https://doi.org/10.18593/ejjl.30723

Guerra, medo e direitos humanos: uma análise da complexa ordem mundial atual

War, fear and human rights: an analysis of the complex current world order

Gilmar Antonio Bedin1

Aline Michele Pedron Leves2

André Giovane de Castro3

“Eles praticam um massacre e o chamam de paz.”

Tácito

Resumo: Este artigo científico analisa a complexidade do atual cenário internacional e suas conexões com as temáticas da guerra, da paz e da proteção dos direitos humanos. O ponto de partida é o tema da guerra e o seu deslocamento do lugar de um sempre possível conflito potencial entre os Estados para uma situação que torna cotidiana a possibilidade da violência em grande escala. Nessa trajetória, tem um papel fundamental a administração política das incertezas e do medo propagado. O objetivo é demonstrar o profundo dilema estabelecido, na atualidade da sociedade internacional, entre o permanente estado de guerra instalado nas diversas regiões do mundo e a crescente proteção internacional dos direitos humanos. Para isso, o texto reflete sobre a formação de um quadro global em que o medo é utilizado, de forma reiterada e contundente, como ferramenta de exercício do poder. Esse fato impulsiona a disseminação da possibilidade de um estado de guerra global, inscrito nos contornos de um estado de exceção estabelecido e que, diante da busca por segurança e paz, retroalimenta a violência de forma estrutural. Com efeito, esse cenário traz à tona a necessidade urgente de se voltar a pensar sobre o papel dos direitos humanos. A abordagem é feita a partir do método hipotético-dedutivo e da técnica de pesquisa bibliográfica.

Palavras-chave: direitos humanos; guerra global; paz mundial; sociedade internacional.

Abstract: This scientific article analyzes the complexity of the current international scenario and its connections with the thematics of war, of peace and of the protection of human rights. The starting point is the theme of war and its displacement from the place of an ever-possible potential conflict between states to a situation that makes daily the possibility of large-scale violence. In this trajectory, the political administration of uncertainties and propagated fear plays a fundamental role. The aim is to demonstrate the profound dilemma established, in the currently of the international society, between the permanent state of war installed in the various regions of the world and the increasing international protection of human rights. To this end, the text reflects on the formation of a global framework in which fear is used, repeatedly and forcefully, as a tool for the exercising power. This fact drives the spread of the possibility of a global war state, inscribed in the contours of an established state of exception and which, in front of the search for security and peace, feedback the violence in a structural way. Indeed, this scenario highlights the urgent need to think again about the role of human rights. The approach is made from the hypothetical-deductive method and the bibliographic research technique.

Keywords: human rights; global war; world peace; international society.

Recebido em 09 de agosto de 2022

Avaliado em 05 de março de 2024 (AVALIADOR A)

Avaliado em 05 de março de 2024(AVALIADOR B)

Aceito em 05 de março de 2024

Introdução

A sociedade internacional sofreu grandes transformações nas últimas décadas. Um dos resultados mais evidentes desse processo é o crescente surgimento de incertezas na atualidade e, em consequência, da manifestação quase que onipresente do medo e da violência. Esse fato impulsionou a formação de um estado de exceção constante. Com isso, tornou-se aceitável, em várias partes do mundo, a adoção de medidas arbitrárias e sua normalização num quadro de guerra permanente. Dito de outra forma, o medo se instalou no núcleo mais duro da política e os Estados nacionais passaram a almejar um maior poder bélico, como também uma série de novas medidas de segurança.

Nesse contexto, pode-se perceber que a institucionalização do medo e da aceitação de um estado de guerra permanente não condiciona somente a forma e as estratégias da organização política do mundo, mas reflete também no desenvolvimento de uma racionalidade perigosa para o enfrentamento desse quadro de incerteza. Essa tendência gera uma certa paralisia em relação à possibilidade de elaboração e implantação de formas pacíficas para a resolução dos conflitos existentes, desde suas origens. Com efeito, pode-se afirmar que isso relativiza as iniciativas de formulação – simbólica e real – de ações compartilhadas e a construção de um mundo comum.

Esse panorama do mundo atual reveste-se de grande relevância política. Isso porque as incertezas do presente geram conflitos e violências de grandes proporções, de tal maneira que envolvem toda a humanidade e não apenas grupos isoladamente considerados da humanidade, integrando as vidas cotidianas dos indivíduos e das estruturas de cooperação internacional. Em outras palavras, o problema central reside no fato de que o conjunto de medos e de violências instalados, a sua intensificação ou neutralização recíproca, constitui a dinâmica do mundo contemporâneo, exigindo-se, para o seu enfrentamento, a adoção de novas práticas políticas e o desenvolvimento de uma consciência universal de paz.

Assim sendo, o presente texto busca compreender os elementos que constituem esse novo cenário global e, a partir do método hipotético-dedutivo e da técnica de pesquisa bibliográfica, destacar a importância da proteção internacional dos direitos humanos em um quadro social pautado nos sentimentos de medo e de incerteza. O objetivo consiste em demonstrar, portanto, que a sociedade internacional atual se caracteriza por uma sensação de guerra permanente e pelo declínio crescente do papel dos direitos humanos, o que desafia o mundo a (re)construir mecanismos de solução pacífica dos conflitos, de formas de regulação da guerra e de proteção à dignidade da pessoa humana.

