https://doi.org/10.18593/ejjl.20520

“LAICIDADE À BRASILEIRA” E A DECISÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL SOBRE ENSINO RELIGIOSO CONFESSIONAL

“BRAZILIAN SECULARITY” AND THE BRAZILIAN SUPREME COURT’S DECISION ON CONFESSIONAL RELIGIOUS EDUCATION

Letícia Regina Camargo Kreuz1

Ana Claudia Santano2

Resumo: O artigo tem como objetivo a exposição do princípio da laicidade como é aplicado no Brasil, evidenciando as particularidades nacionais do que se considera como separação entre Estado e igrejas, assim como as possibilidades de relação entre tais instituições. A pesquisa traça um paralelo dessa relação com a decisão do Supremo Tribunal Federal sobre ensino religioso confessional em escolas públicas. Parte-se da análise do preâmbulo constitucional em sua invocação à proteção de Deus, passando pela discussão acerca do princípio da laicidade estatal e chegando à querela dos crucifixos em espaços públicos e da expressão “Deus seja louvado” em cédulas de Real. Por fim, faz-se um exame do ensino religioso confessional em relação ao princípio da laicidade, culminando na análise da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4439, julgada pelo Supremo Tribunal Federal em 2017, que permitiu o ensino religioso confessional em escolas públicas no país. A metodologia empregada é lógico-dedutiva, com uso de referências bibliográficas e análise de julgamento do STF. A conclusão a que se chega é de que existe uma “laicidade à brasileira”, com diversos pontos de confusão sobre os limites do religioso na esfera pública, o que prejudica a pluralidade política e religiosa defendidas também constitucionalmente.

Palavras-chave: laicidade; Supremo Tribunal Federal; ensino religioso confessional; ADI 4439; Constituição de 1988.

Abstract: The article aims at exposing the principle of secularity in the way it is applied in Brazil, highlighting the national particularities of what is considered as a separation between State and churches, as well as the possibilities of relationship between such institutions. The research draws a parallel of this relation with the decision of the Brazilian Supreme Court on confessional religious education in public schools. It begins with the analysis of the constitutional preamble in its invocation to the protection of God, passes through the discussion about the principle of the state secularity and arrives at the quarrel of the crucifixes in public spaces and of the expression “praise the Lord” in notes of Real. Finally, it makes an analysis of confessional religious education in relation to the principle of secularity, culminating in the analysis of the Direct Action of Unconstitutionality n. 4439, judged by the Brazilian Supreme Court in 2017, which allowed confessional religious education in public schools in the country. The methodology used is logical-deductive, with use of bibliographical references and analysis of an action judged by the STF. The conclusion reached is that there is a “Brazilian secularity”, with several points of confusion about the limits of the religious in the public sphere, which harms the political and religious plurality defended constitutionally.

Keywords: secularism; Brazilian Supreme Court; confessional religious education; ADI 4439; 1988 Constitution.

Recebido em 12 de abril de 2019

Avaliado em 10 de março de 2022 (AVALIADOR A)

Avaliado em 31 de agosto de 2022 (AVALIADOR A)

Aceito em 11 de setembro de 2022

Introdução

A noção de que uma sociedade pode coexistir com a profusão de ideais de diferentes fontes, ideologias e valores é a chave da noção de justiça e de democracia. A pluralidade de ideias é um retrato da sociedade, sendo necessário que, para que se tenha de fato uma sociedade justa, livre e democrática, a legislação e os tribunais acompanhem essa pluralidade. No entanto, há acordos mínimos a serem observados no sentido de não impor a grupos minoritários a ideologia da maioria e, simultaneamente, de não se aceitar ideais que objetivem a própria inexistência, aniquilação e subjugação dos mesmos grupos minoritários por uma maioria autoritária – ou ao menos de não aceitar que estes atinjam os objetivos de eliminar o diferente.

A ideia de separação entre Estado e igreja é um corolário da modernidade, cuja origem remonta à revolução francesa. Ainda que possam cooperar em torno do interesse público, as esferas secular e sacra não podem se confundir – tampouco pode o Estado estabelecer entraves ao funcionamento adequado das entidades religiosas ou permitir relações de dependência ou aliança. É o que determina o art. 19, I, da Constituição Federal de 1988 (SILVA, 2015, p. 282).

No entanto, o país vivencia momentos de confusão entre o espaço público e os elementos religiosos. Desde o preâmbulo constitucional que invoca a proteção de “Deus”, passando pela moeda com mensagem religiosa (“Deus seja louvado”), pelos crucifixos em espaços públicos e alcançando, mais recentemente, a decisão do Supremo Tribunal Federal acerca da possibilidade de ensino religioso confessional em escolas públicas, proferida em sede da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4439. Essas relações entre o religioso e o profano no espaço público e na deliberação política brasileiras, bem como o conteúdo do princípio da laicidade expresso na Constituição, são o objeto do presente estudo.

1 Preâmbulo constitucional – a proteção de Deus que não é norma jurídica

O preâmbulo constitucional é uma declaração “mais ou menos solene, mais ou menos significante”, que representa a ideologia do constituinte, na concepção de Jorge Miranda (2002. p. 633-635). Para, Gilmar Ferreira Mendes e Paulo Gustavo Gonet Branco, o preâmbulo apresenta informações relevantes sobre a Constituição, sua origem e seus valores. A relevância está no âmbito da interpretação e aplicação do direito constitucional (MENDES, 2014. p. 77-78). Armin von Bogdandy identifica que o preâmbulo cumpre a função de manifesto, na medida em que indica as características básicas da organização política de maneira acessível, além de expressar convicções fundamentais, experiências e aspirações da Constituição. O preâmbulo teria a capacidade de orientar o entendimento político e social de quem está submetido ao texto por ele inaugurado (BOGDANDY, 2003. p. 03).

O preâmbulo da Constituição de 1988 é condizente com uma Assembleia Nacional Constituinte que buscava romper com um regime ditatorial precedente. Enquanto representantes do povo brasileiro reunidos com o objetivo de instituir um Estado Democrático preocupado com as garantias de exercício dos direitos sociais e individuais, com a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça, definidos enquanto os valores supremos de uma sociedade que se pretendia fraterna, pluralista e sem preconceitos, o preâmbulo propõe um projeto de sociedade. Diz ainda que esse projeto está fundado na harmonia social e comprometido, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias. É um manifesto político de uma nação que retorna à democracia, que rompe com práticas autoritárias e que deseja, acima de tudo, a defesa dos direitos e liberdades dos cidadãos e a própria democracia. Ao fim, o preâmbulo invoca a proteção de Deus, embora não diga de qual religião – pelo que fica subentendido ser um Deus cristão (ou ao menos monoteísta, com “d” maiúsculo), dado que a maioria da população nacional professa essa crença.

As constituições estaduais em geral reproduziram a Constituição Federal também em relação ao preâmbulo, à exceção do Acre. Em virtude da omissão da “proteção de Deus” da constituição estadual do Acre, o Partido Social Liberal (PSL) propôs a Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2076/AC, que foi examinada pelo Supremo Tribunal Federal. O partido defendeu na ADI que o preâmbulo integraria o texto constitucional e, portanto, suas disposições teriam valor jurídico. A omissão expressa da proteção divina seria uma ofensa aos cidadãos do estado do Acre, pois estes teriam sido privados da proteção de Deus pela Assembleia Estadual Constituinte.

