https://doi.org/10.18593/ejjl.20099

Do esquecimento à desindexação: a evolução internacional da controvérsia sobre o direito ao esquecimento e as limitações da jurisprudência brasileira

From forgetfulness to the deindexation: the internacional development of the controversy about the right to be forgotten e and the limitation of brazilian jurisprudence

José Ribas Vieira1

Mário Cesar da Silva Andrade2

Vitor Jorge Gonçalves Vasconcelos3

Resumo: O presente artigo analisa a evolução do direito ao esquecimento a partir de julgamentos paradigmáticos, estrangeiros e nacionais, especialmente, no reconhecimento do chamado direito à desindexação. Com esse novo direito supera-se algumas das dificuldades práticas em impedir a veiculação midiática de conteúdo ofensivo na internet. Adotando como fio condutor os julgamentos dos casos Lebach, ocorrido na Alemanha, e Mario Costeja González v. Google, ocorrido na Espanha, busca-se analisar criticamente a formação do entendimento jurisprudencial brasileiro sobre o direito ao esquecimento, a partir do entendimento firmado no julgamento do caso Aída Curi pelo Superior Tribunal de Justiça, bem como de suas revisões e limitações. Metodologicamente, a pesquisa qualitativa, de viés compreensivo e crítico-reflexivo, vale-se de fontes doutrinárias, legislativas e jurisprudenciais, com destaque para as decisões do Superior Tribunal de Justiça envolvendo o direito ao esquecimento. Como referencial teórico, são adotadas as reflexões doutrinárias sobre o direito ao esquecimento, especialmente, nas formulações de Jorge Manrique, Stefano Rodotà e Francisco Javier Leturia Infante. Em conclusão, aponta-se como a jurisprudência brasileira ainda não assimilou plenamente o direito à desindexação. Apesar de já ter reconhecido a estratégia técnica da desindexação, ainda não avançou na sua dimensão material, no esclarecimento dos conteúdos que fazem jus à restrição dos buscadores. Enfrentar esse desafio pode ser o contributo brasileiro à evolução internacional do direito ao esquecimento em novos termos.

Palavras-chave: Direito ao esquecimento. Direito à desindexação. Direitos fundamentais. Superior Tribunal de Justiça.

Abstract: The present essay analyses the development of the right to be forgotten starting from paradigmatic judgments, foreigners and nationals in kind, especially, on the recognition of the called right to be deindexed. Adopting as our underlying theme the jurisprudence in what concerns Lebach´s case, which took place in Germany, as well as Mario Costeja González v. Google, which occued in Spain, we seek to analyse critically how has been developed the brazilian jurisprudence regarding the right to be forgotten, through the understanding that was established by the Brazilian Court in the matter of the Aída Curi´s case, along with it´s revisions and limitations. Concerning the method, this research is qualitative, comprehensive and critical-reflexive in nature, adopting academic sources such as jurisprudence, with emphasis for the Brazilian Suprme Court of Justice´s decisions related to the right to be forgotten. As theoretical framework, were adopted a serie of doctrinial reflexions, especially, the opinion of Jorge Manrique, Stefano Rodotà and Francisco Javier Leturia Infant. In conclusion, it is shown how the brazilian jurisprudence has not still absorbed completely the right to be forgotten. Despite the fact that the brazilian jurisprudence has already approved the tecnical strategy of the deindexation, has not still progressed in what concerns the material dimension, that is, on the clarification of the contents which can limit viewers. Overcoming this challenge may be the brazilian contribution to the international development regarding a new perspective to the controversy of the right to be forgotten.

Keywords: Right to be forgotten. Right to be deindexed. Fundamental rights. Brazilian Suprme Court of Justice.

Recebido em 12 de janeiro de 2019

Avaliado em 15 de junho de 2019 (AVALIADOR A)

Avaliado em 24 de junho de 2019 (AVALIADOR B)

Avaliado em 18 de outubro de 2019 (AVALIADOR C)

Aceito em 22 de outubro de 2019

Introdução

Na atual sociedade da informação, qualificada pela historicamente incomparável capacidade de armazenamento e entrecruzamento de dados, proporcionada pelos recursos tecnológicos da computação e da rede mundial de computadores, a gestão da informação assume um papel central. Qualquer ato ou opinião registrada por escrito ou vídeo pode ser prontamente difundido na internet, com alcance internacional e consequências, praticamente, irreversíveis. Todos os comportamentos individuais passam a ser processados, categorizados e entrecruzados a partir de algoritmos que filtram e direcionam as informações acessíveis a todos, selecionando interesses, ofertas e publicidades.

