https://doi.org/10.18593/ejjl.20635
PARÂMETROS INTERNACIONAIS PARA EFETIVIDADE DAS LIBERDADES CULTURAIS NO CONTEXTO INTERAMERICANO
INTERNATIONAL PARAMETERS FOR THE EFFECTIVENESS OF CULTURAL LIBERTIES IN THE INTER-AMERICAN CONTEXT
Marcus Pinto Aguiar1
Resumo: O presente trabalho busca delinear, no contexto jurídico e institucional do sistema internacional de proteção e promoção de direitos humanos, parâmetros jurisdicionais que promovam a máxima efetivação das liberdades culturais, a partir, principalmente, dos mecanismos regionais interamericanos. Nesse sentido, procedeu-se à análise da jurisprudência contenciosa e consultiva da Corte Interamericana, da normatividade convencional de outros sistemas regionais e do global, do pronunciamento de órgãos jurisdicionais dos demais sistemas internacionais, além da pesquisa bibliográfica. Levou-se em consideração, na construção da pesquisa, recortes materiais, no sentido de abordar as manifestações das liberdades culturais, sob a forma de expressão artística e identitária, este último como autonomia para a escolha dos próprios planos de vida. Desse modo, conclui-se que as liberdades culturais, enquanto direitos humanos e fundamentais devem ser protegidos em suas expressões mais amplas de manifestação pelo Estado e pela sociedade, cabendo apenas, excepcionalmente, restrições legais e adequadas à realidade social para se evitar prejuízos a outros direitos e à segurança nacional, e à reparação civil posterior por eventuais abusos de direito.
Palavras-chave: Liberdade de expressão; Liberdades culturais; Parâmetros internacionais; Controle de convencionalidade.
Abstract: The present work seeks to delineate, in the juridical and institutional context of the international system of protection and promotion of human rights, jurisdictional parameters that promote the maximum realization of cultural freedoms, mainly from the inter-American regional mechanisms. In this sense, the contentious and advisory jurisprudence of the Inter-American Court, the conventional normativity of other regional systems and the global system, the pronouncement of jurisdictions of other international systems, as well as bibliographical research were analyzed. In the construction of the research, material frameworks were taken into account in order to approach the manifestations of cultural freedoms, in the form of artistic expression and identity, the latter as autonomy for choosing one’s own life plans. In this way, it can be concluded that cultural freedoms, as human and fundamental rights, must be protected in their broader expressions of manifestation by the State and by society, only exceptionally limited legal restrictions and adequate social reality to avoid harm to others rights and national security, and to subsequent civil damages for possible abuse of rights.
Keywords: Freedom of expression; Cultural freedoms; International parameters; Conventionality control.
Recebido em 02 de maio de 2019
Avaliado em 31 de agosto de 2020 (AVALIADOR A)
Avaliado em 03 de maio de 2020 (AVALIADOR B)
Avaliado em 19 de agosto de 2021 (AVALIADOR C)
Aceito em 30 de maio de 2022
Com a perspectiva de analisar o tratamento dado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos por meio de suas decisões jurisprudenciais às liberdades culturais, busca-se compreender os principais parâmetros regionais para a proteção e promoção de tais liberdades, e qual seu alcance no contexto geral da proteção da liberdade de expressão como direito humano fundamental.
Nessa perspectiva, leva-se em consideração as dimensões individual e social das liberdades culturais, como instrumento de desenvolvimento pessoal e coletivo, de uma comunidade que tem nas suas expressões culturais os meios para se identificar, reconhecer suas diversidades e estabelecer marcos de convivência, próprio de Estados democráticos.
Desse modo, para verificação do tratamento dado às liberdades culturais na América Latina, analisa-se o Sistema Interamericano e seus fundamentos normativos de proteção e promoção da liberdade de expressão e das liberdades culturais, além da Convenção Americana de Direitos Humanos, também conhecida como Pacto de São José da Costa Rica, mais especificamente, o disposto em seu artigo 13.
Considerando ainda o caráter expansivo e interdependente dos direitos humanos, o trabalho propõe a verificação do tratamento dado às liberdades de expressão, fundamento das liberdades culturais, nos instrumentos do Sistema Global da Organização das Nações Unidas (ONU), no caso, o Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais; e a Convenção Europeia de Direitos Humanos, parâmetro normativo principal do Sistema Europeu; além de analisar diretrizes regulatórias propostas pelo Marco Jurídico Interamericano sobre o Direito à Liberdade de Expressão e o Relatório de Desenvolvimento Humano, de 2004, este último com abordagem específica das liberdades culturais.
Aqui também se faz referência à jurisprudência contenciosa e consultiva, esta última por meio de Pareceres ou Opiniões Consultivas, da Corte Interamericana de Direitos Humanos, principal órgão jurisdicional do Sistema Interamericano, que tem se posicionado de maneira firme, coerente e consolidadora, frente a mais ampla garantia que se deve dar à liberdade de expressão, juntamente com as liberdades culturais, além de ressaltar a estreita relação de tais direitos com a democracia substancial e o desenvolvimento humano na América Latina, buscando-se afastar argumentos puramente moralizantes.
A proposta da pesquisa inclui ainda a análise específica de dois julgados da Corte Interamericana, em matéria de liberdades de expressão - artística e identitária -, enquanto exemplos de fundamento da parametrização que se pretende aqui elaborar para as liberdades culturais – o Caso Olmedo Bustos e Outros vs. Chile (caso A Última Tentação de Cristo), e o da Comunidade Mayagna (Sumo) Awas Tingni vs. Nicarágua.
Por fim, refere-se à importância do controle de convencionalidade como instrumento de interação do direito internacional dos direitos humanos com o direito de ordem interna, promovendo processos de aplicação de normas de fontes diversas nos contextos nacionais, aportando potencialidades para a construção de um direito comum – jus commune – regional ou, pelo menos, latino-americano, como característica de um projeto em busca de implementar, ampliar e integrar competências, jurisdições, interpretações, culturas e garantias para a máxima efetividade dos direitos humanos, em especial, no âmbito dessa pesquisa, as liberdades culturais, e cuja efetividade se dá pari passu com a concretização dos direitos fundamentais no âmbito nacional.
Conclui-se que os sistemas internacionais de proteção e promoção de direitos humanos tem como regra geral e primeira a mais ampla liberdade para garantir as manifestações das liberdades culturais, com a possibilidade de, complementarmente, fortalecer o sistema nacional para alcançar a máxima efetividade dos direitos no âmbito interno; e que as possíveis restrições só podem se dar com fundamento na legalidade estrita e adequada para atender as necessidades sociais de garantia de outros direitos humanos e fundamentais, cuja ponderação deve se dar sempre que possível no sentido da maior promoção das referidas liberdades
1 Liberdade de expressão como manifestação de um conjunto de liberdades culturais
Ressalta-se inicialmente que as liberdades culturais têm um espectro de abordagem muito vasto, uma vez que podem ser compreendidas nos campos artístico, linguístico, de práticas culturais comunitárias, e da liberdade de expressão, entre outras.
Para o recorte que propõe este trabalho, foca-se nas liberdades culturais alcançadas pelas ideias de criação e expressão, mais especificamente, as liberdades culturais de expressão, tal como a liberdade artística, inclusive a de expressão da própria identidade, conforme os parâmetros estabelecidos a partir das jurisdições contenciosa e consultiva da Corte Interamericana de Direitos Humanos, em interação com outras fontes de produção de tratados internacionais de direitos humanos.
Desse modo, a liberdade de expressão pode ser compreendida não apenas como uma das mais importantes liberdades fundamentais, mas também como um conjunto de liberdades culturais, como dispostas, por exemplo, ao longo do artigo 5º, da Constituição Federal brasileira, tais como: a liberdade de manifestação de pensamento, a liberdade de imprensa, a liberdade de expressão da atividade intelectual, científica e de pensamento, a liberdade de expressão artística e a liberdade identitária.
Nessa perspectiva, afirma Meyer-Pflug (2009, p.27-28) que: “Sem a proteção à liberdade todos os demais direitos perdem muito de sua razão de ser. Está relacionada ao desenvolvimento das potencialidades e dos aspectos fundamentais da personalidade do homem”.
De acordo com Silva (2005, p. 241), a exteriorização do pensamento é que aporta interesse maior para o direito por conta dos conflitos que usualmente proporciona no seio social. Considera, dessa forma, o referido autor, ser a liberdade de opinião uma “liberdade primária e ponto de partida das demais”; compreendendo a liberdade de comunicação, “as formas de criação, expressão e manifestação do pensamento e de informação, e a organização dos meios de comunicação”.
