https://doi.org/10.18593/ejjl.27264

O ACESSO À INFORMAÇÃO E AS CONSULTAS JURÍDICAS: os limites da transparência passiva e o papel da advocacia pública

THE ACCESS TO INFORMATION AND LEGAL CONSULTATIONS: the limits of passive transparency and the role of government´s legal counsel

Mariana Barbosa Cirne1

Samuel Lisboa Alves2

Resumo: O Estado brasileiro tem o dever de ser transparente. Pauta-se no princípio da publicidade. A Lei n. 12.527, de 18 de novembro de 2011, Lei de Acesso à Informação (LAI), inaugurou uma nova forma de acesso à Administração Pública ao estabelecer um canal com prazos a serem cumpridos. A transparência passiva. Isso, no entanto, não significa que não existam limites para os pedidos de acesso à informação. A partir do estudo dos precedentes da Ouvidora-geral da União e da Comissão Mista de Reavaliação de Informações, este artigo analisou 159 decisões para entender os parâmetros no entendimento firmado de que consultas jurídicas estão fora do escopo do acesso à informação. Para isso, por meio de revisão bibliográfica e de estudo de precedentes recursais de LAI, o artigo elegeu 49 decisões para definir alguns limites dos canais de participação da sociedade no âmbito da Administração Pública. A pesquisa concluiu, então, que os limites das consultas jurídicas não afastam o dever de se informar os fundamentos legais de sua atuação pública. Defende que é necessário pesquisar se existem manifestações jurídicas anteriores sobre o tema solicitado e que eventuais pedidos podem ser encaminhados às ouvidorias. Explica, neste contexto, o papel da advocacia pública na resposta das consultas jurídicas e as limitações relacionadas ao interesse público.

Palavras-chave: Administração Pública; Transparência passiva; Lei de Acesso à Informação; Consulta Jurídica; Advocacia Pública.

Abstract: The Brazilian State has a duty to be transparent. It is based on the principle of publicity. The Brazilian Law no. 12,527, of November 18, 2011, the Brazilian Access to Information Law (LAI), inaugurated a new form of access to Public Administration by establishing a channel with deadlines to be met. Passive transparency. This, however, does not mean that there are no limits on requests for access to information. Based on the study of the precedents of the Ombudsman-General of the Union and of the Joint Committee on Information Revaluation, this article analyzed 159 decisions to understand the parameters in the established understanding that legal consultations are outside the scope of access to information. For this, through bibliographic review and study of precedents of LAI appeals, the article elected 49 decisions to define some limits of the participation channels of society in the scope of Public Administration. The research concluded, then, that the limits of legal consultations do not remove the duty to inform the legal bases of its public performance. This paper defends that it is necessary to research if there are previous legal manifestations on the requested topic and that eventual requests can be forwarded to the ombudsman. In this context, it explains the role of government´s legal counsel in responding to legal advice and limitations related to the public interest.

Keywords: Public administration; Passive transparency; Access to Information Law; Legal Consultation; Government´s legal counsel.

Recebido em 05 de fevereiro de 2021

Avaliado em 25 de maio de 2022 (AVALIADOR A)

Avaliado em 31 de agosto de 2022 (AVALIADOR A)

Aceito em 20 de setembro de 2022

Introdução

O Estado brasileiro deve ser transparente. Os cidadãos precisam conseguir acompanhar a gestão pública de maneira simples, garantindo-se o seu direito de obter informações do Estado. A Constituição de 1988 reconheceu o direito fundamental de acesso às informações públicas, conforme inciso XXXIII do art. 5º, inciso II do § 3º do art. 37; e § 2º do art. 216 (BRASIL, 1988; ARAUJO; BUSSINGUER, 2020; AVELINO; POMPEU; FONSECA, 2021, p. 18).

Apesar de sua aprovação no Brasil ter demorado (BERLINER, 2014), a edição da Lei de Acesso à Informação (LAI), a Lei n. 12.527 de 18 de novembro de 2011 (BRASIL) fortaleceu a cultura da transparência no país3. Essa norma dispôs sobre o direito fundamental de acesso à informação, estabeleceu procedimentos objetivos e ágeis com a finalidade de garantir a transparência da Administração Pública. A avaliação de 5 anos da sua implementação demonstra os ganhos do novo normativo para a democracia brasileira (MICHENER; CONTRERAS; NISKIER, 2018).

Ocorre que, passados 10 anos de sua criação, parece necessário identificar não só os seus ganhos, mas também entender alguns limites aos pedidos de LAI. É preciso aprender com a experiência da aplicação da LAI. Neste contexto, este artigo pretende, por meio de revisão bibliográfica e de estudo dos precedentes da Ouvidora-geral da União (OGU) e da Comissão Mista de Reavaliação de Informações (CMRI), analisar se as consultas jurídicas poderiam ser formuladas à Administração Pública federal por meio de pedido de LAI. Mais do que isso, pretende-se estudar quais são os parâmetros usados pela Administração Pública federal, em sua jurisprudência administrativa, para não conhecer os pedidos de LAI em sede recursal quanto ao tema.

Para responder a estas questões, o artigo tratará da Administração Pública transparente (BRASIL, 2015). Busca, com isso, apresentar a transparência como regra, o que não afasta a existência de alguns limites. Em seguida, será discutido o conteúdo da Lei de Acesso à Informação e o que pode ser objeto de pedidos de acesso à informação. Na terceira parte, levando em conta a pretensão de formular uma consulta jurídica em LAI, haverá espaço para a pesquisa dos precedentes. O trabalho analisará 159 decisões da OGU e da CMRI, no período de 2011 a 2020. Neste tópico, traça-se estudo pormenorizado em 49 decisões, elegendo algumas balizas para a aplicação desse entendimento sobre o não-conhecimento de consultas jurídica. Ante os achados da pesquisa, pareceu necessário ao trabalho acrescentar o debate acerca do papel da advocacia pública quanto às respostas de consultas jurídicas.

O trabalho conclui que de 49 consultas jurídicas formuladas pela LAI, 48 delas não foram conhecidas, por estar fora do escopo do acesso à informação. Há uma posição consolidada na Administração Pública federal de que assessoria jurídica não está contida no conceito de informação da LAI. Isso, contudo, não afasta o dever de: a) a Administração Pública indicar os fundamentos legais de sua atuação; b) pesquisar se há manifestações jurídicas anteriores sobre o tema do pedido de LAI; e c) encaminhar eventuais demandas às ouvidorias, para que sejam consideradas na gestão pública. Como conclusão, apesar de reconhecer a importância da transparência e da participação social no Brasil, defende-se, aqui, que a Administração Pública é quem deve eleger quais demandas devem ser endereçadas à advocacia pública, sob pena de prejuízo ao interesse público.

Delimitados os contornos deste trabalho, passa-se ao seu desenvolvimento.

1 A Administração Pública transparente

O artigo 5º, inciso XXXIII, da Constituição Federal de 1988 (BRASIL; MOTA FILHO, 2020, p. 31) prescreve que todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade. A regra, portanto, da Administração Pública, é a publicidade. Por tais canais, os cidadãos podem participar ativamente dos processos de tomada de decisões, controlar os gastos governamentais, fiscalizar e denunciar os atos de corrupção (LAMBERTY; GOMES; SILVA, 2020, p. 158; BERLINER, 2014).

Não bastasse isso, entre os princípios da Administração Pública brasileira consta expressamente o da publicidade (LIMBERGER, 2006). Tal definição merece, ainda, ser acrescida do art. 37, § 3º, inciso II (BRASIL), que não só garante as formas de participação do usuário na administração pública direta e indireta, conforme definição legal, mas também reafirma o direito dos usuários aos “registros administrativos e a informações sobre atos de governo” (BRASIL). Ainda no contexto constitucional, o art. 216, §2º, da Constituição de 1988 (BRASIL) estabeleceu que cabe à administração pública, na forma da lei, a gestão da documentação governamental e as providências para franquear sua consulta a quantos dela necessitem. O direito de acesso à informação pública, dessa forma, constitui forte instrumento democrático que possibilita, entre outras coisas, uma melhor compreensão do funcionamento da administração pública ao cidadão, além de facilitar a participação social na fiscalização dos atos administrativos. Promove a integridade e gera aproximação entre a sociedade e o Estado (AVELINO; POMPEU; FONSECA, 2021, p. 21). Da junção de tais dispositivos constitucionais, conclui-se que a Administração Pública tem um dever de ser transparente.