1 Da guerra tradicional às novas guerras

A perspectiva do conflito violento sempre integrou as diversas formas de convivência humana. Até onde se pode aprender acerca da humanidade, pelo menos a partir da filosofia política moderna, a natureza do homem sempre esteve perpassada por paixões beligerantes, em antítese à sociabilidade almejada. É esse fato que impulsiona a configuração do estado de natureza. Nessa situação, todos eram livres e iguais, mas ninguém possuía, de fato, verdadeira liberdade, uma vez que o referido estado era um estado de guerra de todos contra todos. Foi isso que justificou a afirmação de Thomas Hobbes (2012) no sentido de que o homem é o lobo do próprio homem.

A institucionalização do Estado, enquanto detentor do monopólio do uso da força, de certa maneira, controlou a possibilidade da guerra em nível interno. No entanto, em analogia aos primórdios da sociabilidade humana, o excesso de liberdade, que alimentava o poder dos Estados nacionais e a ausência de regularização das relações entre essas nações soberanas, criava, em âmbito externo, uma condição de austeridade extrema, ou seja, um mar de “Leviatãs” (Hobbes, 2012). Nesse contexto, a guerra emergia como um fato natural de solução dos conflitos. Foi isso que permitiu a afirmação de que a guerra consistia na condição da paz. Nesse sentido, tornou-se famoso o provérbio latino de Flávio Vegécio: “Si vis pacem, para bellum” (“se quer paz, prepare-se para a guerra”).

Essa noção foi retomada e ampliada durante os séculos XV e XVII e permitiu a construção da teoria do bellum justum (guerra justa). Ressalta-se que naquela época interessava, especialmente à manutenção do poder pela Igreja e à exploração mercantil e territorial dos Estados nascentes da Europa, justificar o emprego da violência em prol da dominação como algo não apenas necessário aos fins da evolução civilizatória cristã, mas, perversamente, como algo justo (domínio dos europeus). Contudo, isso durou pouquíssimo. Logo o argumento colonizador, embasado na vontade divina da “verdade” cristã, começou a ser questionado, seja pela expansão do protestantismo europeu ou, inclusive, pelas descobertas de povos não-cristãos.

A noção de guerra necessitava, então, ser associada a um fundamento de direito que, coadunado aos anseios de máxima racionalidade e ao processo de laicização, forjasse uma nova fonte de legitimidade. Nesse sentido, elaborações teóricas inéditas foram criadas e novos autores emergiram. Em meio ao cenário da colonização espanhola, destacou-se Francisco De Vitória (2006), que, muito embora tenha escrito da perspectiva do povo dominante, reconhecia que a guerra somente poderia ser justa quando estivesse associada à noção de defesa e não de ofensa. Por conseguinte, as incursões armadas espanholas contra os povos originários (os indígenas) não poderiam ser consideradas como guerras justas e tampouco se justificavam mediante pressupostos religiosos.

Ainda nesse contexto, Alberico Gentili (2006) argumentou que a guerra justa seria aquela empregada apenas pelo poder soberano, ampliando o entendimento de guerras públicas, também pensada por Francisco Suárez. Na mesma esteira de pensamento, Hugo Grotius (2005) veio a identificar a guerra como um estado (status) daqueles que contendem, mesmo que não necessariamente soberanos, relembrando a noção já construída por Marco Túlio Cícero (1973), que trata da guerra como um embate que se resolve pela força e pelas armas, independente de quem são os seus sujeitos.

Ao fazê-lo, o jurista holandês traduz a ideia de que a guerra, assim definida enquanto um estado, designa um conjunto de características específicas e um conjunto de condições que se referem a um modo de estar, no qual se encontram os indivíduos em um determinado momento. É o que afirma em outra parte o autor referido: “A guerra é a designação de um estado que pode existir mesmo sem produzir suas operações externamente” (Grotius, 2005, p. 1423). Isso também se torna possível de compreender quando Grotius (2005, p. 304) assevera que a guerra pública “se prolonga e se realimenta continuamente pela sucessão de novas culpas e novas injúrias”.

Por outro lado, é possível dizer que foi estabelecida uma compreensão comum de que a justiça da guerra apenas poderia ser associada a um critério de licitude, ou seja, de estar, ou não, de acordo com os preceitos do emergente Direito Internacional Público. Desse modo, a guerra tornava-se parte da prerrogativa de defesa dos Estados modernos soberanos, sendo considerada como um mal necessário e que se encontrava devidamente legitimado e regulamentado por um novo ramo do Direito. Esse novo ramo do Direito passou a ser, portanto, reconhecido como o Direito da Guerra.

Da mesma forma que internamente os Estados fortaleciam o princípio da soberania e a ideia de nação sob a tutela do Direito, em âmbito externo, os entes estatais se afirmavam, embora desiguais política, jurídica e economicamente, todos como Estados soberanos. Nessa condição, todos os Estados constituem-se em verdadeiras potências e, a partir desse lugar definido, vão tentar construir o Direito Internacional – então, como o nome de Direito das Gentes – e, no seu interior, tentar regular o poder estatal e legitimar a guerra como um direito natural do Estados nacionais. Assim, o raciocínio moderno embasava-se, desse modo, na experiência de normalização da guerra como uma forma natural de exercício do poder dos Estados e como o mecanismo que, em última análise, poderia garantir a paz e a segurança no contexto das relações existentes entre eles.

