https://doi.org/10.18593/ejjl.35508
A liberdade de expressão e as restrições à propaganda eleitoral paga na mídia impresSa versus as mídias sociais digitais: um estudo da ADI 6281
Freedom of speech and restrictions on paid electoral advertising in print media versus digital social media: a study of ADI 6281
Marco Aurélio Rodrigues da Cunha e Cruz1
Jose Luis Bolzan de Morais2
Adriana Martins Ferreira Festugatto3
Resumo: Objetiva-se examinar a Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 6281, que versou sobre a liberdade de expressão e as restrições espacial, temporal e quantitativa da propaganda eleitoral paga em veículos de comunicação impressa e na Internet. A questão jurídica de fundo é a isonomia dos postulantes na disputa eleitoral ante o binômio direito à informação/liberdade de expressão. O problema de pesquisa é: quais as premissas e/ou os argumentos desenvolvidos na ADI 6281 sobre as restrições à propaganda eleitoral paga como manifestação da liberdade de expressão? Adotou-se uma metódica reconstrutiva dos principais argumentos suscitados na ADI 6281. A partir dos argumentos da peça inicial proposta pela Associação Nacional dos Jornais, realizou-se o cotejo com as razões de direito que fundamentaram a decisão do Supremo Tribunal Federal. As principais conclusões dos votos da maioria do Tribunal Pleno indicam que tais restrições não comprometem a liberdade de expressão dos candidatos nem a liberdade de imprensa, pois a propaganda eleitoral é vista como um produto comercializável, não como atividade jornalística. Além disso, as restrições promovem a pluralidade e igualdade nos anúncios, contribuindo para a diversidade político-partidária e devem ser baseadas em princípios de direito público para o fortalecimento da democracia, sem se submeter aos interesses comerciais privados.
Palavras-chave: liberdade de expressão; liberdade de imprensa; mídias sociais; propaganda eleitoral paga; restrições.
Abstract: This text aims to examine Direct Unconstitutionality Action n. 6281, which dealt with freedom of expression and the spatial, temporal and quantitative restrictions of paid electoral propaganda in printed media and on the Internet. The fundamental legal issue is the equality of the candidates in the electoral dispute before the binomial right to information/freedom of expression. The research problem is: what are the premises and/or arguments developed in ADI 6281 regarding restrictions on paid electoral advertising as a manifestation of freedom of expression? A reconstructive method was adopted for the main arguments raised in ADI 6281. Based on the arguments in the initial piece proposed by the National Newspaper Association, a comparison was made with the legal reasons that supported the Federal Supreme Court’s decision. The main conclusions of the votes of the majority of the Full Court indicate that such restrictions do not compromise the candidates’ freedom of expression or freedom of the press, as electoral propaganda is seen as a marketable product, not as a journalistic activity. Furthermore, restrictions promote plurality and equality in advertisements, contributing to political-party diversity and must be based on public law principles to strengthen democracy, without submitting to private commercial interests.
Keywords: freedom of expression; freedom of the press; social media; paid electoral advertising; restrictions.
Recebido em 29 de agosto de 2024
Aceito em 06 de dezembro de 2024
Introdução
Em tempos de desordem informacional (Wardle; Derakhshan, 2017) mais do que nunca a liberdade de expressão, a liberdade de imprensa e o direito à informação têm sido pautas frequentes de preocupações e projeções científicas, normativas e jurisprudenciais. Tais bens constitucionais ganham ainda mais destaque quando o assunto desborda para a legislação eleitoral, pois a proteção à formação da vontade do eleitor, medidas contra o abuso do poder econômico (art. 14, § 9º, CF/884) e a isonomia de meios para a disputa entre candidatos são vetores ao modelo de democracia representativa nacional.
Neste contexto, além de oportuno é altamente relevante o estudo sobre a constitucionalidade das restrições espacial, temporal e quantitativa da propaganda eleitoral em veículos de comunicação impressa decidida pelo do Supremo Tribunal Federal (STF) na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 6281 (ADI 6281, r). Proposta pela Associação Nacional dos Jornais (ANJ), esta ação oportunizou que o STF interpretasse uma normativa específica da Lei eleitoral que tematiza a propaganda eleitoral: os arts. 43, caput, e 57-C, caput e §1°, I da Lei n. 9.504/97 e, por arrastamento, os artigos da Resolução TSE nº 23.551/17 que à época conferiam regulamentação àqueles (revogada pela , com atual . Estes dispositivos normativos foram impugnados tendo como parâmetros de controle os direitos constitucionais à liberdade de expressão, à liberdade de imprensa, à livre inciativa e ao pluralismo. A questão jurídica fundamental é a igualdade dos candidatos na disputa eleitoral perante o binômio direito à informação/liberdade de expressão, de modo que o problema de pesquisa é: quais as premissas e/ou os argumentos desenvolvidos na ADI 6281 sobre as restrições à propaganda eleitoral paga como manifestação da liberdade de expressão?
O objetivo deste texto é reconstruir a linha argumentativa decisória da ADI 6281 em três partes, a partir de uma metódica analítica. A justificativa de eleição metodológica decorre do modelo seriatim de deliberação procedimental (Steinmetz; Freitas, 2014), utilizado nos Tribunais de segundo grau e superiores (e não o per curiam), no qual se contabiliza os votos individuais de cada ministro, marcado pela individualidade de convencimento5 sobre os fundamentos normativos e empíricos. Em uma decisão tão apertada e relevante como a tematizada, é conveniente proceder críticas sobre a linha de raciocínio lógico seguida, por versar sobre votos extensos e com ampla capacidade de discussão geral e argumentos desenvolvidos sobre a propaganda eleitoral como manifestação da liberdade de expressão. Uma justificativa da importância da complexidade de temas levantados neste julgado (e apesar de compor o obter dictum) pode ser lida no questionamento feito no voto do Min. Gilmar Mendes: “A permissão inaugurada pelo Legislador, em 2017, de facultar o gasto com impulsionamento de conteúdo, pode ser considerada responsável pela divulgação massiva e sistemática de notícias falsas ocorrida na eleição geral de 2018?”
O Informativo 1044/2022 do STF (Brasil, 2022) reproduziu este julgamento em apenas quatro parágrafos:
São constitucionais as restrições, previstas na Lei das Eleições (Lei 9.504/1997, arts. 43, caput, e 57-C, caput e § 1o), à veiculação de propaganda eleitoral em meios de comunicação impressos e na internet.
Considerando-se que o pagamento das propagandas eleitorais no Brasil se dá atualmente com recursos públicos, na ampla maioria dos casos, então a regulamentação da propaganda eleitoral está mais direcionada para a forma do gasto do Fundo Eleitoral do que propriamente para disciplinar a liberdade de expressão. Trata-se de uma opção política do legislador sobre onde e como devam ser gastos recursos públicos.
Ademais, as diretrizes relativas à propaganda eleitoral voltam-se à realização de princípios próprios, tais como a paridade de armas entre os candidatos e a preservação das eleições, pondo-os a salvo do abuso do poder econômico, sempre disposto a influir no resultado das urnas.
Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, julgou improcedente o pedido formulado em ação direta. Vencidos os ministros Luiz Fux (presidente e relator), Edson Fachin, Roberto Barroso e Cármen Lúcia, que o julgaram procedente, e, em menor extensão, o ministro André Mendonça, que o julgou parcialmente procedente.
