https://doi.org/10.18593/r.v44i1.17246

A educação das relações raciais no currículo: as Licenciaturas em Geografia em Santa Catarina

The education of racial relations in the curriculum: the Licensee Courses in Geography in Santa Catarina

La educación de las relaciones raciales en el currículo: los Cursos de Licenciatura en Geografía en Santa Catarina

Joana Célia dos Passos1

Universidade Federal de Santa Catarina, Docente do Departamento de Estudos Especializados em Educação do Centro de Ciências da Educação na área de Organização de Processos Educativos e no componente curricular Diferença, Estigma e Educação

Azânia Mahin Romão Nogueira2

Universidade Federal de Santa Catarina, Pesquisadora no Grupo Alteritas – Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Diferença, Arte e Educação

Resumo: A Geografia como campo de conhecimento contribui para o empoderamento dos sujeitos para a construção de sua identidade e de seu posicionamento e atuação no mundo. Desse modo, a discussão sobre as relações raciais é essencial para a percepção da necessidade de mudanças estruturais na sociedade brasileira e para a compreensão da segregação urbana, do direito à terra e das dinâmicas sociais e econômicas da população. Considerando esses aspectos, o artigo analisa os currículos de cursos de Licenciatura em Geografia de cinco Instituições de Ensino Superior localizadas no Estado de Santa Catarina, procurando perceber de que maneira se apresentam as questões raciais nesses cursos. Considerando que as licenciaturas têm como objetivo a formação de professores da educação básica, realizamos também uma análise dos textos legais que normatizam a formação de professores no Brasil, bem como da Geografia e os que interpretam e complementam a Lei n. 10.639/03 no que se refere a sua aplicação, buscando observar a adequação dos cursos de Geografia. A partir dos dados analisados, percebeu-se que, embora a legislação atual e suas normativas curriculares tenham assimilado no corpo de seus textos as questões raciais como estruturantes e princípios educacionais, a presença de conhecimentos e a discussão sobre estas ainda são tímidas nesses cursos, que estão, em sua maioria, cumprindo o mínimo exigido pela lei.

Palavras-chave: Currículo. Educação das relações raciais. Licenciatura em Geografia.

Abstract: Geography as a field of knowledge contributes to the empowerment of individuals to construct their identity and their positioning and agency in the world. Thus, the discussion about race relations is essential for the perception of the need for structural changes in Brazilian society and to understand the urban segregation, the right to land and the social and economic dynamics of the population. Considering these aspects, the article analyzes the curricula of undergraduate courses in Geography of five Higher Education Institutions located in the State of Santa Catarina, seeking to understand how the racial issues in these courses are presented. Taking into account that these undergraduate programs aim at the qualification of teachers of basic education, we also analyze the legal texts that regulate the qualification of teachers in Brazil, as well as Geography and those that interpret and complement Law n. 10.639/03 regarding its application in order to observe the adequacy of the Geography courses. Based on the analyzed data, it was observed that although the current legislation and its curricular norms have assimilated in the body of their texts the racial issues as structuring and educational principles, the presence of knowledge and the discussion about them is still timid in these courses, which are, for the most part, fulfilling the minimum required by law.

Keywords: Curriculum. Education of racial relations. Undergraduate in Geography.

Resumen: La Geografía como campo de conocimiento contribuye con el empoderamiento de los sujetos para la construcción de su identidad y de su posicionamiento y actuación en el mundo. De este modo, la discusión sobre las relaciones raciales es esencial para la percepción de la necesidad de cambios estructurales en la sociedad brasileña y para la comprensión de la segregación urbana, del derecho a la tierra y las dinámicas sociales y económicas de la población. Considerando estos aspectos, el artículo analiza los currículos de cursos de Licenciatura en Geografía de cinco Instituciones de Enseñanza Superior ubicadas en el Estado de Santa Catarina, buscando percibir de qué manera se presentan las cuestiones raciales en esos cursos. Teniendo en cuenta que las Licenciaturas tienen como objetivo la formación de profesores de la educación básica, realizamos también un análisis de los textos legales que normalizan la formación de profesores en Brasil, así como de la Geografía y los que interpretan y complementan la Ley n. 10.639/03 en lo que se refiere a la aplicación de la misma buscando observar la adecuación de los cursos de Geografía. A partir de los datos analizados, se percibió que aunque la legislación actual y sus normativas curriculares han asimilado en el cuerpo de sus textos las cuestiones raciales como estructurantes y principios educativos, la presencia de conocimientos y la discusión sobre éstas todavía es tímida en esos cursos, que en su mayoría, cumpliendo el mínimo exigido por la ley.

Palabras clave: Currículo. Educación de las relaciones raciales. Licenciatura en Geografía.

Recebido em 14 de maio de 2018

Aceito em 9 de agosto de 2018

Publicado em 19 de março de 2019

1 INTRODUÇÃO

Para Anjos (2005, p. 176), “a geografia é a ciência do território, e o território é o melhor instrumento de observação do que está acontecendo no Brasil. Ela expõe a diversidade regional, as desigualdades espaciais e a heterogeneidade da população.” Por isso, tem grande importância como componente curricular para a educação das relações étnico-raciais e para o ensino da história e cultura afro-brasileira e africana, ao discutir os territórios, os diferentes grupos que os habitam e as espacialidades das desigualdades socioeconômicas existentes no mundo e, em especial, na sociedade brasileira, tema deste artigo.

Santos (2011, p. 11) considera que a Geografia está subliminarmente “na base da construção da ideia, das relações e dos comportamentos baseados no princípio de classificação racial.” A compreensão de Santos (2011, p. 11) é que “a visão de mundo que a Geografia constrói alicerça as identidades raciais,” e o seu ensino é um dos principais instrumentos. Assim, o autor apresenta cinco dimensões em que a Geografia influencia a percepção e a atuação dos sujeitos no mundo. São elas:

