http://dx.doi.org/10.18593/r.v43i1.16857
No ano em que a Roteiro comemora seus 40 anos, preparamos um conjunto de atividades alusivas ao seu aniversário. Dentre elas, um estudo exploratório cujo objetivo foi recuperar a história do periódico científico, enquanto mecanismo estruturado e formal de comunicação e disseminação de conhecimentos. O estudo permitiu evidenciar transformações por que passou e resistências até se tornar um dos instrumentos da atualidade mais utilizados na difusão de conhecimentos acadêmico-científicos.
No percurso da aludida investigação, foi efetuado o resgate da trajetória histórica da Roteiro, desde sua criação, publicação do primeiro fascículo, tropeços, desafios e conquistas ao longo de seus 40 anos de existência. O levantamento de dados foi efetuado por uma bolsista de Iniciação Científica, estudante do Curso de Psicologia da Universidade do Oeste de Santa Catarina (Unoesc), Tailândia Guzzi Danielewicz, a quem agradecemos pelo árduo trabalho de coleta de dados e sistematização das informações.
Ao longo das edições de 2018, disponibilizaremos aos nossos leitores resultados do estudo realizado. O artigo produzido a partir dessa investigação está em processo de avaliação visando à publicação em um periódico da área da educação. Tão logo seja publicado, informaremos aos nossos leitores. Nesta primeira publicação do ano de seu aniversário, trazemos algumas informações sobre a história dos periódicos científicos, resultado de revisão de literatura. As fontes consultadas constarão do artigo completo, motivo pelo qual não as mencionaremos neste editorial. Além disso, os leitores terão acesso aos primeiros resultados do estudo empírico, que versa sobre a história da Roteiro.
A trajetória histórica do periódico científico é repleta de percalços, mas demonstra que essa ferramenta se tornou, especialmente a partir de meados do século passado, um dos mais importantes canais de registro e disseminação de conhecimentos produzidos pela humanidade. A evolução e a consolidação do periódico estão profundamente atreladas às mudanças tecnológicas, à ampliação da comunidade científica mundial e ao interesse ou não de disseminação dos conhecimentos produzidos pela ciência desde os primórdios da era moderna.
É importante lembrar ao leitor que se, atualmente, a maioria das editoras de periódicos, ao menos no Brasil, disponibilizam acesso livre e irrestrito aos artigos científicos ou a outros produtos resultantes da produção de conhecimento, como resenhas e entrevistas, é importante lembrar que, como amplamente disseminado na literatura sobre o tema, até o século XVII, apenas as elites tinham facilidade de acesso a esses saberes.
As primeiras iniciativas de comunicação aberta e oral sobre itens científicos ocorreram por meio de encontros fechados, realizadas contra a vontade da igreja e do Estado. Por esse motivo, podiam adentrar esses espaços apenas doutos e omniscientes da ciência. Foi apenas com o advento da modernidade e a consequente criação de aparatos tecnológicos, com a finalidade de atender interesses políticos e econômicos especialmente voltados à exploração marítima e à conquista de novas terras, que a criação do periódico científico se tornou um evento possível.
A história do periódico científico começa na França, no ano 1665. Sua função inicial era oferecer não somente à comunidade científica, mas também à sociedade em geral, informações acerca de estudos publicados em língua estrangeira. Desse modo, o material produzido em livros ou mesmo em grandes tratados, era transcrito para a língua nacional, facilitando o acesso a um número maior de pessoas. Pioneira no uso dessa ferramenta, a Europa Ocidental disseminou para o mundo as grandes descobertas das ciências. A publicação de um manuscrito marcava, para esses povos, a autoria de uma ideia ou de uma invenção.
No Brasil, a criação do primeiro periódico científico realizou-se em um contexto marcado pelo colonialismo de Portugal, pelo analfabetismo da população que vivia no País e pela exploração econômica do colonizador. Datado do início do século XIX, quando foram afrouxadas as amarras da política colonial portuguesa, os primeiros periódicos criados em nosso País eram comercializados junto a outros produtos, como fumo, chás e artigos em geral, em conta da proibição imperial da atividade tipográfica no País.
Influenciada por esse contexto histórico, mas também pelas dificuldades de acesso a instituições de educação superior nas regiões mais afastadas do País, a Roteiro viria a ser criada somente na segunda metade do século XXI, no ano 1978, com o intuito de fomentar a produção acadêmico-científica de estudantes e docentes dos únicos cursos da recém-criada Universidade do Oeste de Santa Catarina, a primeira em uma região completamente desassistida pela União. Compreensível pelas circunstâncias em que fora criado esse periódico, os primeiros fascículos da Roteiro tiveram como característica a dispersão temática, embora com ênfase nas áreas de conhecimento dos cursos oferecidos pela Instituição, administração, estudos sociais e pedagogia. O material publicado não possuía uniformidade em termos de normas técnicas, acadêmicas e científicas.