Nessa linha, Castells (1999) denomina de sociedade informacional, essa sociabilidade em que a informação adquiriu singular natureza de ativo econômico e social, servindo de base para as estratégias empresariais, como a elaboração e direcionamento de propagandas.4 Pesquisa realizada nos Estados Unidos apurou que cerca de 35% das empresas rejeitaram um candidato à vaga de emprego em razão de informações coletadas em suas redes sociais (ALCÓN, 2016, p. 247).

Porém, a personalidade humana não é um fenômeno estático, sendo comuns mudanças de valores, visões de mundo e gostos ao longo da vida de um indivíduo, fazendo com que atos e manifestações passadas não mais representem ou mesmo se oponham ao pensamento atual do agente. Assim, a gestão das informações sobre fatos pregressos da vida torna-se uma preocupação para todos, inclusive, por seu potencial impacto sobre a possibilidade de cada um se reinventar e se redefinir socialmente. Nesse contexto, discute-se o direito ao esquecimento.

A tese de um direito ao esquecimento não é propriamente nova, entretanto, sua discussão no Brasil ganhou destaque após a edição do Enunciado n. 531, da VI Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal (CJF): “ENUNCIADO 531 – A tutela da dignidade da pessoa humana na sociedade da informação inclui o direito ao esquecimento.” (BRASIL, 2016). Essa orientação doutrinária de interpretação do Código Civil elenca o direito de ser esquecido entre os direitos de personalidade. O tema ganhou, ainda maior força, em 2013, após aparecer pela primeira vez no Superior Tribunal de Justiça (STJ), quando do julgamento pela 4ª Turma de dois recursos especiais envolvendo o tema. Ambos os recursos foram manejados contra produções da TV Globo, que tinham como objeto reportagens e dramatizações sobre dois casos criminais históricos e de repercussão nacional: a Chacina da Candelária, de 1993 e o Caso Aída Curi, de 1958.

Em consequência, parcela da comunidade jurídica brasileira tem se dedicado à delimitação do conteúdo normativo desse direito, buscando definir seu âmbito de proteção e suas repercussões para a sistemática de direitos fundamentais na ordem jurídica nacional. As incertezas e controvérsias em torno desse novo direito justificaram a promoção da vigésima segunda audiência pública convocada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Em 12 de junho de 2017, o STF teve a oportunidade de ouvir 16 (dezesseis) expositores sobre o direito ao esquecimento, a fim de angariar subsídios para o julgamento do Recurso Extraordinário (RE) n. 1.010.606/RJ, interposto por familiares de Aída Curi, de julgamento ainda pendente (BRASIL, 2017).

A presente pesquisa pretende analisar como se formou o atual entendimento sobre o conteúdo do direito ao esquecimento e de seu desenvolvimento para o chamado direito à desindexação. Busca-se examinar criticamente o histórico da controvérsia na construção desse direito, em especial, como a jurisprudência nacional e estrangeira contribuiu para sua delimitação e atual compreensão.

A presente pesquisa qualitativa, de viés jurídico-compreensivo, vale-se da análise bibliográfica de fontes doutrinárias, legislativas e jurisprudenciais, com destaque para acórdãos de tribunais superiores brasileiros (STJ e STF) e estrangeiros. Metodologicamente, a pesquisa busca recuperar as continuidades e descontinuidades no desenvolvimento jurisprudencial da controvérsia sobre o direito ao esquecimento, a partir da análise crítica e relacional dos julgamentos de casos paradigmáticos, brasileiros e estrangeiros, para a delimitação desse alegado novo direito fundamental.