A transparência pode ser entendida como a visibilidade do conjunto da Administração Pública (ANGÉLICO, 2012, p. 24). Mais do que isso, para um sistema público ser transparente, a Administração precisa contar com duas características: a) visibilidade e b) inferabilidade (MICHENER, 2011). Isso significa que não basta a disponibilização de informações, exigindo-se que ocorra com qualidade, de forma útil, para serem passíveis de utilização pela sociedade. Em outras palavras, a informação deve permitir o monitoramento governamental (BERLINER, 2014, p. 482). Essas são as bases para a concretização do direito à informação com amparo constitucional e internacional4 (ARAUJO, BUSSINGUER, 2020).

Endossando essa leitura dos dispositivos constitucionais, o Supremo Tribunal Federal (STF), em julgamento de repercussão geral, reconheceu que “[...]o parlamentar, na condição de cidadão, pode exercer plenamente seu direito fundamental de acesso a informações de interesse pessoal ou coletivo, nos termos do art. 5º, inciso XXXIII, da CF e das normas de regência desse direito”. Mais do que qualificá-lo como parlamentar, é a noção de cidadania que confere o direito de acesso à informação.

Perceba-se, então, que este direito fundamental de informação se tenciona nas ações de informar, informar-se e de ser informado. Ele assume uma dimensão individual (sem prejuízo de sua natureza coletiva), na condição de direito subjetivo de acessar informação perante qualquer sujeito de direito, independentemente do direito da coletividade (do sujeito plural de direito) e de buscar, acessar, receber e divulgar informações em poder do Estado, seus agentes, instituições e, mesmo entes privados com interesses vinculados à Administração (SARLET; MOLINARO, 2014). É nesta terceira seara, a transparência passiva, que este artigo pretende participar da discussão para delimitar suas fronteiras.

A participação do cidadão compõe elemento fundamental da democracia brasileira, visto que o parágrafo único do art. 1º da Constituição de 1988 (BRASIL) estabelece que: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. Para que essa forma de participação direta seja viável, somente com a ampla divulgação das ações do Estado é que a atividade de controle encontrará espaço para desenvolver, de maneira eficaz, a democracia, através do controle social5. Neste sentido, o amadurecimento da democracia no país está pautado na concepção de que a publicidade deve ser apontada como preceito geral e o sigilo como exceção.

Ocorre que o dever de publicidade da Administração, com o acesso à informação, não deixa de trazer certas limitações como a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas (art. 5º, inciso X, da CF/1988), além do sigilo indispensável à segurança da sociedade e do Estado (art. 5º, XXXIII, da CF/1988). Como já decidido pelo STF, “A regra geral num Estado Republicano é a da total transparência no acesso a documentos públicos, sendo o sigilo a exceção” (BRASIL, 2015) .

Como apresentar-se-á em seguida, a Lei de Acesso à Informação trouxe as balizas para a implementação do direito à informação no Brasil, o que merece estudos como o empreendido neste artigo.

2 A Lei de Acesso à Informação

A Lei de Acesso à Informação (LAI) brasileira é um novo paradigma cívico e administrativo, ao modificar o papel do Estado de detentor do monopólio de “documentos oficiais”, para o de guardião de “informações públicas” (MICHENER; CONTRERAS; NISKIER, 2018). O papel do Estado passa para a gestão em função das demandas da sociedade e não mais o contrário.

Com a edição da Lei n. 12.527 de 18 de novembro de 2011 (BRASIL), regulamentada pelo Decreto n. 7.724, de 16 de maio de 2012 (BRASIL), nasceu a materialização do direito fundamental de acesso à informação, estabelecendo procedimentos objetivos e ágeis com a finalidade de garantir a transparência da administração pública. Não se trata de um movimento isolado, mas sim de uma tendência mundial de mais de 80 países, em busca de uma governança pública melhor, por ser mais transparente (BERLINER, 2014, p. 479; ACKERMAN; SANDOVAL-BALLESTEROS; 2006, p. 85–130).

A LAI brasileira é um importante marco para a observância da publicidade como preceito geral e do sigilo como exceção, por meio de medidas que devem ser executadas de acordo com os princípios básicos da Administração Pública e por diretrizes que zelam e incentivam a ampla transparência (BRANCO; MENDES, 2014, p. 850). Conforme o art. 5º da LAI, o Estado tem o dever de garantir o direito de acesso à informação, “que será franqueada, mediante procedimentos objetivos e ágeis, de forma transparente, clara e em linguagem de fácil compreensão”. Busca-se, aqui, uma permeabilidade do Estado. Entre os ganhos da LAI merece destaque a desnecessidade de justificar o pedido (ARAUJO; BUSSINGUER, 2020) e a possibilidade de recorrer da negativa de acesso a uma instância superior (MICHENER; CONTRERAS; NISKIER, 2018).

Por meio da informação pública, desenhada em seus contornos procedimentais pela LAI, permite-se ao “cidadão tomar conhecimento dos assuntos de interesse da comunidade e participar da gestão de recursos públicos, mediante uma participação qualificada nos processos decisórios e na proposição de demandas” (LAMBERTY, GOMES, SILVA, 2020, p. 160). Hoje, leis de acesso à informação, como a brasileira, são instrumentos centrais e necessários para as investigações jornalísticas e a publicidade de escândalos envolvendo corrupção (BERLINER, 2014, p. 479).

Com o respaldo da LAI, o cidadão pode ter acesso às informações produzidas pelos órgãos e instituições que integram os poderes da república (alcance horizontal, cf. ANGÉLICO, 2012, p. 25), no âmbito das três esferas (União, Estado/Distrito Federal e Municípios, alcance vertical, cf. ANGÉLICO, 2012, p. 25), cabendo ao poder público atender às demandas por informações a ele apresentadas com base nos princípios constitucionais que regem a atuação do Estado. Com o acesso à informação incorporado à cadeia de valores e de compromisso estatal, o cidadão passa a se enxergar como parte do ciclo decisório e de definição do cenário político e administrativo em que atua, o que beneficia a gestão da coisa pública e propicia o desenvolvimento de um sentimento de cidadania participativa. Isso gera, no cidadão, uma sensação de justiça por fazer parte do processo (COGLIANESE; KILMARTIN; MENDELSON, 2009, p. 926-927).

A metodologia do acesso à informação está respaldada no atendimento das demandas que são formuladas pela população (transparência passiva do órgão público) e no dever de o Estado disponibilizar informações de interesse social (transparência ativa) (BARROS, 2015; MOTA JUNIOR, 2020, p. 31). Em outras palavras, o direito de acesso à informação pública “impõe duas obrigações sobre os governos”. A primeira, de “publicar e disseminar informações essenciais sobre o que os diferentes órgãos públicos estão fazendo”. A segunda, “a obrigação de receber do público pedidos de informação e respondê-los, disponibilizando os dados solicitados e permitindo que o público tenha acesso aos documentos originais indicados ou receba cópias dos mesmos” (MARTINS, 2011, p. 2). É sobre essa segunda faceta que este artigo pretende se debruçar. A transparência passiva e seus limites.

O objetivo da LAI é, primordialmente, proporcionar ampla publicidade da destinação dada à coisa pública, permitindo o controle social inerente ao Estado Democrático de Direito. Essa lei, além de concretizar inúmeros princípios de índole constitucional, converge com as expectativas sociais por uma administração mais transparente, proba e republicana. O direito de acesso à informação “é de natureza positiva e exige do Estado uma postura ativa, necessária para assegurar, na prática, o respeito a esse direito” (CALDERON, 2013). No entanto, isso não significa que o exercício do direito de acesso à informação não detenha requisitos que o limitem.