Em maioria de seis a quatro (6x4), decidiu-se que são constitucionais as restrições previstas na Lei das Eleições (Lei 9.504/1997, arts. 43, caput, e 57-C, caput e § 1º) à veiculação de propaganda eleitoral em meios de comunicação impressos e na internet, prevalecendo a divergência inaugurada pelo Min. Nunes Marques. O argumento vencedor foi que o pagamento das propagandas eleitorais no Brasil dá-se atualmente com recursos públicos, na ampla maioria dos casos, e a regulamentação da propaganda eleitoral está mais direcionada para a forma do gasto do Fundo Eleitoral do que propriamente e para disciplinar a liberdade de expressão. O cômputo dos votos foi o seguinte:
ADI 6281 |
||
Procedente |
(1) Luiz Fux (rel.), (2) Cármen Lúcia, (3) Edson Fachin, (4) Roberto Barroso. |
declarar a inconstitucionalidade do art. 43, caput, da Lei nº 9.504/1997, reputando nulas as restrições à propaganda eleitoral paga na imprensa escrita e na reprodução na internet do jornal impresso; atribuir interpretação conforme a Constituição ao art. 57-C, caput e § 1º, I, da Lei nº 9.504/1997 para admitir a propaganda eleitoral paga na internet em sítios eletrônicos de toda e qualquer organização econômica que produza, veicule ou divulgue notícias; e declarar a inconstitucionalidade, por arrastamento, dos artigos 24, caput e § 1º, inciso I, e 36 da Resolução TSE nº 23.551/2017; |
Parcialmente |
(1) André Mendonça |
declarar a inconstitucionalidade da expressão “escrita, e a reprodução na Internet do jornal impresso” constante nos arts. 43, caput, da Lei 9.504/1997, 36 da Resolução TSE 23.551/2017 e 42 da Resolução TSE 23.610/2019; declarar a omissão parcial pelo Congresso Nacional nos referidos atos normativos no sentido de normatizar restrições espaciais aos periódicos exclusivamente eletrônicos, que obtenham fins regulatórios equivalentes as já existentes em relação ao jornal impresso, propondo, enquanto não sanado esse ato omissivo, delegar ao Tribunal Superior Eleitoral a incumbência para regular a matéria, com amparo nos arts. 23, IX, do Código Eleitoral, e 57-J da Lei das Eleições. |
Improcedente |
(1) N.Marques (red.) (2) A. de Moraes, (3) Dias Toffoli (4) Gilmar Mendes, (5) Rosa Weber, (6) R. Lewandowski; |
declarar a constitucionalidade dos dispositivos impugnados |
Na primeira parte do estudo, procede-se a uma análise das razões apresentadas pela ANJ, autora da ação. Na segunda, são apontadas as questões de direito em disputa, para identificar e depurar fundamentos normativos implicados. Na terceira, a atenção se volta para as razões jurídicas invocadas pelo STF, inclusive sobre os pontos divergentes internamente, para clarificar os fundamentos mais relevantes que sustentaram a ratio decidendi. Na última parte, por meio de uma análise documental, objetiva-se uma crítica das circunstâncias descritas e da decisão final, para com o estudo da ADI 6281 concluir com 4 (quatro) contributos: 1) sistematização argumentativa (já que o nosso modelo de deliberação judicial é o seriatim); 2) superação do ônus argumentativo da posição preferencial da liberdade de expressão; 3) a superação do the three part test (teste de três partes) das restrições à esta liberdade, suscitado desde o primeiro relatório E/CN.4/1995/32 (UN, 1994) do painel da relatoria especial de promoção e proteção da liberdade de expressão e opinião da Organização das Nações Unidas, cujo cometido procedeu uma interpretação genética do artigo 19 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos; 4) a correlação do decidido com os dados dos gastos crescentes declarados com impulsionamento nas redes sociais nas últimas eleições majoritárias.
1 A tríade argumentativa da peça inicial
Em dezembro de 2019 a AJN propôs a ADI 6281, aparelhada com medida cautelar, com o objetivo de que o STF declarasse a inconstitucionalidade do art. 43, caput, e ainda, a fixação de interpretação conforme a Constituição Federal do art. 57-C, caput e §1º, inciso I, da Lei n. 9.504/97. Alegou-se um processo de inconstitucionalização de tais dispositivos: que as normas restritivas da propaganda eleitoral no jornal impresso são de 2009, “época em que as redes sociais, ainda incipientes, possuíam papel bastante reduzido no universo político-eleitoral”, e que não se coadunavam mais com a realidade digital atual. A principal tese é que “[...] não faz mais sentido limitar propagandas em jornais impressos, tampouco em sítios eletrônicos de empresas que divulgam notícias, se, para outros veículos que utilizam exclusivamente a internet, as regras são substancialmente diversas e mais permissivas”.
Sustentou-se que as restrições temporal, quantitativa e espacial do caput do art. 43 da Lei 9.504/1997 (redação dada pela Lei nº 12.034, de 2009) tiveram a finalidade de enfrentar o exercício do abuso do poder econômico e fomentar a igualdade entre os candidatos. Em tais dispositivos, há previsão da propaganda eleitoral paga em veículos de comunicação impressa. Contudo, há restrição na antevéspera do pleito eleitoral (temporal) com o número de até 10 (dez) anúncios (quantitativa), além de limitar o espaço máximo, por edição, de ⅛ (um oitavo) de página de jornal padrão e de ¼ (um quarto) de página de revista ou tabloide (extensão/espaço).
A lei pretendeu, pois, o equilíbrio: por não haver limitação de gastos eleitorais e com o quadro de escassez de espaço nos periódicos impressos, poucos candidatos com maior capacidade financeira e de influência poderiam ser beneficiados em detrimento de outros. Ao regular sobre as restrições temporal, quantitativa e espacial nos veículos de comunicação impressos, o dispositivo objetivou que o maior número possível de postulantes eleitorais pudesse veicular anúncios/mensagens de diferentes candidatos cujo destino é os eleitores. O fundamento é de isonomia, pois a visibilidade junto ao eleitorado é um dos motes dos candidatos.
Entretanto, estas restrições datam de 2009 e a mídia impressa e profissional passou por alterações e os meios virtuais de comunicação se avolumaram. O consumo de conteúdo jornalístico e informativo teria sido alterado. A forma de acesso e a disponibilidade da informação foram transformadas pelas tecnologias de informação e comunicação. A pluralidade de fontes de acesso à informação e a comunicação direta dos eleitores com os candidatos conformam um cenário que não mais justificaria a opção regulatória formalizada nas aludidas restrições. Os argumentos da requerente para defender esta tese jurídica podem ser divididos em: libertário, mercantil e pluralismo6, mediados pelos “critérios de razoabilidade e proporcionalidade” e da igualdade (paridade de armas).
Com argumento libertário, enfatizou-se a posição preferencial da proteção da liberdade de expressão stricto sensu, a importância da liberdade de imprensa e a liberdade de informação (art. 5º, IV, IX, XIV e 200, caput, e §§1º, 2º e 3º, CF/88) como pilares de uma cidadania participativa. Destacou-se, ainda, o papel estratégico da liberdade de imprensa contra a desinformação. Reclamou-se a inconstitucionalidade do art. 43, caput, bem como a interpretação do art. 57-C, caput e §1°, I, da Lei n. 9.504/97, a partir de um “ambiente deliberativo potencialmente ativo e informado, mais apto a assegurar que a condução da coisa pública expresse a real vontade do povo.”
Com o uso da internet como fonte de informação, a requerente defendeu que não mais seriam legítimas as restrições de propagandas em jornais impressos, tampouco em sítios eletrônicos de empresas jornalísticas que divulgam notícias (art. 57-C, caput e §1°, I, da Lei n. 9.504/97), pois os veículos de mídias digitais que utilizam exclusivamente a internet têm regras distintas e mais tolerantes. Com a hipotética mudança substancial do quadro fático e com a possível anacronia da concepção jurídica geral, seriam irrazoáveis e desproporcionais as restrições (temporal, quantitativa e espacial) que incidem somente para os veículos de comunicação impressa e conformam censura, em violação aos seguintes dispositivos: os incs. IX e XIV do art. 5º, bem como art. 220, caput, §§1°, 2° e 3° da Constituição Federal de 1988 (CF/88). Haveria, ainda, uma disparidade de tratamento não fundamentada em norma constitucional, vulneradora da igualdade.
O argumento do pluralismo sustenta que numa democracia os espaços de discussão hão de permitir o confronto de ideias entre os postulantes, com a finalidade de contribuir para a formação da opinião dos eleitores. Com a diversidade de pontos de vista, a imprensa seria um dos principais locais para os fóruns de deliberação e informação desse processo. “Na perspectiva dos candidatos a cargos eletivos, é de se notar que a propaganda é a forma por excelência para que manifestem suas opiniões e dialoguem com os seus potenciais eleitores”. Nesse sentido, a restrição à circulação de informação abalaria a formação da convicção dos eleitores e o próprio pluralismo político, disposto no art. 1º, caput e inc. V, CF/88.
O argumento mercantil foi construído na livre iniciativa e na livre concorrência entre os meios de comunicação impressos e digitais. A proteção das liberdades de expressão e imprensa corresponde a ter recursos materiais para garantir os veículos de comunicação. A liberdade concorrencial pressupõe o direito de publicar propagandas eleitorais pagas, sem restrições. Não poderia, pois, haver uma predileção nas regras eleitorais de alocação de recursos financeiros nas mídias sociais digitais, pois os veículos de comunicação produzem conteúdos jornalísticos impressos e adotam versões digitais de suas publicações. Na internet, há possibilidade jurídica de realizar o impulsionamento de conteúdos nas redes sociais dos candidatos, mas, também na internet, há restrições à propaganda paga para os veículos jornalísticos. Esta circunstância geraria, logo, um desequilíbrio concorrencial, com prejuízo aos veículos jornalísticos tradicionais. Haveria, portanto, afronta à livre concorrência e à isonomia dos meios de comunicação impressos e eletrônicos.
Para a AJN “a propaganda eleitoral, como qualquer outra forma de propaganda, também é (iii) ferramenta essencial para viabilizar o financiamento – e, por conseguinte, o próprio funcionamento – dos veículos de comunicação”. Para não haver desequilíbrio comercial-concorrencial, as regras eleitorais não poderiam ter estímulos para alocar recursos nas mídias eletrônicas em detrimento dos veículos de comunicação produtores de conteúdos jornalísticos impressos e que também (re)produzem seus conteúdos em versões eletrônicas. Como os candidatos têm liberdade de expressão política, as restrições impostas aos veículos de comunicação “farão com que os candidatos migrem seus recursos, de forma mais célere, para outras espécies de propaganda ou eventos de campanha, em especial para as redes sociais (...).” Esta situação vislumbraria uma disparidade e uma violação à liberdade concorrencial (arts. 1º, IV e 170, IV, e art. 5°, CF/88), pois “a proibição da veiculação de qualquer tipo de propaganda eleitoral paga na internet em sítios de empresas que veiculam notícias jornalísticas, com favorecimento injustificável de outras pessoas jurídicas, que arrecadam milhões com o impulsionamento de conteúdo”.