(i) Da associação entre grupos raciais e regiões (geoculturais) de origem, que dá esteio à permanência da idéia de raça; enquanto reguladora de comportamentos, valores e relações sociais, econômicas e de poder; (ii) Da divisão dicotômica do mundo (desde Ratzel) entre países desenvolvidos e subdesenvolvidos – e, no meio deles, os países “em desenvolvimento”, o que (a) reforça a idéia de uma evolução linear cujo futuro único do mundo é seguir o caminho dos chamados “desenvolvidos”, e (b) confere poder nas relações sociais aos indivíduos e grupos cuja historicidade, geograficidade e “corporeidade” são remetidos à herança e ligação com estes países e povos ditos “desenvolvidos” e, portanto, superiores; (iii) Da difusão da monocultura do tempo(espaço) linear, pela forma como se trabalha o papel da técnica como dimensão evolutiva – p. ex., na maneira como é trabalhado o conceito de paisagem, através da divisão entre “paisagens naturais” e “paisagens humanizadas”, estas últimas sendo sempre (evolutivamente) a expressão dos avanços tecnológicos sobre a materialidade terrestre. Assim, paisagens que são fruto de experiências simultâneas aparecem como sendo paisagens do passado, paisagens do presente e paisagens do futuro; (iv) Da visão do mundo contemporâneo como sendo o transbordamento de processos econômicos, políticos, sociais, militares e culturais da Europa – o que aparece com toda força na forma como se ensina sobre os outros continentes, cujos referenciais históricos e espaciais de periodização e regionalização aparecem sempre como resultantes diretos dos processos e interesses eurocentrados, portanto, como se não houvesse protagonismo neles; (v) Da difusão de uma visão tecnicista e cartesiana de mundo, p. ex., pela forma como ensinamos Cartografia. De uma forma de representação espacial, ela é transformada em única forma de expressão espacial do mundo, critério de verdade e de existências naturais e sociais, decorrente das possibilidades da racionalidade técnica subjacente ao processo de elaboração dos mapas - que são, melhor dizendo, limitados por esta racionalidade às formas científico ocidentais de ver o mundo, de expressar referenciais de espaço, de tempo e das existências sociais. Esta forma como se trabalha e ensina a Cartografia Escolar dá aos mapas oficiais um caráter de expressão da verdade que é poderoso instrumento de poder através da produção de não existências de grupos sociais, conflitos, saberes, experiências e formas de relação com o mundo. (SANTOS, 2011, p. 11-12).

Em seu entendimento, todas essas dimensões contribuem para a construção de referenciais de leitura do mundo que conferem poder a indivíduos e grupos nas múltiplas interações e relações, além de incidir fortemente nas relações raciais, no racismo e nas desigualdades raciais que se constroem e aparecem no plano das interações cotidianas entre indivíduos e grupos (SANTOS, 2011).

Considerando as perspectivas apontadas pelos geógrafos e pesquisadores anteriormente citados, analisamos os currículos de cursos de Licenciatura em Geografia de cinco Instituições de Ensino Superior localizadas no Estado de Santa Catarina, procurando perceber de que maneira se apresentam as questões raciais nesses cursos. Nosso entendimento é que a Geografia, bem como as demais ciências, é constantemente desafiada a rever seus paradigmas e métodos, o que se reflete na estruturação dos currículos dos cursos de graduação. Além disso, realizamos uma análise dos textos legais que normatizam a formação de professores no Brasil, bem como o currículo dos cursos de Geografia e os que interpretam e complementam a Lei n. 10.639/03 no que se refere a sua aplicação, buscando observar a adequação dos cursos à legislação vigente. Também é abordado o currículo na formação do geógrafo, por entendermos que os conhecimentos específicos desse campo são indissociáveis dos conhecimentos necessários ao ensino da Geografia, além de ser uma exigência das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica das Relações Étnico-Raciais e do Ensino da História e Cultura Afro-brasileira e Africana.

O currículo é aqui compreendido como um espaço de poder que corporifica as relações sociais a partir dos conhecimentos e que, por isso, é também um território político (SILVA, 1999). O papel político do currículo na formação de professores se mostra ao analisarmos os conhecimentos presentes ou ausentes nos componentes curriculares oferecidos nos cursos de licenciatura, quando se observa a colonialidade do poder/saber/ser3 na hegemonia dos paradigmas eurocêntricos4 que, embora falando de uma localização particular, assumem-se como desinteressados, universais e não situados (BERNARDINO-COSTA; GROSFOGUEL, 2016) no currículo acadêmico dos cursos de licenciatura, visivelmente identificados nos referenciais teóricos, nos conhecimentos considerados relevantes para serem estudados e nas análises sobre a realidade brasileira. Esses processos de subalternização dentro e a partir da perspectiva dos conhecimentos que foram invisibilizados, de categorias suprimidas pelo ocidentalismo e pelo eurocentrismo desvelam e expressam as malhas e o contexto em que se constituíram as diferenças e as desigualdades. Ou seja, a colonização não somente implicou a desconstrução da estrutura social, mas reduziu os saberes dos povos colonizados à categoria de crenças ou pseudossaberes sempre lidos a partir da perspectiva eurocêntrica (NOGUERA, 2014). O estabelecimento da exclusividade ocidental como referência para o debate intelectual e acadêmico institui uma “desigualdade epistemológica”, pois define status, forma opinião e exclui uma quantidade indefinida de conhecimentos.

2 A GEOGRAFIA E AS RELAÇÕES RACIAIS

A Geografia tem importante papel social no empoderamento dos indivíduos no processo de construção de sua identidade e de seu posicionamento e atuação no mundo. Assim, é necessária a discussão racial nesse âmbito, para possibilitar uma real percepção da sociedade – em particular a brasileira, na qual mais da metade da população se autodeclara negra – e suas necessidades. É importante ressaltar que a necessidade da educação das relações raciais não está somente na introdução de conteúdos até então marginalizados pela cultura escolar e acadêmica, mas também em possibilitar uma ressignificação da contribuição negra e indígena para a história nacional, auxiliando o enfrentamento das desigualdades presentes atualmente em nossa sociedade. Nesse sentido, Gomes (2007, p. 30) alerta que “a incorporação da diversidade no currículo deve ser entendida não como uma ilustração ou modismo. Antes, deve ser compreendida no campo político e tenso no qual as diferenças são produzidas, portanto, deve ser vista como um direito.”

Estudos apontam a importância, as dificuldades e as possibilidades da implantação da Lei n. 10.639/03 nos currículos das licenciaturas brasileiras. No artigo Educação Étnico-Racial e Formação Inicial de Professores: a recepção da Lei 10.639/03, Oliveira e Silva (2017) analisam a efetividade e eficácia da Lei a partir da análise crítica dos discursos de estudantes de uma turma de Licenciatura em Língua Portuguesa de uma Universidade Federal brasileira e observam as “ideologias, crenças e representações sociais sobre a educação étnico-racial” (OLIVEIRA; SILVA, 2017, p. 186) presentes neles.

Segundo os autores, a efetividade dessa Lei pode ser compreendida no “fato da norma jurídica se impor perante quem quer que seja” enquanto a eficácia se refere ao cumprimento da finalidade da Lei, solucionando o motivo pelo qual ela veio a existir, no caso, romper com a “hegemonia dos conhecimentos eurocêntricos e socialmente valorizados pela secular elite brasileira nos currículos escolares.” (OLIVEIRA; SILVA, 2017, p. 184-185). Para eles esse processo se efetiva com a descolonização e democratização dos currículos, não sendo, portanto, automático ou linear. Além disso, consideram que nos discursos analisados está em disputa a eficácia e efetividade da Lei, possibilitando diálogos nas mais diversas instâncias, em uma tentativa de combater o racismo institucional presente também nas estruturas educacionais.

Catorze anos depois da promulgação da referida Lei, ainda se faz necessária a ampliação da discussão acerca dela a partir dos currículos do ensino superior, como aponta Godoy (2017) em seu artigo A ausência das questões raciais na formação inicial de professores e a Lei 10.639/03. A pesquisadora analisa ementas, matrizes curriculares e Projetos Político-Pedagógicos de 22 cursos de Licenciatura em Pedagogia de instituições de ensino superior localizadas em 20 municípios do Estado de São Paulo, a maioria deles sendo em universidades privadas.