Primeiramente, analisa-se os contornos do clássico leading case estrangeiro sobre o direito ao esquecimento, o julgamento do caso alemão Lebach. Em seguida, adentra-se na análise do principal precedente estrangeiro sobre a evolução da pretensão jurídica de ser esquecido (ou “deixado em paz”) para além do direito ao esquecimento original, passando a assumir o caráter específico de um direito à desindexação.5 A seção seguinte é dedicada a análise do leading case brasileiro sobre a controvérsia, o caso objeto do Recurso Extraordinário (RE) n. 1.010.606/RJ, através do qual a questão da aplicabilidade do direito ao esquecimento chegou pela primeira vez ao Supremo Tribunal Federal (STF). Por fim, a seção posterior, investiga como esses casos paradigmáticos nacional e estrangeiros influenciaram a compreensão corrente na jurisprudência brasileira do direito ao esquecimento, a fim de identificar seus contornos e limitações, e, consequentemente, o estado da controvérsia no Brasil.

1 Histórico internacional da controvérsia: precedentes de uma evolução

A evolução do direito ao esquecimento e a difusão de seu reconhecimento em diferentes ordens constitucionais, incluindo a brasileira, pode ser reconstruída com certa precisão, dado a repercussão de leading cases internacionalmente conhecidos, que serviram de balizas para o tratamento dessa nova manifestação de um direito fundamental.

A recuperação desse percurso junto aos julgamentos internacionalmente mais significativos presta-se, ainda, à melhor compreensão de como as insuficiências do direito ao esquecimento, como originalmente reconhecido, levou à necessidade de evolução para a identificação do chamado direito à desindexação, mais adequado às novas tecnologias do mundo virtual.

1.1 Caso Lebach: colisão de direitos fundamentais

O Caso Lebach tornou-se célebre pelos direitos fundamentais em colisão, sendo recorrente sua lembrança em julgamentos que envolvam demandas de restrição da liberdade de imprensa em nome de direitos individuais. A recuperação do famoso caso alemão ganhou novas abordagens, com o desenvolvimento teórico do direito ao esquecimento, figurando, inclusive, na fundamentação apresentada pelo Min. Luis Felipe Salomão, do STJ, ao julgar o caso Aída Curi (BRASIL, 2013a).

Dada sua época de ocorrência, o fim dos anos 60 do sec. XX, o caso Lebach não envolveu informações veiculadas na internet, em sites, blogs ou redes sociais, porém, consistiu em importante marco sobre a colisão de direitos fundamentais atualmente presentes nos casos de direito ao esquecimento, como as liberdades de expressão e de imprensa, e os direitos à honra, à imagem, à privacidade e à intimidade.

Em 1969, na então República Federal da Alemanha, um grupo de pessoas invadviu um depósito de munição do Exército, próximo à pequena cidade de Lebach, a fim de roubar armas e munições. Durante a invasão, quatro soldados foram mortos, ficando outro gravemente ferido. O crime causou grande comoção popular, contanto com intensa cobertura midiática, em razão de os assassinatos terem sido considerados brutais. Já no ano seguinte, os dois principais acusados foram condenados à prisão perpétua, sendo um terceiro réu condenado a seis anos de reclusão (SCHWABE, 2005).

Quatro anos depois dos fatos, o canal de televisão ZDF (Zweites Deutsches Fernsehen) produziu um documentário sobre o caso, anunciando sua transmissão para horas antes da soltura do terceiro condenado, em liberdade condicional. A produção apresentaria os nomes e as fotos de todos os acusados, além de encenar uma reconstituição do ocorrido e tratar das relações homofetivas entre os condenados. Alegando prejuízo à sua possibiidade de ressocialização, o terceiro preso buscou, judicialmente, medida liminar contra a veiculação da produção televisiva, sem sucesso (SCHWABE, 2005, p. 136).