Por fim, a (i) vedação ao financiamento de campanhas por pessoas jurídicas e a (ii) criação de um teto de gastos eleitorais configurariam a desnecessidade do vigor do art. 43, caput, e do art. 57-C, caput e §1º, inciso I, da Lei n. 9.504/97, seriam mais adequadas às finalidades de enfrentamento do exercício do abuso do poder econômico e promoção da igualdade entre os candidatos, pois menos gravosas ao pluralismo (democracia), às liberdades de expressão, de imprensa, de informação, de iniciativa e de concorrência.
2 O direito em disputa
O objeto da ADI está nos artigos da Lei n. 9.504/97:
Art. 43. São permitidas, até a antevéspera das eleições, a divulgação paga, na imprensa escrita, e a reprodução na internet do jornal impresso, de até 10 (dez) anúncios de propaganda eleitoral, por veículo, em datas diversas, para cada candidato, no espaço máximo, por edição, de 1/8 (um oitavo) de página de jornal padrão e de 1/4 (um quarto) de página de revista ou tabloide. (...)
Art. 57-C. É vedada a veiculação de qualquer tipo de propaganda eleitoral paga na internet, excetuado o impulsionamento de conteúdos, desde que identificado de forma inequívoca como tal e contratado exclusivamente por partidos, coligações e candidatos e seus representantes.
§ ١º É vedada, ainda que gratuitamente, a veiculação de propaganda eleitoral na internet, em sítios:
I - de pessoas jurídicas, com ou sem fins lucrativos;
Deixa-se aqui de fazer maiores referências aos dispositivos infralegais da Resolução do TSE atacados, pois foi requerido aditamento à exordial, em fevereiro de 2020, para impugnar os artigos 29, caput, §1º, I, e 42 da Resolução TSE 23.610/2019 (modificada a época pelo advento da Resolução TSE 23.671/2021). Posteriormente ao julgamento, os dispositivos foram alterados pela atual redação dada pela Resolução nº 23.732/2024.
Já no que concerne aos paradigmas normativos de controle de constitucionalidade, convém cingi-los sob a tríade de argumentos já exposta:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
[…]
IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;
[…]
XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional;
[…]
Art. 220 A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo, não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição
§ ١º Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV.
§ ٢º É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.
§ ٣ºCompete à lei federal:
I - regular as diversões e espetáculos públicos, cabendo ao Poder Público informar sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada;
II - estabelecer os meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto no art. 221, bem como da propaganda de produtos, práticas e serviços que possam ser nocivos à saúde e ao meio ambiente.
[...]
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
[...]
V - o pluralismo político.
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
[...]
IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
[...]
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes [...]
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
[...]
IV – livre concorrência;
Ainda que a afronta aos critérios da proporcionalidade e da razoabilidade tenham sido tratados em tópico separado, inclusive com indicação de paradigma normativo (arts. 1º e 5º, LIV, CF/88), nesse trabalho entendeu-se que esta fundamentação foi transversal e absorvida pelos demais argumentos.
Quanto ao pedido da ADI 6281, registra-se textualmente:
[...]
(i) declarada a inconstitucionalidade das restrições impostas pelo caput do art. 43 da Lei nº 9.504/97 às propagandas eleitorais pagas realizadas em veículos impressos tradicionais, ante a incompatibilidade das restrições temporal (“até a antevéspera das eleições”); espacial (“no espaço máximo, por edição, de 1/8 (um oitavo) de página de jornal. padrão e de 1/4 (um quarto) de página de revista ou tabloide”); e
quantitativa (“até 10 (dez) anúncios de propaganda eleitoral, por
veículo, em datas diversas”) com a Carta de 1988, sem que haja
repristinação de normas com restrições similares à revogada pela
declarada inconstitucional
(ii) fixada interpretação conforme a Constituição ao art. 57-C, caput e §1º,
inc. I, da Lei nº 9.504/97, de modo a afastar a incidência da proibição
da veiculação de qualquer tipo de propaganda eleitoral paga na internet
em sites de toda e qualquer organização econômica que produza,
veicule e/ou divulgue notícias voltadas ao público brasileiro, por
qualquer meio de comunicação, impresso ou digital, em conformidade
com os dispositivos constitucionais elencados ao longo da exordial; e
(iii) declarados inconstitucionais, por arrastamento, os arts. 24, caput e §1º,
inciso I, e 36 da Res. TSE nº 23.551/17, na medida em que
reproduzem as normas legais acima indicadas, ou qualquer outras que
venham a substituí-las
O objetivo principal é apurar se esses argumentos encontram enfrentamento nas razões jurídicas da decisão do STF. A seguir são elencadas as premissas dos votos condutores (relator e divergência), além de agregar partes de votos de outros ministros, considerados como reforço argumentativo da linha de raciocínio.
3 Razões jurídicas
O relator, Min. Luiz Fux - prevento em virtude da ADI 4352 pela qual vários dispositivos da Lei das Eleições foram impugnados por um partido político - registrou seu entendimento pela prevalência do caráter instrumental da liberdade de expressão no plano político, já que sua finalidade é ampliar e qualificar o debate público. Constou ainda que a calibragem nas liberdades comunicacionais em virtude da proteção do eleitorado deve dar-se, primordialmente, contra as denominadas fake news e o abuso de poder econômico ou político, e nesse sentido, foi pela procedência do pedido. Foi o seu voto vencido, formando a minoria com os Ministros Edson Fachin, Roberto Barroso e Cármen Lúcia. Serão ilustradas as razões jurídicas invocadas, enfatizando os pontos de divergência do Min. Nunes Marques e da maioria, para evidenciar os fundamentos mais relevantes que sustentaram a decisão final.
3.1 Razão jurídica 1 (RJ1): a igualdade de condições entre os candidatos/paridade de armas e o abuso de poder econômico
O Min. Luiz Fux estruturou a RJ1 no direito à igualdade de condições entre os candidatos aos cargos eletivos, extraído dos artigos 5º, caput, 14, § 9º, e 37, caput, CF/88. A partir deste vislumbrou impacto nas liberdades comunicacionais constitucionais. Em alusão ao voto do Min. Gilmar Mendes no Recurso Extraordinário n.º 633.703/MG (Dje. 18/11/2011), reconheceu que um fundamento do Estado Democrático atual é a liberdade e igualdade da propaganda política que assegura a possibilidade jurídica das disputas de prevalência de ideias e interesses. Desta razão jurídica deflui que os critérios de restrição de acesso aos meios de propaganda eleitoral são admissíveis, se compatíveis com as diferenças concretas entre candidatos, partidos e coligações, e desde que adequadas a finalidades legítimas.
O relator evocou o posicionamento do STF nas ADIs 5491 (Dje. 06/09/2017) e 5423 (Dje. 19/12/2017), que ao declarar a constitucionalidade dos dispositivos da Lei das Eleições (Lei n. 9.504/97) que dizem respeito à distribuição do tempo de propaganda eleitoral gratuita e a diferenciação no tratamento dado aos partidos com maior representatividade na Câmara dos Deputados, considerando que ao ser reservado espaço às minorias partidárias, reputou que também lhes é garantido o acesso a esse meio importante de comunicação com o eleitor. Nessa direção, citou ainda a ADI 5487 (Dje. 06/09/2017) que tratou das regras para definição dos participantes em debates eleitorais. A igualdade na disputa mais uma vez apareceu como mote importante na fundamentação:
(...) emissoras de tv e rádio têm a faculdade de realizar debates eleitorais. Optando, no entanto, por promovê-los, têm de obedecer a diretrizes mínimas fixadas em lei, com a finalidade de assegurar (i) o pluralismo político (democracia), (ii) a paridade de armas entre os candidatos na disputa eleitoral (isonomia), e (iii) o direito à informação dos eleitores (liberdade de expressão)
Sustentou que para o funcionamento da democracia (art. 1º, par. ún., CF/88) a igualdade de chances, a moralidade, a normalidade e a legitimidade das eleições (art. 14, § 9º, CF/88) é necessária uma regulação da livre expressão de ideias para resguardar o eleitor em face de informações falsas, imprecisas ou enviesadas pelo abuso do poder político ou econômico. O poder estatal de restringir a liberdade de expressão, sem embargo, deve ser estritamente necessário para objetivar finalidades constitucionalmente legítimas (art. 14, §§ 9º e 10, CF/88).
Neste sentido, concordou com a petição inicial de que o cenário fático e jurídico atual não mais justificaria as restrições espacial, temporal e quantitativa da propaganda eleitoral em veículos de comunicação, cujo desígnio é evitar que candidatos com maior poderio econômico ocupem “a maior parcela do espaço disponível para propaganda na imprensa escrita, aumentando a sua exposição aos leitores, em desequilíbrio com os candidatos de menor capacidade financeira”. Assinalou, por sua vez, três mecanismos legais direcionados obstar o abuso do poder econômico e a assegurar a igualdade de chances na disputa eleitoral, pautados no (i) dever de transparência na propaganda eleitoral, (ii) no limite de gastos em campanhas e (iii) na proibição ao financiamento destas por pessoas jurídicas.