O caminho percorrido pela Roteiro, até conquistar alcance nacional, foi longo e, provavelmente, não muito diferente do de boa parte dos periódicos criados em nosso País. Esse caminho tem sido marcado por tensões e conflitos sobre qual o papel dos conhecimentos produzidos pela humanidade, quais instituições estão aptas a disseminá-los e quais mecanismos são mais adequados para avaliar as ferramentas que os disseminam.
De fato, com a globalização econômica, o conhecimento tornou-se ferramenta poderosa, propulsora da competitividade internacional e, não raras vezes, razão de grandes confrontos entre países. Por conta disso, o acesso aos conhecimentos produzidos nem sempre segue princípios da ampla socialização, mesmo considerando a função de alguns periódicos em regiões mais inóspitas, como muitas encontradas no Brasil. Dependendo da área de conhecimento a que se vincula, a divulgação e o acesso a esses conhecimentos tornam-se ferramentas de barganha e de conquista de privilégios econômicos e políticos por parte de países delas detentores. Essa constatação implica que, especialmente, governantes de alguns países centrais deixem de lado a soberba e compreendam que o conhecimento deve ser meio para a humanidade viver em harmonia com o Planeta e não razão de sofrimento ou causa de mazelas das populações mais vulneráveis.
Imbuídos do interesse e do desejo de uma ampla e irrestrita circulação dos conhecimentos produzidos pelos autores que colaboram com a Roteiro, convidamos leitores e simpatizantes a apreciarem os manuscritos deste número, cuidadosamente selecionados considerando o tema que dá origem ao Dossiê Organismos multilaterais e políticas públicas no cenário da educação básica e superior. Organizado pelas professoras doutoras Marilene Gabriel Dalla Corte, Rosane Carneiro Sarturi e Marília Costa Morosini, o dossiê deste número é composto por nove artigos e duas resenhas, igualmente instigantes da ação e da influência dos organismos multilaterais nas políticas públicas, nomeadamente as da educação básica e superior. Além do dossiê temático, o número também é composto por cinco artigos de demanda contínua, que abordam distintas temáticas do campo educacional.
O primeiro texto de demanda contínua, Perceções dos docentes sobre a avaliação externa das escolas em Portugal, de autoria de Joana Raquel Faria de Sousa e José Augusto Pacheco, discorre sobre as tendências nas percepções dos docentes portugueses acerca de efeitos da avaliação externa em escolas da região Norte de Portugal. A partir das análises dos dados coletados por meio de questionários a professores, os autores sugerem uma maior problematização da avaliação externa das escolas, especialmente no tocante a seus efeitos percebidos pelos docentes, sujeitos basilares da escola e de sua valorização organizacional, curricular e pedagógica.
O segundo, Avaliação e ranqueamento de universidades sob a lógica de critérios globais, de Raimunda Maria da Cunha Ribeiro, também aborda os efeitos da avaliação externa, porém no contexto universitário. A partir do objetivo de compreender o processo de avaliação de universidades e as exigências impostas a essas instituições no que se refere às mudanças na política de ensino, pesquisa, extensão e gestão, a autora, por meio de pesquisa bibliográfica e pautada em indicadores de ranqueamentos nacional e internacionais, traz à tona a competitividade e os fins mercantilistas aos quais, muitas vezes, as universidades são submetidas.
Dando sequência às discussões que envolvem a universidade, no texto Alterações recentes da educação superior: limites e perspectivas para a universidade pública, as autoras Eliane Cleide da Silva Czernisz e Lorena Dominique Vilela Freiberger, por meio de pesquisa bibliográfica e documental, reconhecem o aumento do número de instituições de educação superior e de matriculados, porém constatam que muitas das mudanças que vêm ocorrendo na universidade continuam atendendo aos interesses capitalistas.
O contexto da universidade também é abordado por Jardelino Menegat, Ricardo Antônio de Marco e Dirleia Fanfa Sarmento, no artigo Qualidade da educação superior e a responsabilidade social. Nesse trabalho, os autores refletem sobre a responsabilidade social das instituições de ensino superior, a partir da compreensão de que essa é uma das dimensões de análise do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior. Concluem que a responsabilidade social é essencial tanto para a formação dos acadêmicos quanto para a efetivação da função social das instituições de ensino superior.
Por fim, no texto Currículo e inclusão educacional: percepções de docentes da educação básica, Jacqueline Lidiane de Souza Prais, Hallison Fernando Rosa e Adriana Regina de Jesus analisam como os professores da educação básica perceberem a relação entre o currículo e a inclusão educacional. Segundo destacam, muitos docentes consideram que o currículo também influencia na efetivação ou não da inclusão.
Desejamos que o conjunto de manuscritos que integra este número seja apreciado pela comunidade acadêmica e que as leituras possam suscitar reflexões acerca das temáticas apresentadas.
Marilda Schneider
Nadiane Feldkercher
Priscila Monteiro Chaves
Roteiro, Joaçaba, v. 43, n. 1, p. 9-14, jan./abr. 2018 | E-ISSN 2177-6059