Em decorrência desse fato, no mundo moderno, a guerra, conforme o entendimento de Jerome B. Schneewind (2001, p. 99), passou a ser compreendida como um fato normal da vida humana, pois “somos seres autopreservadores e briguentos”. Daí, portanto, a compreensão de que a guerra é fruto do ódio e da animosidade, sendo considerada, segundo Carl Von Clausewitz (2010, p. 30), “como um cego impulso natural, depois, do jogo das probabilidades e do acaso, que fazem dela uma livre atividade da alma, e, finalmente, a sua natureza subordinada a instrumento da política”.

Entendida dessa forma, a guerra tornou-se, ao longo do mundo moderno, uma prática normal dos Estados. Esse cenário somente sofreu uma grande transformação com o término da Segunda Guerra Mundial e a criação da Organização das Nações Unidas (ONU), em 1945. De fato, a partir da criação dessa organização a guerra deixou de ser um fato normal do cotidiano da sociedade internacional e passou a ser considerada legal apenas em duas circunstâncias: nas situações em que se configuravam guerra de defesa e de preservação dos Estados ou, então, quando eram autorizadas expressamente pelo seu Conselho de Segurança.

Esse foi um fato político e jurídico muito importante. Politicamente, devido ao fato que a ONU passou a se constituir como um terceiro importante na solução dos conflitos entre os Estados; juridicamente, devido ao fato que a guerra passou a ser uma exceção no Direito Internacional. Tal restrição política e jurídica da guerra começou a ser novamente flexibilizada nas últimas décadas do século XX e levou Eric Hobsbawm (1995) a afirmar que é necessária uma nova análise sobre o mundo atual e a formulação de um novo conceito de guerra – não mais aquele tradicional.

O ponto de partida da referida análise é que o mundo atual se mostra cada vez mais complexo e interdependente. De fato, com o avanço dos processos da globalização, os fatores internos e externos aos Estados passam a se confundir e a transcender as fronteiras territoriais, redefinindo as concepções espaço-temporais e contribuindo para o crescimento exponencial da complexidade da vida em sociedade. Essa conjuntura traz à tona uma série de conflitos que desafiam a ordem mundial e, ao mesmo tempo, admitem a sucessiva ampliação dos riscos e dos caminhos possíveis para a efetivação da paz no contexto do estado de guerra global que aflige as mais diversas coletividades humanas.

Não resta a menor dúvida, portanto, de que a configuração do mundo enquanto um sistema global consiste num dos mais expressivos acontecimentos da história da humanidade dos últimos séculos. O fenômeno caracteriza-se por ser a causa e o efeito, simultaneamente, da unificação do planeta em todos os sentidos e com diversos graus de intensidade. Logo, faz-se plenamente coerente a afirmação de Milton Santos (1997, p. 48) no sentido de que “a Terra se torna um só e único ‘mundo’ e assiste-se a uma refundição da totalidade-terra”, formando um território comum da humanidade.

Desse modo, as mudanças que afetam as civilizações podem, de fato, ser sentidas em toda parte do globo. Isso porque, conforme Octavio Ianni (2013, p. 169-170), por meio da globalização, o planeta se transformou “em um território de todo o mundo. Tudo se desterritorializa e reterritorializa. [...] As fronteiras são abolidas ou tornam-se irrelevantes ou inócuas, fragmentam-se e mudam de figura, parecem, mas não são”. Por isso, nota-se que o fenômeno da globalização consiste em um verdadeiro marco simbólico-referencial da emergência de uma nova era dotada de complexidades, caracterizando-se como um acontecimento intenso e com dimensões bastante abrangentes no que se refere “à redução das distâncias, à aceleração do tempo, à quebra das identidades nacionais [...] e à conformação de novas relações políticas” (Bedin, 2011, p. 130).

Com o impacto desse novo fenômeno, a soberania e a autonomia dos Estados são significativamente relativizadas e fragilizadas em virtude do extraordinário aumento das interconexões globais. Esse fato “oportuniza uma maior inter-relação entre as nações” (Menezes, 2005, p. 104) e consagra que o poder dos Estados, em relação aos inúmeros problemas que sobrecarregam a agenda internacional, se torna pequeno e funcionalmente pouco eficiente. Nesse sentido, Michael Hardt e Antonio Negri (2005) sustentam que a nova configuração mundial estabelecida pela globalização acarretou a ruptura e o desaparecimento do sistema moderno westfaliano dos Estados, pois, “na era da interdependência global, seria anacrônico apostar ainda no modelo de Westfália para garantir a ordem mundial e a manutenção da paz” (Zolo, 2011, p. 32).