Para o Supremo Tribunal Federal, o preâmbulo não faz norma constitucional. Na ADI n. 2076, o Ministro Carlos Velloso entendeu que o texto preambular não tem relevância jurídica e que não é norma constitucional central. Na visão do julgador, a Constituição não faz diferenças entre deístas, ateus ou agnósticos, pois é um texto de todos. O preâmbulo se insere no campo político, não no jurídico, e reflete a posição ideológica do constituinte. O Ministro Sepúlveda Pertence acrescentou, em tom jocoso, que não seria possível impor uma obrigação à entidade divina – mesmo porque seria pretensioso imaginar que Deus estivesse “preocupado” com a Constituição ou que fosse obrigado a qualquer coisa.3

Para Velloso, o preâmbulo é um reflexo ideológico do constituinte, de seu sentimento religioso nutrido socialmente, refletido pela invocação de um “Deus” cristão no preâmbulo da Constituição, uma vez que a Assembleia Nacional Constituinte contou com a presença de deputados de origem cristã não católica de diversas confissões, como a Assembleia de Deus, Batistas, Presbiterianos, Congregacionais, Adventistas, membros da Igreja de Cristo, da Igreja do Evangelho Quadrangular, da Igreja Universal do Reino de Deus, de Confissão Reformada e Cristã Evangélica (PINHEIRO, 2008. p. 55-56).

Mesmo com a decisão do STF pela improcedência da ADI, a Constituição do Acre foi emendada no ano 2000, fazendo constar a proteção de Deus em seu preâmbulo. Como não se trata de uma alteração normativa ou de uma mudança de conteúdo, a emenda que provocou a mudança é carregada apenas de um conteúdo simbólico.

Na visão de Douglas Pinheiro, com a fixação da proteção de Deus no preâmbulo, “reforçou-se uma identidade religiosa monoteísta do sujeito constitucional, excluindo-se, pois, inúmeras expressões de religiosidade existentes no país, o que demonstra que a postura do Estado em relação à pluralidade em questões de fé não é tão inclusiva como se imagina” (PINHEIRO, 2008. p. 101), o que acaba sendo um paradoxo, visto que o próprio preâmbulo assume compromisso com a pluralidade.

Ainda que se entenda que o preâmbulo não é norma jurídica e que não gera obrigações, parece ser aceita a interpretação de que ele é dotado de um conteúdo político forte, de noções gerais do projeto de sociedade que inaugura e que pode, em síntese, servir como critério interpretativo do direito. Com isso, além de ser possível evidenciar que o preambulo retrata um sujeito constitucional cristão, ele demonstra um apego simbólico ao cristianismo e uma carência de neutralidade e pluralidade, ainda que seja o conteúdo inicial de uma Constituição comprometida com a laicidade.

2 Princípio da laicidade estatal e a Constituição brasileira

O Estado laico é “um instrumento jurídico-político para a gestão das liberdades e direitos do conjunto de cidadãos” (BLANCARTE, 2008. p. 25). A Constituição brasileira estabelece esse princípio no Título III, da Organização do Estado, Capítulo I, da Organização Político-Administrativa. É uma escolha que decorre de uma sociedade plural, composta por sujeitos de diferentes crenças e por aqueles que não partilham de nenhuma fé. Para a garantia dos direitos e liberdades fundamentais de todas essas pessoas, é fundamental que o Estado se mantenha neutro em relação às religiões e que permita, simultaneamente, que todas elas tenham a possibilidade de se desenvolver livremente.

O Estado laico não pode impor normas de caráter religioso ou orientar sua atuação por meio de dogmas confessionais. “Ao mesmo tempo, o Estado laico responsabiliza-se pela garantia da liberdade religiosa de todos, de forma igualitária e independentemente de sua confissão, protegendo os cidadãos contra eventuais discriminações decorrentes da fé. Ou seja, o Estado laico deve ser imparcial em relação à religião, garantindo, de todo modo, a liberdade religiosa.” (ZYLBERSZTAJN, 2012. p. 38). A laicidade é, assim, a separação entre Estado e igreja, sendo um princípio que opera em duas direções: “salvaguarda as diversas confissões religiosas do risco de intervenções abusivas do Estado”, assim como “protege o Estado de influências indevidas provenientes da seara religiosa” (SARMENTO, 2007).

Daniel Sarmento compreende a laicidade não como uma perspectiva ateísta ou refratária da religiosidade, mas sim como a necessidade de o Estado manter-se neutro em relação à pluralidade de concepções religiosas presentes na sociedade (SARMENTO, 2007). A laicidade não se confunde com o laicismo, que seria a exclusão completa da religião da esfera pública, sem possibilidade de que a religião adentre em ambientes estatais. É o contexto francês, que não admite expressão religiosa na arena pública (ZYLBERSZTAJN, 2012. p. 54).

Desde a Constituição de 1891, o Estado brasileiro tem a separação entre os poderes secular e religioso. A laicidade foi instituída pelos republicanos na Constituinte de 1890.4 Alguns autores, como Mirian Ventura, compreendem que a relação entre o Estado brasileiro e as religiões é de separação e colaboração.” (VENTURA, 2006. p. 14). O princípio constitucional da laicidade estatal é constante do art. 19, I, da Constituição, mediante a vedação do estabelecimento de cultos religiosos ou igrejas, assim como de qualquer interferência ao funcionamento de igrejas. Determina que pode haver relações pelo interesse público entre as instâncias, na forma da lei. No entanto, Ana Paula de Barcellos observa que “basta uma leitura rápida no texto da Constituição de 1988 para se notar que a religião, de longe, não deixou de ser um assunto de relevância para o legislador constituinte. Pelo contrário, em diversos pontos do texto constitucional são feitas referências ao fenômeno religioso” (BARCELLOS, 2011. p. 30). Em realidade, ainda que exista a separação entre sacro e profano, a própria Assembleia Nacional Constituinte também foi marcada por manifestações religiosas, desde a bíblia sobre a mesa até a leitura de trechos dela durante seus trabalhos (SALGADO, 2007. p. 179-187). O resultado foi, ainda assim, pela laicidade no texto constitucional.

Para John Rawls, a separação entre Estado e religião é uma “via de mão dupla”: ela protege Estado da religião e religião do Estado, e também protege os cidadãos de suas igrejas e entre si (RAWLS, 2001. p. 218). Em um Estado democrático de Direito, é fundamental que o Estado seja laico. Não seria concebível em uma ordem dessa natureza que uma única fé ditasse os valores sociais de forma impositiva e unilateral, por maior que fosse sua adesão social. A neutralidade do Estado em relação às religiões é essencial às liberdades democráticas, respeito à diversidade de pensamento. “Assim, ao Estado laico cabe garantir a toda sociedade o exercício da liberdade de consciência e o direito de tomar decisões livres e responsáveis, respeitando, assim, a existência de uma sociedade plural e igualitária” (EMMERICK, 2008. p. 118).