Esta multiplicidade de formas desse conjunto de liberdades tem um caráter interativo dialógico com força sociocultural e jurídica para prevenir violações das demais liberdades culturais, inclusive diante da discriminação por conta da identidade cultural. Daí entender a ONU (2004) que a liberdade cultural é uma expressão da identidade pessoal e comunitária, de acordo com seu informe sobre Desenvolvimento Humano, nos termos seguintes:
La libertad cultural es la libertad que tienen las personas de escoger su identidad (de ser quienes son) y vivir sin perder el acceso a otras opciones que les resultan importantes. La libertad cultural es violada cuando hay falta de respeto o reconocimiento por los valores, las instituciones o los estilos de vida de grupos culturales y cuando las personas son discriminadas debido a su identidad cultural (ONU, 2004, p. 27).
Não é sem razão que Canotilho (2010, p.349) ao se referir à “constituição cultural”, aponta como fundamental o direito à cultura e ensino como condição a uma “real liberdade de formação de desenvolvimento da personalidade e instrumento indispensável da própria emancipação (progresso social e participação democrática)”.
Para que esse processo emancipatório se realize, é preciso que se manifestem as condições materiais e imateriais intrínsecas a uma vida digna; daí a necessidade ainda de se pensar sob a ótica do alargamento da ideia de um princípio da democracia econômica, não restrita a uma simples dimensão econômica, mas que alcance os deveres estatais de proteção e promoção das diversas expressões culturais no âmbito geopolítico do Estado, ou seja, segundo Canotilho (2010, p. 349):
Quando se fala de prestações existenciais para ‘assegurar uma existência humana digna’ pretende-se também aludir à indissociabilidade da ‘existência digna’ de uma expressão cultural e, ao mesmo tempo, à inseparabilidade da ‘democracia cultural’ de um dever de cuidado pelas prestações culturais (Daseinsvorsorge) material. (CANOTILHO, 2010, P. 349).
Esta visão ampliada da democracia econômica também pode ser destacada na Constituição Federal do Brasil, quando expressa os princípios gerais da atividade econômica, em seu capítulo I, do Título VII – Da Ordem Econômica e Financeira – em especial, no caput do artigo 170, quando dispõe que a ordem econômica “tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social” (BRASIL, 2019, p. 109).
Assim, de nada adianta um crescimento econômico que eleve a riqueza do país se não há proporcionalidade na distribuição de renda para fortalecer a igualdade material e a justiça social, em busca de uma autêntica promoção de uma vida humana digna, que também é fomentada pela ampliação das liberdades culturais.
Nessa perspectiva, a liberdade de escolha da própria identidade, em suas múltiplas dimensões – religiosa, de gênero, linguística, cultural etc. - pressupõe maior participação popular e voz na esfera pública, ambiente próprio da democracia coparticipativa (ou material), que, de acordo com Sankievicz (2011, p. 41), “enfatiza o papel do debate público para o equacionamento das divergências”.
Em sentido contrário, todavia, pensa Barbalho (2019, p. 23): “As relações entre cultura e democracia não são óbvias, pois uma não pressupõe a outra, e muito menos são exclusivas entre si. Melhor dizendo, o regime democrático não prevê necessariamente a atuação do Estado na promoção cultural, nem a defesa incondicional da liberdade de criação”.
E aqui surgem alguns conflitos delicados, pois essa diversidade cultural, paradoxalmente, é uma fonte de enriquecimento individual e social, mas também, de grandes desafios para a gestão do Estado, especialmente no que concerne ao fomento de oportunidades igualitárias ao acesso para participação na esfera pública e nas decisões referentes às políticas culturais.
2 Liberdades culturais: possibilidade de parametrização
O caminho das liberdades culturais tem sido marcado por tensões entre a livre manifestação como princípio fundamental e as limitações impostas pela sociedade e pelo Estado. De um lado, a defesa do pleno desenvolvimento humano por meio da exteriorização de suas potencialidades; e do outro, a aferição da aceitabilidade social frente a tais expressões.
Entre os referidos extremos, estão presentes vários princípios fundamentais, como instrumentos de harmonização de condutas e de interesses, além de meios de resolução de disputas, tais como: autonomia da vontade, acesso à cultura, liberdade de culto, não-discriminação, melhor interesse da criança e do adolescente, responsabilidade dos pais pela educação dos filhos, dever de informação, entre outros.
Nesse sentido, da mesma forma que os demais direitos humanos, as liberdades culturais têm seu fundamento na dignidade da pessoa humana e no princípio democrático do Estado de Direito, ambos vistos como meios fecundos de realização do pleno desenvolvimento humano, ao possibilitar a mais ampla liberdade para manifestação de ideias e planos de vida, haja vista que apesar das possíveis restrições sociais e legais – vedação ao anonimato e ofensa da honra, assim como a classificação indicativa – prevalece a liberdade como princípio primário e regra geral, sendo os abusos rechaçados a posteriori.
As diretrizes aqui dispostas como orientadoras da aplicação da ordem jurídica nacional em matéria de liberdades culturais têm nos sistemas internacionais de direitos humanos instrumentos complementares e subsidiários que possibilitam a máxima efetividade de tais direitos, especialmente, por conta do vínculo jurídico “desejado” pelos Estados, quando se obrigam a cumprir obrigações previstas nos tratados internacionais, além de livremente se submeterem, em alguns casos, à jurisdição das cortes regionais, no caso das Américas, à Corte Interamericana de Direitos Humanos.
Entende-se que o estudo das normas convencionais de tais sistemas protetivos e da jurisprudência – contenciosa e consultiva – da Corte Interamericana, além de outros tratados em matéria de direitos humanos e da jurisprudência de outros tribunais internacionais, pode formar um jus commune a ser aplicado como parâmetro de interpretação e solução de conflitos nesse campo cultural, marcado por expressões diversas que procuram se expressar para manifestar sua identidade e seus interesses.
Desse modo, para “gerir a diversidade e respeitar as identidades culturais”, é que se entende legítima a busca por indicadores de medição da liberdade cultural para além dos que se referem aos investimentos em bens culturais de consumo, tais como: peças de teatro, filmes, livros, entre outros.
Nesse caso, deve-se considerar a relevância das liberdades culturais e demais direitos culturais como fundamentais para a concretização de uma existência digna, sinônimo de realização pessoal e coletiva em um contexto de participação democraticamente substancial na arena pública, ou seja, a mais ampla possibilidade de expressão das liberdades culturais está intrinsecamente atada ao desenvolvimento humano, pois, como dispõe o relatório da ONU (2004):
La preocupación central del desarrollo humano es la gente, más específicamente, ampliar las alternativas de las que dispone la gente para ser y hacer aquello que valoran en la vida”. [...] La gente también debe tener la libertad de optar por alternativas culturales sin ser castigada por ello ni verse obligada a renunciar a otras opciones, como puestos de trabajo, escolaridad, vivienda, atención en salud, voz política y muchas otras oportunidades cruciales para el bienestar del ser humano. (ONU, 2004, p. 28)
Uma vez que se propõe, em consonância com a ONU (2004), a íntima ligação entre liberdades culturais e realização identitária, nas dimensões individual e coletiva, é preciso então, compreender que os processos de violação de tais direitos remetem à exclusão cultural, e se manifestam “quando há falta de respeito ou reconhecimento dos valores, das instituições ou dos estilos de vida de grupos culturais e quando as pessoas são discriminadas devido a sua identidade cultural”.
Assim, o próprio Informe sobre o Desenvolvimento Humano de 2004, produzido pela ONU, trata da importância de se elaborar um indicador de liberdade cultural, tal qual o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), enquanto instrumento de inclusão social, de promoção da dignidade da pessoa humana e que estabeleça parâmetros para análise das ações dos agentes públicos frente aos seus deveres constitucionais.
Nesse contexto, o índice de liberdade cultural pode proporcionar uma perspectiva mais aproximada da valorização que as democracias estatais atribuem ao desenvolvimento humano, como fator de plena promoção das capacidades humanas, contribuindo, consequentemente, para o desenvolvimento nacional em uma dimensão ampliada, para além da econômica.
Na perspectiva proposta por essa pesquisa, entende-se que a busca de parâmetros normativos para as liberdades culturais é uma possibilidade factível, especialmente com os aportes advindos dos sistemas internacionais de proteção e de promoção de direitos humanos como se vê a partir da próxima seção.
3 As liberdades culturais na jurisprudência contenciosa e consultiva da corte interamericana
Do exposto anteriormente, tem-se que a liberdade de expressão, e seu conjunto de liberdades culturais, são pressupostos da formação da personalidade e da autonomia individual, uma vez que, por meio delas, o indivíduo tem acesso às informações e às ideias que permitem escolhas livres e conscientes, contribuindo para a construção de sua individualidade.