Sobre o dever de transparência, argumentou que a Lei. 12.034/2009 exigiu constar do anúncio, de forma visível, o valor pago pela inserção no anúncio eleitoral na imprensa. Dois efeitos desta obrigação jurídica são: manter os eleitores informados sobre o preço das propagandas e dificultar o favorecimento a candidato pelas empresas jornalísticas ao estabelecer preços diferenciados pelos anúncios. Desde a Lei 13.165/2015 há limites de gastos para as campanhas eleitorais (vide: Lei 13.488/2017, Lei 13.878/2019), inclusive para a utilização de recursos do próprio candidato (10% - dez por cento dos gastos de campanha no cargo em que concorrer). Tais limites confluem que não mais haveria motivos para apontar um desequilíbrio como efeito da liberdade quanto à forma e à frequência da propaganda eleitoral na imprensa escrita. A proibição ao financiamento de campanhas por pessoas jurídicas foi decidida na ADI 4650 (Dje. 24/02/2016) e assumida pelo direito positivo pelas Leis 13.165/2015 e 13.487/2017. Com o Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), o objetivo é assegurar que os candidatos tenham acesso aos meios de propaganda eleitoral, respeitados os critérios de isonomia.
Observou que estes instrumentos seriam mais eficazes e estimou que seriam inadequadas, desnecessárias e desproporcionais as restrições (quantitativa, espacial e temporal) previstas pelo caput do art. 43 da Lei 9.504/1997 sobre a propaganda eleitoral na imprensa escrita, por não atenderem mais às finalidades de assegurar a igualdade de chances e combater o abuso do poder econômico. Ainda, ressaltou que o disposto no art. 57 da Lei 9.504/1997 causaria um desequilíbrio entre as plataformas gestoras de redes sociais em detrimento das empresas jornalísticas, com a autorização da remuneração para o impulsionamento de conteúdos eleitorais na internet. Esta desigualdade de condições de competição entre as empresas jornalísticas e as gestoras de aplicações na internet não promoveria um equilíbrio de chances entre os candidatos, pois as diferentes vias de comunicação alcançam diversas camadas do eleitorado. E esta diferença de tratamento entre os meios de informação agudizam a desigualdade entre as classes sociais sobre o poder de voto.
Infere-se que a RJ1 (direito à igualdade) guarda conexão com o argumento libertário levantado pela ANJ.
O Min. Nunes Marques abriu divergência integral. Para não haver a violação ao artigo 2º da CF/88, defendeu que não ocorrerá a inconstitucionalidade superveniente se com a mudança do quadro fático a escolha do legislador ainda se mostrar coerente com os paradigmas constitucionais. Enfatizou que os atos normativos impugnados tiveram o propósito de dar “alguma racionalidade à propaganda eleitoral, permitindo que, com menos gastos, mais candidatos consigam expressar-se, em igualdade de condições, e mais eleitores possam ouvir (...)”. Argumentou que o processo de inconstitucionalização tem de ser premido por uma alteração fática relevante ao ponto de revelar, com absoluta segurança, opção diversa do legislador às razões de fato que hoje se deixam de observar. O art. 43, caput, da Lei das Eleições, tem o escopo justamente de baratear a propaganda eleitoral e dar concretude à paridade de armas.
O Min. Alexandre de Moraes, por sua vez, acompanhou a divergência e assinalou que os dispositivos partem do interesse democrático e objetivam (i) impedir o abuso do poder econômico de “sequestrar” os veículos e meios de comunicação e (ii) assegurar a igualdade possível entre os candidatos na divulgação de suas ideias e programas de governo para convencer o eleitorado. Não há uma limitação de divulgação de notícias, sim a regulação da propaganda eleitoral. Citou as seguintes ações de controle concentrado para sustentar esta lógica jurídica: ADI 5491 (Dje. 06/09/2017), a ADI 5423 (Dje. 19/12/2017), a ADI 5122 (Dje. 20/02/2020). O Min. Gilmar Mendes, na mesma linha, rechaçou o aventado na inicial e acolhido pela minoria, pois argumentou que o efeito da opção legislativa é exatamente o oposto: leva à pluralidade de anúncios, a condições de igualdade, e à pluralidade político-partidária.
O Min. Nunes Marques, ainda, sublinhou que novos mecanismos legais não justificam o desaparecimento de outros já existentes para que não haja insuficiência de concretização da igualdade de condições de candidatos (paridade de armas). No mesmo sentido, o Min. Alexandre de Moraes aduziu que “o financiamento de campanhas por pessoas jurídicas e a existência de um limite de gastos com campanhas eleitorais são ferramentas necessárias, mas não suficientes para afastar eventual abuso de poder econômico” e são somadas como mais mecanismos, como os dispositivos legais questionados. A distribuição dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha entre os partidos não é formal ou materialmente paritária, pois há diversos critérios, mormente o número de cadeiras congressuais ocupadas e quantidades de votos. Nas eleições municipais de 2020 o partido com a maior fração do fundo teve um montante 163 vezes superior à agremiação partidária que recebeu a menor fração. Esta desproporcionalidade de recebimento de dinheiro público pode resultar em vantagens e abuso do poder econômico nas eleições.
Neste específico ponto, o voto do Min. André Mendonça é contrário ao da minoria e aderente ao da maioria. Ao citar Bryan Caplan (O mito do eleitor racional: porque as democracias escolhem políticas públicas ruins); que explora o paradoxo do regime democrático sobre a agregação de preferências particulares quando se tem a tomada de decisões por meio do autogoverno coletivo; defendeu que a indicação de forma visível do valor pago pela inserção na própria propaganda não é suficiente para demover as empresas jornalísticas da capacidade de influir ilegitimamente no pleito eleitoral. A transparência sobre os gastos de campanha que é um imperativo mínimo para se afirmar como uma democracia constitucional, de acordo com o art. 7.3 da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, com o Comentário Geral n. 25 ao art. 25 do Pacto de Civis (Participação em Negócios Públicos e Direito ao Voto), e o relatório anual do Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos a respeito (23.7.2015). Ainda, recordou que o teto de gastos eleitorais não estabelece um limite per capita independente da riqueza pessoal do postulante a cargo eletivo. É razoável, portanto, a prognose do Legislativo para limitar mediante critérios proporcionais a exposição de candidatos por propaganda eleitoral paga na imprensa.
3.2 Razão jurídica 2 (RJ2): a proteção constitucional às liberdades comunicacionais
A segunda razão jurídica elencada no voto do min. Luiz Fux foi sobre a proteção às liberdades de expressão, de imprensa e de informação. Reforçou-se a importância da circulação de informação ao sistema democrático, seja para a formação da vontade do eleitor, seja para a paridade da disputa entre candidatos, conectando-a diretamente à RJ2 e ao argumento libertário. Sustentou, pois, que esse é um dos pilares para o pleno funcionamento do regime democrático:
Eleitores bem-informados sobre as propostas de candidatos capazes de expressar-se em igualdade de condições evitam resultados enviesados nos certames eleitorais. Por sua vez, os candidatos eleitos implementarão, à frente de seus cargos públicos, os programas que receberam o batismo das urnas, os quais tendem a configurar políticas públicas eficientes para o avanço social e econômico da nação.
Destacou que apesar de considerados como direitos, a regulação desses vetores constitucionais busca coibir eventuais distorções do seu conteúdo, já que, em sentido contrário, a desinformação prejudica a formação de um ambiente informacional isento para o exercício consciente do direito de voto:
(...) a regulação da livre expressão de ideias é particularmente importante quanto à propaganda eleitoral, porquanto o resguardo do eleitor em face de informações falsas, imprecisas ou enviesadas pelo abuso de poder político ou econômico protege o bom funcionamento da democracia (art. 1º, parágrafo único, da CRFB), a igualdade de chances, a moralidade, a normalidade e a legitimidade das eleições (art. 14, § 9º, da CRFB). (...) A partir desses ensinamentos, resta claro que o poder estatal de restringir a liberdade de expressão, sobretudo na seara eleitoral, deve ater-se ao estritamente necessário à consecução de legítimas finalidades constitucionais, como o combate à influência do poder econômico ou político (art. 14, §§ 9º e 10, da CRFB) e a promoção da paridade de armas entre os concorrentes no certame eleitoral.
Admitiu-se o caráter instrumental da liberdade de expressão, em seu aspecto político, defendendo que a liberdade de expressão, no campo eleitoral, é condição prima face para maximização do debate público, com a proposta de que se tornaram “absolutamente inadequadas as limitações quantitativa, espacial e temporal aos anúncios nos jornais”. Nesse sentido, eventuais restrições por limitações legais devem estar atreladas a evitar o abuso de poder nas eleições e o combate às denominadas fake news.