Uma sociedade justa, pluralista, democrática e com pleno exercício de direitos humanos só é possível a partir de um Estado laico. Na visão de Flávia Piovesan, a ordem jurídica democrática não pode ser marcada exclusivamente por uma moral religiosa, seja ela cristã ou não (2003). Ainda, Luís Roberto Barroso compreende a fé enquanto conteúdo da esfera privada dos indivíduos e adverte que “na política e nos assuntos públicos, uma visão racional e humanista deve prevalecer sobre concepções religiosas.” Para o jurista, não ocorre depreciação da liberdade religiosa das pessoas, mas sim um “equilíbrio implícito e justo” que é normalmente atingido pelas democracias maduras, marcadas pela ideia de neutralidade, com o objetivo de libertar a dignidade humana de doutrinas religiosas (2014. p. 73-74). Já Maria José Rosado-Nunes assevera que os Estados democráticos “devem assumir a responsabilidade de legislar para uma sociedade diversa e plural, impedindo que crenças religiosas influam sobre o trabalho político, ainda que se reconheça o quanto seus valores e normas estão arraigados na cultura local” (2006. p. 37).

Na perspectiva de Ana Paula de Barcellos, o Estado “não poderá ignorar o fenômeno religioso como expressão pública de pertencimento de cada indivíduo à comunidade política; afinal, quem entenderá como legítimo um governo que não respeita a suas escolhas mais íntimas e pessoais” (2011. p. 2-3); do mesmo modo, as pessoas têm liberdade religiosa e de expressão para adentrar ao debate, traduzindo em argumentos suas crenças. É uma noção de pluralidade característica da democracia. Nas palavras de Roberto Blancarte, “evidentemente, a moral pública não pode estar totalmente secularizada, à medida que as religiões formam parte essencial da cultura dos povos, portanto, é impossível que não influenciem em suas concepções morais sobre o que é correto ou incorreto, sobre o que é bom ou mau”. Para o autor, a ação de legisladores e funcionários públicos será influenciada por suas religiões e cosmovisões, invariavelmente (2008. p. 27). No entanto, quando o fenômeno religioso passa a interferir na vida privada dos sujeitos, na educação de crianças e jovens, na autonomia do corpo de mulheres, na liberdade de cátedra de professores, ela não mais se traduz em uma mera escolha íntima e pessoal de alguém. E essa situação tampouco se traduz em razões públicas.

John Rawls elabora a ideia de razão pública enquanto parte de uma sociedade democrática constitucional bem ordenada, na medida em que as democracias têm como característica básica o pluralismo razoável, com uma diversidade de doutrinas abrangentes razoáveis e conflitantes5, de cunho religioso, filosófico e moral. “Os cidadãos percebem que não podem chegar a um acordo ou mesmo aproximar-se da compreensão mútua com base nas suas doutrinas abrangentes irreconciliáveis. Em vista disso, precisam considerar que tipos de razões podem oferecer razoavelmente um ao outro quando estão em jogo perguntas políticas fundamentais.” A razão é pública, é uma razão de cidadãos livres e iguais, o bem é público e a natureza e o conteúdo são igualmente públicos (2001. p. 173-175).

O cidadão elabora uma razão pública quando delibera um espectro compreendido por si como a mais razoável concepção política de justiça, expressando valores políticos que espera que também os demais possam considerar razoável enquanto cidadãos livres e iguais. A razão pública é uma família de concepções que podem preencher adequadamente o critério de reciprocidade (OLIVEIRA, 2013. p. 111-122). A justiça como equidade é um elemento fundante dessas concepções, mas não o único; elas envolvem também direitos, liberdades e oportunidades básicas e medidas que possam assegurar a todos os cidadãos os meios adequados aos propósitos para fazer uso de suas liberdades (RAWLS, 2001. p. 186).

A laicidade e a neutralidade são tentativas de libertação da dignidade humana de doutrinas religiosas ou políticas abrangentes, associando-a à ideia de razão pública (BARROSO, 2014. p. 74). Na teorização de Rawls, “embora razões religiosas e doutrinas sectárias não devam ser invocadas para justificar a legislação numa sociedade democrática, argumentos seculares sensatos podem ser”. Um exemplo: a justificação para políticas públicas pautada na noção de “pecado” ou da “violação da moralidade cristã” pode não ser vista por outros cidadãos como aceitável; se os argumentos partem de doutrinas sociais abrangentes, mas são seculares e aceitos como razoáveis pelos demais (mesmo que não concordem com eles), traduzem-se em razões públicas (2001. p. 194-205).

Pensando em uma defesa das minorias, como seria de se esperar de um Estado Democrático de Direito, é fundamental incluir mais grupos e pessoas no debate. O pluralismo razoável importa na necessidade de se ter diferentes grupos, com diferentes opiniões e doutrinas abrangentes dialogando na Ágora democrática. Se o que se tem em disputa são princípios fundamentais e, em especial, direitos de minorias, uma decisão da maioria sem atenção à pluralidade social inviabiliza a emancipação. Cabe ao Estado democrático de Direito conter os avanços dessas maiorias.

O modelo de separação brasileiro é com cooperação entre poderes sacro e secular (SILVA, 20015, p. 281 e ss.). No entanto, há que se considerar qual poder sacro é invocado para cooperação. Em geral, são as instituições cristãs que se envolvem com a atividade administrativa. Exemplo disso é a concordata firmada entre o Brasil e a Sé de Roma, que envolve previsão sobre o ensino religioso (católico ou de outras confissões religiosas)6. Na visão de José Afonso da Silva, não passa de uma relação diplomática entre dois Estados soberanos, Brasil e Vaticano, sem qualquer dependência ou impeditivo a essa aliança (2009. p. 252). Já Marco Huaco entende que “o cerne da questão reside no fato de que ao constituir um tratado internacional com a Santa Sé inevitavelmente abordam-se conteúdos que não podem ser diferentes do que os que regulamentam os assuntos religiosos da Igreja Católica em um determinado território nacional” (2008. p. 69). Mesmo porque a concordata é um tratado internacional relacionado a fé, o que indica que ultrapassa a mera relação política entre países soberanos.

Nesse sentido, o autor examina que “a realidade política de países tradicionalmente católicos demonstra que neles existe uma ‘separação’ orgânica e institucional, mas suas políticas e leis seguem sendo fortemente inspiradas em valores, crenças e princípios religiosos” (HUACO, 2008. p. 49). Por outro lado, Maria das Dores Campos Machado, analisando a influência religiosa nos espaços públicos, afirma que “não se trata de negar ou deixar de reconhecer a presença histórica da Igreja Católica, tampouco de impedir a divulgação de seus princípios normativos. Porém, trata-se de ressaltar que, em um regime democrático, os assuntos públicos não podem definir-se pelos postulados de um credo, independentemente de seu caráter majoritário ou minoritário” (MACHADO, 2008. p. 174).

Desse modo, ainda que a laicidade estabelecida pela Constituição brasileira permita uma relação de colaboração entre igrejas e cultos religiosos com o poder público para fins de interesse público, ela não permite a confusão entre ambas as esferas, a formação de alianças ou de dependência. O respeito à esfera religiosa por parte do Estado envolve a noção de uma sociedade plural, mas a atuação estatal deve estar marcada pela neutralidade em relação às religiões.