O denominado Sistema Global de proteção e promoção de direitos humanos, sob a supervisão da Organização das Nações Unidas, em matéria de liberdade de expressão e, especificamente, liberdades culturais, tem no artigo 19, da Declaração Universal dos Direitos Humanos, e no artigo 19, do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, disposições que asseguram o mais amplo exercício de tais direitos (ONU, 1945; ONU, 1966).
No âmbito do Sistema Interamericano, inserido na Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo principal documento normativo é a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), disposto principalmente em seu artigo 13, sobre o direito à liberdade de pensamento e de expressão, tem-se que:
Artigo 13 LIBERDADE DE PENSAMENTO E DE EXPRESSÃO
1.Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento e de expressão. Esse direito compreende a liberdade de buscar, receber e difundir informações e ideias de toda natureza, sem consideração de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer outro processo de sua escolha.
2 O exercício do direito previsto no inciso precedente não pode estar sujeito à censura prévia, mas a responsabilidades ulteriores, que devem ser expressamente fixadas pela lei e ser necessárias para assegurar: o respeito aos direitos ou à reputação das demais pessoas; ou a proteção da segurança nacional, da ordem pública, ou da saúde ou da moral públicas.
3 Não se pode restringir o direito de expressão por vias ou meios indiretos, tais como o abuso de controles oficiais ou particulares de papel de imprensa, de frequências radioelétricas ou de equipamentos e aparelhos usados na difusão de informação, nem por quaisquer outros meios destinados a obstar a comunicação e a circulação de ideias e opiniões.
A Convenção Americana sobre Direitos Humanos consagrou o direito à liberdade de pensamento e expressão ao compreender a “liberdade de buscar, receber e difundir informações e ideias de toda natureza”. Além disso, a previsão convencional dispõe que é vedada a censura prévia, existindo apenas a possibilidade de responsabilização posterior, em caso de condutas ilícitas.
Com o tempo, a jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH), especialmente ao deliberar sobre questões de violações das liberdades no contexto dos regimes de exceção da América Latina, nas décadas de 1960 a 1980, foi construída no sentido de reconhecer a intensa relação entre a liberdade de expressão e a democracia. Isso porque a liberdade de expressão se realiza na democracia, e é a partir da liberdade de expressão que se constrói a própria democracia.
Tal entendimento vem sendo construído pela Corte Interamericana desde a Opinião Consultiva nº 5, emitida em 13 de novembro de 1985, que definiu os parâmetros acerca da matéria e que serve de diretriz às decisões da Corte IDH.
Aqui vale lembrar que a referida Corte regional, além de se manifestar por meio de decisões advindas de sua função contenciosa, possui também uma jurisdição consultiva, por meio da qual os Estados Membros e órgãos da Organização dos Estados Americanos (OEA) podem realizar consultas, e contribuir para a efetividade dos tratados internacionais de direitos humanos no âmbito doméstico, conforme previsão do artigo 64 da Convenção Americana de Direitos Humanos e do artigo 2º do Estatuto da Corte IDH, além de regulamentação nos artigos 60 a 65 do Regulamento da Corte Interamericana. Assim, dispõe o referido artigo 64:
1. Os Estados membros da Organização poderão consultar a Corte sobre a interpretação desta Convenção ou de outros tratados concernentes à proteção dos direitos humanos nos Estados americanos. Também poderão consultá-la, no que lhes compete, os órgãos enumerados no capítulo X da Carta da Organização dos Estados Americanos, reformada pelo Protocolo de Buenos Aires.
2. A Corte, a pedido de um Estado membro da Organização, poderá emitir pareceres sobre a compatibilidade entre qualquer de suas leis internas e os mencionados instrumentos internacionais.
No caso que provocou a consulta à Corte IDH, o Estado da Costa Rica requer Parecer Consultivo sobre a existência ou não de conflito ou contradição entre o registro profissional obrigatório como requisito indispensável para poder exercer a atividade do jornalista em geral e, em especial, do repórter – segundo sua lei interna – e as normas dispostas nos artigos 13 e 29 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (CADH) (OEA, 1985, p. 3).
Ao se manifestar, por meio da Opinião Consultiva n. 5, de 1985, a Corte IDH (1985) dispõe, por unanimidade, que:
o registro profissional obrigatório de jornalistas, na medida em que impeça o acesso de qualquer pessoa ao uso pleno dos meios de comunicação social como veículo para se expressar ou para transmitir informação, é incompatível com o artigo 13 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos.
[...]
que a Lei nº 4420 de 22 de setembro de 1969, Lei Orgânica do Conselho de Jornalistas da Costa Rica, objeto da presente consulta, na medida em que impede certas pessoas de pertencer ao Conselho de Jornalistas e, por conseguinte, o uso pleno dos meios de comunicação social como veículo para se expressar e transmitir informação, é incompatível com o artigo 13 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (OEA, 1985, p. 21).
Dessa forma, ressalta a Corte IDH, que a liberdade de expressão, conforme disposto no artigo 13 da Convenção Americana, tem uma dimensão de direito individual e outra de direito coletivo, pois afirma que a liberdade de pensamento e de expressão “compreende a liberdade de buscar, receber e difundir informações e ideias de toda natureza”, ressaltando não apenas o direito de expressar-se, mas também o de ter acesso às informações e ideias que são postas pelos outros. Assim, segundo a Corte IDH:
em sua dimensão social, a liberdade de expressão é um meio para o intercâmbio de ideias e informações e para a comunicação massiva entre os seres humanos. Compreende também o direito de cada um a comunicar aos outros seus próprios pontos de vista, implica também o direito de todos a conhecer opiniões e notícias. Para o cidadão comum, o conhecimento da opinião alheia ou da informação de que dispõem os outros tem tanta importância como o direito a difundir a própria (OEA, 1985, p. 8).
Daí que a restrição ilegal do indivíduo se expressar é também uma violação ao direito de todos poderem ter acesso ao conteúdo do que se deseja expressar, isto é, um direito coletivo de conhecer o pensamento dos outros (OEA, 1985, p. 8).
Outro aspecto relevante da Opinião Consultiva n. 5, é o reconhecimento de que uma restrição aos meios de divulgação atinge diretamente a própria liberdade de expressão, ou seja:
Quando a Convenção proclama que a liberdade de pensamento e de expressão compreende o direito a difundir informações e ideias “por qualquer processo”, está destacando que a expressão e a difusão do pensamento e da informação são indivisíveis, de modo que uma restrição das possibilidades de divulgação representa diretamente, e na mesma medida, um limite ao direito de se expressar livremente. Daí a importância do regime jurídico aplicável à imprensa e ao status de quem se dedique profissionalmente a ela (OEA, 1985, p. 8).
Nessa perspectiva, as liberdades culturais podem ser vistas como o mais amplo exercício dos direitos culturais, no que concerne a autonomia de escolhas que permitem a divulgação e comunicação de pensamentos, ideias, informações, planos de vida e vivências da diversidade de expressões culturais; assim como podem ser entendidas como o exercício pleno do direito de escolha e mantença de identidade étnica, linguística e religiosa.
Para melhor explicitação de parâmetros relativos à liberdade de expressão e às culturais, construídos pela jurisprudência da Corte Interamericana, apresentam-se dois julgados significativos para se entender o tratamento dado pelo tribunal regional no âmbito das liberdades artísticas e das identitárias, respectivamente, por meio da análise do caso Olmedo Bustos e Outros vs. Chile (caso A Última Tentação de Cristo), e o caso Comunidade Mayagna (Sumo) Awas Tingni vs. Nicarágua.
A justificativa para o foco de análise no Caso Olmedo Bustos e Outros vs. Chile (caso A Última Tentação de Cristo) sustenta-se na relevância de aspectos específicos da decisão da Corte Interamericana. Primeiro, a alteração de um dispositivo constitucional (Estado Chileno) frente à prevalência de uma norma convencional, manifestando aspectos de uma sanção moral, para além da pecuniária, costumeiramente estabelecida pela Corte; daí o Caso estar referido como o primeiro em análise no cuadernillo n. 16, de jurisprudência da Corte regional, em matéria específica de liberdade de pensamento e expressão (OEA, 2022, p. 5).
Além disso, o Caso não trata de responsabilidade internacional do Estado por violação de direitos humanos da parte do Poder Executivo, como usualmente se tem, mas por uma decisão judicial da Corte Suprema chilena, que viola o artigo 13 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, remetendo ao entendimento da Corte regional de que o Estado responde integralmente pela violação, independentemente de qual seja o órgão ou o Poder estatal que a tenha provocado.