O Min. Luiz Fux ponderou que em deferência às liberdades constitucionais é vedado ao legislador estabelecer restrições à livre circulação de informações, sem fundamentação razoável. Entendeu ser desproporcional a restrição imposta pelo art. 43, caput, da Lei 9.504/1997, pelo cenário fático e jurídico atual. Ademais, após discorrer sobre diferença de tratamento entre a propaganda eleitoral gratuita e a paga, concluiu que na regência do art. 57 da Lei 9.504/1997 sobre a propaganda política paga na internet há um favorecimento às redes sociais em detrimento das mídias tradicionais. Tal preterição teria como um dos efeitos reduzir o papel da imprensa nas campanhas eleitorais com o potencial de causar maior confusão no eleitorado, que perderia o referente para checar as informações recebidas:
Se a internet facilitou enormemente a difusão de conhecimento, encurtando as fronteiras entre os indivíduos, também é certo que se tornou um ambiente propício ao radicalismo e ao compartilhamento de notícias enganosas – as chamadas fake news. É essencial que a regulação da comunicação política na rede mundial de computadores reserve à imprensa livre e profissional o seu devido espaço, em igualdade de condições com as redes sociais e outras plataformas de transmissão informal de conhecimento.
Com relação à desinformação, o relator acentuou os riscos de polarização ao defender que as redes sociais, nas quais é admissível o impulsionamento pago, favorecem o aparecimento das chamadas fake news que contaminam o debate político e embaraçam o exercício consciente do voto. Argumentou que a fiscalização e a retirada de conteúdos desinformativos pode suceder muito mais facilmente nos sítios que hospedam a versão digital dos veículos de imprensa se comparados com a vastidão de conteúdos compartilhados nas redes sociais.
O Min. Edson Fachin, que votou com a minoria, realçou a imbricação entre liberdade de expressão e democracia, além de liberdade de imprensa e a formação da vontade popular em ambiente democrático, citando a ADPF 130 e o caso Cepeda Vargas vs. Colombia (2010) da Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH). Ressaltou que a liberdade de expressão da imprensa é dilatada em relação à liberdade de expressão dos particulares. Defendeu que a Constituição Federal de 1988 e a Convenção Americana de Direitos Humanos determinam uma posição de preferência à liberdade de expressão. Sem embargo, a imprensa se sujeita a um regime regulatório para a garantia do pluralismo democrático, nos termos do art. 220, §5º, da CF-88, e consoante a Opinião Consultiva 5/85 da Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) e o caso Granier vs. Venezuela (2015).
Como ponto de partida, argumentou que a controvérsia deve pressupor a posição de preferência da liberdade de expressão jornalística no direito brasileiro. Em interpretação genética, sustentou que a justificativa do projeto de lei (PL 5498/2009) origem da Lei 12.034/2009 “teleologia da norma é, em princípio, compatível com a Constituição da República”, pois objetiva o dever de proteção da imprensa e a democracia por meio das restrições de circulação de informações relativas às eleições, para que não se capture por interesses políticos e econômicos abusivos, corrompendo os processos de formação de vontade popular. Contudo, julgou procedente os pedidos por admitir que existiu adequação no momento da produção legiferante, mas que “desapareceu com o decurso do tempo, caracterizando, assim, um processo de inconstitucionalização, ou um devir-inconstitucional, causado por radicais mudanças no substrato fático e normativo da sociedade”.
O Min. Nunes Marques, redator do acórdão, divergiu no sentido de que as restrições postas nos dispositivos impugnados não trazem embaraço à liberdade de expressão, já que “Para além de jornais, revistas e tabloides impressos, os candidatos dispõem de um vasto rol de instrumentos a serem utilizados para divulgar suas ideias e propostas, os quais, na prática, têm sido preferidos”. Os candidatos possuem diversas outras formas de se aproximar do eleitorado, além da propaganda eleitoral em mídia profissional impressa. As restrições impostas pelo art. 43, caput, da Lei das Eleições, portanto, não significam qualquer embaraço à liberdade de expressão dos candidatos a cargos eletivos. Tampouco à liberdade de imprensa. Advertiu-se que o espaço de propaganda eleitoral é um produto a ser vendido aos partidos políticos e aos candidatos e não é uma relação de atividade jornalística, pois não é “local destinado ao debate político propriamente dito, ao confronto de ideias e muito menos à divulgação de informações isentas”. Neste espaço, vendido aos candidatos, não pode o veículo de imprensa emitir qualquer opinião ou noticiar qualquer fato, ainda que verdadeiro, capaz de desprestigiar o anunciante.
Não é inconstitucional a restrição legal imposta à propaganda eleitoral paga na internet, pois não impede a manifestação de órgãos de comunicação e permite o impulsionamento de conteúdos na internet, mas não autoriza neste meio as propagandas onerosas, cujo custeio é predominante procedente de recursos públicos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC). Os gastos de campanha eleitoral não devem ser absolutamente discricionários, pois são realizados, em sua maioria, com recursos públicos.
O legislador não proibiu a propaganda eleitoral pela internet, somente criou limites razoáveis. A regulação está voltada mais para a forma do gasto do Fundo Eleitoral e não para disciplinar a liberdade de expressão. O art. 57-C, caput e § 1º, I, da Lei federal n. 9.504/1997 pretende evitar que a mercantilização da internet ou “a confusão dos papéis dos jornais (que se colocam como agentes isentos de informação da sociedade) podem induzir o eleitor a erro”. Estão incólumes, portanto: as liberdades de expressão, de imprensa e de informação, pois o art. 43, caput, da Lei das Eleições, não empobrece o debate político ou compromete o fact-checking, destinado a evitar que notícias falsas contaminem o sufrágio popular. Citou a jurisprudência do STF [ADI 5122 (Dje 20/02/2020), ADI 2266 (Dje 15/10/2019), ADI 5491 (Dje 06/09/2017), ADI 2278 (Dje 10/11/2006)] para sustentar que a propaganda eleitoral deve ser detalhadamente disciplinada, por meio de leis ordinárias (Congresso) e/ou resoluções do TSE.
Ao caracterizar a propaganda eleitoral paga como um produto a ser vendido aos partidos políticos e aos candidatos, o Min. Nunes Marques desconstituiu, ao nosso ver, o argumento libertário e o argumento do pluralismo, pois separa-se a liberdade de expressão, a liberdade de imprensa e o negócio vinculado à publicidade. Da leitura dos votos dos demais Ministros, tem-se que essa tese influenciou decisivamente a razão de decidir do STF na ADI 6281. E do cotejo do argumento libertário agora com a RJ2, e ainda do próprio argumento do pluralismo, muito embora tanto o relator como o redator não tenham utilizado o paradigma normativo da petição inicial da ANJ (art. 1o, V, CF/88).
O Min. Alexandre de Moraes pontuou que o argumento libertário (liberdades de expressão, de imprensa e de informação) não deve se confundir com o interesse econômico, que é legítimo. O interesse econômico consiste em “participar dos lucros das empresas propiciados pelos gastos com propaganda eleitoral pelos candidatos no transcurso de suas respectivas campanhas. Quantos mais propaganda paga, mais lucro obviamente”. A redução do número de propagandas pagas, mesmo que diminua o caráter econômico, não tem relação com o debate democrático no período eleitoral. Não se pode dizer que há cerceamento das liberdades de expressão, de imprensa e de informação porque são 10 e não 100 propagandas. A legislação objurgada não impede que jornais, revistas, virtuais ou impressos, publiquem as matérias que quiserem, contendo opinião favorável ou desfavorável, as entrevistas, os debates, as informações.
3.3 Razão jurídica 3 (RJ3): interesses mercadológicos dos órgãos de imprensa
O Min. Luiz Fux fundamentou que o modo de consumo das informações foi alterado, pois segundo os dados: a tiragem de exemplares impressos dos dez principais jornais diários teve redução de mais de 50% (cinquenta por cento) de dezembro de 2014 a outubro de 2019. Com base neste ponto, afirmou que a tecnologia superou o modelo tradicional de comunicação política considerado pelo legislador, e por esta razão, seria inadequada a imposição legal das restrições às liberdades de expressão e de imprensa. Disso resulta, segundo o relator, que há uma restrição indevida à livre concorrência (art. 170, IV, CF/88)
Por sua vez, o Min. Nunes Marques rejeitou os pressupostos sobre os quais recai o argumento mercantil, e que se pode considerar também como decisivo na resolução da ação constitucional. A argumentação contra o tratamento da propaganda eleitoral sob as lógicas próprias do mercado é construída reforçando que as limitações legais impostas se referem predominantemente sobre onde e como devem ser gastos os recursos do fundo eleitoral, e não sobre o intento de gerar lucros para jornais, revistas e tabloides.
Apontou que o caráter empresarial dos órgãos de imprensa costuma ter como principais fontes de receita: (1) a venda de exemplares, em avulso ou por assinatura; (ii) a venda de espaços destinados a propagandas e anúncios publicitários. As regras do processo eleitoral hão de ser construídas com as premissas do direito público, com destino ao aperfeiçoamento da democracia, e por esta razão, “não devem maiores obséquios aos interesses mercadológicos das pessoas jurídicas de direito privado”, ainda que de órgãos de imprensa, importantes para a cidadania. A “propaganda eleitoral não deve ser admitida com as lógicas próprias do mercado”, não é para alavancar negócios, mas sim uma opção política do legislador sobre onde e como devem ser gastos os recursos procedentes do fundo eleitoral.