3 Crucifixos em espaços públicos e “Deus seja louvado” na moeda – retratos de uma “laicidade à brasileira”

A presença de crucifixos em Tribunais e outros prédios públicos é histórica no Brasil. Seja em tribunais, nos poderes legislativos municipais, estaduais ou federal, ou em universidades, escolas, hospitais e quartéis, os crucifixos se fazem uma constante no espaço público (GIUMBELLI, [s.d.]). A noção de que fazem parte da cultura local e, portanto, não ferem a laicidade, apenas representa a sociedade, justifica a sua presença em ambientes relacionados com a justiça.

Contudo, não contente com essa situação, a Liga Brasileira de Lésbicas protocolou o pedido junto ao Conselho da Magistratura do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que determinou por unanimidade a retirada dos símbolos dos prédios da Justiça do estado em 2012 (GLOBO, 2012).

O relator da matéria no TJ-RS, desembargador Cláudio Baldino Maciel, afirmou que quando um julgamento é feito em uma sala de tribunal com um símbolo tão expressivo de uma crença religiosa e sua doutrina, não parece ser a melhor forma de mostrar que o Estado está equidistante dos valores em conflito. O espaço do Judiciário deveria ser resguardado para uso de símbolos oficiais estatais, sendo este o único caminho compatível com os princípios constitucionais republicanos correspondentes ao Estado laico.

A decisão tomada pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul estava em consonância com a noção de laicidade e pluralidade social: não estava desrespeitando a fé católica, mas apenas retirando de uma entidade oficial, relacionada à administração da justiça, um elemento simbólico forte de uma religião dominante numericamente na sociedade. A separação entre Estado e igreja acaba sendo também marcada por elementos simbólicos como esse – e o cuidado do TJ-RS foi o de garantir que não houvesse confusão.

O interessante é que quatro anos depois, em 2016, os crucifixos e símbolos religiosos foram recolocados nos prédios do Judiciário do Rio Grande do Sul após decisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Para o órgão, a presença de tais imagens nos tribunais não prejudica o Estado laico ou a liberdade religiosa. Nas palavras do relator, o Conselheiro Emmanoel Campelo, “a presença de Crucifixo ou símbolos religiosos em um tribunal não exclui ou diminui a garantia dos que praticam outras crenças, também não afeta o Estado laico, porque não induz nenhum indivíduo a adotar qualquer tipo de religião, como também não fere o direito de quem quer que seja”. O relator considerou, ainda, agressiva a retirada dos símbolos religiosos, o que chamou de “visão preconceituosa daqueles que pretendem apagar os vestígios de uma civilização cristã invocando a laicidade do Estado, quando, na verdade, professam um laicismo mais próximo do ateísmo do que uma posição equilibrada da separação entre Igreja e Estado”. Em sua perspectiva, proibir tais símbolos é uma intolerância religiosa que atende a uma minoria social professante de outras crenças e ignora o caráter histórico do símbolo no Judiciário brasileiro. A justificativa jurídica para a permissão dos crucifixos é, para Campelo, o fato de a Constituição não proibir que as entidades públicas sejam adornadas com tais elementos religiosos (ACI DIGITAL, 2016). Note-se que toda essa discussão se deu apenas em relação ao estado do Rio Grande do Sul, sem qualquer relação com a justiça local dos demais estados ou a Justiça Federal.

Daniel Sarmento faz uma análise crítica acerca dos argumentos favoráveis à presença de crucifixos em tribunais. Para o autor, não é sério o argumento de que o crucifixo não é um símbolo religioso, pois “qualquer terráqueo, ao ver um crucifixo, tenderá a associá-lo imediatamente ao cristianismo e à sua divindade encarnada. Trata-se, muito provavelmente, do símbolo religioso mais conhecido em todo o mundo”. Igualmente, não se pode dizer que seja meramente um enfeite, um adorno estético, pois encarna os valores religiosos, e a mensagem que ele transmite não é de neutralidade (2007).

A presença dos ornamentos em questão remete a uma crença religiosa específica. “Em suma: a presença de crucifixos em recintos estatais públicos não se sintoniza com uma concepção pluralista da democracia, nem é uma forma adequada para o reconhecimento da importância do catolicismo no Brasil.” (GIUMBELLI, [s.d.]). É um símbolo inegavelmente católico, relacionado sem dúvida alguma com o cristianismo e com a noção de um Deus monoteísta e da crença de Jesus como salvador.

Nesse ponto, é relevante observar o quanto os católicos têm apego aos seus símbolos. Em setembro de 2017, uma exposição de arte chamada Queer Museu – Cartografia da Diferença na América Latina, realizada em Porto Alegre (Rio Grande do Sul) pelo banco Santander, foi fechada antes da data prevista em razão de protestos iniciados pelo grupo pretensamente apartidário “Movimento Brasil Livre” e por entidades religiosas. Entre as 263 obras expostas de 85 artistas, estavam alguns muitos renomados como Adriana Varejão, Ligia Clark, Alfredo Volpi, Cândido Portinari. Na exposição, hóstias foram relacionadas a palavras como “língua” e “vagina”. Ainda, uma imagem de Jesus com muitos braços, como Shiva (deus hindu), segurando objetos como um cachorro-quente, um pé de coelho e uma luva de boxe, gerou revolta de cristãos, uma escultura representando Jesus com um animal em frente, e um quadro de Maria com um macaco no colo, supostamente representando Jesus (SPERB, 2017).

A situação apenas evidencia que a simbologia é muito arraigada à tradição católica e que o crucifixo é mais que um mero elemento cultural brasileiro. Não há como se distanciar o conteúdo religioso do crucifixo – assim como não há como atribuir-lhe qualquer relação com a pluralidade e diversidade religiosa. Até mesmo elementos artísticos não religiosos são vistos com esse conteúdo pelos cristãos, imagine-se um elemento tradicionalmente marcado por essa carga de fé. Alegar que é apenas uma questão cultural é ignorar a simbologia do sacro.

Por outro lado, em relação à mensagem “Deus seja louvado” escrita em notas de Real, a situação é similar: a expressão foi adicionada à moeda local em 1986, por determinação do presidente da República, José Sarney, e mantida por Fernando Henrique Cardoso (então Ministro da Fazenda) em 1994, quando da adoção do Plano Real, com a justificativa de que se tratava de uma tradição da cédula brasileira (O GLOBO, 2012). O Ministério Público Federal pediu a retirada da expressão com o argumento de que fere o Estado laico e exclui minorias através de uma ação civil pública. O procurador Jefferson Aparecido Dias, que protocolou a ação, expõe o seguinte argumento: “Imaginemos a cédula de real com as seguintes expressões: ‘Alá seja louvado’, ‘Buda seja louvado’, ‘Salve Oxossi’, ‘Salve Lord Ganesha’, ‘Deus Não existe’. Com certeza haveria agitação na sociedade brasileira em razão do constrangimento sofrido pelos cidadãos crentes em Deus” (SAKAMOTO, 2012).