Por fim, o Caso revela a utilidade prática do princípio pro persona – aplicação da norma e da interpretação mais favorável à garantia de direitos humanos – superando o paradigma da questão da hierarquia entre normas constitucionais e convencionais.
Quanto ao Caso Comunidade Mayagna (Sumo) Awas Tingni vs. Nicarágua, além de proporcionar explicitamente mais um exemplo da aplicação do princípio pro persona, a escolha se deve à peculiaridade do caso que tem como fundo uma questão de direito de propriedade e demarcação de terras dos povos indígenas, um dos primeiros enfrentados pela Corte, permitindo uma interpretação extensiva do conceito de “bem”, conforme disposto no artigo 21 (direito de propriedade privada) da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, para acolher a estreita relação entre as expressões culturais indígenas e seus territórios tradicionais.
Ressalta a Corte Interamericana, ainda, a ampliação do conceito de propriedade para reconhecer os direitos comunais indígenas, e a comunidade como sujeito de direitos, em uma importante relação com as liberdades culturais destes povos, in verbis: “Para as comunidades indígenas a relação com a terra não é meramente uma questão de posse e produção, mas sim um elemento material e espiritual do qual devem gozar plenamente, inclusive para preservar seu legado cultural e transmiti-lo às futuras gerações” (OEA, 2001b, p. 78).
3.1 CASO OLMEDO BUSTOS E OUTROS VS. CHILE - CASO “A ÚLTIMA TENTAÇÃO DE CRISTO”
O Caso Olmedo Bustos e outros vs. Chile, também conhecido como Caso “A Última Tentação de Cristo”, cuja sentença de mérito, prolatada em 5 de fevereiro de 2001, reconheceu a incompatibilidade do artigo 19, número 12 da Constituição chilena frente à Convenção Americana, implicando na responsabilidade internacional do Estado Chileno por violação de direitos previstos na Convenção Americana sobre Direitos Humanos.
A denúncia do referido caso chegou à Comissão Interamericana em 3 de setembro de 1997 e, após os trâmites processuais de praxe, foi submetida à Corte Interamericana em 15 de janeiro de 1999, com a alegação de possível violação dos artigos 13 (liberdade de pensamento e expressão) e 12 (liberdade de consciência e religião), da Convenção Americana, que implicou na violação também dos artigos 1.1 (obrigação de respeitar direitos) e 2 (dever de adotar disposições de direito interno) (OEA, 2001a, p. 1).
De acordo com a denúncia da Comissão Interamericana, o Estado chileno, por meio de decisão da Corte Suprema do Chile, em 17 de junho de 1977, proibiu a exibição do filme “A Última Tentação de Cristo”, causando “prejuízos à sociedade chilena e, particularmente, aos senhores Juan Pablo Olmedo Bustos, Ciro Colombara López, Claudio Márquez Vidal, Alex Muñoz Wilson, Matías Insunza Tagle y Hernán Aguirre Fuentes”. Assim, o órgão de admissibilidade de demandas da OEA solicitou à Corte regional que:
1. Autorize a normal exibição cinematográfica e publicidade da película “A Última Tentação de Cristo”.
2. Adeque suas normas constitucionais e legais aos parâmetros sobre liberdade de expressão consagrados na Convenção American, com o fim de eliminar a censura prévia às produções cinematográficas e sua publicidade.
3. Assegure que os órgãos do poder público, suas autoridades e funcionários em exercício de suas distintas competências, exerçam efetivamente os direitos e liberdades de expressão, consciência e religião reconhecidas na Convenção Americana, e se abstenham de impor censura prévia às produções cinematográficas.
4. Repare as vítimas neste caso pelo dano sofrido.
5. Efetue o pagamento de custas e reembolse os gastos incorridos pelas vítimas para litigar neste caso, tanto no âmbito interno como diante da Comissão e da Honorável Corte, além dos honorários aos seus representantes (OEA, 2001a, p. 2).
Em princípio, entende-se que, assim como não há direito humano absoluto, não é possível também direito à livre expressão sem restrições; e, no caso, compete ao Estado, na ordem interna, essencialmente por meio de sua Constituição Federal, estabelecer as restrições aos direitos humanos fundamentais. Desse modo, a Constituição Política da República do Chile, promulgada em 08 de agosto de 1980, dispõe acerca do artigo 19, número 12, nos termos:
Artigo 19 – A Constituição assegura a todas as pessoas:
12º. – A liberdade de emitir opinião e a de informar, sem censura prévia, em qualquer forma e por qualquer meio, sem prejuízo de responder pelos delitos e abusos que se cometam no exercício destas liberdades, em conformidade com a lei, a qual deverá ser de quórum qualificado. [...]. A lei estabelecerá um sistema de censura para a exibição e publicidade da produção cinematográfica e fixará as normas gerais que regerão a expressão pública de outras atividades artísticas (CHILE, 2005, p. 9). (grifo nosso)
Nesse contexto, a lei reguladora da censura já estava em vigor por meio do Decreto Lei número 679, promulgado em 01 de outubro de 1974, que estabelece normas sobre a qualificação cinematográfica e cria o Conselho de Qualificação Cinematográfica, de modo que, em seu artigo 1º, outorga como missão ao Conselho a orientação da exibição cinematográfica e a qualificação das películas de acordo com as normas estabelecidas no próprio Decreto Lei referido. Dessa forma, as películas que ingressam no país devem contar com sua autorização prévia, que poderá recusá-las com base no artigo 9º, como segue:
O Conselho recusará as películas que fomentem ou propaguem doutrinas ou ideias contrárias às bases fundamentais da Pátria ou da nacionalidade, tais como o marxismo ou outras, as que ofendam a Estados com os quais o Chile mantem relações internacionais, as que sejam contrárias à ordem pública, a moral, aos bons costumes, e as que induzam a condutas de ações antissociais ou delituosas (CHILE, 1974, p. 2).
No contexto referente ao caso aqui em análise, mediante tais fundamentos jurídicos (e políticos), o Conselho de Qualificação Cinematográfica rejeitou, em 29 de novembro de 1988, o pedido da United International Pictures Ltda para exibição do filme “A Última Tentação de Cristo”. Decisão confirmada por sentença do Tribunal de Apelação datada em 14 de março de 1989, e posteriormente pela Corte de Apelação de Santiago, em 20 de janeiro de 1997, e, finalmente, em 17 de junho de 1997, pela Corte Suprema de Justiça do Chile.
Ressalta-se que o Chile é Estado-Parte da Convenção Americana desde 21 de agosto de 1990, mesmo dia em que reconheceu a competência contenciosa da Corte Interamericana, posição que deixou o Estado em situação de tensão frente à decisão de sua Corte Suprema de Justiça ao proibir a exibição do filme em questão, opondo-se às obrigações assumidas pelo país no que se refere à liberdade de expressão prevista no artigo 13 da Convenção, como verificado anteriormente.
Esse conflito exigiu uma articulação política do Presidente da República, em 14 de abril de 1997, para tentar harmonizar a aplicação do disposto na Convenção Americana com a Constituição da República, em matéria de liberdade de expressão, e, como solução, apontou para o projeto de reforma constitucional do artigo 19, número 12, com a finalidade de eliminar a censura cinematográfica, que culminou com a promulgação do Decreto número 100, em 17 de setembro de 2005, que alterou a última frase do dispositivo, como segue: “A lei regulará um sistema de qualificação para a exibição de produção cinematográfica” (CHILE, 2005, p. 4).
Nesse ponto específico, o processo de convergência das normas internas com as convencionais permitiu que a Constituição chilena fosse emendada, revelando uma séria disposição política e jurídica para realizar esta operação, que, reputa-se, como mais importante não pelo embate sobre a hierarquia das normas, mas do ponto de vista da valorização do princípio mais protetor da pessoa humana, no caso, o pro persona.
Vale destacar que o princípio pro persona ou pro homini se refere a uma forma de interpretação que privilegia a aplicação da norma mais favorável ao indivíduo, quer seja ela de direito interno ou internacional, permitindo inclusive que seja afastado um determinado tratado para que outro que melhor garanta o direito ou liberdade previsto possa ser aplicado. Nesse sentido, o artigo 29 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos dispõe expressamente que seus dispositivos podem ser afastados quando dispositivo de outro tratado de direitos humanos tenha uma aplicação mais favorável no caso concreto (OEA, 1969).
Descrevendo de modo mais claro o conceito do princípio pro persona, Mazzuoli (2010, p.106) afirma que “ao se interpretar uma norma de direitos humanos o intérprete/aplicador do direito deve ponderar pela aplicação da que seja mais favorável à dignidade da pessoa”. Deste modo, para Mazzuoli (2010, p.142), o princípio internacional pro homine implica na aplicação da norma de direitos humanos que “mais amplia o gozo de um direito ou liberdade ou de uma garantia à pessoa”.
