https://doi.org/10.18593/ejjl.27216
O ATAQUE A FONTES DE ÁGUA COMO CRIME DE GUERRA: ANÁLISE NO ÂMBITO DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL
ATTACK ON SOURCES OF WATER AS A WAR CRIME: ANALYSIS IN THE FRAMEWORK OF THE INTERNATIONAL CRIMINAL COURT
José Irivaldo Alves Oliveira Silva1
Beatriz Nogueira Caldas2
Sara Alves Magalhães3
Resumo: O artigo proposto traz uma análise da água como um direito humano, sob a perspectiva do direito penal internacional, considerando a existência de casos em que ataques sistemáticos a fontes de água são utilizados como uma estratégia de guerra em conflitos armados. Uma vez que aquíferos são contaminados, a população daquela região fica vulnerável, causando um grande problema humanitário. Assim, a pesquisa procura avaliar se ataques a fontes de água durante conflitos armados podem ser considerados um crime de guerra, dentro dos parâmetros estabelecidos pelo Estatuto de Roma. Para isso, é feito um estudo do caso de Darfur, no Sudão, julgado pelo Tribunal Penal Internacional (TPI), onde há evidências de que tanques de água foram propositalmente contaminados pelo governo, por ordem do ex-presidente Omar Al Bashir, para combater ataques de tropas rebeldes. Também é feito um estudo sobre o Estatuto de Roma, e sua definição de crimes de guerra, como forma de verificar se ataques voltados ao meio ambiente estão dentro do escopo penal do Estatuto. O método utilizado é o dedutivo aplicado a uma pesquisa qualitativa, feita por meio de um levantamento bibliográfico, com análise de artigos científicos e livros, além de fontes documentais. A pesquisa baseia-se em um estudo de caso concreto, referente à demanda da Procuradoria do TPI contra Omar Al Bashir. Apesar do TPI ser competente para julgar esse tipo de crime, isso não ocorre de forma eficaz.
Palavras-chave: Tribunal Penal Internacional; crimes ambientais; água; crimes de guerra.
Abstract: The article proposed brings an analysis of water as a human right, under the perspective of international criminal law, considering the existence of cases in which systematic attacks to water sources are utilized as a strategy of war in armed conflicts. Once the aquifers are contaminated, the population of the region stays vulnerable, causing a large humanitarian problem. Therefore, the research seeks to evaluate if the attacks on water sources during armed conflicts can be considered a war crime, under the requirements established by the Roma Statute. For that, it is made a case study of Darfur, in Sudan, a case judged by the International Criminal Court (ICC), where evidences where found of water tanks and plumps being intentionally contaminated by the government, as demanded by the ex-president Omar Al Bashir, to combat attacks of rebel troops. It is also made a study about the Rome Statute, and its definition of war crimes, as a way to determine if the attacks to the environment are within the scope of the Statute. The methodology utilized is a qualitative research, made by a bibliographical study, with the analysis of scientific articles and books, besides documents and international treaties. Likewise, it is made a case study about the case of the Prosecution v. Omar Al Bashir, in a way to conclude that, even though the ICC is able to judge this type of crime, this does not occur effectible.
Keywords: International Criminal Court; environmental crimes; water; war crimes.
Recebido em 28 de janeiro de 2021
Avaliado em 30 de abril de 2021 (AVALIADOR A)
Avaliado em 23 de março de 2022 (AVALIADOR A)
Aceito em 23 de março de 2022
Introdução
Os recursos hídricos são objeto de diversas discussões, sejam acadêmicas, políticas, jurídicas, ambientais, entre outras. Contudo, existe uma perspectiva pouco abordada no que diz respeito à água, qual seja a sua utilização como instrumento de guerra, que é o tema central deste artigo. Isso não é um tema surreal, distante de ocorrer, porém uma realidade muito mais próxima do que se possa pensar, principalmente pelas características essenciais da água, quais sejam: líquido escasso, essencial à vida no planeta com multiplicidade de usos, a vulnerabilidade quanto à proteção dos mananciais superficiais e subterrâneos e com distribuição irregular. A luta por água já é travada em diversas localidades sendo objeto de conflitos em diversas nações.
Diante disso, o trabalho traz três seções que apresentam, respectivamente, a água como direito humano e como instrumento de guerra, fazendo uma breve introdução sobre como se dá a configuração do crime de guerra por uso de recurso hídrico para fins bélicos; a competência e as principais implicações do processamento e julgamento pelo Tribunal Penal Internacional de crimes de guerra pelo uso de água como instrumento de guerra; e, por fim, a análise do caso concreto do conflito de Darfur, pelo qual o ex-presidente da República do Sudão, Omar Al-Bashir, é acusado de cometer crimes de genocídio, contra a humanidade e de guerra, com enfoque no suposto cometimento do crime de guerra por contaminação e bombardeamento de poços de água em Darfur, atingindo diretamente a população civil local.
A relevância temática, portanto, fica evidenciada pela escassa discussão do tema no âmbito acadêmico. Assim, o estudo justifica-se pelo fim de conferir maior visibilidade à questão, uma vez que o uso de recursos hídricos para fins bélicos são uma afronta direta aos direitos humanos, pois além da reprovabilidade do conflito armado por si só, trata-se de um recurso escasso e essencial não só à humanidade, mas à manutenção de todos os ecossistemas terrestres.
Assim, o objetivo geral do estudo é demonstrar a importância de discutir a crise hídrica mundial também sob o aspecto da sua utilização para fins de guerra, o que se pretende efetivar por meio dos objetivos específicos, que são: discutir o status jurídico da água como direito fundamental humano; de apresentar o Tribunal Penal Internacional como órgão competente para julgar crimes de guerra por uso de recurso hídrico para fins de guerra, evidenciando tanto como se dá o processamento como as dificuldades existentes na persecução de crimes desse tipo; e analisar um caso real e recente capaz de ilustrar a discussão proposta. No que diz respeito à metodologia, foi adotado o método indutivo com abordagem qualitativa, com análise bibliográfica e documental.
Dentre os resultados obtidos, merece destaque o de que a crise hídrica mundial apresenta diversas causas, devendo todas serem amplamente discutidas pela comunidade internacional, inclusive as que envolvem a utilização da água para fins de guerra, a fim de que haja punição efetiva daqueles que cometem crimes desse tipo, pois apresenta relevante gravidade por violar não apenas direitos humanos inerentes do conflito armado em si, mas também por promover o desperdício arbitrário de um recurso limitado e imprescindível à manutenção da vida terrestre em sua integralidade.