Com o fim do modelo de Westfália, a sociedade internacional deixa de se estruturar a partir do conceito de soberania e a guerra adquire novos contornos. Efetivamente, a guerra deixa de ser um conflito de soberanias reguladas pelo Direito Internacional e vai, cada vez mais, assumindo a forma de um princípio difuso de organização social em escala planetária. Com essa transformação mundial, torna-se muito mais obscura a diferenciação entre a definição de guerra e de política, uma vez que “a guerra vai-se transformando no princípio básico de organização da sociedade, reduzindo-se a política apenas a um de seus recursos ou manifestações.” (Hardt; Negri, 2005, p. 33).

Assim, a guerra, ocupando esse novo lugar na atualidade, volta a ser vista como um fato normal do cotidiano da vida humana. É que ela, ao se vincular ao conceito de estado de exceção, passa a ser percebida como algo regular, ficando quase que imperceptível aos olhos da sociedade. O motivo é que a sua existência emerge imbricada nos próprios contornos do Direito estabelecido, cujo contexto provoca a dificuldade de compreensão quando o Estado age, ou não, de acordo com os seus pressupostos jurídicos. Com isso, a guerra se aproxima da noção de guerra civil e passa a se situar numa zona cinzenta entre o legal e o ilegal. Nesse sentido, o soberano (Chefe de Estado), como detentor da decisão sobre a instauração ou não do regime de exceção, adquire uma aura na qual a transgressão da ordem jurídica é, ao mesmo tempo, interna e externa a ela (Agamben, 2004).

Dessa forma, poder, guerra e direito adquirem uma nova convergência e novas técnicas de dominação são forjadas, havendo, ou não, um conflito violento de grande escala. Consequentemente, esta se transforma em um regime de biopoder, ou seja, em uma forma de governo destinada a controlar a população e, inclusive, a (re)produzir continuamente todos os aspectos da vida em sociedade. Entretanto, isso não significa que a violência em grande escala esteja ocorrendo, mas, sim, que a vida cotidiana dos indivíduos e o poder passaram a ser permeados e caracterizados pela ameaça da violência potencial do estado de guerra permanente (Hardt; Negri, 2005).

É justamente esse fato que permite à Judith Butler (٢٠٠٩, p. ١١٠) afirmar que “a guerra parece ter estabelecido um estado mais ou menos permanente de emergência nacional”4. Esse fato somente pode ser verdadeiramente compreendido no contexto não da regulamentação da guerra pelos Estados, mas, sim, no contexto de um verdadeiro estado de exceção (Agamben, 2004). Com isso, pode-se observar que os conflitos passam a ser vistos como permanentes, os quais adquirem, com os novos recursos tecnológicos, dimensões bastante extraordinárias e, em consequência, produzem um profundo sentimento de insegurança e um medo generalizado em toda a população mundial.

2 As novas guerras e as guerras por escolha

O novo cenário estabelecido, como demonstrado na seção anterior, produz novas formas de sociabilidade. Os seres humanos passam a viver, portanto, em meio a uma constante ansiedade e ameaça de perigos reais e irreais que podem, eventualmente, se concretizar em qualquer lugar e a qualquer momento. Esse elemento permeia o panorama político atual e é uma das características mais marcantes da sociedade globalizada. Nesse contexto, parece ter toda a razão Zygmunt Bauman (2013, p. 99-100), quando lembra que, cada vez mais, a necessidade de “segurança torna-se [algo] viciante; as pessoas descobrem que, embora tenham muito, isso nunca será suficiente [...] O medo alimenta o medo”.

Notadamente, o medo foi instalado e, em consequência, as medidas de segurança se tornaram permanentes. A justificativa é que “novos perigos são descobertos e anunciados quase diariamente, e não há como saber quantos mais, e de que tipo, conseguiram escapar à nossa atenção (e à dos peritos!) – preparando-se para atacar sem aviso.” (Bauman, 2008, p. 12). É por esses motivos que, na atualidade, a guerra adquiriu uma nova configuração e a vida humana se transformou em uma verdadeira e constante luta contra o medo. Esse quadro permite que a incerteza e a potencial violência humana se tornem motivos relevantes para a construção de novos controles políticos e de novas cruzadas que podem levar a uma verdadeira guerra de extensão global.

Um exemplo dessa tendência pode ser encontrado na política de enfrentamento aos “inimigos”, adotada pelos Estados Unidos, após o episódio que envolveu o World Trade Center. A luta contra o terrorismo travada pelo governo estadunidense demonstra a pretensão de combater os perigos a qualquer custo, independentemente se são, de fato, potenciais ameaças. Os eventos que marcaram o 11 de setembro de 2001, contudo, apenas trouxeram à tona, como bem lembra Maiquel Ângelo Dezordi Wermuth (2015, p. 59), iniciativas que já se alastravam por longa data no cenário político mundial, pois várias medidas tinham sido gestadas antes do aludido acontecimento, mas a emergência desse fato permitiu que a “guerra ao terrorismo se afirmasse como uma justificativa perfeita”.