Godoy salienta o papel central ocupado pelos movimentos sociais na “discussão e na preposição de ações políticas voltadas para regular o racismo e o preconceito étnico-racial.” (GODOY, 2017, p. 78). Ela afirma que, na academia, o mito da democracia racial ancora-se na cultura, e, compreendendo o professor como “um agente social mediador da cultura humana e construtor de conhecimentos” (GODOY, 2017, p. 82), é imperativo que ele tenha instrumentos para promover o enfrentamento ao racismo. Para a autora, a intencionalidade tem papel fundamental no rompimento da reprodução das desigualdades raciais no âmbito escolar, considerando que “uma política materializada somente pela prescrição legal não é suficiente para promover as transformações necessárias” (GODOY, 2017, p. 89), portanto, a Lei e demais dispositivos legais são marcos importantes que devem servir de incentivo para a efetivação da equidade.

Passos (2014), em As relações étnico-raciais nas licenciaturas: o que dizem os currículos anunciados, examina a oferta de componentes curriculares que discutem relações raciais a partir da análise de projetos pedagógicos dos Cursos de Pedagogia e Licenciatura em História de 10 universidades catarinenses. Antes disso, a autora discute que as mudanças curriculares acerca das relações raciais são influenciadas por diversas frentes, lembrando-nos que a Lei n. 10.639 é resultado de uma longa luta dos movimentos negros e que, a partir do fim da década de 1970, a escola se constitui a “principal instituição para o exercício da diversidade como direito” (PASSOS, 2014, p. 174) para o movimento negro. Entre diversas ações, inclui-se a instituição de leis semelhantes à n. 10.639 de abrangência municipal e estadual em diversas localidades brasileiras desde então. Em Santa Catarina, por exemplo, a partir da década de 1990, quatro cidades incluíram a história afro-brasileira em seus currículos: Itajaí, em 1993, Florianópolis e Tubarão, em 1994, e Criciúma, em 1997. Porém, a autora aponta a baixa eficácia e eficiência dessas leis, apesar da atuação dos movimentos negros no Estado nas questões educacionais.

Passos (2014) também evidencia outra frente, no tocante ao fato de que as políticas educacionais brasileiras sofreram uma crescente intervenção de organismos internacionais a partir da década de 1990, como a Unesco, que têm a diversidade como objeto de suas resoluções. Ainda no âmbito internacional, a autora cita o fato de o País ser signatário das Resoluções da III Conferência Internacional sobre Racismo, Discriminação Racial, a Xenofobia e as Intolerâncias Correlatas, que ocorreu em Durban, África do Sul, em 2001, o que teria repercussão em diversos planos de ações para a promoção da igualdade racial, incluindo programas de ações afirmativas. E, além disso, outro fator importante destacado pela autora, é a divulgação de pesquisas, acadêmicas (especialmente a partir do fim da década de 1980) e de governo (especialmente a partir dos anos 2000), que explicitam as desigualdades na escolarização de grupos que têm sido discriminados na sociedade brasileira.

Isto posto, Passos (2014, p. 177) parte para a análise dos projetos pedagógicos, apontando que, apesar de a investigação estar limitada aos documentos, ela permite “problematizar as intencionalidades declaradas pelas instituições sobre a formação docente.” (PASSOS, 2014, p. 177). A autora aponta os principais conceitos abordados nas ementas (multiculturalismo, diversidade, identidade, diferença e etnia) e conclui que as relações raciais ainda ocupam lugares periféricos nos currículos, tanto pela generalidade da abordagem quanto pela carga horária insuficiente para as discussões.

São preocupantes os resultados das pesquisas apresentadas nos artigos que encontramos debatendo o tema, mostrando a baixa implantação da Lei e outros dispositivos legais em licenciaturas de instituições de ensino superior no País. A ausência de trabalhos que discutam o currículo das Licenciaturas em Geografia também chama atenção. Uma possível explicação é apontada por Ratts (2010, p. 128), o qual indica que as questões raciais “[têm] pouca ressonância nos debates geográficos e, em específico, no ensino de Geografia, em face do primado de certas leituras do marxismo em que a classe social é considerada a principal variável, senão única da desigualdade socioespaciais.” Dessa forma, as relações raciais desempenhariam um papel secundário nas discussões geográficas, inclusive nos debates acerca de currículo e formação docente.

Passados 11 anos da aprovação da Lei n. 10.639/03,5 que alterou a LDB n. 9.394/96, e da Resolução que instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-raciais e o Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana (DCNERER), são identificadas ausências e baixa institucionalidade na adequação dos currículos, seja nas escolas, seja nas licenciaturas, ainda que hajam recomendações específicas para as instituições de ensino superior. Mas, a que se deve essa dificuldade das instituições de ensino superior e dos cursos de licenciaturas?

Essa ausência também pode ser reflexo de uma concepção universalista de política pública, influenciada pelo mito da democracia racial e pela hegemonia de uma análise pautada na classe social sobre a realidade brasileira. A dificuldade em reconhecer as questões raciais como também estruturantes das desigualdades sociais se deve, em parte, à tênue fronteira entre “raça” e “classe”, visto que, ao identificar que os negros são geralmente os mais pobres, tende-se a acreditar que o aspecto econômico é o principal fator de desigualdade, ignorando os efeitos perversos do racismo existente na sociedade brasileira. Nessa abordagem, “as ‘classes’ e as ‘desigualdades de classe’ explicam a maioria das condutas sociais e culturais, transformando-se, assim, numa espécie de objeto sociológico total.” (DUBET, 2003, p. 26).

Nos apoiamos em Carvalho (2005) para afirmar que o “confinamento racial” a que está imerso o mundo acadêmico contribui significativamente para a baixa institucionalização de conhecimentos que possibilitem que as questões raciais sejam tratadas no currículo. Ou seja, universidades majoritariamente brancas favorecem a não observância das relações raciais. Do mesmo modo, o eurocentrismo perpetuado nas universidades e a negação de conhecimentos não legitimados pela ciência ocidental favorecem a ausência de conhecimentos sobre a África e a população negra brasileira. Uma concepção de estrutura rígida para o currículo também pode ser mais um elemento a interferir na inserção de conhecimentos para a educação das relações étnico-raciais, já que tradicionalmente não se pensa nestes durante o processo de criação de componentes curriculares.

Desse modo, o que aqui ensaiamos é discutir a necessidade da “restituição da fala e da produção teórica e política de sujeitos que até então foram vistos como destituídos da condição de fala e da habilidade de produção de teorias e projetos políticos” (BERNARDINO-COSTA; GROSFOGUEL, 2016, p. 21), na tentativa de problematizar as licenciaturas de Geografia para que assumam também a educação das relações étnico-raciais como perspectiva para a compreensão dos fenômenos globais atuais.

Nossa intenção encontra-se também em consonância com a expectativa de que o ingresso de negros e indígenas nas universidades pelas ações afirmativas possa incidir e influenciar intelectualmente os diferentes campos de conhecimentos na reversão do silenciamento de tantas vozes, em prol de uma universidade que promova um currículo antirracista.