No caso Comunidade Mayagna (Sumo) Awas Tingni vs. Nicarágua, julgado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, objeto de análise deste trabalho, o juiz Sergio Garcia Ramirez, em seu voto fundamentado concordante, afirma que “a regra pro homine, inerente ao Direito Internacional dos Direitos Humanos – frequentemente invocada na jurisprudência da Corte –, que conduz à maior e melhor proteção das pessoas, com o propósito último de preservar a dignidade, assegurar os direitos fundamentais e alentar o desenvolvimento dos seres humanos” (OEA, 2001b).
Outra importante alteração favorável à promoção dos direitos humanos se deu por meio da Lei de Reforma Constitucional número 18.825, de 15 de junho de 1989, cujo artigo único, Número 1, acrescentou ao artigo 5º da Constituição de 1980, como segue:
O exercício da soberania reconhece como limitação o respeito aos direitos essenciais que emanam da natureza humana. É dever dos órgãos de Estado respeitar e promover tais direitos, garantidos por esta Constituição, assim como por outros tratados internacionais ratificados pelo Chile e que se encontrem em vigor (CHILE, 1989, p. 1).
Essa alteração fortaleceu os fundamentos para a modificação do tratamento jurídico dado à liberdade de expressão no Estado chileno, pois permitiu ampliar o espectro de proteção e promoção dos direitos humanos, por meio da integração hermenêutica e normativa dos sistemas nacional e regional da Organização dos Estados Americanos, que tem seu fundamento normativo principal na Convenção Americana.
Nesse caso em análise, infelizmente, a Corte Suprema de Justiça do Chile não levou em consideração este novo parâmetro de validade das leis internas, nem deu importância aos tratados internacionais ratificados e em vigor no país, quando desconsiderou também o artigo 27 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados que afirma que “uma parte não poderá invocar as disposições de seu direito interno como justificativa para o não cumprimento de um tratado” (ONU, 1969).
Ressalta-se que a Corte Interamericana reconheceu que a responsabilidade do Estado pode ser promovida por atos ou omissões de qualquer poder ou órgão estatal, desde que seja caracterizada a violação; e, no Caso Olmedo Bustos, refere-se à disposição constitucional, do artigo 19, que trata de censura prévia na produção cinematográfica, conforme disposto no parágrafo 72 de sua decisão final (OEA, 2001a, p. 31).
Cabe destacar na decisão desse caso que a Corte Interamericana faz expressa referência à incompatibilidade de uma norma constitucional com a Convenção Americana, e decide, de acordo com o parágrafo 103.4 da sentença de mérito que:
O Estado deve modificar seu ordenamento jurídico interno, em prazo razoável, com o fim de suprimir a censura prévia para permitir a exibição da película “A Última Tentação de Cristo”, e deve entregar à Corte Interamericana de Direitos Humanos, dentro de um prazo de seis meses a partir da notificação da presente Sentença, um informe sobre as medidas tomadas a esse respeito (OEA, 2001a, p. 35).
Observa-se ainda que o Caso Olmedo Bustos conduziu a Corte Suprema de Justiça do Chile a realizar um autêntico controle de supraconstitucionalidade, isto é, ao decidir pela inconvencionalidade da norma constitucional, dispondo que a Constituição chilena deveria ser alterada para se ajustar às normas do Pacto de São José da Costa Rica, mais favoráveis em matéria de direitos humanos e fundamentais.
Algo parecido poderia ter lançado o Brasil ao patamar dos países que ultrapassam a fase da retórica para a práxis, no que concerne à proteção de direitos humanos, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) teve a oportunidade, no Recurso Extraordinário (RE) n. 466.343-1/SP, de 2008, de analisar a questão da prisão civil do depositário infiel (BRASIL, 2008, p. 1).
Ressalta-se aqui a decisão do STF, inclusive dos votos particulares dos ministros, em sede do Recurso referido, pois tal decisão ensejou relevante discussão acerca do controle de convencionalidade - instrumento de validação de normas infraconstitucionais quando comparadas com os tratados internacionais de direitos humanos - e da hierarquia entre normas nacionais e tratados de direitos humanos; inclusive, aos moldes do Caso Olmedo Bustos, também acerca da supremacia dos dispositivos constitucionais frente à Convenção Americana sobre Direitos Humanos, parâmetro normativo por excelência do Sistema Interamericano de Direitos Humanos.
Apesar de ter sido considerado um momento de evolução em matéria de direitos humanos no Brasil, frente a posicionamentos mais retrógrados que vinham sendo sustentados pelo STF, a decisão final do Recurso Extraordinário em questão atribuiu aos tratados internacionais de direitos humanos hierarquia supralegal, abaixo apenas da Constituição Federal, na perspectiva tradicional da pirâmide normativa kelseniana.
No entanto, tal decisão – supralegalidade – traz relevância prática no campo da aplicação da legislação infraconstitucional, pois permite que os juízes, em sede de controle difuso, possam aferir a validade das leis nacionais, a partir da parametrização frente aos citados tratados, em especial, o Pacto de São José da Costa Rica.
Ainda em relação ao Caso Olmedo Bustos, outra interpretação do ocorrido e que aponta para a promoção de maior integração interinstitucional, é a de que uma leitura que privilegia a aplicação do direito mais favorável a pessoa humana não necessitaria rechaçar a norma constitucional, mas complementá-la com a Convenção Americana, ensejando uma hermenêutica dialógica e integradora de fontes normativas diversas, salvo quando o dispositivo constitucional for diretamente contrário à previsão convencional, como se entende ser o caso tanto do Chile como o do Brasil (artigo 5º, LXVII, da Constituição Federal), cabendo, em ambos, o denominado controle convencionalidade, como adiante se explica de forma mais precisa.
Lembra-se que, no entendimento dessa pesquisa, a decisão da Corte Interamericana de ordenar ao Estado a modificação de um dispositivo constitucional não se trata de considerar a norma internacional hierarquicamente superior à Constituição estatal, mas sim, de considerar efetiva a aplicação do princípio pro persona que direciona a decisão judicial, no caso, a buscar sua fundamentação na primazia da norma mais favorável à pessoa humana, isto é, à vítima de violação de direitos humanos fundamentais; assim como no princípio da interpretação conforme, que opta pela norma que melhor possa ser interpretada segundo a possibilidade de ampliação de direitos e liberdades.
3.2 Caso Comunidade Mayagna (sumo) Awas Tingni vs. Nicarágua
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos apresentou à Corte Interamericana de Direitos Humanos, em 4 de julho de 1998, demanda contra o Estado da Nicarágua informando suposta violação dos seguintes artigos da Convenção Americana de Direitos Humanos: artigo 1: Obrigação de Respeitar os Direitos; artigo 2: Dever de Adotar Disposições de Direito Interno; - artigo 21: Direito à Propriedade Privada; e artigo 25: Proteção Judicial.
A denúncia foi apresentada em razão da não demarcação pelo Estado das “terras comunais” da Comunidade Awas Tingni, nem adoção de medidas que deveriam ter sido tomadas para garantir o direito de propriedade da Comunidade, bem como pela concessão de exploração dos recursos naturais em seu território ancestral sem consentimento, além da falta de manifestação da justiça interna acerca dos recursos impetrados pela comunidade para proteção de seus direitos fundamentais.
A relação espiritual e cultural que a comunidade indígena tem com a terra, expressão da cosmovisão identitária que transcende a relação material de posse e propriedade ocidentais, revela por si só a rica contribuição ao patrimônio cultural da humanidade e a abertura ao incremento da criatividade humana; além do respeito – e reverência - com a biodiversidade para buscar soluções aos problemas criados com a degradação do meio ambiente e uma concepção mitigada de desenvolvimento. Assim, do relato da testemunha em questão, tem-se que:
As colinas localizadas no território da Comunidade são muito importantes. Dentro delas vivem os “espíritos do monte”, chefes do monte, que em Mayagna diz-se “Asangpas Muigeni”, que são os que controlam os animais ao redor dessa região. Para aproveitar esses animais, é preciso ter uma relação especial com os espíritos. Em muitas oportunidades é o cacique, que é uma espécie de “xamã” chamado Ditelian, quem pode manter essa relação com os espíritos. Então, a presença de animais e a possibilidade de serem aproveitados mediante a caça está baseada na cosmovisão e tem muito a ver com as fronteiras, porque, segundo eles, esses amos do monte são donos dos animais, especialmente do porco da montanha, que se desloca em manadas ao redor das montanhas. Assim, há um vínculo muito forte com o entorno, com estes lugares sagrados, com os espíritos que neles vivem e os irmãos membros da Comunidade. Há dois tipos de lugares sagrados nas zonas fronteiriças: cemitérios, que são visitados atualmente com frequência pelos membros da Comunidade, localizados ao longo do Rio Wawa; são assentamentos velhos que os visitam quando vão caçar. Até certo ponto, ir à caça é um ato espiritual e tem muito a ver com o território que eles aproveitam. O segundo tipo de zonas sagradas são as colinas (OEA, 2001b, p. 23).