Nesse contexto, as guerras tornaram-se diferentes e podem, muitas vezes, ser efetivamente apenas guerras por escolha e não por necessidade. Isso significa dizer que se trata de um tipo de guerra muito específico: guerras que se justificam a partir de uma ameaça forjada. Como exemplo, tem-se a guerra do Iraque (2003-2011), que não eclodiu e tampouco possuía um casus belli. De fato, o referido conflito ocorreu no bojo da chamada guerra global contra o terrorismo, lançada em 2003 pelo então presidente estadunidense, George W. Bush. Essa guerra, claramente ilegal conforme a Organização das Nações Unidas (ONU), foi travada por uma escolha unilateral e não por necessidade (BBC NEWS, 2004).

A justificativa utilizada foi a de combate ao terrorismo. Mas, como lembra Bauman (2006, p. 53), talvez a verdadeira razão por detrás daquela guerra, da escolha do Iraque como parte, tenha sido o “desejo de se apossar do segundo maior suprimento de petróleo do planeta”. Esse fato atribui pouco crédito à racionalidade daqueles que a planejaram, uma vez que “a guerra em si custa caro demais, a ocupação que ela provoca é desastrosa e todos os benefícios derivados do preço do petróleo são anulados antecipadamente pelos gastos militares” (Bauman, 2006, p. 53). De uma forma bastante semelhante, observa-se a guerra civil da Síria, onde as grandes potências mundiais intervêm militarmente, sem casus belli, para combater o terrorismo internacional e, assim, “impedir” as violações dos direitos humanos no âmago do conflito armado.

Desse modo, em relação aos Estados Unidos e seus aliados, enfatiza-se a tentativa dessas grandes potências mundiais neoimperiais de apresentar as próprias guerras assimétricas – que acarretam efeitos e impactos em âmbito global – como conflitos armados conduzidos em prol de toda a humanidade. Contudo, para Danilo Zolo (2011, p. 205), quando um Estado nacional combate “seu inimigo em nome da humanidade, a guerra que conduz não é uma guerra da humanidade. Aquele Estado tenta simplesmente se apropriar de um conceito universal, para poder se identificar com ele à custa do inimigo”. O monopólio desse conceito durante uma guerra, o qual pode ser considerado como uma espécie de slogan ético e humanitário, significa nada mais do que a negação da condição e qualidade de humano ao inimigo, o que justifica a utilização de métodos cruéis, excludentes e desumanos, com capacidade de atingir proporções vastas e inimagináveis.

Nesse sentido, essas guerras com fins “humanitários” inverteram tanto as noções de necessidade como de liberdade e, em consequência, produzem uma nova naturalização da guerra. É esse fato que permite a retomada da ideologia do bellum justum (guerra justa) por parte dos Estados Unidos. Isso é inaceitável e representa o renascimento de uma doutrina tipicamente imperial, no sentido de que pressupõe a existência de uma autoridade e de um poder superior. Por isso, os EUA apresentam a guerra global contra o terrorismo ou contra os Estados inimigos como uma investida armada do bem contra o mal, ou seja, como uma just war (guerra justa). Na verdade, são guerras com interesses pré-definidos e que tentam encobrir guerras unilaterais e ilícitas que são realizadas às margens do Direito Internacional.

São guerras, portanto, diferentes. Por isso, Zolo (2011, p. 206) evidencia que a “guerra que se perfila no horizonte não será somente uma guerra global, assimétrica, ‘justa’ e ‘humanitária’, mas será a guerra capaz de uma discriminação abissal do inimigo, pois assumirá a forma de permanente ‘ação de polícia’”, a qual é controlada pelos Estados Unidos e seus aliados europeus em nome dos direitos humanos universais. Estas nações utilizam-se de armas com um alto potencial destrutivo contra aqueles que são considerados como perturbadores da paz mundial. Assim sendo, o que se verifica não são guerras entre Estados nacionais, suscetíveis de serem concluídas através de um tratado de paz, mas, sim, “uma permanente ‘guerra civil mundial’ conduzida por grandes potências, para submeter ao controle policial-militar o planeta inteiro.” (Zolo, 2011, p. 206).

Dessa forma, as guerras da atualidade fragilizam totalmente as normas internacionais sobre o tema e colocam em segundo plano a prática existente na Organização das Nações Unidas (ONU) sobre as guerras de agressão. De fato, essa nova configuração das guerras leva, como lembra Zolo (2011, p. 2010), a uma verdadeira “inutilidade da proscrição jurídica da guerra proclamada pela Carta das Nações Unidas e confirmada pelo Tribunal de Nuremberg”. As novas guerras da atualidade são “impunemente praticadas pelas grandes potências, em particular pelos Estados Unidos, pela Inglaterra, por Israel e, até mesmo, pela Turquia” (Zolo, 2011, p. 2010). Essa realidade é, de fato, muito importante e contribui para a normalização da guerra e da violência nas suas formas mais cruéis e, cada vez mais, distantes da regulação jurídica internacional.

A deflagração de guerras justificadas pelo interesse de combater os perigos e, via de consequência, promover a “pacificação mundial” situa-se em uma situação de indistinção entre direito, poder e política, haja vista que a violência é sustentada como necessária para restabelecer a ordem. Contudo, isso parece não ser razoável ou coerente, especialmente porque os governos, na visão de Hobsbawm (2009, p. 21), não ingressam nas novas guerras por as verem como algo necessário e indispensável para a paz mundial, mas, sim, para “conseguir o apoio da opinião pública”.

