bem como a formação do professor indígena, tendo em vista que são questões que fazem parte do seu cotidiano.

Na cultura indígena, segundo Barcellos (2012), quando o ancião potiguara fala das suas memórias, ele resgata a memória coletiva; não faz referência a si mesmo, mas aos seus antepassados. Tudo isso são conhecimentos e saberes que foram sendo acumulados na tradição oral e na cultura indígena. Tais ensinamentos fazem parte da história dos potiguaras e são acolhidos, trabalhados e valorizados pela escola como forma de manter viva a sua etnicidade e o seu protagonismo indígena.

A partir dos depoimentos dos professores comprova-se que, na cultura indígena, existem respeito e valorização dos conhecimentos que os anciões trazem consigo, por se configurarem na essência da educação indígena.

Nascimento, Silva e Barcellos (2012, p. 23) destacam que são “[...] os anciões que prudentemente perpetuam o legado étnico cultural repassado como herança pelos seus pais e avós. Pelo cultivo da tradição oral um cabedal de crenças e valores [...] junto às práticas cotidianas de cada aldeia [...]” Esses conhecimentos, transmitidos oralmente, contribuem na formação da construção dos saberes nas práticas dos professores da EJA indígena, como reconhecem nossos entrevistados.

Nesse sentido, foi possível constatar que os anciões cooperam na construção dos saberes dos professores da EJA indígena, visto que eles contribuem para a elaboração de conhecimentos inerentes à cultura e à tradição indígena. Estes, segundo os entrevistados, representam elemento importante para sua prática pedagógica, tendo em vista que muitos dos saberes repassados pelos anciões potiguara não se encontram em livros didáticos, muito menos em cursos de formação inicial e continuada para os professores. São saberes de fundamental importância para quem trabalha com um público indígena, além de serem essenciais para manter viva a história, a cultura e a tradição do potiguara da Paraíba.

Ainda em relação aos saberes dos professores, destaca-se o Prolind como mais um espaço importante de construção desses saberes. O programa contribuiu para a formação inicial dos indígenas, em nível de licenciatura. O depoimento do professor Tinga expressa como a formação contribui na construção dos seus saberes e na sua prática pedagógica.

Eu, como professor, me encontrei com minha prática no PROLIND. Trabalhar com educação indígena é mais trabalhoso, não é só trabalhar com agricultura e artesanato, mas pegar todos os aspectos e os elementos da cultura indígena e adequar aos conteúdos, fazendo uma ponte. O professor deve adaptar a EJA indígena, trazendo situações que fazem parte do cotidiano do aluno. O PROLIND ajudou a gente a ir melhorando nisso, ver outras possibilidades, sair do conteúdo só do livro. Mas em relação à EJA, não foi trabalhado nada sobre essa modalidade; eu fui adaptando à realidade dos meus alunos. (Tinga, grifo nosso, informação verbal).

Para o professor Tinga, o Prolind foi um curso importante para a sua formação profissional. Destaca que a formação ajudou a descobrir possibilidades e recursos para o ensino que vão além do livro didático. Destaca, ainda, que a partir dessa formação, foi obtendo mais clareza sobre a necessidade de relacionar os conteúdos do cotidiano do aluno com os conteúdos da escola, promovendo uma educação significativa. E enfatiza a ausência de abordagem sobre a modalidade EJA na formação dos professores.

Nesse contexto, consta-se que o Prolind teve uma importante contribuição para a formação dos professores indígenas, como um espaço que colabora na consolidação de saberes na prática pedagógica. No que diz respeito às questões relacionadas às áreas dos conhecimentos indígenas, evidencia-se que as metodologias voltadas para a valorização dos saberes dos educandos e dos elementos da cultura indígena foram de fundamental importância nessa formação. Conforme o Projeto Político-Pedagógico (PPP) do Prolind, “A Licenciatura em Educação Indígena possui uma proposta curricular ampla e flexível, com a apresentação de conhecimentos contextualizados, como forma de possibilitar condições para o enfrentamento de questões presentes no cotidiano tanto escolar como da aldeia.” (UNIVERSIDADE FEDERAL DE CAMPINA GRANDE, 2007, p. 7).

O professor Tinga demonstra que, a partir da formação, foi capaz de estabelecer uma ponte entre os conhecimentos indígenas e os conteúdos curriculares, contribuindo, assim, para fortalecer a identidade indígena potiguara.

Segundo Brito (2012, p. 3), a aprendizagem “[...] torna-se mais significativa à proporção que o conteúdo apresentado se incorpora ao conhecimento prévio de um aluno, adquirindo significado para ele.” Ainda corroborando a visão de aprendizagem significativa, Brandão (2007, p. 9) afirma: “[...] não há uma forma única nem um único modelo de educação; a escola não é o único lugar onde ela acontece.” Enquanto seres sociais, homens e mulheres estão sempre aprendendo em diversos momentos e espaços. Os indígenas potiguara vivenciam cotidianamente essas aprendizagens com a mãe natureza, nos ambientes naturais e nas relações sociais, tanto pelo contato com seus parentes indígenas quanto com os não indígenas.