Em síntese, pode-se perceber que a Lei de Acesso à Informação obrigou os órgãos públicos a cumprirem uma série de diretrizes para a disponibilização das informações. Os gestores públicos foram orientados a observar os princípios constitucionais vigentes e adotar a publicidade como preceito geral a ser seguido, ficando estes com o ônus de justificar a negativa de acesso. Portanto, as atribuições da administração pública regem-se conforme os dispositivos legais que estabelecem a sua competência. Em seguida, será trabalhado o que pode ser solicitado pela LAI.

2.1 Os Pedidos de Acesso à Informação

No art. 4º, inciso I, da Lei n. 12.527/2011 (BRASIL), consta a definição de informação como “dados, processados ou não, que podem ser utilizados para produção e transmissão de conhecimento, contidos em qualquer meio, suporte ou formato(FERREIRA; SANTOS; MACHADO, 2013, p. 6). Perceba-se, entanto, que o dado precisa existir para ser solicitado. Isso significa que o dever de publicidade, concernente ao acesso à informação, requer, em sua essência, a preexistência da informação requerida. Não bastasse isso, o pedido deve ser específico, permitindo que o servidor do órgão ou entidade, que tenha familiaridade com os dados, possa recuperá-los de maneira rápida e precisa.

Nesse passo, a Administração Pública não está obrigada a produzir, naquele instante, o documento solicitado mediante pedido de acesso à informação. Por isso, o acesso aos documentos administrativos só se dará “quanto aos documentos já existentes; vale dizer, não pode o requerente, a pretexto de obter algum documento administrativo, pretender que a Administração venha a produzi-lo, se já não o tinha ela em seus registros” (NOGUEIRA JÚNIOR, 2003). Há, portanto, dois requisitos estabelecidos pela Lei de Acesso à Informação para a apresentação de um pedido de informação ao Estado: “a identificação do interessado e a especificação da informação requerida” (CUNHA; XAVIER, 2014, p. 161). Logo, se a informação não existe, não há como ser atendido o pedido.

Conforme exposto anteriormente, a Lei n. 12.527/2011 foi publicada com a intenção de regular o direito de informação, protegido constitucionalmente, e dispõe que o acesso à informação compreende a obtenção de informação produzida ou custodiada. O seu art. 7º da LAI6 define as informações que podem ser obtidas através do pedido de acesso à informação e não inclui, entre as suas possibilidades, a realização de consulta jurídica (BRASIL, 2011). Da mesma forma, o art. 12, inciso III, do Decreto n. 7.724/2012 (BRASIL) exige a especificação, de forma clara e precisa, da informação requerida.

Apesar do direito de acesso à informação ser aparentemente amplo, tendo em consideração o princípio da publicidade, constata-se que consultas jurídicas não são aceitas como pedidos de acesso à informação por não se enquadrarem na definição de informação da Lei n. 12.527/2011 e do Decreto n. 7.724/2012. Este ponto parece central, visto que, como se observará na análise dos precedentes em seguida, o eixo principal para o não conhecimento dos pedidos de LAI está na não configuração do conceito de informação.

3 Os precedentes da Ouvidora-geral da União (OGU) e da Comissão Mista de Reavaliação de Informações (CMRI) sobre as consultas jurídicas

À Controladoria-Geral da União (CGU), por meio da Ouvidora-geral da União (OGU7), compete se manifestar em sede de recurso na hipótese de ocorrência de negativa de acesso à informação pelos órgãos ou entidades do Poder Executivo Federal, conforme o art. 16 da Lei n. 12.527, de 2011 (BRASIL) e o art. 23 do Decreto n. 7.724, de 2012 (BRASIL). Nos termos do § ٣º do mesmo dispositivo, e do art. 24 do Decreto n. 7.724, de 2012, caso seja negado o acesso à informação pela OGU caberá ainda recurso à Comissão Mista de Reavaliação de Informações (CMRI). Em outras palavras, a OGU e a CMRI são a terceira e quarta instâncias na hipótese de negativa de acesso à informação no âmbito do Poder Executivo Federal. Exatamente por estarem no topo da cadeia de acesso à informação, merecem destaques os precedentes disponíveis na base de busca da CGU, disponível no link: http://buscaprecedentes.cgu.gov.br. Essa base é um importante repositório em que estão acessíveis as decisões que formam uma jurisprudência administrativa de pedido de acesso à informação8. Estudá-la é relevante porque o uso de seus precedentes pode contribuir com a abertura e transparência do Estado. Esse é o coração desta pesquisa, pois traçam a experiência do órgão quantos aos recursos em pedidos de LAI.

Essa decisão de terceira instância, inclusive, tem sido o diferencial no deferimento dos pedidos de acesso à informação, o que reforça a importância desta base. Como demonstrado em pesquisa empírica sobre a aplicação da LAI, os órgãos federais tiveram uma taxa de resposta média mais alta (91%) do que as estaduais (53%) ou municipais (44%) em razão do forte controle da Controladoria-Geral da União (CGU) (MICHENER; CONTRERAS; NISKIER, 2018). Isso acontece exatamente no âmbito recursal.

A pesquisa sobre os precedentes da CMRI, por sua vez, tem especial interesse porque a ela compete a orientação e a regulamentação no tocante aos vácuos normativos presentes na aplicação da Lei n. 12.527/2011 e do Decreto n. 7.724/2012, conforme o art. 47, inciso V do Decreto n. 7.724/2012 (BRASIL). Ela ainda é a última instância no tema, podendo rever uma eventual negativa da OGU a respeito de solicitação de acesso.

Na pesquisa, os marcos temporais da busca foram de 2011 (ano de edição da LAI) até janeiro de 2021. Em suma, toda a base de precedentes (OGU e CMRI). Buscava-se, aqui, encontrar os pedidos de LAI que formulassem uma dúvida jurídica, uma dúvida sobre a aplicação da norma, pois trata-se de tema reiteradamente enfrentado nos pedidos de LAI (CUNHA, XAVIER, 2014). Para isso, as palavras usadas foram “consulta jurídica”9 o que inicialmente localizou 159 decisões de recurso de terceira e de quarta instância. O recorte da pesquisa está na atuação de um jurista. Foram analisados todos eles, para excluir aqueles que não discutiam o objeto deste artigo, como a Decisão n. 51/2018/CMRI/SE/CC-PR, que discutiu sigilo, passando pelo tema da consulta jurídica de maneira periférica e superficial. Evitou-se, ainda, a repetição da amostra, na hipótese de um mesmo caso ter sido analisado nas duas instâncias (terceira e quarta). Elegeu-se, entre eles, o que melhor discutia o tema “consulta jurídica”.

Outro ajuste que ensejou a redução da amostra foi a constatação de que um único pedido LAI, algumas vezes, foi objeto de vários processos administrativos. Um exemplo disso está no PARECER n. 4403 de 02/05/2017, que teve o debate travado também nos processos administrativos: 99908.000687/2016-01; 99908.000675/2016-78; 99908.000679/2016-56; 99908.000678/2016-10. Em todos houve recursos, apesar da discussão ter o mesmo objeto. Para evitar a repetição, o que afetaria os resultados, apenas um deles foi escolhido para fazer parte da pesquisa. O mais representativo do debate.

Com esses recortes metodológicos, da triagem deste material, restaram 49 casos no estudo. As informações dessas decisões foram organizadas quanto aos seguintes elementos: a) manifestação da OGU ou CMRI e sua denominação; b) o número do processo administrativo em que está formalizado o pedido de LAI e os recursos; d) o resultado do recurso; e e) síntese do pedido de LAI. O material da pesquisa está agrupado no quadro abaixo:

Quadro 1 - Precedentes OGU e CMRI sobre Consulta Jurídica (2011-2021)

Precedentes sobre Consulta Jurídica (OGU e CMRI)

Manifestação

Processo Administrativo

Resultado

Síntese do pedido LAI

1.

PARECER n. 1565 de 13/08/2018

99901.000623/2018-23

Não conhecido

Cidadão busca acesso a contrato de trabalho e de normativos que ensejam descontos obrigatórios no Banco do Brasil.

2.

PARECER n. 942 de 06/07/2020

21900.001632/2020-79

Não conhecido

Cidadão questiona se os prazos processuais do MAPA estão suspensos considerando o disposto no art. 6.º- C, da Lei n. 13.979/2020.

3.