Assim, analisamos as Diretrizes nacionais para a formação em nível superior, a Resolução CNE/MEC n. 2, de 01 de julho de 2015, as Diretrizes Curriculares para os cursos de Geografia, os projetos de cursos e ementas dos componentes curriculares oferecidos por sete Instituições de Ensino Superior de Santa Catarina que possuem o curso de Licenciatura em Geografia, procurando perceber de que maneira as questões raciais estão implicadas nos cursos. Mediante o estudo das determinações impostas pela Lei n. 10.639/03 e por outros textos legais referentes à educação das relações raciais no ensino brasileiro, também observamos se essas instituições cumprem o estabelecido.

3 AS RELAÇÕES RACIAIS NAS NORMATIVAS CURRICULARES

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n. 9.394/96) estabelece que o ensino será ministrado com base em 12 princípios, entre estes o da “diversidade étnico-racial.” (Art. 3º) (BRASIL, 1996). A inclusão desse princípio somente se dá em 2013, 10 anos após a sanção da Lei n. 10.639/03, que tornou obrigatório o ensino sobre História e Cultura Africana e Afro-Brasileira nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio. Esse fato demonstra, por certo, que houve tensionamentos no processo de formulação e negociação do texto legal.

A Lei n. 10.639/03, posteriormente ampliada por meio da Lei n. 11.645/08, é complementada por outros dispositivos, como a Resolução CNE/CP n. 1/2004 e o Parecer CNE/CP n. 3/2004 do Conselho Nacional de Educação, que instituem as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana.

A Resolução CNE/CP n. 1/2004 estabelece que essas Diretrizes Curriculares devem ser “observadas pelas Instituições de ensino, que atuam nos níveis e modalidades da Educação Brasileira e, em especial, por Instituições que desenvolvem programas de formação inicial e continuada de professores.” (Art. 1º) (BRASIL, 2004), incluindo, portanto, as instituições de ensino superior, em especial aquelas que oferecem cursos de licenciatura, objeto desta pesquisa. Nesse sentido, vale destacar que as Diretrizes Curriculares constituem-se de

orientações, princípios e fundamentos para o planejamento, execução e avaliação da Educação, e têm por meta, promover a educação de cidadãos atuantes e conscientes no seio da sociedade multicultural e pluriétnica do Brasil, buscando relações étnico-raciais positivas, rumo à construção de nação democrática. (Art. 2º). (BRASIL, 2004).

Além disso,

o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana tem por objetivo o reconhecimento e valorização da identidade, história e cultura dos afro-brasileiros, bem como a garantia de reconhecimento e igualdade de valorização das raízes africanas da nação brasileira, ao lado das indígenas, europeias, asiáticas (§ 2º). (BRASIL, 2004).

Reforçando, portanto, a ideia de que a educação das relações raciais é um direito, não apenas dos negros, mas da sociedade brasileira, objetivando uma cidadania plena e uma real democracia racial.

O Plano Nacional de Implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana é parte integrante do processo contínuo de implementação da Lei n. 10.639/03, fruto de um processo coletivo de construção a partir dos Fóruns Estaduais de Diversidade Étnico-Racial, sendo o resultado da negociação entre Estado e movimentos negros. Elaborado pela Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão do Ministério da Educação6 e pela sociedade civil tem como objetivo principal “colaborar para que todos os sistemas de ensino cumpram as determinações legais com vistas a enfrentar as diferentes formas de preconceito racial, racismo e discriminação racial para garantir o direito de aprender a equidade educacional a fim de promover uma sociedade justa e solidária.” (BRASIL, 2004, p. 23).

No que diz respeito às atribuições das instituições de ensino superior, o Plano indica as principais ações a serem efetivadas por estas, sendo três delas diretamente ligadas aos cursos de licenciatura e seus currículos:

a) Incluir conteúdos e disciplinas curriculares relacionados à Educação para as Relações Étnico-raciais nos cursos de graduação do Ensino Superior, conforme expresso no §1º do art. 1º, da Resolução CNE /CP n. 01/2004;

b) Desenvolver atividades acadêmicas, encontros, jornadas e seminários de promoção das relações étnico-raciais positivas para seus estudantes.

c) Dedicar especial atenção aos cursos de licenciatura e formação de professores, garantindo formação adequada aos professores sobre História e Cultura Afro-Brasileira e Africana e os conteúdos propostos na Lei 11645/2008;

d) Desenvolver nos estudantes de seus cursos de licenciatura e formação de professores as habilidades e atitudes que os permitam contribuir para a educação das relações étnico-raciais com destaque para a capacitação dos mesmos na produção e análise crítica do livro, materiais didáticos e paradidáticos que estejam em consonância com as Diretrizes Curriculares para Educação das Relações Étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana e com a temática da Lei 11645/08;

e) Fomentar pesquisas, desenvolvimento e inovações tecnológicas na temática das relações étnico-raciais, contribuindo com a construção de uma escola plural e republicana;

f) Estimular e contribuir para a criação e a divulgação de bolsas de iniciação científica na temática da Educação para as Relações Étnico-raciais;

g) Divulgar junto às secretarias estaduais e municipais de educação a existência de programas institucionais que possam contribuir com a disseminação e pesquisa da temática em associação com a educação básica. (BRASIL, 2004, p. 39).

A formação de professores é essencial para a aplicação real da Lei n. 10.639/03, por isso a preocupação dos dispositivos legais com relação a esse aspecto. O Plano inclui, ainda, metas e períodos para sua execução, responsabilizando atores específicos para cada uma. Com isso, a ideia parece ser garantir uma uniformidade nos avanços necessários para que a Lei seja efetivamente cumprida nas salas de aula.

As metas norteadoras e períodos de execução do Plano foram divididos em seis eixos. Existem duas metas em especial que tratam especificamente das licenciaturas e currículo do ensino superior. No Eixo 2, Políticas de Formação de Gestores(as) e Profissionais da Educação, a meta “Incluir nas licenciaturas, com destaque para o curso de Pedagogia, temas relacionados à diversidade étnico-racial em seus currículos” tem como atores o MEC, as Instituições de Ensino Superior, a Capes e o Inep, sendo considerada uma meta de curto prazo (devendo ser cumprida entre 2009-2010). Já no Eixo 3, Políticas de Material Didático e Paradidático, a meta “Incluir disciplinas e atividades curriculares relacionadas à Educação para as Relações Étnico-Raciais nos cursos de Ensino Superior, conforme expresso no § 1º do Artigo 1º da Resolução CNE/CP 1/2004” tem como atores as Instituições de Ensino Superior, também sendo considerada uma meta de curto prazo. Considerando os prazos indicados pelo Plano, todas as universidades analisadas já deveriam estar adequadas a ele e aos demais textos legais, especialmente os currículos elaborados após 2010. Na análise a seguir observamos esses aspectos.