Após decisões de improcedência no Tribunal Estadual e no Tribunal Superior Estadual, o caso chegou ao Tribunal Constitucional Federal (Bundesverfassungsgericht). Ressalte-se que esse caso foi julgado duas vezes pela Corte Constitucional. A primeira, em 1973, e a segunda (caso chamado de Lebach II), em 1999. Contudo, além de envolverem emissoras distintas, as sentenças também foram opostas (RODRIGUES JÚNIOR, 2013).Na decisão de 1973, o Tribunal Constitucional decidiu pela proibição da veiculação do programa, basicamente, sob dois fundamentos: possibilidade de comprometimento da ressocialização do apenado;6 e ausência de interesse público no fato, haja vista o tempo decorrido. Assim, os direitos de personalidade prevaleceram sobre a liberdade de imprensa (MALDONADO, 2017, p. 170). Segundo Rodrigues Júnior (2013):

3) No Caso Lebach-1, o Tribunal Constitucional preservou o direito geral da personalidade porque ali havia uma lesão capaz de associar, de modo permanente, o criminoso a essa condição. Tratou-se, portanto, de uma questão de intensidade do ato que interferiu no direito ao desenvolvimento da personalidade. Nos termos do acórdão, é de se lembrar que o mero fato de ter cumprido a pena de prisão não significa que o criminoso adquiriu o “direito a ser deixado em paz” (ou, mais literalmente, “direito a ser deixado só”).

Na verdade, o TCF buscou harmonizar os direitos colidentes, decidindo que a ZDF não poderia transmitir o documentário, caso fossem apresentados o nome ou a imagem do apenado (MALDONADO, 2017).

Em 1999, uma outra emissora alemã (SAT 1) decidiu produzir uma série de documentários a respeito de crimes históricos, incluindo o caso Lebach, no entanto, diferentemente da ocorrência anterior, a emissora substituiu os nomes de alguns partícipes do crime, além de pretender uma abordagem mais objetiva, sem apelos emocionais. Mais uma vez os envolvidos no crime pleitearam, judicialmente, a proibição da veiculação do programa, valendo-se de argumentos semelhantes aos que embasaram a fundamentação do primeiro julgado (MALDONADO, 2017).

Ambos os casos, o de 1973 e o de 1999, possuem uma relação muito próxima no que diz respeito ao conflito entre direitos fundamentais, no caso, à liberdade de expressão e de imprensa e à imagem e honra. As duas produções televisivas tinham vieses bem distintos, a primeira, com teor jornalístico e, temporalmente, mais próxima dos fatos, e a segunda, de caráter mais documental e historiográfico, com teor mais retrospectivo, dado o maior distanciamento da data dos fatos cobertos. Logo, a colisão de direitos fundamentais adquiriu intensidades diferentes daquelas presentes em 1973 (MALDONADO, 2017).

Em 1999, o Tribunal assumiu postura contrária à da decisão de 1973, fundamentando-se, especialmente, no tempo decorrido do crime, ao afirmar que não ocorreria qualquer problema à ressocialização dos condenados. As liberdades de imprensa, informação e expressão prevalecem sobre os direitos de personalidade. Importa salientar que, em ambos os casos, não houve pagamento de verba indenizatória, mas apenas a vedação à veiculação das produções televisivas (MALDONADO, 2017, p. 176).

A recuperação do Caso Lebach evidencia os contornos iniciais do direito ao esquecimento, permitindo, ainda, identificar como os elementos do caso alemão influenciaram, determinantemente, a recepção jurisprudencial brasileira dessa nova manifestação dos direitos fundamentais. O caso permite identificar, inclusive, as limitações dessa recepção, que são analisadas mais adiante.

Contudo, o direito ao esquecimento desenvolveu-se para além dos limites, exemplificados no Caso Lebach, até mesmo em decorrência do surgimento de novas tecnologias, que potencializaram e pulverizaram a produção e difusão de conteúdo midiático. Internacionalmente, deve-se apontar como marco de viragem da compreensão jurídica sobre o direito ao esquecimento o caso do espanhol Mario Costeja González.

1.2 Caso Mario Costeja González: para além do esquecimento

Em 13 de maio de 2014, o Tribunal de Justiça da União Europeia decidiu o caso Google Spain SL e Google Inc. v. Agencia Española de Protección de Datos (AEPD) e Mario Costeja González (processo C-131/12) (UNIÃO EUROPEIA, 2014).

O autor da ação, o advogado espanhol Mario Costeja González, requeria à empresa Google que seu nome fosse removido de resultados do buscador associados a um débito já extinto com a seguridade social da Espanha (UNIÃO EUROPEIA, 2014).