PARECER n. 5610 de 08/08/2017

99902.002550/2017-13

Não conhecido

Cidadão solicita à CEF a fundamentação legal para a realização de descontos consignados em folha de pagamento de empregados celetistas.

4.

PARECER n. 4452 de 04/05/2017

00077.000323/2017-66

Não conhecido

Cidadão declara que foi membro da Força Aérea Brasileira e deseja saber se está amparado pela Lei de Anistia.

5.

PARECER n. 88 de 29/01/2018

16853.008526/2017-93

Não conhecido

Cidadão pergunta se o disposto no art. 2º, da Portaria Coger 123, de 29-11-2007, se aplica a todos servidores da RFB, incluindo-o.

6.

PARECER n. 3956 de 23/03/2017

03950.000739/2017-27

Não conhecido

Cidadão quer saber se assistentes administrativos que atuam na EBSERH e que recebem adicional por titulação estão mais aptos a realizarem funções de grande complexidade do que os assistentes administrativos do quadro da empresa.

7.

PARECER n. 5901 de 18/09/2017

48700.003437/2017-91

Não conhecido

Cidadão quer que o DNPM intérprete a legislação sobre garimpagem.

8.

PARECER n. 4178 de 22/11/2016

99901.001702/2016-90

Não conhecido

Cidadão apresenta duas situações hipotéticas e pede a manifestação do Banco do Brasil acerca do tema jornada de trabalho.

9.

PARECER n. 1498 de 18/04/2016

37400.001212/2016-87

Não conhecido

Cidadão quer ser informado sobre a legislação que embasaria o seu direito de ser considerado no cálculo de sua aposentadoria.

10.

PARECER n. 794 de 28/06/2019

25820.002876/2019-86

Não conhecido

Cidadão solicita quais os normativos que impõem a obrigatoriedade de os equipamentos das farmácias de manipulação serem calibrados por laboratórios da RBC ou rastreáveis.

11.

PARECER n. 5883 de 11/09/2017

48700.001784/2017-89

Não conhecido

Cidadão formulou à ANEEL uma consulta jurídica.

12.

PARECER n. 6176 de 17/10/2017

16853.007171/2017-15

Não conhecido

Cidadão quer tirar dúvida quanto ao seu benefício de aposentadoria.

13.

PARECER n. 666 de 03/06/2019

48700.000991/2019-88

Não conhecido

Cidadão pede a fundamentação vigente que define que concessionários de energia elétrica podem instituir forçadamente a servidão administrativa, sem autorização válida de pessoa legítima ou sem determinação judicial.

14.

PARECER n. 4403 de 02/05/2017

99908.000675/2016-78

Não conhecido

Cidadão requer informações sobre a aplicabilidade do Estatuto do Idoso.

15.

PARECER n. 1496 de 18/04/2016

23480.004370/2016-31

Não conhecido

Cidadão solicita posicionamento sobre regra de acúmulo de bolsa de estudos e remuneração.

16.

PARECER n. 4376 de 26/04/2017

00077.000324/2017-19

Não conhecido

Cidadão quer saber se a Emenda Constitucional n° 83 revogou o Decreto n. 1.805/96.

17.

PARECER n. 1419 de 08/11/2019

60502.002049/2019-96

Não conhecido

Cidadão questiona se o PL n. 1645/2019 altera o Inciso III do Artigo 154, Portaria n. 046-DGP, de 27 de março de 2012.

18.

PARECER n. 4223 de 13/04/2017

60502.000481/2017-81

Não conhecido

Cidadão solicita esclarecimentos sobre um parágrafo de um artigo do Estatuto dos Militares (Lei 6.880/80).

19.

PARECER n. 157 de 18/02/2019

48700.000078/2019-81

Não conhecido

Cidadão quer saber sobre a adequação do procedimento de corte de energia elétrica por falta de pagamento com notificação prévia adotado pela concessionária em relação à Resolução ANEEL 414/2010.

20.

PARECER n. 82/2020/CGRAI/OGU/CGU

99923.001069/2020-68

Não conhecido

Cidadão solicita informação sobre caso concreto ou hipotético referente ao recebimento de Função Convencional.

21.

PARECER n. 1373 de 17/07/2018

50650.000531/2018-53

Perda de objeto

Cidadão formula perguntas à ANTT quanto à cobrança dos preços efetuados pelas entidades sindicais na prestação do serviço de inscrição no RNTRC.

22.

PARECER n. 3579 de 16/10/2015

46800.0012932015-12

Não conhecido

Cidadão quer saber a legislação aplicável à contratação de professores via Microempresa Individual (MEI).

23.

PARECER n. 5889 de 13/09/2017

99928.000239/2017-41

Não conhecido

Cidadão gostaria que fosse melhor explicado o termo “Justo Motivo” que aparece na norma GP085 V2.

24.

PARECER n. 105 de 28/01/2020

99928.000581/2019-11

Não conhecido e Perda do Objeto

Cidadão solicita informações a respeito do regime disciplinar do Serviço Federal de Processamento de Dados.

25.

PARECER n. 4504 de 26/12/2016

08850.003588/2016-20

Não conhecido

Cidadão solicita orientações sobre as Portarias Reservadas do Ministério da Aeronáutica no S-50-GM5, de 19 de junho de 1964, e no S-285-GM5.

26.

DECISÃO n. 126/2014 – CMRI

23480.033908/2013-72

Não conhecido

Cidadão questiona qual o dispositivo legal utilizado para fundamentar procedimento correcional instaurado.

27.

PARECER n. 194 de 07/02/2018

18600.003065/2017-60

Não conhecido

Cidadão formula consulta para conhecer as interpretações do BACEN acerca do tema.

28.

PARECER n. 292/2020/CGRAI/OGU/CGU

08198.030029/2020-10

Não conhecido

Cidadão quer que o Departamento de Polícia Federal (DPF) informe a fundamentação legal para as exigências apresentadas nos artigos 22, § 1º, 34, inciso VIII, 34, § 1º, inciso II, e 34, § 2º, da Instrução Normativa (IN) n. 180 da Polícia Federal, sobre armamento e munições.

29.

PARECER n. 2650 de 13/08/2015

08850.002086/2015-09

Não conhecido

Cidadão quer saber qual é a base legal para celebração de convênios com Defensorias Públicas Estaduais.

30.

Decisão n. 161/2014-CMRI

60502.000623/2014-67

Não conhecido

Cidadã cria uma situação hipotética de subordinação entre oficial e suboficial e pergunta qual é a fundamentação legal que normatiza essa conduta.

31.

Decisão n. 74/2015-CMRI

00700.000450/2014-19

Não conhecido

Cidadã formula caso hipotético e solicita que o órgão se manifeste sobre a interpretação do art. 100 do Decreto 6.514, c/c OJN n2 34/2012/PFE/IBAMA em face do caso.

32.

DECISÃO n. 0180/2016-CMRI

37400.001212/2016-87

Não conhecido

Cidadã formula caso hipotético sobre contribuinte individual.

33.

DESPACHO n. 4646 de 13/06/2013

60502.001387/2012-34

Não conhecido

Cidadã requer ao Comando do Exército - CEX a interpretação da Norma R-105, para o termo Rodovia, constante na Tabela 1 do Anexo XV, do R-105.

34.

PARECER n. 713 de 19/03/2015

01390.000058/2015-64

Não conhecido

Cidadão questiona se há algum dispositivo legal que obrigue o aluno da graduação sanduíche (Ciência sem Fronteiras) a concluir o curso na instituição de origem.

35.

PARECER n. 1440 de 26/07/2018

01590.000568/2018-28

Não conhecido

Cidadã desenvolve um cenário, seja ele hipotético ou real, e pede ao órgão requerido parecer acerca da situação apresentada.

36.

PARECER n. 894 de 23/07/2019

08850.002418/2019-71

Não conhecido

Cidadão quer saber se os servidores ocupantes dos cargos especificados no parágrafo único, art. 3º da Lei n. 10.871/2004 possuem a prerrogativa de porte de arma descrita na alínea “e”, inciso III, § 3º, art. 20 do Decreto n. 9.785/2019.

37.

PARECER n. 3039 de 25/11/2013

00380.000230/2013-74

Não conhecido

Cidadão solicita que a CONJUR/MPA emane parecer sobre a homologação do estágio probatório de servidor requisitado por lei específica.