1 Água: direito humano, instrumento de guerra e crime de guerra
A água, dada a sua inquestionável influência nos aspectos da vida humana, é objeto de recorrentes discussões, desde os mais remotos tempos, seja sob perspectivas ambientais, sociais, jurídicas, econômicas ou políticas. Em sendo um assunto que atrai, em algum grau, as atenções da população mundial, a água se mostra como um objeto a ser tutelado pelo direito que deve ser resguardado e efetivado, notadamente diante das hodiernas crises hídricas que afetam o planeta e que têm provocado diversos conflitos. Isso tem se processado de forma lenta e gradual ao longo dos tempos.
Assim sendo, pretende-se discutir, inicialmente, a utilização da água sob três perspectivas: a de direito, a de instrumento de guerra e a de crime de guerra. Isto é, compreender a relevância jurídica da água, identificando o seu status nessa seara; apresentar as possibilidades de esta ser utilizada como um artifício para enfraquecer oponentes em confrontos armados; e analisar o enquadramento da utilização de recursos hídricos para fins bélicos como crime de guerra.
1.1 O status jurídico da água
Inicialmente, um questionamento e uma distinção se fazem necessários. Qual o status jurídico da água? Seria o direito à água um direito humano ou um direito fundamental? Apesar destas terminologias serem empregadas comumente como sinônimos, tem-se que isto é um equívoco.
Franco (2007) explica que a nomenclatura “direitos humanos” se refere a uma realidade universal, que não se restringe aos direitos positivados em um determinado ordenamento jurídico interno ou internacional. Por outro lado, a expressão “direitos fundamentais” diz respeito aos direitos, liberdades e garantias essenciais conferidas aos indivíduos de uma determinada sociedade, por intermédio de uma ordem constitucional específica.
Assim, o referido autor conclui que a relação sinonímia se deve ao fato de que, normalmente, os direitos fundamentais assegurados por uma determinada ordem jurídica expressam as mesmas garantias jurídicas dos direitos humanos, ambos visando, ao fim, a efetivação da dignidade da pessoa humana. Logo, os direitos fundamentais seriam decorrentes dos direitos humanos, os quais, de forma autoexplicativa, são intrínsecos ao ser humano.
Nesse contexto, considerando os conceitos apresentados, o direito à água se mostra como um direito humano, sendo este o seu status jurídico, pois inerente a todos e indispensável à concretização da dignidade humana por estar diretamente ligado à manutenção da vida. Por essa razão, converte-se também em direito fundamental a ser positivado pelos entes estatais em seus respectivos ordenamentos jurídicos, de forma a garantir o bem-estar da população.
Brown, Neves-Silva e Heller (2016), relatam que, no ano 2010, após a rejeição em 2008 de uma resolução que estabelecia o direito humano à água e ao saneamento, a Assembleia Geral das Nações Unidas e o Conselho de Direitos Humanos reconheceram, respectivamente, por meio da Resolução 64/292, de 28 de julho de 2010, e da Resolução 15/9, de 6 de outubro de 2010, o direito humano à água, estabelecendo que todo ser humano deve ter acesso à água suficiente para uso pessoal e doméstico, devendo aquela ser segura, aceitável e acessível.
Portanto, esse é o modelo conceitual instituído internacionalmente como sendo o norteador para o cumprimento do direito humano à água. Para além disso, todos esses elementos precisam estar adequados com o direito à saúde, especificamente a disponibilidade e o acesso a uma água de qualidade na quantidade adequada. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estabelece o mínimo de 50 litros de água, em média, por dia per capita, para o ser humano desenvolver suas atividades básicas (WHO, 2003; GLEICK, 1996). Isso culminou com a institucionalização do direito humano à água e ao saneamento em 2010 na Assembléia Geral da ONU. No comentário geral da Organização das Nações Unidas (ONU) n. 15 de 2002, no item 12, tem-se o conteúdo normativo do direito humano à água, formado pelas seguintes características: disponibilidade, qualidade, acessibilidade e informação acessível (UN, 2002). Importante frisar que no item acessibilidade foi destacado que ela precisaria ser física e economicamente verificável, bem como não discriminatória.
Ademais, as obrigações relacionadas ao acesso à água potável podem estar implícitas em outros tratados internacionais de direitos humanos e são derivadas de obrigações relativas à promoção e proteção de outros direitos humanos, incluindo os direitos à vida, moradia adequada, educação, alimentação, saúde, trabalho e vida cultural (WHO4, 2010). A OMS estabeleceu uma ligação entre água e saúde, especificamente como causador de doenças nas seguintes modalidades (WHO, 2003):
1) doenças de veiculação hídrica - causada pelo consumo de água contaminada (por exemplo, doenças diarreicas, hepatite infecciosa, febre tifóide, verme da Guiné);
2) doenças causadas pela falta de quantidade suficiente de água - causado pelo uso de volumes inadequados para a higiene pessoal (por exemplo, doenças diarreicas, hepatites infecciosas, febre tifóide, tracoma, infecções cutâneas e oculares);
3) doenças à base de água - onde um hospedeiro aquático intermediário é necessário (por exemplo, verme da Guiné, esquistossomose); e,
4) doenças com vetor relacionado à água - propagado por meio de insetos vetores associados à água (por exemplo, malária, dengue, zika).
A água é uma preocupação mundial, notadamente em relação ao seu acesso, quantidade e qualidade. Ainda convive-se com a transmissão de doenças através da água e com as externalidades causadas pela contaminação desse precioso líquido (GEVORGYAN et al., 2021; JIMÉNEZ-OYOLA et al., 2021; COIMBRA; ESCAPA; OTERO et al., 2021; WANG et al., 2021; CARLES et al., 2021).
O direito à água, apesar de explicitamente reconhecido como direito humano pela Assembleia Geral das Nações Unidas, não vem de forma patente nas constituições, a exemplo da brasileira, sendo comumente interpretado como sendo um componente implícito dos direitos fundamentais existentes, como o direito à vida, o que, de certa forma, dificulta a concretização do acesso à água, pois a não previsão expressa desse direito nas constituições, permite a esquiva dos governantes quanto à adoção de medidas que o efetivem. No caso brasileiro, tem-se uma emenda constitucional5 tramitando no congresso nacional visando inserir o direito a água no rol dos direitos fundamentais. Logo, o desafio de efetivar o acesso suficiente à água ainda se mostra como uma árdua tarefa, seja pelas questões naturais de distribuição dos recursos hídricos no planeta, seja por questões socioeconômicas e políticas.
1.2 A água como instrumento de guerra
Gleick (1993) explica que o uso dos sistemas de recursos hídricos como instrumentos de guerra, tanto de forma ofensiva como defensiva, tem uma longa história. O site World Water permite consultar uma lista cronológica de conflitos envolvendo água desde 3000 a.C. até o ano de 20196.