Em 1998, o jornal catalão La Vanguardia publicou, nos dias 10 de janeiro e 09 de março, dois editais de leilão de um imóvel de Mario Costeja, que estava indo à hasta pública devido ao inadimplemento tributário do proprietário. A divulgação desses editais permaneceu mesmo após a finalização da execução fiscal, já que o jornal digitaliza suas edições diárias e as disponibiliza na internet. Ao buscar o nome de Mario Costeja no buscador7 Google, os primeiros resultados reportados eram os referentes ao débito fiscal. Essa permanente exposição acabava por manter viva a relação do nome do autor com o débito, impactando, ininterruptamente, em sua imagem pública (UNIÃO EUROPEIA, 2014).

Como primeira medida, em novembro de 2009, o autor pediu ao jornal a remoção ou alteração da informação, alegando a extinção do débito há mais de 10 anos, entretanto, o periódico negou o pedido, afirmando tratar-se de publicação oficial. Meses depois, o autor realizou a mesma solicitação à Google Spain. A empresa submeteu o pedido à sede norte-americana da companhia, sediada na Califórnia (EUA), que manteve o conteúdo (RODRIGUES JÚNIOR, 2014).

Diante da segunda negativa, em 05 de março de 2010, Mario Costeja apresentou reclamação à Agência Espanhola de Proteção de Dados (AEPD), contra Google Spain e Google Inc. (UNIÃO EUROPEIA, 2014). Em decisão de 30 de julho de 2010, a AEPD indeferiu a reclamação em relação ao conteúdo publicado, por se tratar de publicação oficial, mas deferiu quanto à responsabilidade do buscador sobre a recuperação dos dados pessoais do reclamante, determinando que a busca pelo nome do autor não levasse a resultados relacionados com o extinto débito fiscal (PINHEIRO, 2016, p. 84).

Google Spain e Google Inc. apresentaram recursos à corte constitucional da Espanha, a Audiência Nacional, sob a alegação de que as informações são processadas nos Estados Unidos, logo, fora da jurisdição espanhola. Contudo, essa preliminar foi rejeitada. A Audiência entendeu que controvérsias referentes à indexação,8 localização e disponibilização de informações na internet através de páginas virtuais de terceiros deveriam ser analisadas com base na Diretiva 95/46-CE, que tratava da proteção de dados pessoais no âmbito da Comunidade Europeia, atraindo, assim, a competência do Tribunal de Justiça da União Europeia9 (PINHEIRO, 2016, p. 84).

Em maio de 2014, o Tribunal decidiu favoravelmente ao advogado espanhol, com base em três pontos principais: aplicabilidade do ordenamento jurídico do território em que as informações são processadas; objeto da atividade dos buscadores, que inclui o processamento de dados pessoais; e o direito individual sobre dados pessoais (PINHEIRO, 2016, p. 86).

A Grande Seção do Tribunal entendeu que a exploração econômica de “espaços publicitários, de que se ocupa a Google Spain, constitui parte essencial da atividade comercial do grupo Google e pode ser considerada estreitamente ligada ao Google Search.” (UNIÃO EUROPEIA, 2014).

Por conseguinte, há que declarar que, ao explorar a Internet de forma automatizada, constante e sistemática, na busca das informações nela publicadas, o operador de um motor de busca ‘recolhe’ esses dados, que ‘recupera», «regista» [sic] e «organiza» posteriormente no âmbito dos seus programas de indexação, «conserva» nos seus servidores e, se for caso disso, «comunica» e «coloca à disposição» dos seus utilizadores, sob a forma de listas de resultados das suas pesquisas. Na medida em que estas operações estão explícita e incondicionalmente referidas no artigo 2.°, alínea b), da Diretiva 95/46, devem ser qualificadas de «tratamento» na aceção desta disposição, independentemente de o operador do motor de busca efetuar as mesmas operações também com outros tipos de informação e não as distinguir dos dados pessoais. (UNIÃO EUROPEIA, 2014).