A reação cristã veio com o projeto de lei para incluir no art. 1º da Lei n. 9.069/95, que dispõe sobre o Plano Real, da disposição expressa de que as cédulas teriam a expressão “Deus seja louvado” impressa. A proposta legislativa foi do deputado Eduardo da Fonte, do Partido Progressista (Pernambuco). Fonte afirma que “A expressão ‘Deus seja louvado’ respeita a tradição cultural de nosso povo e não faz proselitismo de nenhuma agremiação religiosa. O respeito e o culto a um Ser supremo, que representa a divindade, está presente em todas as religiões. Vivemos em um mundo conturbado e precisamos cada vez mais ter gratidão ao Ser supremo que comanda nossas vidas. Não se pode perder o elo com a divindade que cada um acredita” (EXAME, 2013). O Projeto de Lei n. 4710/12 não teve andamento na Câmara dos Deputados.

A ação do Ministério Público Federal, no entanto, teve seu pedido negado pela juíza federal Diana Brunstein, da 7ª Vara Federal Cível de São Paulo, que interpretou não ser competência do Judiciário definir se a inscrição pode ou não estar presente nas cédulas de Real. Brunstein entendeu, ainda, que a expressão não fere direitos individuais ou coletivos, e tampouco que ela impõe alguma conduta. Na interpretação da julgadora, aceitar o argumento do MPF abriria espaço para se abolir feriados religiosos tradicionais, modificar o nome de cidades ou proibir decoração de Natal em espaços públicos. Ela menciona ainda a tradição católica, que foi religião oficial por mais de 300 anos, além da representatividade do Cristo Redentor como símbolo nacional.7 A sentença seguiu o entendimento da Advocacia-Geral da União, que se manifestou pela manutenção da expressão nas notas, o que considerou como uma manifestação histórico-cultural de uma fé genérica que boa parte da população partilha. Para a AGU, o pedido do MPF levaria o país a apagar todos os elementos simbólicos do cristianismo, “a despeito de sua importância na formação espiritual, cultural e moral do povo brasileiro”.8

O que se percebe com as situações narradas é que há um constante retorno ao argumento da tradição cultural, ignorando que ela pode ser marcada pela religiosidade, pelo conteúdo sacro e pela simbologia de suas representações, que não conseguem fugir ao seu significado histórico. Essa “laicidade à brasileira” custa em entender que a não influência religiosa vai além de não se ter uma religião oficial, de não se impor formalmente uma crença a todos os cidadãos ou de tolerar outras religiões que não a majoritária. Ainda, a retirada de elementos religiosos normalmente enfrenta o argumento de que se está faltando com tolerância e violando a liberdade religiosa dos cristãos – que ficou popularmente conhecida como cristofobia. Daniel Sarmento afirma que não é a liberdade dos cristãos de cultuarem a sua religião que está em jogo, pois a conduta individual das pessoas não está em debate. É a postura assumida pelo Estado em relação à religião que está em discussão – é o dever de neutralidade, decorrente da laicidade, que não está sendo observado (2007).

Em síntese, Emerson Giumbelli avalia que o problema dos símbolos religiosos em espaços e questões públicas (em sua análise, tratando especificamente sobre os crucifixos, mas uma observação que pode também se relacionar com a questão das cédulas de Real) não decorre do fato de serem religiosos, mas do fato de serem associados com referências que correspondem a grupos e valores com interesses específicos. Assim, não faria sentido substituí-los por outros ou ainda acrescentar símbolos de outras crenças. ([s.d.]). Afinal, quais religiões seriam contempladas? Seria possível a inserção de um símbolo satanista no Supremo Tribunal Federal? Ou haveria a possibilidade de retratar o ateísmo através de um símbolo a ser afixado nas paredes do Poder Legislativo?

Essa situação acaba influenciando a sociedade brasileira como um todo – e o constante retorno ao religioso afasta a pluralidade e a multiplicidade de ideias e crenças constante tanto do preâmbulo constitucional quanto de sua parte normativa – uma vez que a promoção do bem de todos, sem preconceitos de qualquer tipo (inclusive religioso) é um objetivo fundamental da República, constante do art. 3º, IV. A discussão volta à cena jurídico-política brasileira em 2017, com a decisão do Supremo Tribunal Federal na ADI n. 4439, cuja análise se faz a seguir.

4 Lei de Diretrizes e Bases da Educação e Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4439

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei n. 9.394/96) determinava, na redação original do art. 33, que o ensino religioso seria oferecido sem ônus para os cofres públicos e em consonância com as preferências de alunos e seus responsáveis. Nos incisos I e II, a previsão era de que o ensino poderia ser confessional ou interconfessional, artigo que foi modificado pela Lei n. 9.475/97, passando a prever que o ensino religioso é parte da formação básica do cidadão, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do país, vedadas quaisquer formas de proselitismo. Os parágrafos do mesmo artigo determinam a regulamentação dos procedimentos para definição dos conteúdos do ensino religioso cabe aos sistemas de ensino, assim como as normas para habilitação e admissão dos professores, bem como que esses sistemas devem ouvir a sociedade civil, constituída pelas diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso. A Constituição, em seu art. 210, §1º, também determina a possibilidade de ensino religioso, estabelecendo que ele é de matrícula facultativa e que constitui disciplina dos horários normas das escolas públicas.

O ensino confessional “estaria circunscrito a uma comunidade religiosa específica, ao passo que o interconfessional partiria de consensos entre as religiões, uma estratégia educacional mais facilmente posta em prática pelas religiões cristãs, por exemplo”. Para Débora Diniz e Tatiana Lionço, a questão do ensino religioso interconfessional é que ele é também, em seus fundamentos, confessional – a diferença estaria na abrangência da confessionalidade (2010. p. 14-15). O ensino religioso secular, a terceira vertente possível da disciplina, seria aquele que privilegia o histórico das religiões e os fundamentos de suas doutrinas, sem privilegiar dogmas de nenhuma delas, mas sim privilegiando as múltiplas crenças existentes.

A Procuradoria-Geral da República (PGR) propôs a Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4439 contra o mencionado dispositivo, com o pedido de interpretação conforme a Constituição para assentar o entendimento de que o ensino religioso em escolas públicas só poderia ser de natureza não-confessional, com proibição de admissão de professores na qualidade de representantes de confissões religiosas. A mesma ADI pediu a interpretação conforme a Constituição do art. 11, §1º, “Acordo entre a República Federativa do Brasil e a Santa Sé relativo ao Estatuto Jurídico da Igreja Católica no Brasil”, aprovado pelo Congresso Nacional através do Decreto Legislativo n. 698/09 e promulgado pelo Presidente da República através do Decreto n. 7.107/10, igualmente para estabelecer o entendimento de que o ensino religioso em escolas públicas só pode ser de natureza não-confessional ou, alternativamente (caso negado o pedido), que fosse declarada a inconstitucionalidade do trecho “católico e de outras confissões religiosas” do dispositivo atacado.9 A redação do parágrafo 1º do art. 11 do acordo diz que “o ensino religioso, católico e de outras confissões religiosas, de matrícula facultativa, constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, em conformidade com a Constituição e as outras leis vigentes, sem qualquer forma de discriminação”.