A professora Îuba destaca a maneira como buscava adquirir conhecimento quando sentia dificuldade: “aqui na escola, quando eu não sabia, procurava ajuda com outro professor que fez o curso indígena, o Prolind; eles têm uma base boa na área indígena.” (informação verbal). Em seu depoimento, expressa que, embora não tenha participado dessa formação, no seu trabalho diário ela foi construindo seus saberes juntamente com os professores colegas que passaram pela formação ofertada no programa.

Tais afirmativas encontram apoio em Tardif (2014) e Pimenta (2012), ao ressaltarem que, na prática, os saberes acontecem em diversos momentos na trajetória profissional do professor, os quais não se resumem ao espaço acadêmico. Nessa mesma esteira de discussão, Barcelos (2009, p. 24-25) reforça que a formação do professor é algo que se relaciona também com a vida, ou seja,

[...] são as viagens que realizei, são os livros e revistas que li, a música que me tocou, as amizades, as paixões e amores que vivi, o ódio que senti (se senti), as conversas de que participei. Enfim, é aquilo que forma o meu acervo de conhecimentos. É o conteúdo misterioso deste baú chamado memória. Essa ligação entre o saber e a vida é que talvez faça com que seja ele – o saber – pessoal e intransferível.

Assim, os saberes docentes são construídos no cotidiano escolar, mediante várias experiências, entre elas com os colegas de profissão, os educandos na sala de aula, a comunidade escolar e a comunidade na qual está inserida a escola, além dos espaços em que, socialmente, também está inserido o professor.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

À guisa de considerações finais, evidencia-se que os professores da EJA indígena constroem saberes, em diversos espaços e de formas diversas. Tais saberes são construídos, sobretudo, no contato com os anciões, importantes no seu processo formativo. Ressalte-se que, na cultura indígena potiguara, estes mantêm viva a tradição oral, por meio da qual determinados conhecimentos ainda são transmitidos dos mais velhos para os mais jovens. Nesse sentido, os professores da EJA indígena reconhecem os anciões como sujeitos importantes na sua formação, considerando a existência de conhecimentos sobre a cultura indígena que não são encontrados nos livros, nem nas formações inicial ou continuada. São conhecimentos próprios da tradição indígena, adquiridos por meio de experiências e práticas que constituem princípios da educação indígena.

Percebe-se que o professor da Educação de Jovens e Adultos indígena, além de ampliar a sua formação em nível superior, vem construindo conhecimentos e saberes por meio das experiências que foram sendo adquiridas no seu cotidiano e no próprio chão da escola. Esses saberes são oriundos de vários espaços formativos, os quais, ao longo da sua trajetória docente, eles foram vivenciando em sua prática pedagógica cotidiana. São saberes que se constituem em um arcabouço de conhecimentos de que o professor lança mão e utiliza, a partir das necessidades, para adequá-lo à sua realidade.

Ao se fazer referência à modalidade EJA indígena, identificou-se a existência de uma lacuna na formação desses professores. Mesmo possuindo experiência docente, falta-lhes a formação própria para atuar na modalidade em foco. Em decorrência disso, esses profissionais buscam construir estratégias, metodologias e técnicas diferenciadas capazes de atender à especificidade do público que ensina.

Outro espaço de construção de saberes é o acadêmico, por meio do Prolind. Embora nem todos tenham acesso ao Programa, em razão do número reduzido de vagas ofertadas, os professores indígenas o reconhecem como um espaço importante na construção dos saberes, haja vista que os conhecimentos adquiridos nesse programa são repassados nos planejamentos pedagógicos e nas rodas de conversa por aqueles que participam dessa formação.

Conclui-se, portanto, que os saberes adquiridos na prática docente da EJA indígena acontecem em espaços coletivos que contribuem na elaboração de novas metodologias e estratégias de aprendizagem. Estas são efetivadas no exercício da prática dos professores, contemplando em seus planejamentos os saberes indígenas e os saberes científicos, desenvolvendo com rigor teórico-técnico ações que venham fortalecer a cultura, a identidade indígena potiguara e o seu protagonismo. Nesse sentido, torna-se imprescindível fomentar políticas públicas que considerem as especificidades dos sujeitos da EJA indígena, garantindo o respeito às suas particularidades e tendo como um de seus nortes a formação de professores indígenas para essa modalidade de educação.

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Endereços para correspondência: Rua Dr. Efigênio Barbosa da Silva, 229, apto 202, Jardim Cidade Universitária, 58052-310, João Pessoa, Paraíba, Brasil; aldasilvalopes@hotmail.com

Roteiro, Joaçaba, v. 44, n. 2, p. 1-20, maio/ago. 2019 | e17496 |E-ISSN 2177-6059


1 Mestre em Educação pela Universidade Federal da Paraíba; doutoranda pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal da Paraíba, linha de pesquisa Processos Ensino-Aprendizagem; Membro do Grupo de Estudos e Pesquisas Educação de Jovens e Adultos e Diversidades (GEPEJAD).

2 Doutor em Educação pela Universidade Federal de Pernambuco; Mestre em Educação pela Universidade Federal da Paraíba; Coordenador do Grupo de Estudos e Pesquisas Educação de Jovens e Adultos e Diversidade (GEPEJAD).

3 Vale ressaltar que a pesquisa foi aprovada, após ser submetida ao Comitê de Ética em Pesquisa do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal da Paraíba – Campus I.