38.

PARECER n. 620 de 14/05/2020

00077.000613/2020-13

Não conhecido

Cidadão questiona se o Decreto n. 9.727/2019, ao mencionar a necessidade de título de mestre ou doutor, refere-se apenas a mestrado e doutorado acadêmico ou se são aceitos MBAs e especializações.

39.

PARECER n. 757 de 04/06/2020

03006.005783/2020-16

Não conhecido

Cidadão solicita ao Ministério da Economia esclarecimentos acerca da validade da Portaria n. 12, de 20/01/2012, sobre a suspensão dos tributos federais e parcelamentos, visto haver a Portaria n. 139, de 03/04/2020, que é mais específica quanto ao PIS, COFINS e INSS.

40.

Decisão n. 467/2017/CMRI/SE/CC-PR

99901.000751/2017-96

Não conhecido

Cidadão pergunta qual a legislação que dispõe sobre a gestão das consignações em folha de pagamento no âmbito do sistema de gestão de pessoas do Banco do Brasil.

41.

PARECER n. 2778 de 27/07/2016

00077.000597/2016-74

Não conhecido

Cidadão solicita consulta jurídica sobre o art. 173 da constituição.

42.

PARECER n. 444 de 24/04/2019

48700.000190/2019-12

Não conhecido

Cidadão faz consulta à ANEEL sobre qual é a interpretação regulatória e fiscalizatória do órgão, para efeitos de fiscalização ativa ou passiva (via reclamações dos consumidores de energia elétrica), acerca dos termos “quitação intempestiva” e “momento precedente”, ambos constantes da resolução 414/10, § 1º.

43.

Decisão n. 42/2018/CMRI/SE/CC-PR

60502.001886/2017-36

Não conhecido

Cidadão busca interpretação do Parágrafo 1º do Artigo 95 do Estatuto do Militares (Lei n. 6.880/80).

44.

PARECER n. 4031 de 31/10/2016

08850.005368/2017-11

Não conhecido

Cidadão solicita a aplicação Nota Técnica n. 11094/2016- MP aos empregados públicos oriundos da Lei n. 8878/94 participantes de OSCIP.

45.

PARECER n. 3482 de 09/09/2016

18600.001511/2016-11

Não conhecido

Cidadão questiona interpretações sobre aplicação das disposições da Resolução n. 3.954, de 24 de fevereiro de 2011.

46.

PARECER n. 1689 de 15/05/2014

2348.0033908/2013-72

Não conhecido

Cidadão pergunta se no caso de ele ser transferido ou promovido para outro estado, ou seja, no interesse do governo federal, maior acionista do BB, sua esposa (servidora do IFPE) tem direito também a remoção para o mesmo estado?”

47.

Decisão n. 338/2017/CMRI/SE/CCPR

00077.000314/201775

Não conhecido

Cidadão solicita informação se a Lei n. 8.112 de 1990 aplica-se a funcionários do Banco do Brasil.

48.

PARECER n. 80 de 26/01/2018

12649.001953/2017-13

Não conhecido

Cidadão pergunta qual a base legal para a exigência do comprovante de quitação de obrigações sindicais para que o corretor de seguros seja recadastrado.

49.

PARECER n. 3157 de 05/08/2014 – CGU

08850.007540/2013-48

Não conhecido

Cidadão pretende ter o acesso à informação relacionada a cadastro de servidor público no Departamento de Polícia Federal (DPF).

Fonte: os autores.

Da organização das 49 manifestações da OGU e CRMI, algumas constatações interessantes são possíveis. Só 8 decisões são da CMRI. 41 das decisões são da OGU, o que atesta um protagonismo da terceira instância, ou desinteresse em levar o caso à última instância. Há de se chamar atenção ainda para a predominância dos casos de não conhecimento dos recursos. São 47 casos de não conhecimento. 1 caso de não conhecimento e perda do objeto. Outro caso – singular e avaliado de maneira pormenorizada em seguida – de perda do objeto com a elaboração da manifestação.

Outro achado interessante está na variabilidade dos pedidos de acesso enquadrados na categoria “consulta jurídica”. Percebe-se que neste espaço, há desde dúvidas de situações pessoais (como remoção de cônjuge ou direito a aposentadoria) até perguntas gerais sobre interpretações de normas.

Sobre esse tópico, cabe explicar que o Guia de aplicação da Lei de Acesso à Informação na Administração Pública Federal, da CGU, define consulta como “situação na qual o cidadão deseja receber do Poder Público um pronunciamento sobre uma condição hipotética ou concreta” (BRASIL, 2019, p. 12-13). Portanto, há uma coerência com a definição usada na CGU e os resultados encontrados.

Prosseguindo, o Guia esclarece que “Atualmente, consultas não são aceitas como pedidos de acesso à informação quando a informação solicitada é inexistente, ou seja, quando o órgão não tenha realizado a análise de um caso semelhante e sobre ele produzido um documento, por exemplo” (BRASIL, 2019, p. 12-13). Há, aqui, a ressalva já explicada da inexistência da informação, presente no tópico 2.1 deste artigo.

Ocorre que isso não pode afastar o cuidado da Administração indicar à sociedade as normas aplicáveis em sua área de atuação. Em outras palavras, o óbice da consulta em tese não afasta o dever de a Administração Pública explicar quais as normas legais em que está se pautando a sua atuação.

No caso do PARECER n. 794 de 28/06/2019, apesar de ser uma consulta jurídica sobre as normas aplicáveis, a ANVISA apontou o normativo RDC 67/2007 que determinou que “as calibrações dos equipamentos e instrumentos de medição devem ser executadas por empresa certificada, utilizando padrões rastreáveis à Rede Brasileira de Calibração”. No mesmo sentido, no PARECER n. 292/2020/CGRAI/OGU/CGU (BRASIL, 2020), há relato de que o DPF citou a lei e os decretos que fundamentaram a elaboração dos normativos questionados.

No PARECER n. 666 de 03/06/2019, a ANEEL informou que os normativos que regem os processos de declaração de utilidade pública instruídos pela ANEEL estão no link: http://biblioteca.aneel.gov.br/index.html. Indicou, com isso, o caminho ao cidadão. Outro exemplo está na Decisão n. 467/2017/CMRI/SE/CC-PR, em que para a pergunta sobre a legislação que dispõe acerca da gestão das consignações em folha de pagamento no âmbito do sistema de gestão de pessoas do Banco do Brasil (BB), o BB indicou a Lei n. 10.820, de 17 de dezembro de 2003. No PARECER n. 80 de 26/01/2018, por sua vez, a pergunta solicitou a base legal para a exigência do comprovante de quitação de obrigações sindicais para que o corretor de seguros seja recadastrado e, em resposta, houve a indicação do art. 5 da Lei n. 4.594, de 1967, e das Resoluções CNSP n. 249/2012 e n. 303/2013. Essa indicação das normas de regência parece necessário para garantir uma reaproximação entre o Estado e a sociedade (AVELINO; POMPEU; FONSECA, 2021, p. 21). Especialmente diante do contexto de crise da legislação (CIRNE, 2019), ante o excesso de normas.

Exatamente por nem sempre o cuidado com a indicação das normas acontecer, essa parece ser uma orientação interessante desta pesquisa: incrementar o dever de a Administração Pública indicar as normas sobre os temas em que se pauta a sua atuação, mesmo que não se faça uma interpretação jurídica sobre o tema.

Há de reconhecer, como segundo achado, que não parece fazer sentido a Administração Pública federal responder, em regra, dúvidas jurídicas do cidadão. Isso, no entanto, não afasta o dever de verificar se já houve manifestações sobre o tema.