Quando examinadas as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação inicial em nível superior de professores, destacam-se como princípios vitais para a melhoria e democratização do ensino a “liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber; [...] o respeito e a valorização da diversidade étnico-racial.” (BRASIL, 2015, p. 1). Elas apontam também a necessidade de articulação entre a formação e as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica. As disposições gerais apontam que “as instituições de ensino superior devem conceber a formação inicial e continuada dos profissionais do magistério da educação básica na perspectiva do atendimento às políticas públicas de educação” (BRASIL, 2015, p. 3), e que isso deve estar expresso no Projeto Pedagógico dos cursos. As diretrizes apontam que a formação inicial tem como princípio:

compromisso com projeto social, político e ético que contribua para a consolidação de uma nação soberana, democrática, justa, inclusiva e que promova a emancipação dos indivíduos e grupos sociais atentas ao reconhecimento e à valorização da diversidade e, portanto, contrária a toda forma de discriminação. (BRASIL, 2015, p. 4).

Isso significa dizer que os cursos de licenciatura são analisados aqui à luz das orientações legais para contemplar as questões raciais, entre outras, a partir da compreensão da valorização da diversidade como princípio. Além disso, como apontam as diretrizes, a formação inicial precisa assegurar a base comum nacional, considerando-se, portanto, a Lei n. 10.639/03.

O Art. 22 das Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação inicial em nível superior de professores declara que “os cursos de formação de professores que se encontram em funcionamento deverão se adaptar a esta Resolução no prazo de 2 (dois) anos, a contar da data de sua publicação.” (BRASIL, 2015, p. 16), ou seja, as universidades aqui analisadas deveriam estar de acordo com as determinações das diretrizes até o dia 1 de julho de 2017. Porém, no dia 10 de maio de 2017, menos de dois meses do fim desse prazo, o Conselho Pleno do Conselho Nacional de Educação aprovou o Parecer CNE/CP n. 10/2017, que ampliou esse prazo até 1 de julho de 2018 (BRASIL, 2017).

Já as diretrizes curriculares para os cursos de Geografia explicitam a posição do campo científico ao afirmar que “busca conhecer e explicar as múltiplas interações entre a sociedade e a natureza” e que deve “superar a ‘cultura da cartilha’ e para assumir a liberdade da crítica e da criação, como uma área do conhecimento que tem seu objeto específico, sem abrir mão do rigor científico e metodológico.” (BRASIL, 2001, p. 10). Apontam também, entre as competências e habilidades específicas dos formados, a capacidade de “identificar, descrever, analisar, compreender e explicar as diferentes práticas e concepções concernentes ao processo de produção do espaço”, assim sendo compreendidas também as relações raciais, e “dominar os conteúdos básicos que são objeto de aprendizagem nos níveis fundamental e médio” (BRASIL, 2001, p. 11), incluindo, portanto, a Lei n. 10.639/03.

No tocante aos conteúdos curriculares, as diretrizes para a Geografia organizam as temáticas em núcleos específicos, complementares e opções livres. No núcleo específico estariam os conteúdos “referentes ao conhecimento geográfico” (BRASIL, 2001, p. 11), em que entrariam componentes curriculares como, por exemplo, Geografia da População, Geografia do Brasil, Planejamento Urbano, Geografia Agrária, Geografia de Santa Catarina e suas correlatas, presentes em todos os currículos analisados aqui. Esses componentes curriculares potencializam os estudos sobre relações raciais, ao discutirem a formação socioespacial do País, contemplando as dinâmicas sociais que aqui existiam antes da invasão dos colonizadores e de que maneira o sistema escravagista imposto por eles se estabeleceu como a base das relações presentes até os dias atuais.

Além disso, os estudos acerca da população, levando em consideração a criação de políticas públicas, de estratégias de planejamento urbano e gestão de recursos naturais, deve ter em vista que vivemos em uma sociedade racializada em que mais da metade da população se autodeclara negra.

Haja vista que a produção acadêmica não fica restrita aos muros das universidades, a ausência de uma abordagem sobre as relações raciais no componente curricular Cartografia pode ter reflexo nas demarcações de terras indígenas e quilombolas, por exemplo. Da mesma maneira, o desconhecimento sobre as práticas culturais desses grupos também contribui para a propagação do racismo ambiental, que poderia ser combatido também nos componentes curriculares Análise Ambiental e Recursos Hídricos, por exemplo, mostrando de que maneiras as relações raciais devem se fazer presentes no núcleo específico.

O núcleo complementar inclui os componentes curriculares que “podem ser oriundos de outras áreas de conhecimento, mas não excluem os de natureza específica da Geografia.” (BRASIL, 2001, p. 12). As relações raciais também devem estar presentes aqui, especialmente nos componentes curriculares que dialogam com as Ciências Sociais, História, Ciências da Saúde, Direito, Serviço Social e Artes.

Já o núcleo de opções livres são os optativos “a serem escolhidos pelo próprio aluno. No caso da licenciatura deverão ser incluídos os conteúdos definidos para a educação básica, as didáticas próprias de cada conteúdo e as pesquisas que as embasam.” (BRASIL, 2001, p. 12). Aqui estão, portanto, os componentes curriculares da licenciatura abarcados pela Lei n. 10.639/03.

Mas, como as Licenciaturas em Geografia articulam os conhecimentos para ampliar as perspectivas de compreensão sobre a realidade brasileira, levando em conta a população negra? É o que discutimos na próxima seção.

4 OS CURRÍCULOS NOS CURSOS DE GEOGRAFIA EM SC E A EDUCAÇÃO DAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS

Santa Catarina apresenta uma rede de Instituições de Ensino Superior (IES) bastante diversa: são quatro instituições públicas federais (duas universidades e dois institutos), duas estaduais (uma universidade e uma escola de governo), três municipais (uma universidade, um centro universitário e uma faculdade), 36 privadas sem fins lucrativos (nove universidades, seis centros universitários e 21 faculdades), 47 privadas com fins lucrativos (quatro centros universitários, 42 faculdades e uma instituição especialmente credenciada para oferta de cursos lato sensu por decisão judicial) e uma faculdade cuja categoria administrativa não é informada.

Das 93 instituições de ensino superior existentes em Santa Catarina, 22 oferecem o curso de Licenciatura em Geografia, 10 na modalidade presencial, 10 a distância e duas em ambas. Para essa análise, focamos nas instituições participantes da Associação Catarinense das Fundações Educacionais7 (Acafe) e nas instituições do sistema federal de ensino. De acordo com o MEC, são 11 universidades, conforme os critérios anteriormente mencionados, que possuem cursos de Licenciatura em Geografia em atividade: Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc), Universidade do Contestado (UnC), Universidade do Extremo Sul Catarinense (Unesc), Universidade do Planalto Catarinense (Uniplac), Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul), Universidade do Vale do Itajaí (Univali), Universidade da Região de Joinville (Univille), Universidade do Oeste de Santa Catarina (Unoesc), Universidade Alto Vale do Rio do Peixe (Uniarp), Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS). Porém, três dessas instituições atualmente não oferecem o curso, segundo consulta realizada nos sites (Unoesc, UnC, Univali e Univille), e duas delas não disponibilizam as ementas ou Projetos Político-Pedagógicos em seus sites (Unisul e Uniarp). Assim, analisamos os currículos de cinco instituições: Uniplac, Udesc, Unesc, UFSC, UFFS.