Dentre os eventos registrados, um caso demonstra claramente a ocorrência da utilização ofensiva e defensiva da água como instrumento de guerra: a represa de Hwacheon, na Coreia, concluída em 1944 (SANG-HUN, 2002), a qual se tornou um alvo e uma ferramenta de forças opostas durante a Guerra da Coreia. Em 1951, a Coreia do Norte abriu a represa para inundar áreas a jusante e avançar lentamente; em resposta, a Marinha dos Estados Unidos enviou aeronaves para bombardear a represa.
Em conflitos armados, a água pode ser um grande aliado ou um grande inimigo, pois sua capacidade destrutiva, a depender da forma como é utilizada, pode encerrar ou agravar uma disputa. O bombardeio de água potável de uma base militar ou a liberação de água de barragens para inundar localidades são capazes de produzir catástrofes e vitimar não apenas os envolvidos diretamente no combate, mas também inocentes.
Geneva Water Hub (2016) diz que embora a água não seja necessariamente uma causa de conflito, ela é frequentemente usada como uma ferramenta militar ou estratégica. Assim, a água, para além dos conflitos existentes envolvendo a sua distribuição, também causa diversos debates quanto ao seu uso para fragilizar rivais políticos, militares e até mesmo sociais e religiosos.
Popalzai (2012), em matéria para a CNN, registrou um caso, no Afeganistão, em que cerca de cento e cinquenta alunas adoeceram em virtude do envenenamento de um abastecimento de água escolar em um ataque intencional realizado por conservadores religiosos contrários à educação das mulheres.
Os recursos hídricos como ferramenta estratégica de ataque a opositores podem ser usados de formas sutis, como ocorre nos casos de envenenamento de água potável para o consumo de determinado grupo, ou de forma mais agressiva, como os bombardeios e inundações intencionais.
Percebe-se, desse modo, que, conforme salienta Gleick (1993, p. 87), “até mesmo a percepção de que o acesso à água potável poderia ser usado como ferramenta política por outra nação pode levar à violência.” A reflexão do referido autor se mostra plausível ao se analisar um caso recente envolvendo a Índia e o Paquistão no ano de 2019.
A Índia liberou água de uma represa no rio Sutlej, causando inundações moderadas rio abaixo no Paquistão (BOBIN, 2012). Apesar de a Índia ter afirmado que o lançamento foi um “exercício de rotina” durante a estação das monções, a liberação e as inundações resultantes foram vistas pelo Paquistão como um ato de guerra. O Paquistão reclama da falta de informações e sobre o temor do controle da água pela Índia. É interessante pontuar que já existe um tratado na região, o tratado do Indo. Esse tratado, assinado em 1960, sob a coordenação do Banco Mundial, aloca ao Paquistão os chamados três cursos d’água “ocidentais” (o Indo e seus dois afluentes Jhelum e Chenab) – quase 75% de toda a vazão – e à Índia os chamados três “orientais” (Ravi, Beas, Sutlej, outros afluentes do Indo) (BOBIN, 2012). A grande questão é que o tratado aborda o uso da água, mas não trata das obras de infra-estrutura hídrica, que agora estão sendo realizadas pela Índia, causando receio ao Paquistão (ECODEBATE, 2010). Portanto, a água pode ser vista, notadamente em algumas regiões, como um notório instrumento de guerra, sendo, qualquer indício da sua utilização para fins de ataque, um sinal de represália.
Verifica-se, portanto, que os recursos hídricos, desde os mais longínquos tempos até a atualidade, são efetivamente utilizados como instrumentos de guerra, podendo ser tanto para fins de ataque como de defesa. Contudo, conforme será discutido na seguinte subsecção, a água direcionada para estes fins também pode (e deve) provocar a responsabilização penal dos envolvidos, pois se trata de um recurso natural finito que está tendo sua função vital desvirtuada, atingindo inocentes, promovendo um arbitrário desperdício e violando os direitos humanos de acesso à água de parte da população mundial que sofre com a escassez contínua desse recurso.
1.3 Utilização da água como ferramenta de guerra: violação grave às Convenções de Genebra
Como visto, a água pode ter seu uso destinado tanto a ser um instrumento de guerra – a exemplo do caso da Guerra da Coreia – como de conflitos por questões sociais ou religiosas – a exemplo do caso dos extremistas que envenenaram a água de uma escola para meninas no Afeganistão por serem contra à educação de mulheres (REUTERS, 2012).
Este trabalho, contudo, tem enfoque na análise de casos em que o uso da água no contexto de conflitos armados, notadamente quando atinge a população civil, é considerado crime de guerra. Diante disso, faz-se necessária a análise de um dos principais tratados humanitários que subsidiam o conceito de crime de guerra7: as Convenções de Genebra.
As Convenções de Genebra, que são quatro, foram assinadas entre ١٨٦٤ e ١٩٤٩ com o fim de atenuar os impactos das guerras sobre a população civil, bem como de proporcionar proteção a militares capturados ou feridos. Assim, a IV Convenção de Genebra é relativa à proteção aos civis em tempo de guerra, identificados, segundo Barbosa (٢٠١٠), por terminologias como “territórios ocupados”, “zona desmilitarizada” etc.
O artigo 147 da IV Convenção de Genebra classifica como infração grave, dentre outras, causar intencionalmente grandes sofrimentos ou ofender gravemente a integridade física ou a saúde de pessoas ou bens protegidos pela Convenção.
Considerando os exemplos apresentados na subsecção anterior, tem-se que a utilização da água como instrumento de guerra enquadra-se como crime de guerra exatamente por isso: por ofender de forma grave à integridade física ou a saúde de um elevado número de pessoas simultaneamente.
Independentemente do tipo de ataque, seja o bombardeio ou o envenenamento de fontes de abastecimento de água potável ou a liberação de quantidade excessiva de água a fim de inundar determinada comunidade, todas agridem perigosamente o bem-estar físico das pessoas atingidas, que normalmente são civis. Logo, quando esse tipo de artifício é utilizado em conflitos armados, configura-se crime de guerra.
Geneva Water Hub (2016) explica que as consequências desses atos são severas e, na maioria dos casos, duradouras, pois incluem a degradação das terras agrícolas e o deslocamento de civis. Diante disso, o uso da infraestrutura hídrica e da própria água no contexto do conflito armado foi estabelecido pela Declaração de Madri de 1911 (CASTRO, 2009), uma soft law, que estabeleceu as seguintes proibições específicas para a proteção da população civil e do meio ambiente:
Artigo II
As instalações de abastecimento de água indispensáveis para as condições mínimas de sobrevivência da população civil não devem ser cortadas ou destruídas.