No PARECER n. 942 de 06/07/2020 (BRASIL), por exemplo, a OGU destacou que as consultas estão fora do escopo da Lei de Acesso à Informação, “exceto nos casos em que o órgão/entidade já tenha tal informação consolidada em documentos oficiais”. Há, portanto, que delimitar se a consulta já foi respondida anteriormente ou se há outras manifestações jurídicas sobre o tema. Isso parece fazer sentido, visto que o art. 8º da LAI (BRASIL, 2011) estabelece que “É dever dos órgãos e entidades públicas promover, independentemente de requerimentos, a divulgação em local de fácil acesso, no âmbito de suas competências, de informações de interesse público coletivo ou geral por eles produzidas ou custodiadas”. O dever de transparência ativa. Se isso deveria estar disponibilizado ao acesso público, o mesmo tratamento merece ser dado quando feito o pedido. O Estado só será transparente se entregar aquilo que produz sobre os temas. Esse dever também se aplica à advocacia pública, que presta a assessoria estatal.

Em resumo, se a manifestação existe, ela merece ser entregue. No PARECER n. 757 de 04/06/2020, por exemplo, foi entregue o Parecer n. 74/2020 e a Nota Cosit n. 126, de 23 de abril de 2020 como resposta. Perceba-se que no PARECER n. 4452 de 04/05/2017 (BRASIL), a Casa Civil da Presidência da República – CC/PR indeferiu o recurso porque “não possui documento semelhante ao tema apresentado que possa satisfazer a demanda”. Houve, aqui, o cuidado de verificar se existia uma manifestação jurídica anterior sobre o tema, o que merece reforço.

Nesse sentido, é necessário diferenciar duas situações quanto às consultas jurídicas. “Na primeira, o cidadão solicita um parecer jurídico específico que já existe, e na segunda solicita, mediante consulta jurídica, a produção de parecer normativo” (CUNHA, XAVIER, 2014, p. 337). No primeiro caso, o pedido deveria ser deferido. No segundo, não. Os mesmos autores, valendo-se dos precedentes da OGU, concluem que “pareceres jurídicos já elaborados por advogados públicos podem ser disponibilizados”. Isso, no entanto, não significa “admitir que a Administração seja obrigada a produzir pareceres jurídicos em decorrência de pedidos de acesso à informação” (CUNHA, XAVIER, 2014, p. 337). As duas situações são díspares e merecem tratamentos distintos.

Esse ponto, identificado como achado da pesquisa, merece reforço, pois em parte dos casos a preocupação de buscar análises jurídicas anteriores não parece ocorrer. Neste sentido, consta no PARECER n. 5901 de 18/09/2017 (BRASIL) que:

O que Vossa Senhoria deseja é que o DNPM intérprete a legislação. Não cabe ao órgão público prestar consultoria jurídica com base na lei de Acesso à Informação - LAI. A LAI, não tem esse escopo de interpretar a legislação para ninguém e sim informar, foi o que fiz. Informei a Vossa Senhoria todos os passos para requerer uma PLG e a Portaria que regulamenta a temática, exatamente com seu Título e seu Capítulo. Essa é a função da LAI, informar e não interpretar a legislação. (BRASIL, 2017, p. 3).

Não parece ter ocorrido aqui qualquer interlocução com a assessoria jurídica do órgão para que avaliasse se existiam manifestações sobre a portaria. Nem mesmo o parecer que analisou a minuta.

Diferentemente deste caso é o PARECER n. 4178, de 22/11/2016 (BRASIL), caso em que houve a cautela de analisar se existiam manifestações jurídicas sobre o tema. Perceba-se a diferença:

Assim, realizando-se uma interpretação a favor do cidadão, a CGU solicitou esclarecimentos adicionais ao BB, conforme respostas que seguem abaixo:

a) Considerando o princípio da máxima publicidade, existe algum parecer jurídico ou peça de defesa apresentada em juízo que discuta a interpretação do item 2.1.2.1.1.8 da IN 383 supramencionada?

Manifestações nesse sentido somente são possíveis para ocorrências concretas, onde estarão presentes todas as especificidades e particularidades do caso sob exame. Aproveitamos para ratificar que a questão relativa à gestão da jornada de trabalho é parte do poder diretivo do empregador e a resposta ao item ‘b’ infra bem expõe essa situação, inclusive a Instrução Normativa citada (IN 361) é a que regula a Jornada de Trabalho, enquanto a referida na questão proposta (IN 383) exemplifica Desvios de Comportamentos mais comuns, dentre estes, o de chegar frequentemente atrasado (BRASIL, 2016, p. 6).

Houve, aqui, um exemplo raro em que se abriu uma diligência, na OGU, para verificar se havia manifestações jurídicas sobre o tema. Pela resposta, nem sempre essa pretensão parece ser vista com bons olhos, mas o incremento da cultura de transparência que a lei traz exige uma atuação diferente pelas instâncias superiores (OGU e CMRI).

No PARECER n. 4178 de 22/11/2016 (BRASIL), em que houve a diligência, a OGU teve a cautela de esclarecer que não buscava avaliar qual seria a correta interpretação de estar “frequentemente atrasado”, mas sim “localizar um documento oficial que interpretasse a norma jurídica de interesse do cidadão”. Esta parece, portanto, a melhor medida a ser adotada, com o intuito de delimitar a restrição das consultas jurídicas e contribuir com a transparência.

Outra constatação interessante do estudo está na constatação do padrão de respostas de LAI no tempo. As decisões iniciais de LAI, mesmo que vinculassem consultas jurídicas, pareciam contar com maior esmero do gestor em traçar respostas. Algumas vezes até mesmo formular entendimentos jurídicos. Depois, ante a consolidação do entendimento de que “consulta jurídica era hipótese de não conhecimento”, esse exercício pareceu mais raro.

Há que se falar, como terceira conclusão, que mesmo em se tratando de consulta jurídica, uma possibilidade interessante, com ganhos para a Administração Pública, seria o encaminhamento da demanda para os canais de ouvidoria10. No PARECER n. 157 de 18/02/2019 (BRASIL), por exemplo, restou definido que “presume-se que a Agência, além de não possuir o documento, não possui tal parecer jurídico que tenha analisada situação semelhante e por isso, indicou os canais de comunicação com a Ouvidoria do órgão para tratar do assunto”. No PARECER n. 274 de 11/03/2020 (BRASIL), após não conhecer o recurso, foi registrado a ressalva de que é “recomendável a sua apresentação por meio dos canais específicos adequados para o tratamento de manifestações de ouvidoria”.

Pois bem. Perceba-se que demandas recorrentes da população, manifestadas por meio de pedidos de acesso à informação, podem ser um interessante termômetro para eventuais ajustes no desenho jurídico das políticas públicas.

Cumpre destacar que esses achados não afastam, contudo, a identificação de que a maioria dos casos busca uma análise jurídica, o que em regra não ocorrerá.

No PARECER n. 1496 de 18/04/2016 (BRASIL), o cidadão pleiteia “uma posição legal acerca do caso” ou de “um documento oficial da CAPES se posicionando”. O caso não foi conhecido.

Há, no entanto, casos excepcionais em que a demanda chegou à advocacia pública, por escolha do gestor. Um caso emblemático está no PARECER n. 1373 de 17/07/2018. O cidadão fez uma série de perguntas à Agência Nacional de Transportes Terrestres sobre a cobrança dos preços efetuados pelas entidades sindicais na prestação do serviço de inscrição no RNTRC. No PARECER n. 1373 de 17/07/2018 (BRASIL), a gestão não só achou pertinente a dúvida como a encaminhou à Procuradoria-Geral Federal. O pedido foi respondido pela Nota n. 00248/2018/PFANTT/PGF/AGU.

Outro exemplo está no PARECER n. 3039 de 25/11/2013 (BRASIL), em que o cidadão solicitou à Consultoria Jurídica junto ao Ministério da Pesca e Aquicultura (CONJUR/MPA) que emanasse parecer sobre a homologação do estágio probatório de servidor requisitado por lei específica e como resposta recebeu a Nota n. 364/2013/CONJUR-MPA/CGU/AGU. Teve, então, o seu pedido de questionamento jurídico atendido, apesar da OGU não conhecer do seu recurso. No PARECER n. 894 de 23/07/2019 (BRASIL) há o relato de que “devido a amplitude da expressão “agente público que exerça atividade com poder de polícia administrativa”, não está pacificado o entendimento quanto às categorias que serão contempladas pelo novo decreto e que a questão foi encaminhada à Consultoria Jurídica - CONJUR solicitando esclarecimentos adicionais”. Apesar disso, a decisão da OGU foi pelo não conhecimento do pedido pois a Consultoria Jurídica (CONJUR) do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) não havia concluído o parecer sobre o assunto. Essas três decisões mostram que nem sempre o uso da LAI para um tema jurídico será deserto.