As guerras, que passam a ser apresentadas como o principal instrumento para a assegurar a tutela de fins nobres na atualidade – defesa dos direitos humanos, da democratização mundial, do aumento da liberdade, do bem-estar dos povos e da segurança mundial –, são, como regra, guerras por escolha e possuem como “finalidade” a promoção da paz universal. Assim, são conflitos muito diferentes daqueles característicos de seu período clássico. Esta diferença evidencia-se através da constante busca dos Estados pelo poder em escala global. Esse movimento resulta em infindáveis disputas violentas e que transformam a guerra em um fenômeno global e permanente, visto que inúmeros conflitos armados emergem cotidianamente, uns mais “breves e limitados a um lugar específico, outros prolongados e expansivos.” (Hardt; Negri, 2005, p. 21-22). No entanto, o mais importante disso é notar que os conflitos estão sempre presentes na conjuntura social.

Por isso, as guerras tornam-se um fato cotidiano relevante e são incorporadas à regularidade da política. Consequentemente, nessa mesma esteira de pensamento, Hardt e Negri (2005, p. 23) afirmam que, em “determinados momentos e lugares, pode haver cessação das hostilidades, mas a violência letal está presente como uma potencialidade constante, sempre pronta a irromper em qualquer lugar”. Desse modo, na atualidade, não é mais possível falar em guerras isoladas, haja vista que estas assumem dimensões políticas, econômicas e sociais bastante abrangentes, devendo-se considerá-las como “um generalizado estado de guerra global que de tal maneira torna menos distinta a diferença entre guerra e paz que já não somos capazes de imaginar uma paz verdadeira ou de ter esperança nela” (Hardt; Negri, 2005, p. 23, grifo dos autores).

A guerra global é tão violenta como todas as outras guerras, mas se diferencia, acima de tudo, pela sua crueldade intencional. Destaca-se que nessas guerras é praticamente inexistente a diferenciação entre exterior e interior dos Estados, entre a segurança interna estatal e os conflitos externos. Por isso, passa-se do patamar das invocações retóricas e metafóricas da guerra para a ideia de guerras reais globalizadas contra inimigos indefinidos e imateriais. Uma das principais consequências desse novo tipo de guerra consiste no fato de que, diferentemente das antigas guerras contra um Estado – que possuíam delimitações no tempo e no espaço, sendo marcadas por vitórias, tréguas ou rendições entre os países que estavam em conflito –, as guerras globais se contrastam justamente pelo fato de seus limites passarem a ser indefinidos, tanto em termos espaciais como temporais. Essas guerras, conforme Hardt e Negri (2005, p. 35), “podem estender-se em qualquer direção, por períodos indeterminados”, até porque “uma guerra para criar ou manter a ordem social não pode ter fim. Envolverá necessariamente o contínuo e ininterrupto exercício do poder e da violência”.

O estado de guerra global trata-se, então, de um dos problemas centrais da atualidade. Pode-se afirmar que a guerra passa a ser efetivamente absoluta mediante o desenvolvimento tecnológico de armas que rompem com a moderna dialética e tornam possível, pela primeira vez, a destruição em massa e mesmo global. O certo é que a guerra sempre envolveu destruição e mortes, mas, a partir do século XX, esse poder destrutivo chegou aos limites da pura produção da morte. Por isso, as novas guerras, consoante Achille Mbembe (2016, p. 139), “visam forçar o inimigo à submissão, independentemente de consequências imediatas, efeitos secundários e ‘danos colaterais’”.

Em consequência, aumentou-se, significativamente, o medo e as incertezas em âmbito global, tornando necessária e urgente a busca da construção de um cenário de paz internacional. Assim sendo, pode-se afirmar que a sociedade internacional passa a ter como desafio a criação de novas formas de solução pacífica dos conflitos e de novos métodos de regulação da guerra. Esse é um desafio extraordinário. No entanto, é importante manter a esperança e observar que as possibilidades da paz mundial estão atualmente obscurecidas pelo estado de guerra global. Fato é que se é verdade que o mundo se globalizou, fomentando as incertezas e os medos, também é verdade que as possibilidades humanas se ampliaram e que novas perspectivas sugiram na sociedade contemporânea.

3 O papel dos direitos humanos na atualidade

A ambiguidade referida no âmbito do cenário internacional da atualidade constitui-se como fundamental. Nesse sentido, deve-se perceber que a lógica clássica westfaliana, que se baseava exclusivamente nas relações entre os Estados soberanos, está rompida e que novas possibilidades de conflitos violentos (novas guerras) emergiram. Ao mesmo tempo, ampliaram-se, por exemplo, as possibilidades de proteção internacional dos direitos humanos e as formas de cooperação entre os povos. Esses últimos fatores ficam mais evidentes a partir da segunda metade do século XX e permitem que os indivíduos tenham, cada vez mais, a atenção internacional e, por conseguinte, a proteção da dignidade humana, a qual se tornou um princípio de alcance planetário e universal que consolidou o pressuposto de limitação da soberania estatal (Guerra, 2015; Lafer, 2015).