Artigo III
O desvio de águas para fins militares deve ser proibido quando causar sofrimento desproporcional à população civil ou danos substanciais ao equilíbrio ecológico da área em causa. Um desvio realizado para danificar ou destruir as condições mínimas de sobrevivência da população civil ou o equilíbrio ecológico básico da área em causa ou a fim de aterrorizar a população deve ser proibido em qualquer caso.
Artigo IV
A destruição de instalações hídricas contendo forças perigosas, como barragens e diques, deve ser proibida quando tal destruição pode envolver graves perigos para a população civil ou danos substanciais ao equilíbrio ecológico básico.
Artigo V
A causa das enchentes, bem como qualquer outra interferência no equilíbrio hidrológico por meios não mencionados nos artigos II a IV, devem ser proibidas quando envolver graves perigos para a população civil ou danos substanciais ao equilíbrio ecológico da área em causa. (tradução nossa)
A comunidade internacional, portanto, tem buscado, há muito, mudar essa realidade de emprego de recursos hídricos para fins bélicos, principalmente a fim de reduzir os impactos sobre a sociedade civil e sobre o meio ambiente. Entretanto, isso ainda se mostra uma tarefa difícil. Certamente, com o a agravamento da escassez de água e com as mudanças climáticas a proteção de mananciais superficiais e subterrâneos se converterá em tema cada vez mais estratégico nos países.
Entre os anos de 2010 a 2019, pela listagem do World Water, ocorreram trinta e nove conflitos envolvendo a água como “arma”. Dentre eles, vinte ocorreram na Ásia Ocidental; oito no Sul da Ásia; quatro na África Subsaariana; três no Norte da África; dois na América do Norte; um na América Latina; e um na Ásia Central. Por outro lado, nesse mesmo lapso temporal, ocorreram cento e setenta e dois conflitos nos quais a água era o “gatilho”, ou seja, disputas por água. Outro dado relevante é que dos trinta e nove conflitos, treze têm envolvimento do Estado Islâmico, tendo como alvos principais o Iraque e a Síria.
Verifica-se, portanto, que a água ainda tem sido utilizada frequentemente no contexto de conflitos armados, principalmente nos continentes asiático e africano, popularmente conhecidos pela grande concentração populacional e pela escassez tanto de recursos hídricos como alimentícios.
Logo, a utilização, seja de forma ofensiva ou defensiva, da água como “arma” nessas regiões mostra-se ainda mais reprovável, dada a evidente dificuldade de acesso da população a esse recurso, razão pela qual faz-se necessária a responsabilização penal dos envolvidos perante o tribunal competente, conforme será debatido da seção a seguir. Importante destacar algumas formas já detectada de utilização da água como instrumento de guerra (UNAM, 2019):
Gleick (2014) apresenta um panorama à época dessas modalidades de conflitos em torno da água:
Gleick (2014) condensa os principais conflitos de 3000 a.C. até o atual século XXI e isso só tem aumentado à medida dos interesses estratégicos regionais e geopolíticos, agravado pela escassez e pelo processo de mudanças climáticas. É preciso estabelecer como marco de análise uma disputa geopolítica pela água. Plaza (2020) coloca que não só a escassez, mas inundações já foram e podem ser arma de guerra também. A água pode ser utilizada de diversas formas em um conflito. Mesmo em tempos de pandemia, mais de 2 milhões de líbios sofrem com corte de água e eletricidade em Trípole, capital, e arredores e segundo denúncias em virtude de grupos armados que não se importam que a população fique vulnerável a contrair o Covid-19 sem acesso à água, vital para a prevenção desse grande mal que assola atualmente o mundo (TSF, 2020). A figura 1 apresenta um mapa de possíveis focos de conflito pela água, e em alguns desses a água pode se tornar em arma de guerra.
Figura 1 - Locais prováveis de conflito pela água
Fonte: Eler (2018).
2 O Tribunal Penal Internacional e a possiblidade de persecução criminal de violações ao meio ambiente
Conforme observado na seção anterior, há vários casos na história da humanidade em que a água foi usada como instrumento de guerra, além dos recursos hídricos estarem sujeitos a ataques durante conflitos armados. Assim, é possível verificar nas legislações internacionais que o ataque a fontes hídricas pode ser considerado um crime de guerra, penalmente tipificado pelas Convenções de Genebra e de Haia e pelo Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional. Todavia, as leis internacionais não fazem referência direta ao termo “água”, estando ela no âmbito dos ataques ao meio ambiente.
Os crimes de guerra são crimes de competência do Tribunal Penal Internacional (TPI). Por esse motivo, faz-se necessária a análise da estrutura do Tribunal, incluindo um estudo sua atuação em investigações relativas a crimes contra o meio ambiente, analisando como o Estatuto de Roma aborda a questão do dano ambiental durante conflitos armados e como essas disposições se concretizam em um contexto fático.
2.1 O surgimento e a estrutura do Tribunal Penal Internacional
O sistema internacional de proteção aos direitos humanos é composto por várias esferas, sendo uma delas a do direito penal internacional. O conceito de direito penal internacional foi estabelecido a partir da Segunda Guerra Mundial com a criação do Tribunal de Nuremberg, que elaborou diversos conceitos de responsabilidade criminal internacional, com objetivo de manutenção da paz mundial (PERRONE-MOISÉS, 2003).
Os mais graves crimes de violação aos direitos humanos, sendo eles crimes contra a humanidade, crimes de guerra, genocídio e crimes de agressão, tiveram seus precedentes estipulados pelos Tribunais pós-guerra (Nuremberg e Tóquio) e pelos Tribunais penais ad hoc para Ruanda e para a antiga Iugoslávia (PERRONE-MOISÉS, 2003). Ademais, o conceito de um direito penal de caráter internacional surgiu a partir da estipulação das leis de guerra, conhecidas atualmente como parte do direito internacional humanitário, consolidado pelas Convenções de Haia e de Genebra (PERRONE-MOISÉS, 2003).
Uma vez que os tribunais penais ad hoc tiveram um funcionamento satisfatório e atenderam aos anseios da comunidade internacional, a ideia da possibilidade de criação de uma corte internacional permanente ficou ainda mais fortalecida, e acarretou no surgimento do Tribunal Penal Internacional (PIOVESAN; IKAWA, 2013). Assim, em 17 de julho de 1998, o Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional foi criado, entrando em vigor em 2002, após a ratificação de mais de 60 países, e o Brasil ratificou o Estatuto em 11 de abril de 2002 (PIOVESAN; IKAWA, 2013).