A Procuradoria-Geral da República fundamenta o pedido no art. 19, I, da Constituição (princípio da laicidade), considerando especialmente o princípio da unidade da Constituição. A partir desse princípio, não é viável a adoção de uma perspectiva que negasse o ensino de religião nas escolas, mas, ao mesmo tempo, não é possível que a escola se transforme em espaço de catequese ou proselitismo religioso, católico ou não. Mesmo um ensino religioso interconfessional seria inadequado na visão da autora, uma vez que tem por propósito inculcar nos alunos os princípios e valores religiosos compartilhados socialmente e, com isso, não envolve visões ateístas, agnósticas ou de religiões com menor poder na esfera sociopolítica.

A visão da Procuradoria é de que, com a interpretação conforme a Constituição dos dispositivos atacados, haveria compatibilização do caráter laico do Estado brasileiro com o ensino religioso em escolas públicas e que, com isso, o ensino da disciplina se daria a partir da exposição de doutrinas, práticas, história e dimensões sociais das diferentes religiões, assim como de posições não-religiosas, como o ateísmo e o agnosticismo. Estaria também de acordo com o Plano Nacional de Direitos Humanos 3 (PNDH-3), especialmente no que se refere à determinação de respeito às diferentes crenças, liberdade de culto e garantia da laicidade do Estado. A ação foi proposta porque, apesar da redação do caput do art. 33 vedar o proselitismo religioso, a aplicação das autoridades públicas na prática vinha sendo a de permitir tanto o ensino religioso confessional quanto o interconfessional em escolas públicas. Na percepção da PGR, as escolas públicas brasileiras se tornaram um espaço de doutrinamento religioso financiado com recursos públicos e, muitas vezes, com professores que são representantes de igrejas.10

A autora destaca, invocando a laicidade do Estado brasileiro como fundamento da ação, que esta não se refere à adoção de uma perspectiva ateísta ou refratária à expressão individual da religiosidade, mas que protege o Estado de influências provenientes do campo religioso e impede confusão entre os campos religioso e secular. Assim, a laicidade não seria o mesmo que laicismo, que envolve hostilidade entre as esferas. Uma educação que privilegiasse a história das religiões permitiria que os alunos, com as informações provenientes das aulas, fizessem suas próprias escolhas, além de ser condizente com uma noção de respeito à pluralidade e com a noção de autonomia da educação. A confusão entre Estado e religião criaria constrangimentos e discriminaria indevidamente crianças e adolescentes.

A relatoria da ADI n. 4439 foi do Ministro Luís Roberto Barroso, que votou pela procedência da ação. Na visão de Barroso, “somente o modelo não confessional de ensino religioso nas escolas públicas é capaz de se compatibilizar com o princípio da laicidade estatal. Nessa modalidade, a disciplina consiste na exposição, neutra e objetiva, das doutrinas, práticas, história e dimensões sociais das diferentes religiões (incluindo posições não religiosas), e é ministrada por professores regulares da rede pública de ensino, e não por pessoas vinculadas às confissões religiosas”.11

Barroso entendeu que a relação entre laicidade estatal e ensino religioso é de conciliação necessária, o que afastaria a possibilidade de ensino religioso confessional ou interconfessional. A simples presença do ensino religioso em escolas públicas seria já uma cláusula constitucional de exceção ou de limitação da laicidade, por aproximar os planos estatal e religioso. A laicidade teria três dimensões: institucional (veda arranjos políticos entre Estado e religião); pessoal (impede que representantes das religiões sejam admitidos como agentes públicos); e simbólica (proíbe que os símbolos adotados pelo Estado constituam símbolos de identificação de religiões). A permissão de ensino religioso confessional ou interconfessional ofenderia a dimensão simbólica da laicidade, uma vez que seria inevitável a identificação institucional entre o Estado e as confissões. Ainda, deveria o Estado obedecer ao princípio da neutralidade religiosa, que impede que o Estado “(i) favoreça, promova ou subvencione religiões ou posições não-religiosas (neutralidade como não preferência); (ii) obstaculize, discrimine ou embarace religiões ou posições não-religiosas (neutralidade como não embaraço); e (iii) tenha a sua atuação orientada ou condicionada por religiões ou posições não-religiosas (neutralidade como não interferência).” Um ensino que privilegia uma crença é marcado pela discriminação e desprestígio das crenças minoritárias e, com isso, pela quebra com a neutralidade estatal nesse âmbito religioso.12

O último argumento defendido pelo relator é o da garantia de liberdade religiosa. Quando a escola cria um ambiente incapaz de assegurar a liberdade religiosa dos alunos que professam crenças não representadas nas aulas, ela viola essa garantia. Barroso considera a legitimidade dessa leitura observando a audiência pública realizada no âmbito da ação, em que 23 dos 31 participantes defenderam a procedência da ação, sendo que 8 das 12 entidades religiosas presentes defenderam a procedência. A proposta seria incompatível com a laicidade estatal, a liberdade religiosa e a igualdade, violaria a neutralidade e privilegiaria as religiões e igrejas majoritárias, com maior capacidade de organização e disponibilidade de recursos.13

Seguiram o entendimento do relator os ministros Rosa Weber, Luiz Fux, Marco Aurélio e Celso de Mello. Este último julgou possível o controle pelo STF de atos em esfera internacional, a exemplo do acordo bilateral entre Brasil e a Santa Sé. O decano entendeu que a intolerância religiosa não é compatível com um regime democrático, que tem como uma de suas características essenciais o pluralismo e a diversidade de visões de mundo. “Resulta claro, pois, que o tratamento constitucional dispensado, entre outras prerrogativas fundamentais da pessoa, à liberdade religiosa deslegitima qualquer medida individual ou governamental de intolerância e de desrespeito ao princípio básico que consagra o pluralismo de ideias.” 14

Celso de Mello cita a Conferência Geral da UNESCO (“Declaração de Princípios sobre a Tolerância”), que estabelece a tolerância como “harmonia na diferença” e como suporte dos direitos humanos e do pluralismo, da democracia e do Estado de Direito. A laicidade impõe a necessidade de uma neutralidade axiológica do Estado em matéria confessional para preservar a integridade do direito fundamental à liberdade religiosa. O Estado laico não pode ter preferências de ordem confessional ou interferir na esfera das escolhas religiosas das pessoas. Mello frisou ainda a função contramajoritária do STF, com o dever de proteção das minorias, inclusive as religiosas. “O pensamento religioso, ainda que ostente caráter hegemônico no seio da coletividade, não está acima da Constituição e das leis da República, pois o Estado laico não privilegia – assim como não persegue nem restringe – qualquer manifestação de religiosidade ou qualquer expressão de fé religiosa”.15

A dissidência foi aberta pelo Ministro Alexandre de Moraes e acompanhada por Edson Fachin, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Cármen Lúcia. Para Moraes, a ação alcança o campo da liberdade de expressão de pensamento sob a luz da tolerância e diversidade de opiniões, para além da complementariedade do Estado laico e da liberdade de crença. Na visão do julgador, a ação pretende “transformar essa correta tolerância e defesa da diversidade de opiniões em sala de aula, defendida para todas as demais manifestações de pensamento, em censura prévia à livre manifestação de concepções religiosas em sala de aula, mesmo em disciplinas com matrícula facultativa, transformando o ensino religioso em uma disciplina neutra com conteúdo imposto pelo Estado em desrespeito à liberdade religiosa”.16