Merece destaque o precedente do PARECER n. 1689 de 15/05/2014, por ser um dos primeiros a tratar do tema consulta jurídica. Há, aqui, esclarecimento relevante, ante uma tentativa do Instituto Federal de Pernambuco de formular uma resposta jurídica ao pedido de LAI:

O que pode ser solicitado por meio da LAI são pareceres jurídicos já prontos e avalizados por autoridade administrativa competente.

Nesse sentido, caso o interessado solicitasse ao recorrido um parecer jurídico determinado ou questionasse sobre a existência de parecer no qual fosse analisada uma situação de remoção, redistribuição de servidor ou concessão de licença por motivo de afastamento de cônjuge, parece-nos claro que tal solicitação estaria caracterizada como pedido de acesso à informação, eis que se referiria a um documento existente.

10. Contudo, o cidadão apresentou ao órgão uma consulta em tese. Sua pergunta apresenta características que demandam estudo e análise quanto aos entendimentos acerca do tema: ele, empregado público, concorrerá a uma promoção e, como consequência dela, poderá ser removido.

A remoção em decorrência de uma promoção a qual o interessado se inscreveu voluntariamente é considerada remoção de ofício?

Sua esposa poderia ser removida ou seria redistribuída?

Qual o entendimento atual da Administração Pública Federal sobre o assunto?

Enfim, a resposta a essas questões pressupõe a elaboração de um documento específico, com os elementos próprios ao caso apresentado pelo cidadão, até então inexistente no órgão recorrido.

11. Não obstante a tentativa do IFPE em responder ao cidadão pelo e-SIC, é preciso comunicar-lhe sobre a inexistência da informação e sobre o fato do e-Sic não ser o canal adequado para dirimir sua dúvida nos termos apresentados.

Perceba-se que a partir do trecho transcrito, chama-se atenção para o cuidado da administração fornecer uma resposta jurídica ao cidadão, sem o crivo de avaliar todos os elementos da pergunta. Mais do que isso, deve-se ter cuidado de informar o cidadão sem chancelar qual seria o entendimento do órgão e de sua assessoria jurídica.

Por ter se identificado neste estudo que, apesar das respostas falarem sobre consulta jurídica, não se aborda o tema advocacia pública, parece necessário trazer algumas colocações sobre a importância deste órgão para que seja viável aliar a ideia de Administração Pública transparente com a segurança jurídica e a unidade de entendimentos jurídicos trazida pela advocacia pública.

4 O papel da advocacia pública nas respostas às consultas jurídicas

Além do dever de transparência, a Constituição traçou para a Administração Pública o dever de se pautar na legalidade estrita, o que significa estar restrita aos atos autorizados em lei. A supremacia da lei corresponde à ideia de que a atividade administrativa encontra na lei seu fundamento e seu limite de validade (JUSTEN FILHO, 2009). Partindo dessa noção, o administrador público está vinculado aos mandamentos da lei às exigências do interesse público (CASTELO BRANCO, 2018, p. 73). De tais deveres, não pode se “afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se à responsabilidade disciplinar, civil e criminal” (MEIRELLES, 2005). Enquanto a atuação do particular se pauta na autonomia da vontade (pode fazer tudo, salvo o que a lei vede), a atuação da Administração pública se pauta no princípio da legalidade estrita (só cabe atuar naquilo que a lei autoriza). A administração deve se pautar dentro das finalidades definidas em lei, o que ocorre com o auxílio da Advocacia-Geral da União, responsável pela assessoria jurídica do Poder Executivo Federal (AMORIM, 2012; SOUZA; 2008).

Ocorre que, conforme o parágrafo único do art. 1º da Lei Complementar n. 73, de 10 de fevereiro de 1993 (BRASIL), a atuação da advocacia pública está restrita às hipóteses em que a gestão pública (órgão assessorado) entende cabível formular tais demanda. A advocacia pública é quem detém a atribuição de responder as consultas jurídicas objeto deste artigo. A definição de tais consultas, no entanto, estão na definição dos gestores públicos11, no intuito de viabilizar juridicamente políticas públicas (GUIMARÃES, 2011).

Sobre o tema, o enunciado n. 21 do Manual de Boas Práticas Consultivas da AGU explica que: “O exercício da atividade jurídica de assessoramento e consultoria dá-se em razão de consulta apresentada pelo assessorado e se realiza mediante exteriorização de manifestação voltada a conferir segurança jurídica à atuação administrativa, visando à efetivação das políticas públicas”. Exatamente em nome dessa segurança jurídica nas políticas públicas que o debate sobre os pedidos de LAI e as consultas jurídicas precisa passar pelo tema da Advocacia Pública. Para dar uma resposta, com segurança, ao cidadão, a advocacia precisa participar deste processo, dentro de sua função de interpretar as normas na Administração Pública Federal. Isso pode ocorrer não apenas com a entrega das manifestações jurídicas que existam sobre o tema, como recomendado no tópico anterior, como também na hipótese em que a gestão entenda que a pergunta merece uma resposta.

Dentro das suas atribuições legais, cabe ao gestor, considerando a conveniência e a oportunidade, em prol do interesse público, decidir quais são as demandas jurídicas a serem enviadas ao crivo da AGU. Uma das possibilidades está nos pedidos de LAI recebidos. Isso pode unir a Administração transparente com o papel do advogado público.

Não se pretende com isso afirmar que a administração pública tem a obrigação de enviar todas as dúvidas jurídicas que advenham da participação social, mas sim que o envio parece possível naquelas em que o gestor entenda que isso poderia contribuir com melhoria da política pública.

Ao se abrir essa oportunidade, parece possível trazer o cidadão para mais próximo da tomada de decisões do poder público, de modo objetivo e ágil, mas isso não pode se distanciar da ideia de que a atuação estatal precisa se centralizar na busca pela obtenção de resultados eficazes (TONETTO; GUERRA, 2020, p. 81-82). O princípio da eficiência, no qual a Administração Pública deve se pautar, tem dois aspectos: a) quanto à atuação do agente público, do qual se espera o melhor desempenho possível de suas atuações e atribuições, para lograr os melhores resultados, e b) no modo racional de se organizar, estruturar, disciplinar a administração pública, para uma melhor prestação do serviço público (DI PIETRO, 2002). Há, de um lado, o dever de o agente público prestar um melhor serviço público, e de outro um dever de racionalização da sua atuação. Nesta esteira, a eficiência é um requisito caracterizador da prestação dos serviços públicos e está atrelada à forma como ocorrerá a participação social na construção de uma política pública.

Na questão da segurança jurídica, cabe acrescentar a preocupação com a harmonia da interpretação jurídica na Administração Pública Federal. A AGU é um órgão que tem uma atuação transversal exatamente para garantir essa consolidação de entendimentos, para que a Administração atue sem contradições quanto às posições jurídicas. Deveria, por isso, contribuir com a clareza de suas interpretações ao escrutínio público12. Saber quais foram as orientações jurídicas recebidas pelo gestor, ajuda no convencimento público de que a escolha feita está correta (CIRNE, 2019). O interesse público, com isso, parece mais claro e passível de convencer. Ao não entender por que a Administração decidiu daquela forma (o que ficaria mais claro ao ler o parecer jurídico que o assessorou), a Administração opaca perde uma oportunidade de ganhar legitimidade popular. Por isso, como último achado, parece interessante trazer o advogado público para mais próximo dos pedidos de informação na hipótese de consulta jurídica. Ele pode dar acesso ao cidadão de outras manifestações jurídicas sobre o tema e com isso contribuir com a aproximação da sociedade ao Estado. De outra parte, se o gestor entender cabível, um pedido de LAI pode ser o ponta pé inicial para firmar um entendimento jurídico importante, e necessário, à Administração Pública.