Atualmente, o TPI possui 122 Estados parte8 e 27 casos já foram abertos desde o início de sua atuação, sendo a maioria em países africanos (ICC, 2016). No âmbito material, o TPI possui competência para julgar crimes de guerra, crimes contra a humanidade, genocídio e crimes de agressão (BRASIL, 2002). Por sua vez, o Estatuto de Roma foi incorporado ao ordenamento jurídico brasileiro por meio da emenda constitucional n. 45/2004, sendo incluído no art. 5º da Constituição Federal9.
O TPI é composto por 3 órgãos principais10, sendo eles as Seções de Julgamento, a Procuradoria e a Secretaria. As Seções são divididas em Seção de Instrução, Seção de Julgamento e Seção de Recursos11, e elas são responsáveis pelo julgamento de casos, avaliando também os critérios de admissibilidade de cada situação (BRASIL, 2002). A Procuradoria, por sua vez, é o órgão responsável por realizar investigações, coletar informações, receber denúncias e realizar persecuções criminais (BRASIL, ٢٠٠٢).
A Procuradoria do TPI, consequentemente, está encarregada de selecionar os casos que serão levados para análise da Seção de Instrução, sendo independente para definir quais situações se enquadram como de maior gravidade12. Por essa razão, é importante verificar como a Procuradoria seleciona seus casos, qual a prioridade de crimes envolvendo danos ambientais e como ela pode ampliar o escopo da interpretação dos crimes contra o meio ambiente como crimes de guerra ou crimes contra a humanidade. Contudo, primeiramente é preciso observar como o Estatuto de Roma aborda a questão do dano ambiental.
2.2 Crimes contra o meio ambiente no âmbito do Estatuto de Roma
O Estatuto de Roma traz a definição de crimes de guerra, crimes contra a humanidade, crimes de genocídio e crimes e agressão. Em relação aos crimes de guerra, ele define em seu artigo 8º como “as violações graves às Convenções de Genebra, de 12 de Agosto de 1949, a saber, qualquer um dos seguintes atos, dirigidos contra pessoas ou bens protegidos nos termos da Convenção de Genebra que for pertinente” (BRASIL, 2002). A seguir, o Estatuto elenca uma série de crimes que, durante conflitos armados, constituem crimes de guerra.
Entre os crimes citados, o artigo 8º, parte 2, item b, estabelece “outras violações graves das leis e costumes aplicáveis em conflitos armados internacionais no âmbito do direito internacional” (BRASIL, 2002), e entre essas outras violações estão os ataques ao meio ambiente. O artigo ٨º, parte 2, item b, IV (BRASIL, 2002), determina, assim, que constitui um crime de guerra:
Lançar intencionalmente um ataque, sabendo que o mesmo causará perdas acidentais de vidas humanas ou ferimentos na população civil, danos em bens de caráter civil ou prejuízos extensos, duradouros e graves no meio ambiente que se revelem claramente excessivos em relação à vantagem militar global concreta e direta que se previa.
É importante observar que a forma como o Estatuto de Roma aborda os danos ambientais causados por conflitos armados é mais relacionada ao objeto, à proibição de um método de guerra, sem qualificar o meio ambiente como um ente em si, passível de ser vítima de ataques, ou como um direito humano a ser protegido. Ademais, esse artigo elenca a única menção feita ao meio ambiente em todo o Estatuto, sendo um termo abrangente, não havendo nenhuma menção específica à água.
Entretanto, Rachel Killean (2020) argumenta que os danos ao meio ambiente podem estar tipificados no escopo dos outros crimes de competência do Estatuto de Roma, como os crimes de genocídio e crimes contra a humanidade. No âmbito dos crimes de genocídio, a autora afirma que seria possível estabelecer um nexo entre o genocídio e o ecocídio, como atos que afetassem as condições de vida de um grupo, podendo levar a sua destruição, tendo relação com as populações indígenas que vivem diretamente da natureza (KILLEAN, ٢٠٢٠).
Killean (2020) também observa que os crimes ambientais poderiam estar contidos na esfera dos crimes contra a humanidade de quatro formas, sendo a proibição de extermínio intencional das condições de vida de uma população, a transferência forçada de pessoas, a privação de um direito fundamental ou outros atos desumanos em decorrência de ataques a populações civis.
O acesso à água potável caberia no sentido da privação de um direito fundamental, a depender da interpretação dada ao direito à água, e também como um direito humano, como citado anteriormente. Uma vez que o rol taxativo de crimes do Estatuto de Roma possui algumas categorias que expandem sua tipificação, como no caso do artigo 7º, parte 1, item k que relaciona “outros atos desumanos de caráter semelhante, que causem intencionalmente grande sofrimento, ou afetem gravemente a integridade física ou a saúde física ou mental”, a margem interpretativa do Estatuto torna-se ainda maior, podendo, de fato, haver a criação de outros tipos penais.
É com base nessa abertura que a Procuradoria do TPI consegue expandir seu campo de atuação, trazendo inovações persecutórias. Em suas políticas de priorização de casos, ela já deixou explícito seu interesse na investigação de crimes que envolvam violações ao meio ambiente, como será analisado a seguir.
2.3 A Procuradoria do TPI e suas políticas para persecução de crimes ambientais
Em 2013, a Procuradoria do TPI publicou o Policy Paper on Preliminary Examinations13, determinando que o dano ambiental deveria ser um fator a ser considerado durante as investigações realizadas pelo órgão (KILLEAN, 2020). As políticas elaboradas pela Procuradoria têm o intuito de nortear as investigações e demonstrar a linha argumentativa que será usada durante as persecuções criminais.
Assim, a referida “Política sobre Exames Preliminares” (tradução nossa) determinou que “o impacto dos crimes deve ser avaliado a luz dos, inter alia, sofrimentos vivenciados pelas vítimas e sua vulnerabilidade aumentada; o terror subsequente instalado, ou o dano social, econômico ou ambiental infligido nas comunidades afetadas.”14 (ICC, 2013, p. 14, tradução nossa). A interpretação trazida pela Procuradoria, como pode ser observado, é relativamente diferente daquela trazida pelo Estatuto de Roma, uma vez que ela relaciona mais diretamente o dano ambiental com a vida das comunidades afetadas.
Não obstante, em 2016, a Procuradoria publicou o Policy paper on case selection and prioritisation, documento que trouxe um maior número de menções à persecução criminal de danos ambientais. O próprio nome do documento faz referência a seleção e priorização de casos, mostrando o interesse da Procuradoria em dar prioridade a situações em que o meio ambiente tenha sido afetado de algum modo. Rachel Killean (2020) ressalta que o foco da Procuradoria está na gravidade dos crimes, abrangendo a escala, natureza e modo de perpetração da violação e seus impactos.