No mesmo sentido, sublinha que o art. 57-C, caput e § 1º, I, da Lei federal n. 9.504/1997 não deve obséquios a interesses comerciais que se sintam contrariados, mesmo que legítimos. Assinala ainda a justificativa para a proibição de propaganda em sites de pessoas jurídicas (incluídas aqui, por evidente, as páginas mantidas pelos órgãos de imprensa, com exceção apenas da permissão da reprodução digital do jornal impresso), acrescentando que o poder simbólico de algumas entidades poderia levar a algum tipo de convencimento subliminar, e nesse sentido, ainda, que a “confusão do papel dos jornais (que se colocam como agentes isentos de informação da sociedade) podem induzir o eleitor a erro”.
Neste debate, o voto do Min. André Mendonça aporta um ponto aderente: a função social das organizações jornalísticas prevista no texto constitucional e interpretada pelo STF conformam as suas pretensões de lucratividade. A alteração pretendida de interpretação desvirtuaria a legítima opção tomada pelo Congresso Nacional, sem amparo em norma constitucional idônea, pois a regulação jurídica dos periódicos e das redes sociais guardam peculiaridades distintas que não autorizam equiparação.
O Min. Alexandre de Moraes rebateu o argumento mercantil, de certo modo, na distinção/não equiparação. Alegou que por serem modelos de negócios distintos, a autorização legal de contratos de prestação de serviço de impulsionamento de conteúdo não configura tratamento diferenciado entre os prestadores de serviço de busca na web (mídias sociais) e os portais de notícias, jornais e revistas eletrônicas. Sublinhou que o serviço de impulsionamento implica “o aumento do alcance original de uma publicação disponível na web por meio das redes sociais e de ferramentas de busca”. Disso se deflui que o conteúdo impacta apenas um número restrito de usuários, pois o impulsionamento objetiva que “a matéria seja exibida para mais possíveis interessados naquele conteúdo, conforme os algoritmos das redes”. Neste sentido, quando utilizados os mecanismos de buscas:
[...] permite que as informações relacionadas a determinado candidato apareçam em primeiro lugar, criando o que se convencionou chamar de tráfego “não orgânico” da informação, novamente, àqueles que efetivamente demonstraram, no uso da internet, o interesse pela matéria relacionada.
No caso específico do impulsionamento eleitoral, o conteúdo apresentado – que já se encontra ao alcance de todos da internet (ou seja, a sua disponibilização na rede não foi objeto de contratação específica com contraprestação pecuniária, mesmo porque isso também é proibido para as mídias sociais) - é impulsionado para chegar ao eleitor que faz uma pesquisa específica sobre determinado candidato ou que revela simpatia por determinada ideologia político-partidária (com base em algoritmos capazes de identificar a preferência dos usuários, de acordo com seu histórico de navegação e de interações com os perfis dos demais usuários, pessoas naturais ou não).
O tráfego da informação é direcionado a um nicho específico do eleitorado, e o alcance do impulsionamento fica limitado a um grupo homogêneo de eleitores que, de qualquer maneira, tenham revelado algum interesse naquele tema específico objeto da contratação do serviço em questão.
Por outro lado, a propaganda feita pela publicidade eleitoral paga; destacada nas páginas de veículos profissionais de informação, físicos ou digitais; objetiva alcançar um público heterogêneo de pessoas, as quais sequer buscavam esse tipo de conteúdo. Por isso, conclui “Não se afigura legítima, sob esse aspecto, a imposição ao eleitor de uma informação que ele não quer, não procurou e não deseja, influenciando-o e concedendo-lhe acesso a campanha eleitora específico em detrimento de outros candidatos”.Com efeito, inventaria precedentes do TSE (Rep. 94675, Dje 14/10/20247; RESPE 10696, DJe 12/12/20188; RESPE 060531076, Dje 16/11/20209) sobre o debate de sanções ao impulsionamento irregular, caracterizados casos de ilegal propaganda eleitoral paga, por atingir usuários que (a princípio) não buscariam aquele conteúdo, além de possibilitar eventual abuso do poder econômico.
Por fim, entremeou os argumentos mercantil e do pluralismo. Sustenta que para o enfrentamento à desinformação é altamente relevante a existência da imprensa livre e independente para a eficiência do regime democrático, por meio das liberdades da manifestação do pensamento, da imprensa e de informação. Contudo, garantir mais fontes de receitas aos veículos de imprensa por meio da retirada dos dispositivos normativos questionados na petição inicial poderia gerar, em hipótese, um movimento em direção a captura dessas organizações pelo poder econômico, a serviço de interesses nem sempre republicanos, com efeitos negativos para o processo eleitoral. Por mais esta razão, estimou que o pedido da autora não é solução adequada para o enfrentamento à desinformação.
O Min. Gilmar Mendes refutou utilizar-se de idealização libertária (não como efeito de melhorar a qualidade do processo eleitoral) para maximizar a possibilidade de captação de recursos financeiros de agentes econômicos. Interrogou, de modo direto:
A permissão inaugurada pelo Legislador, em 2017, de facultar o gasto com impulsionamento de conteúdo, pode ser considerada responsável pela divulgação massiva e sistemática de notícias falsas ocorrida na eleição geral de 2018?
Após catalogar vários casos de países que sofreram com a desinformação no processo eleitoral, assinalou que o desenvolvimento de processos tecnológicos relacionados a convergência de mídias sociais (entre estes a curadoria algorítmica de notícias, entre outras) tem gerado “câmaras de eco” que causam a queda da confiabilidade da informação e atribuem suspeição sobre a capacidade de autogovernar a nós mesmos como democracias razoáveis. Responde à pergunta: a possibilidade do impulsionamento de conteúdo não é condição necessária e suficiente para o surgimento ou fortalecimento da desinformação, pois não há equiparação entre impulsionamento de conteúdo e disparo em massa.
A Lei nº 13.488, de 2017 atribuiu competência normativa ao Tribunal Superior Eleitoral para regular o cenário sobre as ferramentas tecnológicas existentes em cada momento eleitoral e as boas práticas relativas a campanhas eleitorais na internet. A diferença entre impulsionamento de conteúdo e disparo em massa está na intelecção da conjugação do inciso II do art. 34 e com o inciso XXI do art. 37 da Resolução TSE 23.610/2019, com redação dada pela Resolução TSE 23.671/2021 (atualmente, houve modificação deste último inciso pela Resolução nº 23.732/2024). Ademais, a Resolução TSE 23.679/2022 alterou a Resolução TSE 26.604/2019 e impôs condicionantes para a contratação de impulsionamento de conteúdo (art. 17, X).
Estas alterações normativas, segundo o Min. Gilmar Mendes, convertem em implausível a tese de tratamento privilegiado em desproveito da imprensa tradicional. Não há tratamento anti-isonômico, pois o regramento é diverso para os âmbitos da comunicação.
4 Críticas
Como contributo deste escrito, cabe enfatizar que este julgado sobre as restrições espacial, temporal e quantitativa da propaganda eleitoral paga em veículos de comunicação impressa é coerente tanto com (i) a construção na jurisprudência do STF da posição preferencial da liberdade de expressão, como com (ii) o the three part test (teste de 3 partes), cuja proposta será descrita com a análise do propugnado no relatório E/CN.4/1995/32 (UN, 1994) do painel da relatoria especial de promoção e proteção da liberdade de expressão e opinião da Organização das Nações Unidas.
O Tribunal Pleno do STF (Cunha e Cruz; Favero, 2021) já aplicou a tese da posição preferencial à liberdade de expressão, em algum grau, em julgados de controle concentrado: ADPF 130, ADI 4815, ADI 4451 e ADPF 572. Cabe agregar a estes (também decididos pelo plenário): o MS 39378 MC-Ref (DJe 23/10/2023); o RE 1010606 (DJe 20/05/2021) - o caso do “direito ao esquecimento” - , o RE 685493 (DJe 17/08/2020) e a ADI 2566 (Dje 23/10/2018)10.
Em diversos trabalhos já se enfatizou a decisiva importância da liberdade de expressão para os sistemas democráticos a ponto de se fundamentar, pela sua arquitetura constitucional, a tese de sua posição preferencial (Martel, 2004) na dogmática nacional (Binenbojm, 2003; Barroso, 2004; Chequer, 2011), ainda que relativa e prima facie (Sarlet, 2019; Sarlet; Siqueira, 2020). Direitos fundamentais são restringíveis, não se admite a existência de direitos constitucionais absolutos, mas o ônus argumentativo para restringir as liberdades de expressão, de imprensa e de informação é maior, pois decorrem de seus fundamentos filosóficos e da constatação de intermédios/condição para o exercício de outros (instrumental) direitos e liberdades e também do próprio regime democrático.
O debate do argumento libertário na ADI 6281 foi o principal exemplo de superação do ônus argumentativo para a restrição da livre expressão de ideias de candidatos no âmbito da propaganda eleitoral na imprensa. A premissa do regime democrático que alimenta a posição preferencial da liberdade de expressão também é a que autoriza o combate à influência do poder econômico para proteger a normalidade e legitimidade das eleições. Descansam, pois, na higidez do regime democrático as restrições à propaganda eleitoral da imprensa, previstas no art. 43, caput, da Lei n. 9.504/97. Por meio de leis congressuais e/ou Resoluções do TSE, atos normativos foram julgados coerentes com esta lógica protetiva da democracia representativa, conforme os acórdãos na ADI 5122 (Dje 20/02/2020), na ADI 2266 (Dje 15/10/2019), na ADI 5491 (Dje 06/09/2017), e na ADI 2278 (Dje 10/11/2006).