A Declaração Universal dos Direitos Humanos inscreve-se, dessa forma, consoante Fábio Konder Comparato (2001), como o estágio culminante do referido processo e fixa definitivamente o ser humano como fonte de todos os valores, independentemente de qualquer condição. Por isso, é possível situar a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) como um marco global de atenção à vida dos indivíduos e como resultado de mãos humanas de diferentes países, etnias, religiões e ideologias. Por isso, a partir de 1948, segundo Norberto Bobbio (1992, p. 28), “podemos ter a certeza histórica de que a humanidade – toda a humanidade – partilha alguns valores comuns; e podemos, finalmente, crer na universalidade dos valores”, que significa “não algo dado objetivamente, mas algo subjetivamente acolhido pelo universo dos homens”. Trata-se de compreender a existência de um núcleo mínimo de preceitos considerados elementares para aquilo que se propõe como dignidade em relação à vida, à saúde, à educação, à segurança, à alimentação, ao trabalho etc.

Nesse processo, lembra Mikel Berraondo López (2004) que, após a criação da Organização das Nações Unidas (ONU), o sistema de proteção internacional dos direitos humanos se institucionaliza a partir de três grandes marcos. Em primeiro lugar, evidencia-se a etapa normativa entre 1945 e os anos finais da década de 60, momento em que os Estados nacionais assumiram a obrigação de garantir os direitos humanos fundamentais elencados na Carta das Nações Unidas e na Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), como também se destaca o impulso ao processo de descolonização (López, 2004).

Em segundo lugar, fala-se de uma etapa de construção institucional, a partir do fim dos anos 60 até a queda do Muro de Berlim (1989). Nesse período, surgem órgãos e mecanismos de aplicação, controle e implementação dos direitos assegurados pelos mais distintos documentos que se instituem, tais como o Comitê de Direitos Humanos, o Comitê para a Eliminação da Discriminação contra as Mulheres, o Comitê para a Prevenção do Racismo, o Comitê contra a Tortura, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, a Comissão Europeia de Direitos Humanos, o Tribunal Europeu de Direitos Humanos, dentre outros institutos destinados à prevenção e à proteção dos direitos humanos (López, 2004).

Por sua vez, em terceiro lugar, evidencia-se a etapa posterior à Guerra Fria, que se iniciou com o fato histórico da desintegração da União Soviética (URSS) e o desmembramento dos países socialistas. O marco fundamental desse momento consiste, justamente, na queda do Muro de Berlim, que findou a Guerra Fria e, sem dúvida, contribuiu para uma maior cooperação entre os Estados nacionais e para a institucionalização dos direitos humanos em nível mundial. É a partir desse período que ocorre um pleno desenvolvimento normativo dos direitos humanos e que se ampliam as conferências mundiais de participação governamental e não-governamental, de importância metafísica para tratar acerca das questões de direitos humanos em âmbito internacional (López, 2004).

Com efeito, em virtude das reivindicações morais pós-1945, os “direitos humanos nascem quando devem e podem nascer” (Piovesan, 2006, p. 07) e, conforme Hannah Arendt (2017), os referidos direitos não se constituem como algo posto, mas, sim, como uma invenção humana, que se encontra em um constante processo de (re)construção. Ou seja, os direitos humanos refletem uma construção axiológica, a partir de lutas e ações sociais que figuram em um espaço considerado como simbólico. Assim, na linha de pensamento de Joaquín Herrera Flores (2009), os direitos humanos invocam uma plataforma de emancipação, a qual está voltada para a proteção da dignidade da pessoa humana.

Todos os avanços no âmbito dos direitos humanos são significativos. Mas, é importante ter consciência que a adoção da Declaração Universal dos Direitos Humanos e seus progressos não resolveram todos os problemas de violação dos direitos humanos. Por outro lado, foi estabelecido um parâmetro importante e direitos indispensáveis foram reconhecidos. De fato, as violações de direitos humanos continuam e as guerras globais atualmente em curso são um bom exemplo disso. Por isso, vive-se um momento, como lembra Bobbio (1992), no qual, mais do que examinar a razão fundante dos direitos humanos e as suas justificativas, se exige, essencialmente, a discussão acerca da forma mais segura de proteção dos referidos direitos. Significa dizer, então, que o debate não se limita a um problema filosófico, mas, sobretudo, a um problema de natureza política devido aos desafios estabelecidos para a efetivação dos direitos humanos.

Tais desafios políticos são de diversas naturezas. Há carências estatais e supranacionais para a promoção de uma cultura de respeito aos direitos humanos. Há ausência de ratificação de tratados nos ordenamentos jurídicos pátrios, de submissão de alguns países à jurisdição internacional e regional de proteção aos direitos humanos. Além disso, existe uma notória necessidade de reformulação das grandes organizações internacionais e de responsabilização das autoridades políticas pelas transgressões dos direitos humanos no âmbito geral, continentais e nacionais. Portanto, são muitos desafios a serem enfrentados e superados para a efetiva proteção internacional dos direitos humanos.