Todavia, Paloma Klee e Vinícius Zambiassi (٢٠١٨) observam que essa política não pode ser considerada uma emenda ao Estatuto de Roma, sendo apenas uma forma de esclarecer o modus operandi da Procuradoria. Os autores também apontam que a maneira como o TPI interpreta as violações ao meio ambiente está relacionada com uma visão antropocêntrica do direito ambiental, uma vez que tanto nas políticas da Procuradoria, quanto no artigo ٨º do Estatuto de Roma, o dano ao meio ambiente precisa estar conectado com um dano aos seres humanos (KLEE; ZAMBIASSI, 2018). Gordilho e Ravazzano (2017) compreendem que é preciso uma emenda ao Estatuto de Roma incluindo o crime de ecocídio de forma autônoma e não apenas realizar uma conexão entre uma ação contra a natureza e crimes contra a humanidade.
Por mais que, como sustentado pelos autores, uma visão ecocêntrica fosse mais benéfica e mais ampla para a proteção ao meio ambiente, a abordagem atual de danos ambientais no âmbito do direito penal internacional já enfrenta diversos desafios em termos de capacidade persecutória e estabelecimento de nexo causal. Um dos desafios, ressaltados por Klee e Zambiassi (2018), está no fato do TPI estabelecer o princípio da responsabilidade penal individual, o que obsta a persecução criminal de pessoas jurídicas.
Freeland (2005) entende que não se pode desvencilhar a conduta de estados em um conflito dos resultados perpetrados em relação ao meio ambiente, pois a depender do nível desses isso pode inviabilizar a vida como um todo, não apenas de seres humanos mas de outros organismos da natureza. Sabe-se que o desafio é muito mais político do que estritamente técnico-jurídico no plano internacional. Atacar um manancial de água deliberadamente, ou não, exige punição severa dos responsáveis diante da crescente escassez de água no mundo. Com as tecnologias de sensoriamento remoto e outras formas de mapeamento em geral fica difícil alegar que não se sabia da existência de recursos ou bens ambientais tão importantes para a vida como a água.
Por outro lado, Payal Patel (2016) argumenta que o TPI não tem capacidade para realizar persecuções criminais relativas a danos contra o meio ambiente porque os procuradores não são especialistas em direito ambiental e, portanto, não tem o conhecimento científico necessário para averiguar danos ambientais. Assim, o autor afirma que os crimes ambientais seriam melhor avaliados em algum órgão específico para violações contra o meio ambiente, não o TPI, que engloba uma grande quantidade de violações aos direitos humanos (PATEL, ٢٠١٦).
Rachel Killean (2020), contudo, demonstra que a Procuradoria do TPI conseguiu estabelecer, em 2008, um nexo causal entre o crime de genocídio e a destruição intencional do meio ambiente no caso de Darfur, no Sudão. Nesse caso, houve um ataque sistemático a vegetação e recursos hídricos, além da poluição e envenenamento de fontes de água como forma de atacar um grupo com a intenção de exterminá-lo, no todo ou em parte, por meio de ataques ao meio ambiente (KILLEAN, 2020).
O caso do Sudão, além de ser o único exemplo de caso julgado pelo TPI em que o ataque a fontes de água foi usado como meio de guerra, é um dos casos que conseguiu demonstrar que houve uma violação intencional ao meio ambiente. Por esse motivo, o caso será analisado mais detalhadamente na próxima seção.
3 Crime de guerra no conflito de Darfur: água como instrumento de guerra
Feitas as considerações acerca da utilização água como instrumento de guerra, do conceito de crime de guerra e de como se dá o processamento e julgamento destes pelo Tribunal Penal Internacional, faz-se necessária a análise aprofundada de um caso concreto, para além das menções exemplificativas feitas nas seções anteriores.
Para este fim, foi selecionado o conflito de Darfur, no Sudão, pelo qual Omar Hassan Ahmad Al Bashir15 é acusado de crimes contra a humanidade, crimes de guerra e genocídio.
3.1 Al Bashir, o contexto do conflito e o crime de guerra
Inicialmente, cumpre apresentar, ainda que sinteticamente, um pouco sobre quem é Omar Hassan Ahmad Al Bashir, presidente da República do Sudão (1989-2019), acusado de cometer crimes de genocídio, crimes de guerra e crimes contra a humanidade.
Em 1966, Al Bashir formou-se na academia militar do Sudão, tornando-se oficial de carreira do exército e chegando ao posto de general. Em 1989, derrubou o governo civil democraticamente eleito do ex-primeiro-ministro Sadeq al-Mahdi. Em 1993, Al Bashir dissolveu a junta militar que o levou ao poder e se nomeou presidente civil em uma ação destinada a estabelecer o governo islâmico no maior país da África (REUTERS, 2008).
No ano de 2003, os dois primeiros de vários grupos rebeldes - o Sudan Liberation Movement/Army (SLM/A) e o Justice and Equality Movement (JEM)) - se levantaram no oeste do Sudão contra as negligências na região árida de Darfur por parte do governo de Al Bashir, bem como contra o armamento de milícias árabes contra civis.
Ao falar sobre o conflito de Darfur, Ban Ki-moon (2007, p. 1) observou que “por uma abreviatura convencional, é uma sociedade em guerra consigo mesma.” Em matéria da Amnesty International (2004) consta que o conflito de Darfur teria como uma de suas principais causas o abandono daquela região pelo Governo do Sudão, o que teria provocado revolta na população local e a consequente formação de grupos armados revolucionários.
Insatisfeito com as críticas e com as iminentes rebeliões, o governo sudanês permitiu invasões por grupos nômades e milícias, notadamente pelos Janjawiid16, para atacar, impunemente, aldeias em Darfur, criando, assim, um ambiente de conflito constante que resultou em milhares de mortes e na violação de diversos direitos humanos.
Há, ainda, registros de que no Sudão há uma desigualdade estrutural étnica que marginaliza os povos não árabes, os quais estão concentrados exatamente na região de Darfur. Diante disso, Bromwich (2017, p. 2) argumenta que “há uma guerra entre as diferentes comunidades dentro de Darfur que foi manipulada pelo governo, ao invés de simplesmente uma guerra nacional que manipulou atores violentos em Darfur.17”
Ban Ki-moon (2007) analisa que a crise em Darfur apresenta diversas causas que devem ser consideradas: segurança, política, recursos, água e questões humanitárias e de desenvolvimento. Percebe-se, desse modo, que as condutas do Governo do Sudão, capitaneadas por Al-Bashir, provocaram imenso retardo e dano à população sudanesa, principalmente aos civis, os quais se veem em situação de flagelo, desabrigados, famintos e traumatizados. Segundo a Reuters (٢٠٠٨), estima-se que dois milhões e meio de pessoas foram expulsas de suas casas na região e que, em cinco anos de conflito, cerca de duzentas mil pessoas morreram de doenças, fome ou como resultado de violência.