Para responder o problema de pesquisa, as inferências entre todos os votos na ADI 6281 levam ao seguinte ponto comum: a regulação/restrição da livre expressão de ideias no âmbito da propaganda eleitoral é juridicamente possível sob o fundamento constitucional de enfrentamento do abuso de poder político ou econômico e funcionamento da democracia (art. 1º, parágrafo único, da CF/88), da igualdade de chances, da moralidade, da normalidade e da legitimidade das eleições (art. 14, § 9º, da CF/88).
Os resultados da leitura dos votos maioria do plenário do STF (6 votos) podem ser condensados nas seguintes premissas em forma de enunciados:
Por outro lado, estas restrições à propaganda eleitoral da imprensa como manifestação da liberdade de expressão também estão conforme o artigo 19 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, em orientação interpretativa genética decorrente de análise do relatório E/CN.4/1995/32 (UN, 1994):
ARTIGO 19
1. Ninguém poderá ser molestado por suas opiniões.
2. Toda pessoa terá direito à liberdade de expressão; esse direito incluirá a liberdade de procurar, receber e difundir informações e idéias de qualquer natureza, independentemente de considerações de fronteiras, verbalmente ou por escrito, em forma impressa ou artística, ou por qualquer outro meio de sua escolha.
3. O exercício do direito previsto no parágrafo 2 do presente artigo implicará deveres e responsabilidades especiais. Conseqüentemente, poderá estar sujeito a certas restrições, que devem, entretanto, ser expressamente previstas em lei e que se façam necessárias para:
a) assegurar o respeito dos direitos e da reputação das demais pessoas;
b) proteger a segurança nacional, a ordem, a saúde ou a moral públicas (grifo nosso).
Aponta-se no relatório E/CN.4/1995/32 (UN, 1994) o direito à liberdade de opinião e expressão como um direito ambivalente e habilitante. É ambivalente, pois como uma das liberdades civis tem com uma das funções proteger a esfera da vida individual contra as intervenções indevidas do Estado e também é um direito político, na garantia de participação do indivíduo na vida política, incluindo a das instituições do Estado. O seu exercício é habilitante para o gozo de direitos humanos previstos na Declaração Universal dos Direitos Humanos, no Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e no Pacto Internacional Sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais.
Sobre as restrições, o aludido relatório E/CN.4/1995/32 (UN, 1994) se refere a uma concepção dual de liberdade, para após sublinhar quando o Estado é obrigado a atuar nas possíveis restrições a liberdade de expressão. A partir de premissas do pensamento liberal, citando inclusive John Stuart Mill (Ensaio sobre a Liberdade - 1859), o relatório propõe que duas são as concepções de liberdade fundamentam a liberdade de expressão: (i) a liberdade de acesso ao Estado: a participação do indivíduo em matérias do Estado, cuja conotação coletiva se volta para o âmbito da liberdade de reunião e da liberdade de associação; (ii) a liberdade do Estado: refere-se ao domínio da privacidade e proteção contra qualquer interferência externa indevida. A princípio o Estado não é obrigado a garantir este direito com medidas protetivas. Contudo, é obrigado a intervir apenas em casos em que a expressão de uma opinião interfira diretamente nos direitos de terceiros ou quando constitua uma ameaça direta a sociedade.
A este respeito, a regra geral é a proteção da liberdade e a sua restrição deve ser a exceção. A restrição não pode ser aplicada de modo que a expressão de uma opinião sobre qualquer assunto específico seja meramente suprimida. Só pode ser restringida na medida em que seja necessária para atingir um dos fins acima referidos.
O relator especial também observou que, durante os trabalhos preparatórios relativos ao artigo 19 do Pacto, mais de trinta (30) propostas de restrições e limitações foram apresentadas. Essas propostas diziam respeito a expressões instigadoras a ações criminosas ou à derrubada violenta do Poder Público, ou expressões que atentam contra os direitos de terceiros à integridade mental e moral. As questões da pornografia e da blasfêmia também foram objeto de debate. O fato de a redação final do n.º 3 do artigo 19.º não incluir uma referência a estas matérias não implica, evidentemente, que a ingerência do Estado para efeitos de proteção desses interesses seja proibida, sem exceção. O escopo limitado de interferência admissível que encontramos no artigo 19.3 - limitado especialmente em comparação com os instrumentos regionais de direitos humanos - sugere ao Relator Especial que qualquer interferência, e especialmente restrição ou limitação, deve ser interpretada restritivamente em caso de dúvida.
A interpretação genética sobre os “deveres e responsabilidades” do art. 19.3 foi incluída nesta parte nos trabalhos preparatórios do Pacto com o objetivo de oferecer aos Estados a possibilidade de combater o abuso de poder pelos meios de comunicação de massa. Os opositores a esta inclusão argumentaram que a finalidade principal do Pacto era estabelecer direitos civis e políticos e garanti-los e protegê-los, em vez de estabelecer deveres e responsabilidades e impô-los aos indivíduos. Ademais, que cada direito carrega um dever correspondente e que nenhum outro artigo do Pacto descrevia este dever.
Sem embargo, nos debates venceu o argumento de que a mídia moderna poderia exercer uma poderosa influência sobre o exercício e o gozo da liberdade de expressão. Por esta razão, a palavra “especial” foi inserta na redação final antes de “deveres e responsabilidades”. “Deveres e responsabilidades” compõem a premissa geral consubstanciada de que os direitos humanos são horizontalmente eficazes. O exercício da liberdade de expressão pode implicar uma violação dos direitos de terceiros. Os efeitos horizontais podem ser encontrados no âmbito da privacidade, da influência da opinião pública ou na monopolização da imprensa. Os deveres e as responsabilidades especiais, portanto, obrigam (i) os formadores de opinião a não abusarem de seu poder em detrimento de outros; (ii) obrigam o Estado a interferir nos casos em que os direitos alheios são violados e a agir nos casos em que a concentração dos meios de comunicação social ameace a diversidade de opiniões ou acesso à opinião publicada.
O nº 3 do artigo 19º só permite a restrição do direito à liberdade de expressão e de informação em determinadas condições. Mais importante ainda, estabelece uma metódica (não citada na jurisprudência do STF) sobre como configurar legítima uma restrição à liberdade de expressão: the three part test. Neste teste de legitimidade (porque inclusive uma lei pode até ser arbitrária/contrária ao direito internacional dos direitos humanos) qualquer restrição ou limitação deve ser (1) prevista por lei, (2) deve servir a uma das finalidades listadas mencionadas no artigo, e (3) deve ser necessária para atingir essa finalidade (the three part test - teste de 3 partes).
O relator especial assinalou a importância da proporcionalidade no processo de estabelecer se é necessária alguma limitação do direito à liberdade de expressão. Outro ponto de ênfase é que o termo “previsto em lei” implica que as restrições e limitações ao direito à liberdade de expressão devem ter sido formalmente promulgadas em lei em sentido estrito. Esse ato deverá especificar a permissibilidade da interferência dos órgãos de execução. O grau de tal especificação é importante, pois qualquer interferência que se baseie unicamente em disposições administrativas prima facie viola o artigo 19.
No caso específico da ADI 6281, a superação da primeira parte do teste é a previsão em lei em sentido estrito: a do art. 43, caput da Lei Federal 9.504/1997, com redação dada pela Lei nº 12.034/2009. As restrições deste dispositivo legal à propaganda eleitoral na imprensa (como direito à liberdade de expressão) se aplicam na hipótese de proteção à ordem pública, prevista na segunda parte do teste. No relatório E/CN.4/1995/32 (UN, 1994) se esclarece que embora a noção de ordem pública seja em si um tanto vaga, é possível incluir nela a noção mais restrita de “prevenção da desordem ou do crime”, como também a noção de ordem pública vinculada aos princípios fundamentais universalmente aceitos nos quais se baseia uma sociedade democrática e que são consistentes com o respeito aos direitos humanos.
Na espécie, as restrições espacial, temporal e quantitativa da propaganda eleitoral paga em veículos de comunicação impressa objetivam a preservação da higidez do regime democrático representativo nacional, pois buscam, como visto: (i) impedir o abuso do poder econômico de “sequestrar” os veículos e meios de comunicação e (ii) assegurar a igualdade possível entre os candidatos na divulgação de suas ideias e programas de governo para convencer o eleitorado. Tais restrições atendem os requisitos estritos de sua necessidade (terceira parte), justificada ao aperfeiçoamento de regras do processo eleitoral.
Com efeito, apesar de concordar com as restrições aos meios de comunicação analógicos, cuja constitucionalidade foi confirmada na ADI 6281, não se pode descurar que a permissão do impulsionamento de propaganda eleitoral na Internet desde 2018 teve um efeito econômico crescente e altamente significativo a partir dos dados obtidos do DivulgaCAND1111, que estipula o ranking de concentração de despesas. Extrai-se que nas Eleições 2018 foram gastos R$ 79.355.959,04 com impulsionamento de conteúdo pelos candidatos e partidos; e que a publicidade em jornais e revistas, tem registro de gastos no valor de R$ 31.931.886,25. O que realmente impressiona é que para as Eleições 2022, os gastos com publicidade em jornais e revistas caíram para R$ 31.909.430,10 e as despesas declaradas com impulsionamento de conteúdos alcançaram a cifra de R$ 376.821.734,6612.