A partir da análise dos currículos construímos o Quadro 1:

Quadro 1 – Componentes curriculares que incluem a discussão de relações raciais e ano do Projeto pedagógico por IES de SC

Instituição

Administração

Componentes curriculares do currículo que discutem relações raciais

Ano

Uniplac*

Privada sem fins lucrativos

Geografia da População Brasileira (2º semestre) – 60h

Políticas públicas na Educação Básica (6º semestre) – 60h

Geografia Afro-Brasileira (7º semestre) – 60h

Cultura, Diferença e Educação (8º semestre) – 60hs

2016

Udesc

Pública Estadual

Educação Inclusiva (1ª fase) – 54h

Educação das Relações Étnico-Raciais (5ª fase) – 54h

2013

UFSC

Pública Federal

Estudos-Educação dos Negros-Brasil (optativa) – 72h

2007

UFFS (Chapecó)

Pública Federal

História da Fronteira Sul (6ª fase) – 60h

2014

Unesc

Privada sem fins lucrativos (Comunitária/Filantrópica)

Sociologia (4ª fase) – 72h

2016

Fonte: os autores.

Nota: *IES signatária do Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento das Instituições de Ensino Superior (Proies).

O currículo do curso de Geografia na Uniplac, em Lages, é o que apresenta o maior número de componentes curriculares obrigatórios que, segundo suas ementas,8 discutem as relações raciais. São quatro, com 60 horas cada, todos obrigatórios, presentes no currículo elaborado em 2016, sendo um dos mais recentes, juntamente com o currículo da Unesc. O próprio curso também é um dos mais novos, tendo iniciado suas atividades em 2013. O componente curricular Geografia da População Brasileira tem em sua ementa o conteúdo Corpo e etnodemografia (UNIVERSIDADE DO PLANALTO CATARINENSE, 2016), mas não traz a discussão acerca das relações raciais de forma direta, mesmo que um dos temas principais esteja relacionado à população brasileira, majoritariamente negra, como apontado pelo Censo Demográfico de 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Além disso, a ementa apresenta os seguintes conteúdos: “População e meio ambiente; Longevidade e cadeia etária atual; Família; Engenharia genética e os novos processos de fecundação e reprodução; Novas pesquisas demográficas e o movimento social; e Prática de pesquisa” (UNIVERSIDADE DO PLANALTO CATARINENSE, 2016) em que as relações raciais ou não são abordadas, ou não se fazem relevantes a ponto de serem mencionadas na descrição do componente curricular.

Já em Geografia Afro-Brasileira são abordados os seguintes conteúdos: “Características do continente africano; Aspectos demográficos e urbanização africana; Processo de exclusão no mundo contemporâneo; Tráfico negreiro; Quilombos, comunidades e território; e Imagem geográfica construída para os trópicos da população brasileira mestiça e marginalizada.” (UNIVERSIDADE DO PLANALTO CATARINENSE, 2016). Percebe-se a intenção de abordar, em um semestre, a geografia africana e afro-brasileira desde a época da colonização até os dias atuais. É também curioso que, a partir do que apresenta a ementa, o continente africano passa a existir somente após o tráfico negreiro. A grandiosidade de assuntos desse componente curricular poderia ser em muito reduzida caso diversos desses conteúdos fizessem parte de outros componentes do currículo, como Imagem geográfica construída para os trópicos da população brasileira mestiça e marginalizada, Geografia da População Brasileira ou Quilombos, comunidades e território e Geografia Rural do Brasil, por exemplo.

Enquanto Geografia da População Brasileira e Geografia Afro-Brasileira trazem o debate específico da ciência geográfica, Políticas públicas na Educação e Cultura, Diferença e Educação trazem a vertente educacional onde a discussão racial está presente a partir da Lei n. 10.639/03, na primeira, e das teorias da etnicidade (UNIVERSIDADE DO PLANALTO CATARINENSE, 2016) na segunda. Em ambas, a discussão racial está imersa em um conjunto de assuntos, o que pode ser um impeditivo para o aprofundamento das questões, considerando a carga horária deles, que se propõem a debater assuntos diversos em 60 horas.

É relevante notar como os componentes curriculares estão distribuídos: Geografia da População Brasileira está ainda no primeiro ano do curso, e a discussão acerca relações raciais não é o foco, e os demais, a partir da segunda metade do penúltimo ano até a conclusão do curso, quando aparecem os conteúdos centrados nas relações raciais. Martins e Oliveira (2017, p. 311) apontam que o maior obstáculo à efetivação da Lei é a ausência de aportes teórico-metodológicos na formação inicial dos professores e reiteram que “leis de inclusão e políticas afirmativas quando aplicadas ao longo do processo formativo têm maiores possibilidades de mudanças de paradigmas, favorecendo a educação de cidadãos críticos e comprometidos com a justiça social” considerando as desigualdades raciais presentes na sociedade brasileira. Dessa forma, é de fundamental importância que a discussão acerca das relações raciais esteja presente durante a formação acadêmica de forma perene.

O curso de Geografia da Udesc é o segundo mais antigo do Estado, em atividade desde 1989 em Florianópolis. São dois os componentes obrigatórios de 54 horas presentes no currículo elaborado em 2013: Educação das Relações Étnico-Raciais e Educação Inclusiva, ambos localizados nas licenciaturas especificamente. Educação Inclusiva aborda os seguintes assuntos: “Práticas pedagógicas de políticas de inclusão; Aspectos éticos, políticos e educacionais na integração de pessoas marcadas por atributos identitários como: gênero, orientação sexual, raça e etnia, necessidades especiais; Uma Escola voltada ao respeito às diferenças.” (UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA, 2013).

Na quinta fase, Educação das Relações Étnico-Raciais tem como ementa:

Educação e a compreensão das Relações Étnico-Raciais no universo educacional. Diferentes perspectivas conceituais sobre educação e Relações Étnico-Raciais. Discussões sobre a natureza do ambiente escolar (Reprodução X Transformação), relacionando-as aos problemas étnicos-raciais, rotineiramente, presentes, na Educação Básica. (UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA, 2013).

Como o nome e a ementa indicam, o componente aborda aspectos educacionais, o que é muito importante para futuros professores, mas não se percebe articulação com os conteúdos do campo geográfico. O absentismo desse debate reflete-se também no Projeto Pedagógico do curso, que em nenhum momento faz menção aos dispositivos legais que regulam a formação inicial no que diz respeito às relações raciais. Buscando perceber em quais componentes curriculares presentes no currículo essas discussões poderiam estar, fomos além das ementas, observando também os conteúdos programáticos dos planos de ensino. Foi assim que encontramos, em Geografia da População (72h), o conteúdo relações étnico-raciais, oferecido na quarta fase. Já em Geografia do Brasil (72h), a escravatura é um dos assuntos do conteúdo programático, que tem como ementa “A formação sócio-espacial brasileira e suas regiões: elementos naturais, históricos, econômicos e políticos.” (UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA, 2013). Em Geografia regional II (72h), África portuguesa e África do Sul são assuntos da última unidade do conteúdo programático, que tem como ementa “A formação dos espaços periféricos mundiais: elementos naturais, históricos, econômicos, culturais e políticos.” (UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA, 2013).