Em 14 de julho de 2008, Al-Bashir foi indiciado pelos procuradores do Tribunal Penal Internacional, de crime de genocídio, crimes de guerra e crimes contra a humanidade, supostamente cometidos durante o conflito armado em Darfur, no Sudão, desde julho de 2002 (SOUARÉ, 2008).
Dentre os crimes de guerra cometidos, em tese, por Al-Bashir em Darfur, tem-se a contaminação de poços e bombas de água das cidades e vilas habitadas principalmente por povos Fur, Masalit e Zaghawa18, conforme consta na Case Information Sheet (ICC, 2018) do Tribunal Penal Internacional. Essa teria sido uma das estratégias de guerra para atingir os principais grupos armados revolucionários da região, mas as vítimas diretas dos ataques eram a população civil.
A Seção de Instrução I do TPI alegou que existiam evidências suficientes para crer que Omar Al Bashir realizou os referidos ataques de forma sistemática, com a intenção de destruir, em parte, os grupos étnicos de Fur, Masalit e Zaghawa, ato considerado crime de genocídio, além de um crime de guerra por ser um ataque voltado a população civil e por afetar o meio ambiente (ICC, 2018). Assim, os ataques a fontes de água teriam sido uma estratégia de guerra do governo sudanês para eliminar os grupos étnicos mencionados, um exemplo claro de como a água pode ser usada como ferramenta bélica.
Entretanto, apesar do TPI ter emitido um mandado de prisão para Al Bashir, em 2009, ele nunca chegou a ser preso e entregue ao Tribunal, continuando como chefe de governo do Sudão (ICC, 2018). O motivo do mandado não ter sido cumprido resta no fato de que o TPI não possui uma polícia própria, dependendo, assim, da cooperação dos Estados partes para prender e entregar o acusado ao Tribunal, para devido julgamento. Não obstante, após trinta anos de poder autocrático, Al Bashir foi derrubado, em 2019, por um golpe militar, em virtude dos diversos protestos da população sudanesa pela sua deposição (ABDELAZIZ, 2019).
Assim, considerando as circunstâncias do conflito, assim como a descrição dos crimes de guerra cometidos pelo ex-presidente do Sudão Omar Al Bashir, com enfoque naqueles que envolvem a utilização da água como instrumento de guerra, realizar-se-á a seguir uma análise dos desafios da persecução penal de crimes contra o meio ambiente, mais especificamente crimes relacionados à água, implicações referentes às condutas criminosas de Al-Bashir no conflito de Darfur perante o Tribunal Penal Internacional.
3.2 Os desafios da persecução criminal de crimes ambientais relativos à água
Como visto no item anterior, apesar da Procuradoria do TPI ter conseguido coletar evidências suficientes para estabelecer o nexo causal entre a contaminação de fontes de água com ataques sistemáticos realizados pelo governo do Sudão, sob o comando de Omar Al Bashir, evidências essas que foram confirmadas pela Seção de Instrução I, o caso não teve uma conclusão porque o acusado nunca foi preso e levado a julgamento. Assim, não foi possível consolidar um precedente relativo ao ataque de recursos hídricos como crime de guerra no âmbito do TPI.
Além da clara dificuldade em conseguir executar mandados de prisão, por não ter um corpo policial próprio, o TPI também enfrenta outros desafios relativos à persecução penal de crimes ambientais relacionados à água. Segato, Mattioli e Capello (٢٠٢٠) afirmam que um desses obstáculos é a falta de dados sobre crimes contra a água, que cria uma lacuna que restringe a capacidade dos organismos internacionais de traçarem estratégias efetivas na prevenção e combate a esse tipo de crime, como contaminação de recursos hídricos ou interrupção forçada na distribuição de água.
A água tem sido utilizada como arma de guerra na Síria, onde o Comitê Internacional da Cruz Vermelha afirma que a população civil da cidade de Aleppo enfrenta enorme sofrimento devido aos cortes deliberados no abastecimento de água e eletricidade, sendo certa de 2 milhões de pessoas com dificuldades de acesso à água (CICV, 2015). Segundo Sancha (2017), isso evoluiu para 4 milhões de pessoas em Damasco sem acesso à qualquer quantidade de água, segundo ela uma conduta deliberada de usar a água como instrumento de guerra. Em toda a Síria são 15 milhões de pessoas com dificuldades de acesso à água e que gastam 25% do seu orçamento comprando esse líquido vital (SANCHA, 2017).
São diversos os conflitos desencadeados a partir da água, seja nesse modelo de atingir estruturas responsáveis pelo tratamento e distribuição da água, ou mesmo conflitos que surgem pelo uso da água transfronteiriça, uma vez que boa parte dos recursos hídricos continentais estão contidos em bacias hidrográficas transfronteiriças gerando conflitos no processo de uso e acesso à água (SILVA, 2020). Esses conflitos são crescentes e carecem de um tratamento no âmbito do Direito Internacional Público (ESPADA, 2017). Na verdade, talvez seja ainda muito cedo para atestar uma guerra pela água, porém há conflitos cujo motivo é o acesso a ela ou que ela é utilizada como arma de guerra. Para se chegar ao patamar de guerra, estudos apontam que a escassez de água não seria suficiente mas a soma de outros fatores como alta densidade populacional, alta desigualdade de renda, semi-democracia, instabilidade política e histórico de conflitos (PFRIMER, 2010).
Outra questão, relativa não somente aos crimes contra a água, mas sobre crimes ambientais no contexto de conflitos armados, resta no fato de que, para que um crime ambiental seja considerado relevante o suficiente para ser classificado como crime de guerra, ele precisa seguir os requisitos de ser um ataque extenso, duradouro e grave, como determina o artigo ٨º, § ٢°, b, IV do Estatuto de Roma19 (MISTURA, 2018). Alessandra Mistura (2018) destaca que não há uma definição clara, nos elementos de crimes do TPI, sobre o significado dos termos “extenso”, “duradouro” e “grave”, o que pode dificultar a análise de um caso, na tentativa de verificar se ele cumpre os requisitos citados. Ademais, o artigo 8º, § 2°, b, IV do Estatuto de Roma ainda exige que o prejuízo ambiental seja excessivo, ou desproporcional, à vantagem militar pretendida (BRASIL, 2002).