Importante se faz o desenvolvimento da compreensão de que a efetivação dos direitos humanos não é uma tarefa exclusiva, por exemplo, da Organização das Nações Unidas (ONU) e, sim, um intento a ser construído com ações e esforços compartilhados entre diversos órgãos e autoridades, tanto de nível internacional como nacional. Por fim, os indivíduos e as estruturas não governamentais devem se conscientizar da sua verdadeira “responsabilidade coletiva, não apenas como nação, mas como parte de uma comunidade internacional baseada no compromisso com a igualdade e com a cooperação não-violenta”5 (Butler, 2009, p. 42). Isso exige, de fato, um amplo e significativo esforço para se recriar condições sociais e políticas instituídas sobre bases verdadeiramente mais sólidas e voltadas para a proteção internacional dos direitos inerentes a todos os seres humanos.

Conclusão

O mundo atual perpassou por grandes transformações. O objetivo do presente trabalho foi buscar compreender as guerras globais estabelecidas e o papel dos direitos humanos frente a esse novo cenário. A análise centrou-se na existência de uma sociedade repleta de riscos e ameaças ensejadoras do medo como instrumento legitimador para a deflagração da guerra, cujo contexto demandou reflexões acerca dos desafios e dos paradoxos apresentados, hoje, pelo estado de exceção configurado diante da suposta luta em prol da pacificação planetária e do controle do terrorismo internacional.

O desenvolvimento do Direito de Guerra moderno, considerado como uma construção paralela à consolidação da noção de Direito Internacional, foi decisivo para a legitimidade da institucionalização da guerra como método de resolução de conflitos e, notadamente, para a formação de uma racionalidade de aceitação da violência como condição humana imutável. A aceitação da guerra, embora sob o manto da dita emergência, evidencia um paradigma difuso de estado de exceção, por vezes temido, por vezes desejado, como meio de manutenção do poder geopolítico das potências estatais. Tais fatores constituem, por certo, os desafios e as possibilidades para a consagração do almejado ideal de paz mundial duradoura no seio do chamado estado de guerra global.

O panorama social da contemporaneidade, que se utiliza do medo como ferramenta de poder político e mercadológico, assim como distorce o conceito de estado de exceção com vistas à legitimação de políticas interventivas e de dominação no bojo dos Estados Democráticos de Direito, vem sendo gradativamente desnudado. Nesse sentido, pode-se afirmar que na medida em que o referido contexto da excepcionalidade para a guerra se torna a regra, assumindo o patamar dominante da política hodierna, a sociedade internacional encontra-se exposta às inúmeras violências estabelecidas em dimensão global e nunca imaginadas no decurso da história das civilizações.

É evidente que os acontecimentos mundiais ocorridos a partir da segunda metade do século XX e do início do século XXI intensificaram os problemas e os desafios estabelecidos. O respeito e o diálogo intercultural, caracterizados como valores fundamentais do pensamento atual, estão sendo indiscriminada e perigosamente solapados pelo poder destrutivo das armas nucleares, pelos atentados terroristas, pela eclosão dos conflitos étnicos e globais no interior ou exterior dos Estados nacionais, o que contribui para tornar a segurança internacional e a manutenção da paz mundial cada vez mais distantes. Mas, a esperança de um mundo melhor se mantém e a crescente proteção internacional dos direitos humanos sinaliza que a batalha ainda não está perdida. Portanto, faz-se necessária uma verdadeira adoção de novas estratégias compartilhadas e de novos valores mundiais.

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  1. 1 Pós-Doutor pelo Instituto de Estudios Avanzados da Universidad de Santiago de Chile (IDEA-USACH); Doutor e Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC); Professor permanente dos Cursos de Graduação em Direito e dos Programas de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito – Mestrado e Doutorado – da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (UNIJUÍ) e da Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões (URI); Líder do Grupo de Pesquisa “Direitos Humanos, Governança e Democracia” (Mundus). https://orcid.org/0000-0001-9183-7065. gilmarb@unijui.edu.br.

  1. 2 Pós-Doutora, Doutora e Mestra pelo Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito – Mestrado e Doutorado em Direitos Humanos – da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul; Bacharela em Direito pela UNIJUÍ; Professora Efetiva Adjunta da Carreira do Magistério Superior do Curso de Direito da Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA), campus São Borja/RS. Vice-líder do Observatório de Direitos Fundamentais; Pesquisadora do Grupo de Pesquisa “Direitos Humanos, Governança e Democracia” (Mundus); Advogada (OAB/RS). https://orcid.org/0000-0002-0371-5234. alineleves@unipampa.edu.br.

  1. 3 Doutor e Mestre pelo Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em – Mestrado e Doutorado em Direitos Humanos – da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul; Bacharel em Direito pela UNIJUÍ; Professor do Curso de Graduação em Direito da UNIJUÍ e Coordenador da UNIJUÍ, campus Três Passos/RS. Pesquisador do Grupo de Pesquisa “Biopolítica & Direitos Humanos”. Advogado (OAB/RS). https://orcid.org/0000-0002-8970-5685. andre.castro@unijui.edu.br.

  1. 4 Tradução nossa. Texto original: “la guerra parece haber establecido un estado de emergencia nacional más o menos permanente”.

  1. 5 Tradução nossa. Texto original: “responsabilidad colectiva, no sólo como nación sino como parte de una comunidad internacional basada en el compromiso con la igualdad y con la cooperación no violenta”.