Nesse mesmo sentido, o julgamento do caso se refere aos povos indígenas da América Latina de modo geral tendo como elemento essencialmente (auto)identificador suas relações comunitárias com a terra, inclusive vinculando sua saúde física, mental e social, cuja ocupação ancestral se manifesta pela continuidade histórica, que as políticas estatais rompem quando “decidem titular estas terras ou outorgar concessões ou permitir desmontes, autorizar a utilização destas terras para outras finalidades determinadas por interesses econômicos diversos” (OEA, 2001b, p. 26).
Ressalta-se ainda a expressão do reconhecimento da diversidade cultural por meio da tutela constitucional na Constituição Nacional do Paraguai, especialmente no seu Capítulo V, que trata De los Pueblos Indígenas. Nesse ponto, com bases fundacionais estabelecidas nos “princípios da democracia republicana, representativa, participativa e pluralista”, conforme disposto no Preâmbulo, declara o texto da Constituição paraguaia, Paraguai (1992), que:
1) reconhece os povos indígenas, “definidos como grupos de cultura anteriores à formação e organização do Estado paraguaio” (artigo 62);
2) garante aos povos indígenas o direito a “preservar e desenvolver sua identidade étnica”; direito a “aplicar livremente seus sistemas de organização política, social, econômica, cultural e religiosa”, inclusive suas normas consuetudinárias, e, em caso de conflitos jurisdicionais, estas deverão ser levadas em conta (artigo 63);
3) reconhece o direito à participação, por meio do qual “se garante aos povos indígenas o direito de participar na vida econômica, social, política e cultural do país, de acordo com seus usos consuetudinários, esta Constituição e as leis nacionais” (artigo 65).
Nesse cenário de garantias constitucionais de baixa efetividade de direitos relativos à diversidade cultural e jurídica, mais ainda se ressalta a relevância para assegurar a proteção e promoção dos direitos humanos do Sistema Interamericano e, especificamente, àqueles, a ampliação dos instrumentos que servem como parâmetro para o controle de convencionalidade, reconhecido como método de compatibilização da ordem jurídica e das políticas internas com as normas convencionais protetivas de direitos humanos; pois, apesar de ter a Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH) como parâmetro primário de compatibilidade dos atos públicos internos, a Corte Interamericana não se restringe a este documento, mas faz uso do corpus juris do Direito Internacional dos Direitos Humanos.
Nesse contexto, a OEA (2005) ampliou seu espectro de controle, quando tratou da questão da violação do direito de propriedade, conforme artigo 21 da Convenção Americana, para levar adequadamente em consideração a preservação da identidade cultural e sua transmissão às gerações futuras, que dão um significado diferenciado à propriedade comunal dos povos indígenas. Por isso:
126. Nesse sentido, esta Corte afirmou que ao interpretar um tratado não apenas se tomam em conta os acordos e instrumentos formalmente relacionados com este (inciso segundo do artigo 31 da Convenção de Viena), mas também o sistema dentro do qual se inscreve (inciso terceiro do artigo 31 desta Convenção).
127. No presente caso, ao analisar os alcances do citado artigo 21 da Convenção, o Tribunal considera útil e apropriado utilizar outros tratados internacionais distintos da Convenção Americana, tais como a Convenção nº 169 da OIT, para interpretar suas disposições de acordo com a evolução do sistema interamericano, levando em consideração o desenvolvimento experimentado nesta matéria no Direito Internacional dos Direitos Humanos. (OEA, 2005, p. 78)
Dispõe o artigo 21 da referida Convenção regional que:
1. Toda pessoa tem direito ao uso e gozo dos seus bens. A lei pode subordinar esse uso e gozo ao interesse social 2. Nenhuma pessoa pode ser privada de seus bens, salvo mediante o pagamento de indenização justa, por motivo de utilidade pública ou de interesse social e nos casos e na forma estabelecidos pela lei. 3. Tanto a usura como qualquer outra forma de exploração do homem pelo homem devem ser reprimidas pela lei” (OEA, 1969).
Assim, ao considerar aspectos culturais próprios dos povos indígenas que aportam uma visão diferenciada de “ser, ver e atuar no mundo”, e que se integram na relação que têm com seus territórios ancestrais e os recursos naturais presentes, entende-se que está presente uma concepção de vida própria que lhes dá uma identidade cultural única, atestada ainda pelo expresso no artigo 13 da Convenção 169 (OIT, 1989), daí a interpretação ampliada atribuída pela Corte ao artigo 21 (direito de propriedade privada) da Convenção Americana, relacionando direitos culturais dos povos indígenas aos seus territórios tradicionais.
4 Parâmetros internacionais para promoção da liberdade de expressão e das liberdades culturais
A ideia de se estabelecer parâmetros (standards) internacionais para direitos fundamentais, in casu, liberdade de expressão e liberdades culturais, é imprescindível para a proteção e promoção de tais direitos no âmbito estatal; haja vista que tal parametrização tem como finalidade não apenas a análise de compatibilidade entre a ordem jurídica interna e a transnacional, mas também visa o fortalecimento dos processos de concretização de direitos, a partir do caráter subsidiário das normas convencionais, da jurisprudência contenciosa e da consultiva. De qualquer modo, em ambos os fins, busca-se a prevalência dos direitos humanos.
A Organização das Nações Unidas (ONU) e a Organização dos Estados Americanos (OEA), entre outros organismos internacionais, quer em matéria de direitos humanos ou em campos diversos, têm procurado estabelecer marcos conceituais e jurisprudenciais que possam servir de diretrizes para os agentes públicos de seus Estados Membros, para que se alcance a máxima efetividade dos tratados internacionais.
Como órgãos técnicos de apoio às organizações anteriormente referidas – ONU e OEA – respectivamente, foram criadas a Relatoria Especial para a Liberdade de Opinião e Expressão, e a Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão, que publicam informes anuais relatando possíveis violações de direitos no âmbito dos Estados Membros, assim como práticas exitosas, fundamentações conceituais e atualização da jurisprudência acerca da temática, além de atuarem conjuntamente para maior eficácia do sistema internacional.
Nessa particularidade, ambas as relatorias em atuação conjunta apresentaram interessante documento sobre o Caso Wikileaks, em 21 de dezembro de 2010, expressando seus parâmetros de abordagem acerca da liberdade de expressão, no qual afirmam que:
El derecho de acceso a la información en poder de autoridades públicas es un derecho humano fundamental sometido a un estricto régimen de excepciones. El derecho a la libertad de expresión protege el derecho de toda persona a tener libre acceso a la información pública y a conocer las actuaciones de los gobiernos. Se trata de un derecho particularmente importante para la consolidación, el funcionamiento y la preservación de los sistemas democráticos, por lo cual ha recibido un alto grado de atención por parte de la comunidad internacional (OEA, 2010, p. 1).
Nesse mesmo sentido, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos aprovou em 27 de outubro de 2000 a Declaração de Princípios sobre Liberdade de Expressão (OEA, 2000), como meio de estabelecer alguns parâmetros para o tratamento de questões relativas a tal direito, plenamente cabível às liberdades culturais, assegurando que “a liberdade de expressão, em todas as suas formas e manifestações, é um direito fundamental e inalienável, inerente a todas as pessoas. É, ademais, um requisito indispensável para a própria existência de uma sociedade democrática.
É importante ressaltar que a proteção da liberdade de expressão e demais liberdades culturais não se refere apenas aos conteúdos que possam ser reconhecidos pela maioria como “desejáveis”, isto é, acolhidos por sistemas morais considerados “dignos” por uma suposta “opinião pública.
Dessa forma, também vale ressaltar que expressões “desagradáveis” à maioria, ideias chocantes ou opiniões ofensivas, capazes de gerar perturbação e mal-estar na ordem estatal ou social, também devem ser livremente manifestadas, desde que, assim como as demais expressões – “agradáveis” -, estejam sob o manto curto das restrições legítimas aos direitos fundamentais, como característica própria de democracias pluralistas.