Moraes compreende que não é possível confundir Estado Confessional com um Estado laico que garanta ensino religioso ministrado de acordo com os princípios da confissão religiosa do aluno. Afastar a possibilidade seria um “dirigismo estatal” e uma “verdadeira censura à liberdade religiosa”. Entende, ainda, que o fato de a Constituição determinar que o ensino religioso é de frequência facultativa não condiz com a interpretação de que ele deve estar limitado, de maneira descritiva e neutra, a princípios gerais das crenças. O inter-relacionamento e a complementariedade entre Estado e religião estariam expressos com o preâmbulo constitucional. Como a matrícula é facultativa, não se trataria de proselitismo religioso, pois o aluno em tese já professaria a crença objeto da disciplina. A neutralidade não seria possível no ensino da disciplina, pois ela é marcada por dogmas de fé. Ao Estado caberia estabelecer regras administrativas gerais para a realização de parcerias voluntárias sem transferência de recursos financeiros, em regime de cooperação mútua com as confissões religiosas que demonstrarem interesse. Ademais, não vislumbrou ofensa constitucional no caso.17

No mesmo sentido, Fachin defendeu que a dimensão religiosa não coincide apenas com a espacialidade da vida privada. Para o Ministro, as razões religiosas não podem justificar práticas públicas, mas a religião não estaria tampouco restrita à consciência. Até mesmo a neutralidade do Estado enquanto expectativa normativa de um princípio da laicidade estaria sujeita ao diálogo, ao debate e ao aprendizado, processo integrante do direito à educação. Conclui que o ensino religioso pode ser confessional, mas não obrigatório.18 Lewandowski julgou que autorizar um ensino confessional ou interconfessional nas escolas públicas não ofende o dever de neutralidade do Estado, ainda que existam confissões predominantes, “porque um dos propósitos da educação é justamente fornecer aos alunos o conhecimento necessário à compreensão dos valores e do papel que a religião exerce no mundo”.19

O “voto de minerva” coube à presidenta Cármen Lúcia Antunes Rocha, que acompanhou a dissidência e, com isso, garantiu a permissão do ensino religioso confessional nas escolas públicas brasileiras. A ministra argumentou que as leis brasileiras não autorizam o proselitismo e o catequismo nas escolas, mas disse não ver proibição a um ensino religioso orientado por princípios de uma denominação específica. Os ministros, segundo ela, estariam de acordo que o Brasil é um Estado laico com liberdade de crença, que dá importância à tolerância, à pluralidade de ideias e à garantia da liberdade de expressão e de manifestação (BBC BRASIL, 2017).

As críticas à decisão surgiram quase que imediatamente, assim como reflexões esclarecedoras sobre os desdobramentos da decisão (WEINGARTNER NETO, 2016). Para Renan Quinalha, a decisão da ADI n. 4439 permite que as religiões se apropriem do espaço público para propagar sua fé. Alexandre Melo Franco Bahia questiona a possibilidade fática de um ensino religioso “confessional pluralista” condizer com um Estado laico. Márcio Sotelo Felippe critica o próprio STF, entendendo que este “julga ao sabor de injunções políticas ou para agradar setores da opinião pública” (CARTA CAPITAL, 2017). Luiz Antônio Cunha, membro do Observatório da Laicidade na Educação, vê a decisão como uma vitória da Igreja Católica, que teria mais recursos e estrutura para formar professores e seria uma das maiores interessadas na derrota da ADI. Para Cunha, a visão reforçada pela decisão foi a de que o cidadão deve ser religioso para ter uma educação completa, pois ela faz parte da formação básica – uma impropriedade do ponto de vista pedagógico e político. “Muita gente pensa que a laicidade do Estado é sinônimo de um Estado inter-religioso, de um Estado que favorece todas as religiões. É uma ideia falsa.” (CARTA CAPITAL, 2017).

Considerações finais

Como foi possível observar ao longo do estudo, ainda que se afirme laico, o Estado brasileiro passa por confusões e interferências de elementos religiosos na esfera pública. É o que se denominou neste estudo de “laicidade à brasileira”: formalmente tem-se uma separação entre Estado e religiões, com a possibilidade de colaboração para fins de interesse público; na prática, elementos religiosos permeiam espaços públicos, físicos ou simbólicos, assim como adentram no político e no jurídico, alcançando até mesmo a educação pública.

O art. 19, I, da Constituição institui o princípio da laicidade estatal, mediante separação entre Estado e confissões religiosas, de não interferência do Estado no funcionamento dos cultos religiosos e igrejas. Simultaneamente, estabelece ao Estado o dever de não manter relações de dependência ou aliança com as religiões, exceto para colaboração de interesse público. Aliada à liberdade de consciência e de crença, expressa no art. 5º, VI, da Constituição, tem-se o contorno exato da laicidade: separação entre sacro e profano e respeito à pluralidade de religiões presentes em sociedade. É um dever-ser condizente com um Estado democrático de Direito comprometido com a pluralidade e a multiplicidade de religiões, mas a realidade é complexa.

O preâmbulo constitucional, momento em que se expressa o projeto político inaugurado pela Constituição, é desde logo marcado pela influência religiosa – ainda que não tenha força de norma. A questão da proteção de Deus no preâmbulo não mudaria se tivesse força normativa, pois ela é, simultaneamente, um marco simbólico e um critério interpretativo de todo o sistema jurídico. Assim, o preâmbulo retrata o sujeito constitucional: católico e excludente no que diz respeito à pluralidade religiosa, ainda que comprometido com a separação entre Estado e igreja.

A prática dessa simbologia é evidenciada no cotidiano do país: o dinheiro leva a prece, os espaços públicos levam o crucifixo. A inclusão da expressão “Deus seja louvado” não tem autorização legal e, ainda assim, não foi retirada das cédulas. O princípio da legalidade administrativa estabelece que a administração pública pode fazer aquilo que está previsto em lei – o que não foi impeditivo para inclusão e manutenção de frase de conteúdo religioso na moeda brasileira. Quanto ao crucifixo, ainda mais grave é a violação da pluralidade. A expressão “Deus seja louvado” pode se referir a várias religiões monoteístas e a todas as denominações cristãs; o crucifixo é um artefato católico, dotado de uma simbologia muito forte. A manutenção desses adornos em locais públicos exclui a possibilidade de pluralidade religiosa.

Diante dessa realidade, não é de se surpreender uma decisão da Suprema Corte do país no sentido de permitir que o ensino religioso seja confessional, ou seja, um ensino religioso restrito a uma comunidade religiosa específica, com suas práticas e dogmas. A religiosidade presente na esfera pública é tratada como um mero reflexo cultural, de uma tradição social que justifica sua presença em esferas nas quais não deveria adentrar a crença. Quando Alexandre de Moraes afirma que os alunos que virão a cursar a disciplina facultativa de ensino religioso são em geral pessoas que já professam uma religião ele esquece que são, também, pessoas de seis a quatorze anos, ainda em formação e sugestionáveis. Se praticam uma religião, em geral é por influência dos pais, e não por escolha própria. Ignorar que esses jovens necessitam mais de conhecimento sobre a pluralidade de religiões e o contexto social é retirar-lhes a possibilidade de conviver com a diferença. É também retirar a possibilidade de uma sociedade mais democrática.