Ainda assim, as ausências são notáveis em componentes como Geografia de Santa Catarina (72h), que tem como ementa “Quadro natural e quadro humano: estudo dos componentes e de suas inter-relações. Analogia/diversidade e o quadro geográfico catarinense.” (UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA, 2013), Geografia Econômica (72h), que aborda o tópico “O mercado de trabalho no Brasil: o desemprego estrutural e conjuntural” (UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA, 2013) e Geografia Urbana (72h), que tem como ementa

Origem das cidades: cidades gregas, romanas, medievais. A urbanização contemporânea. O pensamento geográfico sobre a cidade: relação cidade-campo. Os agentes produtores do espaço urbano. Hierarquia urbana e áreas de influência. A cidade e o Planejamento Urbano. Saída de campo. (UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA, 2013).

Esses componentes curriculares poderiam incluir a discussão racial, considerando a composição da população brasileira e catarinense. Chama atenção a diferença da carga horária dos componentes, pois todos aqueles do núcleo comum ao bacharelado têm no mínimo 72h, enquanto os localizados nas licenciaturas têm, em sua maioria, uma carga horária de 54h.

É também em Florianópolis que se localiza a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), com o currículo mais antigo, elaborado em 2007, e também o que parece ser o que mais precisa avançar no cumprimento das determinações estabelecidas pela Lei n. 10.639/03 e outros textos legais referentes à educação das relações raciais no ensino brasileiro. Existe apenas um componente curricular optativo oferecido pelo Departamento de Estudos Especializados em Educação, do Centro de Educação, chamado Estudos da Educação dos Negros no Brasil, de 72 horas, com a ementa “Educação, relações sociais e os negros no Brasil. Cultura e processos identitários. Escola, currículo e projetos pedagógicos para igualdade de oportunidades educacionais.” (UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA, 2006). Assim, o currículo do curso de Geografia da universidade mais antiga do Estado se exime da discussão que é fundamental para a formação integral dos geógrafos, apesar das inúmeras possibilidades de incluir o debate. Os componentes obrigatórios oferecidos durante toda a duração do curso, como Geografia da População, Geografia Rural, Geografia Urbana, Cartografia Escolar, Organização do Espaço Mundial, Geografia Regional do Brasil, Planejamento Regional e Urbano, Geografia de Santa Catarina, são espaços propícios para a discussão das relações raciais, considerando a presença da população negra e indígena no campo e cidade, nas escalas locais e globais.

O Projeto Político-Pedagógico do curso reforça a ausência percebida na matriz curricular ao não abordar as relações raciais ou os dispositivos legais supracitados. Silva (2009, p. 58), ao discutir as ausências do discurso geográfico brasileiro no tocante ao gênero, apontou que “compreender ausências, silêncios e invisibilidades do discurso científico é reconhecer que tais características não são fruto de acasos, mas de uma determinada forma de conceber e de fazer a geografia” e o mesmo pode ser observado nas relações raciais.

O currículo da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), elaborado em 2014, possui um componente curricular obrigatório de 60h, oferecido na sexta (matutino) ou oitava (noturno) fases, chamado História da Fronteira Sul, cuja ementa é

Construção dos sentidos históricos. Noções de Identidade e de Fronteira. Invenção das tradições. Processos de povoamento, despovoamento e colonização. Conflitos econômicos e políticos. Choques culturais no processo de colonização. Questão indígena, cabocla e afrodescendente. (UNIVERSIDADE FEDERAL DA FRONTEIRA SUL, 2013).

Porém, esse intento é solitário e não reverbera nos demais componentes, considerando as ementas analisadas.

O Projeto Pedagógico do Curso aponta a Resolução CNE/CP n. 001, de 17 de junho de 2004, como um dos referenciais orientadores da matriz curricular do curso; mas essa é a única menção acerca das relações raciais no PPC. A discussão racial poderia estar presente em muitos outros componentes curriculares obrigatórios, que são oferecidos em diferentes fases do curso, de forma a efetivamente refletir as determinações da Resolução, como: Geografia da População, Geografia Econômica, Introdução ao Pensamento Social, Cartografia Sistemática, Geografia Política, Geografia Rural, Fundamentos da Educação, Geografia Urbana e Didática Geral, Didática em Geografia, Geografia Cultural, Política Educacional e Legislação de Ensino no Brasil, Organização do Espaço Mundial e Geografia de Santa Catarina.

O Projeto Pedagógico do Curso (PPC) da Universidade do Extremo Sul Catarinense (Unesc), localizada em Criciúma, foi elaborado em 2016 e declara atender Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das Relações Étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Indígena ao “criar situações educativas para o reconhecimento, valorização e respeito da diversidade” mediante a

inclusão destas abordagens em diversas disciplinas, como por exemplo, Sociologia, Produção e Interpretação de Texto (PIT), Metodologia Científica e da Pesquisa (MCP), Geografia Agrária, Geopolítica e Organização do Espaço Mundial, Geografia da População, Estágio I e Fundamentos, Metodologia da Educação Inclusiva e Introdução à Arqueologia.” (UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE, 2016, p. 31).

Porém, apenas um componente obrigatório aborda relações raciais em sua ementa, o que pode apontar o lugar secundarizado que essa discussão ocupa nas demais. Sociologia, oferecido na quarta fase, com 72h, tem como ementa:

Contexto histórico do surgimento da sociologia. A sociologia como ciência. Os clássicos da sociologia. As instituições e as organizações da sociedade. Educação em Direitos Humanos. Questões sociológicas na modernidade e os novos paradigmas. Cultura Afro-Brasileira e Indígena. Meio Ambiente e Desenvolvimento. (UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE, 2016).

O PPC, ainda, aponta a realização bienal do evento Maio Negro, que é realizado há 11 anos, sendo iniciativa do Curso de História da Unesc, da ONG ACR (Anarquistas Contra o Racismo) e da Unidade Acadêmica de Humanidades Ciências e Educação (UNAHCE). Alternadamente, desde 2003, ocorre a Semana Indígena da Unesc: História e Cultura do Povo Guarani.

Embora a Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul), que oferece o curso em Tubarão e Araranguá, e a Universidade do Alto Vale do Rio do Peixe (Uniarp), que oferece o curso em Caçador, não disponibilizem as ementas dos componentes curriculares nem o Projeto Pedagógico em seus sites, considerando os títulos dos componentes, podemos concluir que não existe nenhum específico tratando sobre relações raciais em ambos os currículos.