Tal entendimento ampliativo foi expressamente avalizado pela Corte Europeia de Direitos Humanos, quando do julgamento do Caso Castells vs. Espanha, em 23 de abril de 1992, considerado paradigmático em matéria de liberdade de expressão. Refere-se à manifestação do sr. Miguel Castells, espanhol de nascimento, por meio de artigo escrito em junho de 1979, intitulado Insultante Impunidad, na revista semanal Punto y Hora de Euskalherria, discorrendo sobre a impunidade e inatividade do Estado espanhol, para identificar, processar e julgar os crimes de mortes de duas pessoas ocorridos há um ano, além de vários outros ao longo de anos anteriores (CEDH, 1992, p. 1).
A Suprema Corte da Espanha requereu ao Senado que retirasse a imunidade do parlamentar, em julho de 1979; e, em julho de 1981, a Suprema Corte acusou o sr. Miguel Castells de manifestar graves insultos contra o Governo e servidores públicos -having proffered serious insults against the Government and civil servants – e proferiu julgamento condenatório em 1983, que, após rejeição da apelação (amparo) pela Corte Constitucional, teve confirmada sua decisão de condenação do réu, em 1986.
Diante dos fatos e decisões políticas e jurídicas do Estado espanhol, após análise do caso, a Corte Europeia de Direitos Humanos, em 1992, referindo-se também à Convenção Europeia dos Direitos do Homem, dispôs – na primeira parte do parágrafo 42 de sua sentença - que:
42. The Court recalls that the freedom of expression, enshrined in paragraph 1 of Article 10 (art. 10-1), constitutes one of the essential foundations of a democratic society and one of the basic conditions for its progress. Subject to paragraph 2 of Article 10(art. 10-2), it is applicable not only to “information” or “ideas” that are favourably received or regarded as inoffensive or as a matter of indifference, but also to those that offend, shock or disturb. Such are the demands of that pluralism, tolerance and broadmindedness without which there is no “democratic society” (see, inter alia, the Handyside v. the United Kingdom judgment of 7 December 1976, Series A no. 24, p. 23, para. 49, and the Observer and Guardian judgment, cited above, Series A no. 216, p. 30, para. 59 (a)) (CEDH, 1992, p. 17).
No vernáculo:
A Corte recorda que a liberdade de expressão consagrada no parágrafo 1 do Artigo 10 (art. 10-1) constitui um dos fundamentos essenciais de uma sociedade democrática e uma das condições básicas para o seu progresso. Com respeito ao parágrafo 2 do artigo 10 (art.10-2), é aplicável não só a “informações” ou “ideias” acolhidas favoravelmente ou consideradas inofensivas ou indiferentes, mas também àquelas que resultam opostas, ferem ou incomodam. Assim o exigem o pluralismo, a tolerância e à abertura de mente, sem os quais não existe “sociedade democrática” (CEDH, 1992, p. 17).
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Aqui vale dar ênfase ao diálogo intersistêmico promovido pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, próprio do movimento de expansão dos direitos humanos e da busca pela efetividade de tais direitos, manifestada na decisão do Caso “A Última Tentação de Cristo”, pelas referências à diversos casos em matéria de liberdade de expressão cujas decisões advieram da Corte Europeia de Direitos Humanos - inserida no Sistema Europeu de Direitos Humanos (OEA, 2001a, p. 26).
Nesse mesmo sentido, com fundamento na mais ampla liberdade às manifestações das liberdades culturais, expressou-se a Human Rights Watch (HRW, 2019) - ONG de atuação internacional -, quando da condenação judicial em primeira instância de um comediante brasileiro, acusado de ofensa à honra de uma parlamentar: “Ninguém deveria ser preso por ter dito algo ofensivo, independentemente de quão repugnantes sejam suas declarações e atitudes”.
Vale ressaltar ainda, que a manifestação da HRW está em harmonia com a Declaração de Princípios sobre a Liberdade de Expressão, construída em conjunto pelas Relatorias Especiais para a Liberdade de Expressão, da ONU e da OEA, anteriormente referida, que também dispõe contrariamente à criminalização das ofensas à honra aos agentes públicos, sendo cabível apenas a reparação civil, ao afirmar em seu Princípio 10 que, “a proteção à reputação deve estar garantida somente através de sanções civis”.
Outro documento de alta relevância para a proteção e promoção das liberdades culturais é o denominado Marco Jurídico Interamericano sobre o Direito à Liberdade de Expressão, produzido pela Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana, cuja principal finalidade é publicar “uma análise sistematizada dos parâmetros interamericanos em matéria de liberdade de expressão e uma revisão de algumas importantes sentenças e leis da região que incorporarão estes standards no âmbito interno no período de 2009” (OEA, 2010, p. 1).
A partir de uma análise comparada da matéria disposta na Convenção Americana com outras normas convencionais, tais como a Declaração Americana, a Carta Democrática Interamericana, o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e a Convenção Europeia de Direitos Humanos, o documento referido entende que “o marco interamericano foi desenhado para ser o mais generoso, e para reduzir ao mínimo as restrições à livre circulação de informação, opiniões e ideias” (OEA, 2010).
Nesse sentido, dispõe ainda que:
La jurisprudencia del sistema ha explicado que el marco jurídico interamericano otorga este alto valor a la libertad de expresión porque se basa en un concepto amplio de la autonomía y la dignidad de las personas, y porque tiene en cuenta tanto el valor instrumental de la libertad de expresión para el ejercicio de los demás derechos fundamentales, como su función esencial dentro de los regímenes democráticos, según se explica a continuación (OEA, 2010).
Nessa perspectiva o Marco Interamericano aponta como limitações às restrições da liberdade de expressão, extensivas às liberdades culturais, não apenas o princípio da legalidade estrita, como dispõe o artigo 13.2 da Convenção Americana – “expressamente fixadas pela lei” – mas também que devem “ser necessárias para assegurar: o respeito aos direitos ou à reputação das demais pessoas”, importante parâmetro que caracteriza as sociedades democráticas. Nesse sentido, aquele referido documento esclarece, em seus parágrafos 85 e 86 que:
85. Ahora bien, el adjetivo “necesarias” no equivale a “útil”, “razonable” u “oportuna”. Para que la restricción sea legítima, debe establecerse claramente la necesidad cierta e imperiosa de efectuar la limitación, es decir, que tal objetivo legítimo e imperativo no pueda alcanzarse razonablemente por un medio menos restrictivo de los derechos humanos.
86. El requisito de “necesidad” también implica que no debe limitarse más allá de lo estrictamente indispensable para garantizar el pleno ejercicio y alcance del derecho a la libertad de expresión. Este requisito sugiere que el medio restrictivo sea en realidad el medio menos gravoso disponible para “proteger los bienes jurídicos fundamentales (protegidos) de los ataques más graves que los dañen o pongan en peligro”, pues lo contrario llevaría al ejercicio abusivo del poder del Estado. (OEA, 2009, p. 30
Por fim, dispõe o Marco Interamericano que as restrições às liberdades de expressão precisam não apenas ser idôneas e necessárias, mas também devem ser “estritamente proporcionais ao fim legítimo que as justifica”, apresentando 3 (três) fatores a se considerar quando de sua aplicação: “(i) el grado de afectación del derecho contrario - grave, intermedia, moderada; (ii) la importancia de satisfacer el derecho contrario; y (iii) si la satisfacción del derecho contrario justifica la restricción de la libertad de expresión” (OEA, 2009, p. 31.
Outro documento importante para a garantia das liberdades culturais, não apenas no âmbito regional, é o Relatório do Desenvolvimento Humano, de 2004, cujo tema é “Liberdade Cultural num Mundo Diversificado”, e publicado para Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).
Destaca o documento que o choque de culturas e o “desafio da construção de sociedades culturalmente diversificadas e inclusivas” não são questões abstratas, afetando os processos de desenvolvimento, uma vez que: “permitir às pessoas uma expressão cultural completa é um fim importante do desenvolvimento em si mesmo”, ou seja: “o desenvolvimento humano tem a ver, primeiro e acima de tudo, com a possibilidade das pessoas viverem o tipo de vida que escolheram – e com a provisão dos instrumentos e das oportunidades para fazerem as suas escolhas” (ONU, 2004, p. 1).
A importância do Relatório de 2004 pode ser mensurada também pela oferta de ideias e planos para a gestão de políticas de identidade e cultura, como fundamentos de uma política de desenvolvimento integral; e que, por mais que se estabeleçam ações legislativas, inclusive constitucionais, para garantir os direitos de minorias sem força política, isto é, sem expressões no espaço público, é preciso um esforço amplo de conscientização e sensibilização de todos os membros da sociedade, em busca de uma sociedade solidária e pacífica, pois, como bem afirma a Constituição da UNESCO:
Uma vez que as guerras se iniciam nas mentes dos homens, é nas mentes dos homens que devem ser construídas as defesas da paz, [...], e que uma paz baseada exclusivamente em arranjos políticos e econômicos dos governos não seria uma paz que pudesse garantir o apoio unânime, duradouro e sincero dos povos do mundo, e que, portanto, a paz, para não falhar, precisa ser fundamentada na solidariedade intelectual e moral da humanidade (UNESCO, 2002, p. 2).