Assim, estes seriam outros fatores que acrescentaria um grau de dificuldade no contexto de uma análise sobre a possibilidade de persecução de crimes ambientais como crimes de guerra. Nesse sentido, é possível compreender o motivo de, até o presente momento, existir somente um caso concreto onde os juízes do TPI determinaram que havia ocorrido um crime ambiental como crime de guerra.
Por sua vez, Peter Gleick (2019) afirma que um dos grandes desafios para a persecução penal de crimes relacionados ao ataque de recursos hídricos é a aparente inabilidade ou desinteresse dos países em investigar esses crimes dentro de seu próprio território, precisando, assim, recorrer a tribunais internacionais, como no caso do Sudão. O autor também faz referência ao fato do TPI não ter conseguido prender Omar Al Bashir, não podendo levar o processo adiante e tomar as medidas cabíveis para a violação à água (GLEICK, 2019). Assim, Gleick (2019) conclui que, em razão da aparente incapacidade do sistema penal internacional em prevenir e punir condutas criminais contra a água, os mecanismos existentes são ineficazes na prevenção do uso da água como ferramenta de guerra.
Dessa forma, é possível verificar que o Estatuto de Roma estabeleceu diversas restrições para o enquadramento de crimes ambientais como crimes de guerra, algo que dificultou a persecução desse tipo de crime, incluindo crimes contra a água. Não obstante, mesmo existindo um precedente no caso do Sudão, ele não foi concluído porque Omar Al Bashir nunca foi preso e entregue ao TPI, impossibilitando seu julgamento e deixando pendente uma das maiores inovações trazidas pelo Tribunal.
4 Considerações finais
O presente artigo evidenciou que a água pode ser utilizada como um instrumento de guerra, bem como objeto de diversos conflitos, existindo vários exemplos ao redor do mundo. Todavia, o exemplo principal foi o caso de Omar Al Bashir, tendo em vista que ele se consolidou como o primeiro caso que um chefe de governo foi condenado pela contaminação de recursos hídricos como um meio para eliminar parte da população do Sudão.
Entretanto, ficou evidente que, apesar do TPI ser o órgão internacional competente para julgar esse tipo de crime, e mesmo com uma política de sua Procuradoria que destaca a importância da persecução de crimes ambientais, ele ainda possui meios muito limitados para conseguir investigar e julgar de forma eficaz os crimes contra a água, principalmente por que o ordenamento internacional acerca do uso e compartilhamento da água não tem a força necessária para dar suporte ao tribunal, sendo fundamental, ainda, muita negociação. Muitos países deixaram de ratificar os tratados e convenções nesse tema, sendo nessário muitas vezes estabelecer tratados envolvendo apenas os Estados parte do conflito. Falta ainda a participação de todos os países no TPI e a cordialidade entre os Estados parte. Além disso, o próprio Estatuto de Roma impõe requisitos que dificultam a persecução de crimes ambientais como crimes de guerra. Dessa forma, é preciso aperfeiçoar, atualizando ao contexto de crise hídrica vivenciada em muitos lugares do mundo.
Ademais, verificou-se que é de suma importância para o direito internacional ter organismos eficazes no combate a crimes contra os recursos hídricos, em razão do status da água como direito humano e de toda crise hídrica mundial, seja para prevenção desse tipo de atrocidade, ou para punir os responsáveis pelas violações, algo que ainda não acontece de maneira eficaz no contexto atual.
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1 Professor da Universidade Federal de Campina Grande, professor do Programa de Pós-graduação em Ciências Jurídicas da Universidade Federal da Paraíba. Bolsista Produtividade CNPq. Rua Alzira Figueiredo, n. 365, Bairro Catolé, Campina Grande, Paraíba. https://orcid.org/ 0000-0002-0022-3090; irivaldo.cdsa@gmail.com
2 Mestre em Direito Constitucional, Universidade de Fortaleza, Advogada, endereço: Rua Silva Jatahy, 1325, apt 402, Meireles, CEP 60165070, Fortaleza, Ceará. https://orcid.org/0000-0001-9709-3079; beatrizcaldas17@gmail.com
3 Mestre em Direito Constitucional, Universidade de Fortaleza, Advogada, Assessora Jurídica do Ministério Público do Ceará. Av. Boulevard Sebastião Carlos, 654, Alto dos 14, CEP: 62.250-000, Ipu/CE. https://orcid.org/ 0000-0001-9643-5276; saraamagalhaes@live.com
4 Abreviação de World Health Organization.
5 Esse é o Projeto de Emenda à Constituição n. 4/2018, cujo texto Garante a todos o acesso à água potável em quantidade adequada para possibilitar meios de vida, bem-estar e desenvolvimento socioeconômico. O texto está na Câmara desde 2021.
6 Disponível em: http://www.worldwater.org/conflict/list/. Acesso em: 15 jan. 2021.
7 Os crimes de guerra, como será visto na seção posterior, estão previstos no Estatuto de Roma, de 1998, o qual recorreu às Convenções de Genebra, de 1949, para especificá-los.
8 Países que ratificaram o Estatuto de Roma.
9 “Art. 5º § ٤º O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão.”
10 Art. 34 do Estatuto de Roma.
11 Art. 39 do Estatuto de Roma.
12 “Art. 42 - 1. O Gabinete do Procurador atuará de forma independente, enquanto órgão autônomo do Tribunal. Competir-lhe-á recolher comunicações e qualquer outro tipo de informação, devidamente fundamentada, sobre crimes da competência do Tribunal, a fim de os examinar e investigar e de exercer a ação penal junto ao Tribunal. Os membros do Gabinete do Procurador não solicitarão nem cumprirão ordens de fontes externas ao Tribunal.”
13 “The OTP conducts a preliminary examination to decide whether there is a reasonable basis to initiate an investigation.” (ICC, 2020).
14 “The impact of crimes may be assessed in light of, inter alia, the sufferings endured by the victims and their increased vulnerability; the terror subsequently instilled, or the social, economic and environmental damage inflicted on the affected communities.” (texto original).
15 Presidente da República do Sudão desde outubro de 1993 até abril de 2019.
16 Milícia supostamente financiada pelo Governo do Sudão.
17 “The institutional perspective highlights the fact that there is a war among the different communities within Darfur that has been manipulated by government, rather than simply a national war that has manipulated violent actors in Darfur.” (texto original).
18 Etnias que são predominantes em Darfur.
19 “Art. 8º, §2 iv) Lançar intencionalmente um ataque, sabendo que o mesmo causará perdas acidentais de vidas humanas ou ferimentos na população civil, danos em bens de caráter civil ou prejuízos extensos, duradouros e graves no meio ambiente que se revelem claramente excessivos em relação à vantagem militar global concreta e direta que se previa.”