A decisão do Supremo Tribunal Federal não choca, mas decepciona. É necessário que a Corte atue em consonância com sua função contramajoritária, em defesa das minorias e na garantia do Estado democrático de Direito tal como ele se compromete em seu preâmbulo, com os valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos. A redução das desigualdades sociais e a eliminação dos preconceitos passa, necessariamente, pelo conhecimento e aceitação do diferente. Do contrário, o Brasil continuará vivenciando situações de violência e intolerância religiosa, especialmente contra as religiões de matriz africana.20 O ensino religioso confessional apenas contribui para acentuar essa realidade e para inviabilizar um verdadeiro direito fundamental à liberdade de crença.

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1 Doutora e Mestra em Direito do Estado pela Universidade Federal do Paraná. Bolsista pela CAPES até 2019. Pesquisadora voluntária do Núcleo de Investigações Constitucionais (NINC-UFPR), e do Grupo de Pesquisa Política por/de/para Mulheres (UFPR), do qual é Diretora Executiva. Graduada em Direito pela UFPR (2013). Especialista em Direito Administrativo no Instituto Romeu Felipe Bacellar (2014). Pesquisadora na área de Direito Constitucional e Eleitoral, com ênfase em erosão democrática, reformas constitucionais e relações de gênero. Professora Substituta de Teoria do Estado da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). E-mail: leticiakreuz@gmail.com.

2 Doutora e Mestra em Ciências Jurídicas e Políticas, Universidad de Salamanca, Espanha. Estágio Pós-doutoral em Direito Público Econômico (PUC-PR) e em Direito Constitucional (Univ. Externado, Colômbia). Integrante da Associação Internacional de Direito Administrativo (AIDA); da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (ABRADEP) e do Instituto Brasileiro de Direito Parlamentar (PARLA). Professora visitante na National Law University (Índia) e na Universidad de El Salvador. Professora de direito constitucional, eleitoral, parlamentar e de direitos humanos em diversos cursos de especialização, mestrado e doutorado no Brasil e na América Latina. E-mail: anaclaudiasantano@yahoo.com.br.

3 EMENTA: “CONSTITUCIONAL. CONSTITUIÇÃO: PREÂMBULO. NORMAS CENTRAIS. Constituição do Acre. I. - Normas centrais da Constituição Federal: essas normas são de reprodução obrigatória na Constituição do Estado-membro, mesmo porque, reproduzidas, ou não, incidirão sobre a ordem local. Reclamações 370-MT e 383-SP (RTJ 147/404). II. - Preâmbulo da Constituição: não constitui norma central. Invocação da proteção de Deus: não se trata de norma de reprodução obrigatória na Constituição estadual, não tendo força normativa. III. - Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente”. (ADI 2076, Relator(a): Min. CARLOS VELLOSO, Tribunal Pleno, julgado em 15/08/2002, DJ 08-08-2003 PP-00086 EMENT VOL-02118-01 PP-00218)

4 Os membros da Assembleia Constituinte foram eleitos por sufrágio direto em cada um dos estados. O grupo contava com muitos militares, como Deodoro da Fonseca, Floriano Peixoto, Eduardo Wandekolk, Benjamin Constant – mas também com outros nomes, civis, como Joaquim Saldanha Marinho, Prudente de Morais, Epitácio Pessoa, Nilo Peçanha. Os anais da Assembleia Constituinte estão disponíveis em: http://bd.camara.leg.br/bd/handle/bd camara/13616. Acesso em 28 mai. 2018.

5 Doutrinas abrangentes são aquelas que buscam expressar compreensões de mundo, organizando valores e princípios em torno de uma lógica de crenças e fé, e que, com isso, adquirem seguidores que acreditam na veracidade de seus princípios.

6 O Acordo entre o Governo da República Federativa do Brasil e a Santa Sé relativo ao Estatuto Jurídico da Igreja Católica no Brasil, firmado na Cidade do Vaticano, em 13 de novembro de 2008, será analisado mais detalhadamente na sequência desta pesquisa.

7 Disponível em: http://s.conjur.com.br/dl/deus-seja-louvado-justica-federal.pdf. Acesso em 28 mai. 2018.

8 Disponível em: http://s.conjur.com.br/dl/contestacao-agu-deus-seja-louvado.pdf. Acesso em 28 mai. 2018.

10 A Procuradoria-Geral da República apresenta dados condensados por Débora Diniz e Vanessa Carrião de que o ensino religioso é confessional no Acre, Bahia, Ceará e Rio de Janeiro; é interconfessional em Alagoas, Amapá, Amazonas, Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Rondônia, Roraima, Santa Catarina, Sergipe e Tocantins; apenas no estado de São Paulo o ensino seria secular, focado na história das religiões (DINIZ; CARRIÃO, 2010. p. 45-46).

11 ADI 4439. Voto do Ministro Luís Roberto Barroso. Disponível em: https://d2f17dr7ourrh3.cloudfront.net/wp-content/uploads/2017/08/VALEESTEADI-4439-2-Ensino-religioso-Voto-30-ago2017-VF-22.pdf. Acesso em 28 mai. 2018.

12 ADI 4439. Voto do Ministro Luís Roberto Barroso. Disponível em: https://d2f17dr7ourrh3.cloudfront.net/wp-content/uploads/2017/08/VALEESTEADI-4439-2-Ensino-religioso-Voto-30-ago2017-VF-22.pdf. Acesso em 28 mai. 2018.

13 ADI 4439. Voto do Ministro Luís Roberto Barroso. Disponível em: https://d2f17dr7ourrh3.cloudfront.net/wp-content/uploads/2017/08/VALEESTEADI-4439-2-Ensino-religioso-Voto-30-ago2017-VF-22.pdf. Acesso em 28 mai. 2018.

14 ADI 4439. Voto do Ministro Celso de Mello. Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADI4439mCM.pdf. Acesso em 28 mai. 2018.

15 ADI 4439. Voto do Ministro Celso de Mello. Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADI4439mCM.pdf. Acesso em 28 mai. 2018.

16 ADI 4439. Voto do Ministro Alexandre de Moraes. Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADI4439AM.pdf. Acesso em 28 mai. 2018.

17 ADI 4439. Voto do Ministro Alexandre de Moraes. Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADI4439AM.pdf. Acesso em 28 mai. 2018.

18 ADI 4439. Voto do Ministro Edson Fachin. Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/VotoFachinEnsinoReligioso.pdf. Acesso em 28 mai. 2018.

19 ADI 4439. Voto do Ministro Ricardo Lewandowski. Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADI4439mRL.pdf. Acesso em 28 mai. 2018.

20 Em setembro de 2017, poucos dias antes da decisão do Supremo Tribunal Federal em relação à ADI n. 4439, fiéis evangélicos atacaram terreiros de Candomblé na Baixada Fluminense, Rio de Janeiro, obrigando os adeptos a destruírem objetos e símbolos sagrados. (D’ANGELO, 2017).