Especificamente em relação ao item (3), o Tribunal reconheceu o direito subjetivo à tutela de dados pessoais em toda a Comunidade, fundamentando-se no Art. 12º, da Diretiva 95/46-CE, que previa que:

Os EstadosMembros garantirão às pessoas em causa o direito de obterem do responsável pelo tratamento:

[...]

b) Consoante o caso, a retificação, o apagamento ou o bloqueio dos dados cujo tratamento não cumpra o disposto na presente diretiva, nomeadamente devido ao caráter incompleto ou inexato desses dados; [...] (UNIÃO EUROPEIA, 1995).10

Segundo Manrique (2018, p. 170), o Tribunal europeu reconheceu um direito fundamental ao esquecimento, enquanto desdobramento do direito à proteção de dados pessoais e direito à autodeterminação informativa.

Com essa decisão, o Tribunal reconheceu o chamado direito à desindexação, ao permitir a restrição à recuperação de dados referentes a eventos passados. A decisão de 2014 foi paradigmática, ainda que não absolutamente inovadora,11 haja vista a existência de legislações e julgados anteriores contemplando a proteção de dados pessoais na internet, em sentido similar.12

Ainda que o caso de Mario Costeja tenha sido um marco definidor e funcionado, na prática, como leading case internacional, o Tribunal europeu amadureceu entendimento contido em duas decisões anteriores em casos levemente semelhantes. O primeiro foi o caso Bodil Lindqvist vs Åklagarkammaren i Jönköping (Case C-101/01), de 2003, ocorrido na Suécia, em que uma trabalhadora de uma igreja publicou em uma revista local relatos sobre sua paróquia, expondo, sem consentimento, dados pessoais de outros paroquianos, como nomes e números de telefone. O segundo foi caso Satakunnan Markkinapörssi and Satamedia vs Finland (Case C-73/07), em que “duas empresas privadas finlandesas publicaram a renda anual tributável e os ativos de cidadãos finlandeses, por meio impresso e por mensagens de celular.” (LUZ; WACHOWICZ, 2018, p. 584).

A decisão do Tribunal europeu pela condenação da Google baseou-se na responsabilidade decorrente da exploração econômica das buscas e dos resultados (LUZ; WACHOWICZ, 2018, p. 586-587). Se a empresa lucra com o serviço de busca, ela deve ser responsável pelos resultados exibidos aos usuários.

Interessante notar que os dados relacionados ao autor foram mantidos na internet, entretanto, foi proibido que o buscador da Google apontasse a informação indesejada após simples busca pelo nome do advogado espanhol. Essa restrição tem a potencialidade de modificar a percepção pública sobre o indivíduo em questão, impedindo que ela seja definida, prima facie, pelo evento passado.

Como ressalta Luz e Wachowicz (2018, p. 583), a decisão do caso espanhol mudou, inclusive, a política internacional da Google de atendimento a pedidos de exclusão de conteúdo. A empresa passou a disponibilizar um formulário para pedidos de supressão de resultados de busca, priorizando a análise extrajudicial e a comunicação direta com os pleiteantes.13 Segundo o relatório da Google Transparency Report (2017), desde a decisão do caso espanhol em 2014, a empresa recebeu cerca de 700.000 pedidos, no âmbito da União Europeia:

Desse enorme montante, 56% foram efetivamente concedidos, o que representa uma economia processual bastante relevante. Do número total de solicitantes, 88,6% eram pessoas não públicas. Dentre os sites com maior número de pedidos de desindexação de resultados de busca, constam o Facebook (46.018 solicitações), o Twitter (25.724 solicitações), o Google Plus (33.098 solicitações) e o Youtube (26.516 solicitações). (LUZ; WACHOWICZ, 2018, p. 587).

Porém, aponte-se que, no âmbito da União Europeia, não estão pacificados os limites e alcances do direito ao esquecimento ou à indexação, o que não foi plenamente elidido com a edição do Regulamento de Proteção de Dados. Por isso, para Infante (2016, p. 108), toda decisão sobre o direito ao esquecimento tende a ser polêmica e envolver diferentes matizes e particularidades do caso concreto, inclusive, em razão da alta mutabilidade tecnológica, a demandar uma análise caso a caso.