Considerações finais

Apesar de tratar de uma limitação do acesso à informação - a formulação de consulta jurídica por meio de LAI - a pretensão deste trabalho milita na consolidação da Administração Pública transparente. Para tanto, trouxe as balizas constitucionais do dever estatal de publicidade e do direito fundamental à informação pública. Em seguida, celebrou os ganhos com a edição da Lei de Acesso à Informação brasileira.

Ocorre que, passados 10 anos de sua criação e implementação o estudo se propôs a avaliar um dos principais motivos para a negativa de acesso: a formulação de consulta jurídica por meio de pedido de LAI. O debate poderia ter ficado limitado à inexistência da informação, mas havia outras lentes do tema a serem apresentadas.

A partir de uma pesquisa quantitativa e qualitativa na base de precedentes da OGU e da CMRI, pareceu possível identificar alguns padrões em tais respostas. Mais do que isso, o estudo busca fazer ajustes neste entendimento, como um degrau no objeto da Administração Pública transparente. Ao analisar os 159 (cento e cinquenta e nove) processos, ficou claro o quanto o argumento da consulta jurídica é utilizado para o não conhecimento dos recursos. Na amostra restrita de 49 (quarenta e nove) processos, apenas 1 (um) teve a perda do objeto, pela entrega de uma manifestação.

Ao passar para um olhar qualitativo, novos ganhos aparecem. A indicação dos fundamentos legais da atuação da administração é sim um direito do cidadão e precisa ter tal informação concedida. Na hipótese de formulação de consulta, pareceu ao estudo interessante verificar nas bases da advocacia pública se existe manifestações jurídicas anteriores sobre o tema. A publicidade deste material, registre-se, pode ajudar na aproximação entre Estado e sociedade, com ganhos na sensação de justiça e legitimidade. Chama-se, com esse achado, atenção para os perigos de uma postura defensiva em casos de consulta jurídica, pautada no sigilo profissional da advocacia pública. A atuação do advogado público também precisa ser transparente. Saber quais são as orientações dadas ao gestor contribui com a democracia. Fortalece e a importância da orientação jurídica estatal.

Ao identificar 3 casos em que a manifestação jurídica foi formulada ao cidadão, este artigo almeja abrir uma possibilidade aos gestores de lidar com os pedidos de LAI. Não se tenciona, com isso, transformar a advocacia pública em um escritório a disposição de qualquer dúvida jurídica. Não é essa a pretensão. Os pedidos de LAI, desde que no crivo do gestor contribuam com o aprimoramento da política pública, podem ser o primeiro degrau para melhorias e ajustes. Conhecer os pareceres jurídico que subsidiaram, no passado, a decisão da política pública também. Para isso, o trabalho prega que a advocacia pública deve se aproximar dessa demanda que viabiliza a transparência social. A ausência de referência à Advocacia-Geral da União nos precedentes, demonstra o tamanho do desafio. Com este artigo, contudo, espera-se trazer uma fagulha para um debate que precisa ser incentivado.

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1 Doutora e Mestre em Direito pela Universidade de Brasília; Professora do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito Constitucional do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP). https://orcid.org/0000-0002-9832-7225. E-mail: mariana.cirne@ceub.edu.br.

2 Graduado em Direito pela Universidade Católica de Brasília (UCB). http://orcid.org/0000-0002-7509-9055. E-mail: samuellisboa999@outlook.com.

3 A demora aqui reconhecida não afasta alguns marcos anteriores no avanço da transparência, como o art. 48 da Lei Complementar n. 101, de 4 de maio de 2000, que determinou ao poder público a adoção de instrumentos de transparência na gestão fiscal em meios eletrônicos de acesso público às informações orçamentárias e às prestações de contas (AVELINO; POMPEU; FONSECA, 2021, p. 9).

4 Foi reconhecido como direito humano pela ONU e pela OEA, Cf. ARAUJO, BUSSINGUER, 2020.

5 Entende-se por Controle Social uma categoria em evolução que inclui: “monitoramento e supervisão, por parte dos cidadãos, do desempenho do setor público e/ou do setor privado; sistemas de acesso/disseminação de informações públicas centradas nos usuários; mecanismos de recebimento de reclamações que incluam recursos contra decisões administrativas; assim como participação cidadã no que diz respeito ao processo decisório de alocação de recursos, como é o caso do orçamento participativo” (FOX, 2019, p. 1332).

6 Cf.Art. 7º O acesso à informação de que trata esta Lei compreende, entre outros, os direitos de obter: I - orientação sobre os procedimentos para a consecução de acesso, bem como sobre o local onde poderá ser encontrada ou obtida a informação almejada; II - informação contida em registros ou documentos, produzidos ou acumulados por seus órgãos ou entidades, recolhidos ou não a arquivos públicos; III - informação produzida ou custodiada por pessoa física ou entidade privada decorrente de qualquer vínculo com seus órgãos ou entidades, mesmo que esse vínculo já tenha cessado; IV - informação primária, íntegra, autêntica e atualizada; V - informação sobre atividades exercidas pelos órgãos e entidades, inclusive as relativas à sua política, organização e serviços; VI - informação pertinente à administração do patrimônio público, utilização de recursos públicos, licitação, contratos administrativos; e VII - informação relativa: a) à implementação, acompanhamento e resultados dos programas, projetos e ações dos órgãos e entidades públicas, bem como metas e indicadores propostos; b) ao resultado de inspeções, auditorias, prestações e tomadas de contas realizadas pelos órgãos de controle interno e externo, incluindo prestações de contas relativas a exercícios anteriores[...]” (BRASIL, 2011).

7 A OGU é um órgão vinculado à CGU que conta com três coordenações-gerais: Orientação e Acompanhamento de Ouvidorias; Atendimento ao Cidadão; e Recursos de Acesso à Informação (AVELINO; POMPEU; FONSECA, 2021, p. 27). A atuação desta última coordenação está no material objeto desta pesquisa.

8 Corroborando a relevância dessa base de dados, Marcio Cunha Filho (2019, p. 162-174) desenvolveu análise de casos sobre esses precedentes para mostrar os avanços graduais e lento desses precedentes. Alguns exemplos de destaque são as informações sobre relatórios de impacto ambiental da construção da usina de Belo Monte ao BNDES e sobre impostos sindicais. Para ver outro estudo interessante sobre esses precedentes, ver: Michener, 2011.

9 A definição do termo “consulta jurídica” decorre da leitura dos precedentes, por meio do qual se percebeu a manutenção desse termo nos precedentes que falavam sobre consultas jurídicas. Não se deve elaborar um código alheio aos usos de sua base, mas sim respeitar o uso corriqueiro do material de pesquisa, cf. Saldaña, 2009.

10 A Súmula CMRI n. 1/2015 estabelece que: “Caso exista canal ou procedimento específico efetivo para obtenção da informação solicitada, o órgão ou a entidade deve orientar o interessado a buscar a informação por intermédio desse canal ou procedimento, indicando os prazos e as condições para sua utilização, sendo o pedido considerado atendido”.

11 Nesse sentido, o Enunciado n. 19 do Manual de Boas Práticas da AGU estabelece a orientação de que o “Órgão Consultivo se destina ao controle de legalidade dos atos da Administração, e não à substituição da deliberação do gestor. A manifestação jurídica que descortine eventuais alternativas legais contribuirá para demonstrar a diversidade de opções jurídicas disponíveis e propiciará ao administrador todos os elementos necessários à eficiente fundamentação de sua decisão, consoante o art. ٥٠ da Lei n. ٩.٧٨٤, de ١٩٩٩” (BRASIL, 2016).

12 A Portaria nº 529, de 23 de agosto de 2016 (BRASIL), que “Regulamenta, no âmbito da Advocacia-Geralda União e da Procuradoria-Geral Federal, o procedimento de acesso à informação e estabelece diretrizes relativas ao sigilo profissional decorrente do exercício da advocacia pública e à gestão da informação de natureza restrita e classificada, para atender o disposto na Lei nº 12.527 de18 de novembro de 2011, no Decreto nº7.724, de 16 de maio de 2012, e no Decreto nº 7.845, de 14 de novembro de 2012” representa uma limitação a ser avaliada. Ao se pautar no sigilo profissional do advogado público, a norma reduz as possibilidades de acesso à informação das manifestações jurídicas da AGU, o que prejudica o conhecimento de sua atuação pela população.