Na perspectiva exposta, verifica-se que questões relativas à(s) cultura(s) e aos direitos culturais, em especial às liberdades culturais, não podem estar fora da pauta de planos e ações voltados ao desenvolvimento humano e à construção de sociedades pacíficas, pautadas em valores de solidariedade e responsabilidade mútua entre seus membros.
Assim, os parâmetros analisados têm a finalidade primeira de garantir o pleno desenvolvimento das potencialidades humanas, que não se dá exclusivamente por uma ótica individual, pois são inescapavelmente construídas e expressas no contexto comunitário no qual a diversidade cultural é o fundamento.
4.1 CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE: GARANTIA DA EFETIVAÇÃO DOS PARÂMETROS INTERAMERICANOS EM MATÉRIA DE LIBERDADES CULTURAIS
O último ponto a ressaltar, como busca pela garantia da concretização dos diversos instrumentos normativos transnacionais aqui elencados e analisados, é sobre a aplicabilidade do controle de convencionalidade para fortalecimento no âmbito nacional dos direitos humanos e das liberdades culturais.
Em linhas gerais e como vem sendo aplicado até o momento, o controle de convencionalidade pode ser considerado um mecanismo de compatibilização entre o direito interno e o direito supranacional, com a finalidade de ampliar os instrumentos de proteção e promoção de direitos humanos no âmbito nacional e no sistema internacional como um todo, no sentido de expandir seus aportes aos demais Estados membros; e, como afirma Mac-Gregor (2022): “Este control es uma nueva manifestación de la constitucionalización del derecho internacional”.
Além disso, tanto pode ser realizado, em princípio, nos casos concretos, pelos tribunais do poder judiciário nacional como pelas Cortes internacionais de direitos humanos, com a finalidade de dar pleno cumprimento às normas convencionais e sua interpretação dada pelos órgãos supranacionais competentes. Assim, segundo Mac-Gregor (2022, p. 173): “El control de convencionalidad tiene dos manifestaciones: una de carácter “concentrada” por parte de la Corte Interamericana, em sede internacional; y outra de carácter “difusa” por los jueces nacionales, e sede interna”.
Desse modo, revela-se o controle de convencionalidade não apenas uma doutrina que nasce do desenvolvimento jurisprudencial, mas também fonte de direito vigente que estabelece obrigações aos juízes nacionais para fazer uma releitura e aplicação renovadas e integradas do ordenamento jurídico interno com as normas internacionais de direitos humanos, e, como posteriormente será abordado, com a jurisprudência da Corte Interamericana e suas Opiniões Consultivas. Assim, afirmam Ramírez e Sánchez (2015, p.299) que:
O controle se pratica a partir dos textos convencionais e da jurisprudência que os interpreta e aplica, produzida pela Corte Interamericana. O controle que se atribui aos órgãos judiciais internos deriva da obrigação de observar o tratado internacional – reconhecimento, respeito e garantia dos direitos humanos – que gravita sobre o Estado em seu conjunto, de que fazem parte os órgãos da jurisdição interna.
A questão do controle de convencionalidade, na perspectiva deste trabalho, está inserida na temática da interação do direito internacional dos direitos humanos – em matéria de liberdades culturais - com o direito de ordem interna; e que abrange processos de aplicação de normas de fontes diversas no contexto nacional.
A aplicação do controle de convencionalidade tem potencialidades para a construção de um direito comum – ius commune – regional ou, pelo menos, latino-americano, como característica de um projeto em busca de implementar, ampliar e integrar competências, jurisdições, interpretações, culturas e garantias para a máxima efetividade dos direitos humanos, entendidos como um caminho que abre espaços para o diálogo e para as lutas em favor de uma vida digna para todos, em suas dimensões pessoal e comunitária (SAGÜÉS, 2022, p.391).
Nessa ampliação dos parâmetros de controle das normas e atos internos, por meio de normas convencionais e da jurisprudência de órgãos supranacionais, aportadas pela aplicação do controle de convencionalidade, entende-se ainda que a proximidade com realidades culturais múltiplas, tratadas no âmbito dos sistemas de proteção e promoção de direitos humanos, quer por meio de denúncias quer casos judicializados, além das próprias relações interestatais e interinstitucionais, permite a conscientização, compreensão e reconhecimento da realidade contemporânea como permeada pela diversidade de expressões culturais na esfera regional e global, favorecendo um novo olhar para a pluralidade cultural também presente em âmbito local.
O controle de convencionalidade também fortalece a efetivação do direito à diversidade cultural e políticas públicas culturais pela possibilidade de trazer uma reflexão mais profunda acerca da realidade nacional quando confrontada com as obrigações acordadas e prenhes de exigibilidade, enquanto expressas em instrumentos convencionais que vigoram no país.
Além disso, o cumprimento de tais obrigações passa a ser visto não como uma imposição de uma cultura alienígena, mas de necessária compatibilização de culturas jurídicas plurais que contêm em si mesmas, valores e normas fundamentais para a concretização de uma existência digna para todos; harmonização essa que está no cerne do controle de convencionalidade.
Considerações finais
A construção dos sistemas internacionais de direitos humanos tem como finalidade o fortalecimento das garantias estatais geralmente estabelecidas em torno dos direitos fundamentais no âmbito da ordem jurídica nacional. Dessa forma, aqueles são fontes subsidiárias que se expressam por seus documentos convencionais – marcadamente os tratados internacionais de direitos humanos – da jurisprudência contenciosa dos tribunais regionais, de suas manifestações não contenciosas – através de pareceres consultivos, como é o caso da Corte Interamericana – integrados a instrumentos protetivos de outros organismos, inclusive o denominado global, sob o monitoramento da Organização das Nações Unidas.
Nesse contexto de universalização dos direitos humanos e de busca incansável por sua concretização, como instrumentos de luta para garantir a dignidade de vida de todos, consubstanciada em oportunidades para a realização de suas potencialidades humanas como expressão de suas personalidades, é que se compreende a importância das liberdades culturais, como conjunto de manifestações da liberdade de expressão.
Das análises realizadas, encontram-se parâmetros normativos, por meio da análise de convenções internacionais, jurisprudências, pareceres consultivos, produzidos no Sistema Interamericano, em interação dialógica com outros sistemas de garantia de direitos humanos, que podem ser aplicados como um direito comum regional para o fortalecimento da mais ampla expressão cultural das comunidades latino-americanas.
Percebe-se, a partir do cotejamento de normas convencionais, inclusive da análise de casos julgados pela Corte Interamericana, tais como o aqui citados - Caso Olmedo Bustos e Outros vs. Chile e o Caso Comunidade Mayagna (Sumo) Awas Tingni vs. Nicarágua – que é possível estabelecer parâmetros para a construção de sociedades diversificadas de modo que todos tenham a possibilidade de alcançar o desenvolvimento máximo de suas personalidades por meio da livre escolha de seus planos de vida, diante da igualdade de oportunidades ofertadas pelo Estado Democrático de Direito e/ou construídas autonomamente.
Outro instrumento valoroso para a elaboração de parâmetros normativos é o controle de convencionalidade, construído a partir da jurisprudência da Corte Interamericana em interação com diversos documentos convencionais, com a finalidade de compatibilizar a ordem jurídica e a política interna, com os documentos convencionais regionais, e, dessa forma, fortalecer a proteção e promoção de direitos humanos, e, especificamente, as liberdades culturais.
Assim, entende-se que as liberdades culturais devem ser manifestadas em suas expressões mais amplas, garantidas plenamente pelo Estado e pela sociedade, e cujas restrições deve se ater a fundamentos estritamente legais, necessários e proporcionais, apropriados para buscar satisfazer os diversos interesses sociais, incluindo-se a proteção de outros direitos fundamentais.
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1 Doutor e Mestre pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR); Docente do PPGD da Universidade Federal Rural do Semiárido (UFERSA) e do Curso de Graduação em Direito da Faculdade 05 de Julho (F5); Pesquisador do Grupo de Estudos e Pesquisas em Direitos Culturais (UNIFOR), do Grupo de Pesquisas DIGICULT/UFERSA e do Observatório de Práticas Sociojurídicas (UFERSA); Ocid. n. 0000-0001-8839-716X; e-mail marcuspaguiar@gmail.com