Também parece pertinente apontar que: a) na Uniplac existe um Núcleo de Estudos Afro-brasileiro e Indígena, constituído no ano 2000, integrante do Consórcio Nacional dos Núcleos de Estudos Afro-brasileiros (Conneab), que tem um papel importante na transformação das universidades brasileira, constituindo-se como espaços de resistência e produção acadêmica; b) a Udesc também conta com um NEAB, formalmente criado em 2003 e que tem expressão nacional na produção acadêmica; c) na UFSC há o ALTERITAS: Diferença, Arte e Educação, fundado em 1996 e integrante do Conneab, e que mais recentemente assume a questão racial como linha de investigação e de extensão; e o Núcleo Interdisciplinar de Estudos Africanos e Afro-brasileiros, fundado em 2013; d) a UFFS conta com dois NEABs, ambos integrantes do Conneab, um no campus Erechim, desde 2014, e outro no campus Chapecó, onde é oferecido o curso de licenciatura em Geografia desde 2016; e na Unesc existe um Núcleo de Estudos Afro-brasileiros integrante do Conneab. O destaque que fazemos é para visibilizar às instituições que ainda apresentam limites na oferta de componentes curriculares e conhecimentos aqui analisados que os NEABs e grupos correlatos podem se constituir em parceiros potenciais na implementação da educação das relações étnico-raciais e no ensino da história e cultura afro-brasileira e africana, haja vista que possuem capital acadêmico e experiência na inserção desses conhecimentos em currículos, além de, na maioria das vezes, seus pesquisadores terem histórica inserção social em movimentos sociais negros.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A obrigatoriedade da inclusão dos conhecimentos sobre história e cultura afro-brasileira e africana no âmbito do currículo escolar representa um avanço político e pedagógico para a história da educação e da escola brasileira. Contudo, a efetivação dos dispositivos legais no currículo acadêmico depende, em grande medida, de uma compreensão sobre a construção das desigualdades raciais na sociedade brasileira e dos mecanismos que alimentam cotidianamente o racismo.

De maneira geral, apesar da existência de currículos distintos, alguns com mais componentes curriculares do que outros, as cinco universidades estão aquém do esperado considerando o definido pela legislação brasileira. É preocupante que os departamentos de Geografia em todo o Estado acreditem ser possível formar geógrafos sem discutir relações raciais de maneira incisiva, considerando a atuação do profissional, especialmente dos professores.

Falando das ausências femininas na Geografia, Silva (2009, p. 74) afirma que os conteúdos curriculares participam ativamente da construção da realidade daqueles que são formados a partir deles. A autora diz, ainda, que os planos curriculares da Geografia no Brasil, ao trataram o espaço como algo neutro, potencializam o padrão masculino nas escolhas de temáticas abordadas e também do referencial teórico.

O mesmo pode ser dito das ausências referentes a relações raciais, em que o padrão branco é potencializado e os geógrafos formados por esses currículos não têm real compreensão da sociedade brasileira.

Além dos prejuízos à formação de professores que deverão estar na sala de aula aplicando a Lei n. 10.639/03 apesar dessa defasagem, a Resolução CNE/CP n. 1/2004 deixa claro, no segundo inciso do Artigo 1º, que “o cumprimento das referidas Diretrizes Curriculares, por parte das instituições de ensino, será considerado na avaliação das condições de funcionamento do estabelecimento.” Ou seja, o descumprimento de tal medida deveria trazer algum prejuízo às instituições. Isso pode explicar o porquê de as medidas tomadas pelos departamentos serem tão tênues perante a profundidade das transformações previstas por lei. Com essa Lei, a perspectiva é não apenas a adição de conteúdos nos currículos escolares, mas uma reestruturação do ensino escolar, do modo de produção acadêmica e das perspectivas teóricas das ciências como um todo.

Silva (2013, p. 2) diz que a implantação da Lei n. 10.639/03 tem enfrentado “resistências silenciosas, mas não invisíveis, de gestores de sistemas de ensino, de diretores de escolas, de professores.” A existência de componentes curriculares somente no papel ou a completa ausência da discussão racial em licenciaturas de Geografia no Estado podem ser exemplos dessas resistências. Mas o currículo vai além do que ser apenas a seleção de conteúdos, sendo também resultado de interesses sociais, constituindo-se, portanto, em uma ferramenta que pode tanto romper quanto reproduzir as inclusões e exclusões presentes na sociedade em geral.

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Endereços para correspondência: Caixa postal 476, Campus Universitário, 88010-970, Florianópolis, Santa Catarina, Brasil; azaniarn@yahoo.com.br

Roteiro, Joaçaba, v. 44, n. 1, p. 1-24, jan./abr. 2019 | e17246 |E-ISSN 2177-6059


1 Doutora e Mestre em Educação pela Universidade Federal de Santa Catarina; https://orcid.org/0000-0001-9946-7900; http://lattes.cnpq.br/6523332944786091.

2 Mestre e Graduada em Geografia pela Universidade Federal de Santa Catarina; https://orcid.org/0000-0001-6637-9883; http://lattes.cnpq.br/0415219260796006.

3 A esse respeito consultar Quijano (2010), Mignolo (2008) e Santos e Meneses (2010).

4 “O eurocentrismo não é exclusivamente, portanto, perspectiva cognitiva dos europeus, ou apenas dos dominantes do capitalismo mundial, mas, também do conjunto dos educados sob a sua hegemonia.” (QUIJANO, 2010, p. 84).

5 Essa Lei é resultado de anos de mobilizações dos movimentos negros. Nos anos 1990 alguns estados e municípios brasileiros aprovaram e instituíram leis semelhantes. Em Santa Catarina, por exemplo, a atuação do movimento negro articulado a parlamentares resultou na aprovação da inclusão do conteúdo História Afro-brasileira nos currículos escolares em quatro municípios: Itajaí, Lei n. 2.830/93; Florianópolis, Lei n. 4.446/94; Tubarão, Lei n. 1.864/94; e Criciúma, Lei n. 3.410/97. No entanto, o pouco investimento, o não reconhecimento por parte do poder público da importância dessa política, a descontinuidade das políticas nos municípios e, por certo, a influência do mito da democracia racial fez com que essas Leis caíssem no esquecimento de gestores e educadores (PASSOS, 2008). Entretanto, entidades do movimento negro catarinense mantiveram-se formulando e desenvolvendo estudos e formação a pedido de escolas e professores que se deparavam com as questões étnico-raciais e que tinham dificuldades em construir mediações pedagógicas para estas. A esse respeito consultar Lima (2004) e Passos e Silva (2010).

6 Na época, era Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade. A partir de Decreto Presidencial assinado em 16 de maio de 2011, ela passa a ser Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (Secadi), assumindo assuntos da competência da Secretaria de Educação Especial (Seesp), que foi extinta nesse mesmo Decreto que reestruturou o Ministério da Educação (BRASIL, 2011).

7 A Acafe é uma sociedade civil sem fins lucrativos criada em 1974. Atualmente é formada por 16 instituições de ensino superior, sendo 11 universidades e cinco centros universitários, presentes em 53 cidades catarinenses.

8 A análise foi realizada a partir apenas da ementa do curso, visto que o Projeto Político-Pedagógico não estava disponível no site da instituição.