Em 2022, a empresa Facebook liderou como maior fornecedor universal das campanhas 2022, acumulando R$ 129.285.246,07, seguido da Google Brasil, com R$ 126.270.758,63. A terceira e quarta posição desse ranking são ocupadas por empresas intermediadoras de pagamento, sendo que a partir da função “detalhar”, verifica-se que se referem também a pagamentos relacionados ao impulsionamento de conteúdo (R$ 61.308.022,53 e R$ 39.940.597,23, respectivamente).
A diferença entre as Eleições 2018 e 2022 resulta que: (i) os gastos com publicidade em jornais e revistas praticamente se mantiveram estáveis, com decréscimo em 2022 de R$22.456,15 ou 0,07% de diminuição; (ii) as despesas declaradas com impulsionamento de conteúdos em 2022 subiram R$297.465.775,62, um acréscimo aproximado de 375,3%. Ao que tudo indica, a justificativa de igualdade entre candidatos na disputa eleitoral parece não encontrar o mesmo tratamento nos meios de comunicação digital, onde a inexistência de regras quanto à restrição espacial, temporal e quantitativa – semelhante ao que ocorre com jornais e revistas -, permite que “apareça mais” quem “contrate mais”. Não bastasse, com a permissão de impulsionamento de conteúdo político-eleitoral para os pré-candidatos para Eleições 2024, despesas essas que sequer têm registro na prestação de contas de campanha, e o faturamento dos provedores de aplicação com a corrida eleitoral provavelmente alcançam cifras ainda maiores.
Referências
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1 Doutor e Mestre em Direito Constitucional pela Universidad de Sevilla; Professor Permanente do Programa de Pós-Graduação em Direitos Fundamentais da Universidade do Oeste de Santa Catarina. https://orcid.org/0000-0002-9343-5358. marco.cruz@unoesc.edu.br.
2 Doutor em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina; Mestre em Ciências Jurídicas pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro; Professor do Programa de Pós-graduação em Direito da Faculdade de Direito de Vitória e da ATITUS Educação. https://orcid.org/0000-0002-0959-0954. bolzan@hotmail.com.
3 Doutoranda em Direito pela Universidade do Oeste de Santa Catarina; Mestra em Direitos Fundamentais pela Universidade do Oeste de Santa Catarina; Integra o quadro de servidores do Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina. Integra o GeP Proteção das Liberdades na Sociedade do Controle (linha direitos humanos, novas tecnologias e privacidade); Integra o GeP/TSE, na linha Democracia em redes; Membra da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político; Atua como editora adjunta na revista Resenha Eleitoral. https://orcid.org/0000-0003-1892-2380. adrianafestugatto@gmail.com.
4 “A condenação por abuso do poder econômico ou político em ação de investigação judicial eleitoral transitada em julgado, ex vi do art. 22, XIV, da LC 64/90, em sua redação primitiva, é apta a atrair a incidência da inelegibilidade do art. 1º, inciso I, alínea d, na redação dada pela LC nº 135/2010, aplicando-se a todos os processos de registro de candidatura em trâmite”. [RE 929.670, red. do ac. min. Luiz Fux, j. 1º-3-2018, P, DJE de ١٢-٤-٢٠١٩, Tema ٨٦٠, com mérito julgado.]
5 Para o modo de deliberação do STF, sugerimos: SILVA, V. A. da. O STF e o controle de constitucionalidade: deliberação, diálogo e razão pública. Revista de direito administrativo, v. 250, p. 197-227, 2009; SILVA, V. A. da. Pauta, público, princípios e precedentes: condicionantes e consequências da prática deliberativa do STF. Suprema - Revista de Estudos Constitucionais, Distrito Federal, Brasil, v. 1, n. 1, p. 22–56, 2021. DOI: 10.53798/suprema.2021.v1.n1.a17. Disponível em: https://suprema.stf.jus.br/index.php/suprema/article/view/17. Acesso em: 13 ago. 2024. Sobre especificamente as decisões do STF sobre liberdade de expressão: HARTMANN, I. A Realidade das Decisões sobre Liberdade de Expressão, Honra e Imagem no STF e no STJ.
EJJL, v. 19, n. 3, p. 731–754, 2019. DOI: 10.18593/ejjl.19672. Disponível em: https://portalperiodicos.unoesc.edu.br/espacojuridico/article/view/19672. Acesso em: 14 jul. 2024; HARTMANN, Ivar A. Crise dos precedentes no supremo: o caso dos precedentes sobre liberdade de expressão. REI, v. 6, n. 1, p. 109-128, abr. 2020. ISSN 2447-5467. Disponível em: https://www.estudosinstitucionais.com/REI/article/view/462/482. Acesso em: 14 jul. 2024.
6 Ao nosso ver, estes mesmos argumentos foram os utilizados na ADI 4815. Para esta análise, consultar: CRUZ, M. A. R. da C. e; STEINMETZ, W. A. Biografias não autorizadas: um estudo da ADI 4815. Espaço Jurídico Journal of Law [EJJL], v. 17, n. 3, p. 1037–1052, 2016. Disponível em: https://periodicos.unoesc.edu.br/espacojuridico/article/view/12744. Acesso em: 15 jul. 2024.
7 Representação 94675/DF, Relator(a) Min. Tarcísio Vieira De Carvalho Neto, Acórdão de 14/10/2014, publicado no(a) Revista de jurisprudência do TSE 26.1, data 14/10/2014, pag. 99:
“IV - Os eleitores são livres para expressar opinião sobre os candidatos na internet. Não podem, contudo, valer-se de mecanismos que, por meio de remuneração paga ao provedor de serviços, potencializam suas mensagens para atingir usuários que, normalmente, não teriam acesso ao pensamento.” (grifo nosso).
8 Agravo Regimental Em Recurso Especial Eleitoral 10696/PE, Relator(a) Min. Edson Fachin, Acórdão de 13/11/2018, publicado no(a) Diário de Justiça Eletrônico, data 12/12/2018, pag. 91-92: “[...]a divulgação de propaganda eleitoral paga na rede social Facebook, mediante link patrocinado, configura propaganda irregular vedada pelo art. 57-C da Lei das Eleições”. (grifo nosso).
9 Recurso Especial Eleitoral 060531076/SP, Relator(a) Min. Sergio Silveira Banhos, Acórdão de 08/10/2020, publicado no(a) Diário de Justiça Eletrônico 235, data 16/11/2020:
“Não obstante o impulsionamento de conteúdos seja, em caráter excepcional, permitido pelo art. 57–C da Lei 9.504/97, inclusive na hipótese de utilização do nome de candidato adversário como palavra–chave de mecanismo ou serviço de priorização paga de resultados em aplicações de busca na internet, cumpre advertir que o eventual desvirtuamento da referida ferramenta, em detrimento da isonomia entre os candidatos, poderá caracterizar, além de propaganda eleitoral irregular, abuso do poder econômico, apurado e punido na forma do art. 22 da Lei Complementar 64/90”.
10 O Min. Edson Fachin utiliza a expressão “primazia da liberdade de expressão”, mas com os mesmos fundamentos da tese da posição preferencial:
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. DIREITO CONSTITUCIONAL. LEI N. 9.612/98. RÁDIODIFUSÃO COMUNITÁRIA. PROBIÇÃO DO PROSELITISMO. INCONSTITUCIONALIDADE. PROCEDÊNCIA DA AÇÃO DIRETA.
1. A liberdade de expressão representa tanto o direito de não ser arbitrariamente privado ou impedido de manifestar seu próprio pensamento quanto o direito coletivo de receber informações e de conhecer a expressão do pensamento alheio.
2. Por ser um instrumento para a garantia de outros direitos, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal reconhece a primazia da liberdade de expressão.
3. A liberdade religiosa não é exercível apenas em privado, mas também no espaço público, e inclui o direito de tentar convencer os outros, por meio do ensinamento, a mudar de religião. O discurso proselitista é, pois, inerente à liberdade de expressão religiosa. Precedentes.
4. A liberdade política pressupõe a livre manifestação do pensamento e a formulação de discurso persuasivo e o uso dos argumentos críticos. Consenso e debate público informado pressupõem a livre troca de ideias e não apenas a divulgação de informações.
5. O artigo 220 da Constituição Federal expressamente consagra a liberdade de expressão sob qualquer forma, processo ou veículo, hipótese que inclui o serviço de radiodifusão comunitária.
6. Viola a Constituição Federal a proibição de veiculação de discurso proselitista em serviço de radiodifusão comunitária.
7. Ação direta julgada procedente.
(ADI 2566, rel. Min. Alexandre de Moraes, red. p/ Acórdão: Min. Edson Fachin, Tribunal Pleno, julgado em 16/05/2018, DJe-225 23/10/2018, grifo nosso).
11 Para consultar o detalhamento completo, acesse: https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/consulta-individual/rank-doadores-fornecedores/20602022/2022
12 A lista dos beneficiários do fornecimento pode ser consultada em: https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/consulta-individual/doadores-fornecedores/2040602022/ 2022/totalizador/individual