O caso Mario Costeja consagrou-se como marco do desenvolimento do direito ao esquecimento para o direito à desindexação, superando a necessidade de atender a improvável eliminação total de exclusão do conteúdo indesejado da internet. Com o foco na pretensão de desindexação, a pretensão de completude cede à pragmeticidade, privilegia-se dificultar o acesso, ao invés de se buscar a supressão do conteúdo. Nesse novo direito, não se busca, propriamente, que o conteúdo seja “esquecido”, mas sim que ele não se “lembrado”. Apesar da simplicidade da mudança, ela possui a potencialidade de alterar o julgamento de demandas semelhantes em todo o mundo, ao oferecer uma reposta mais eficaz, supressão dos resultados de buscas na internet, ainda que menos pretensiosa do que a supressão do próprio conteúdo ofensivo.

2 Leading case brasileiro: O Caso Aída Curi

No Brasil, em se tratando de direito ao esquecimento, um caso representou um marco doutrinário e jurisprudencial: o Caso Aída Curi, objeto do RE n. 1.010.606/RJ.

Sua história não envolve a disputa pela remoção de dados pessoais da internet, como atualmente tornou-se recorrente, mas de um conflito específico entre direitos fundamentais: a liberdade de imprensa e os direitos à honra e imagem. O respectivo processo tramitou em todas as instâncias judiciais e começou a adquirir expressividade midiática ao chegar ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob a relatoria do Min. Luis Felipe Salomão (BRASIL, 2013a).

O caso em tela é protagonizado pela família Curi contra a Rede Globo de Televisão, em razão do programa Linha Direta – Justiça (BRASIL, 2013a).

Em 1958, ocorreu o assassinato de Aída Curi, jovem de 18 anos, no bairro carioca de Copacabana. Ela foi arremessada do 12º andar do edifício Rio Nobre, após ser vítima de agressões físicas e violência sexual por dois rapazes, de 19 e 17 anos. O caso contou com grande cobertura midiática, sendo cercado de controvérsias em relação aos juízes, réus e testemunhas (BAYER, 2015).

Quarenta e nove anos depois, a Rede Globo de Televisão produziu uma série de episódios do programa Linha Direta – Justiça, que recordava e dramatizava crimes de grande repercussão popular no Brasil, sendo um deles dedicado ao Caso Aída Curi. Entretanto, os irmãos da vítima ajuizaram ação judicial contra a pretensão de exibição do programa televisivo, sob a alegação de que a rememoração do crime acorrido há tanto tempo traria sofrimento desnecessário aos familiares da vítima. Os autores do processo alegaram o direito a que certos dados e fatos pessoais não sejam reavivados, a fim de se evitar consequências prejudiciais aos envolvidos (BRASIL, 2013a, p. 17).

O ajuizamento da inicial se deu em outubro de 2004, na 47ª Vara Cível da Comarca do Rio de Janeiro,14 chegando ao STF em setembro de 2014, sob a relatoria do Min. Dias Toffoli. A repercussão geral foi reconhecida em dezembro do mesmo ano por 10 ministros (BRASIL, 2014b, p. 1). Até chegar ao Supremo, as decisões das instâncias anteriores foram favoráveis à TV Globo, incluindo no STJ (BRASIL, 2013a).

No julgamento do caso pelo STJ, o Rel. Min. Luis Felipe Salomão apontou, em seu voto, a existência de um direito ao esquecimento, afirmando sua presença no direito brasileiro:15

3. Assim como os condenados que cumpriram pena e os absolvidos que se envolveram em processo-crime (REsp. N. 1.334/097/RJ), as vítimas de crimes e seus familiares têm direito ao esquecimento – se assim desejarem –, direito esse consistente em não se submeterem a desnecessárias lembranças de fatos passados que lhes causaram, por si, inesquecíveis feridas. Caso contrário, chegar-se-ia à antipática e desumana solução de reconhecer esse direito ao ofensor e retirá-lo dos ofendidos, permitindo que os canais de informação se enriqueçam mediante a indefinida exploração das desgraças privadas pelas quais passaram. (BRASIL, 2013a, p. 1).

Porém, na decisão, o Tribunal entendeu pela impossibilidade de abordar jornalisticamente o crime, de relevância histórica e social, sem que o nome de Aída Curi fosse mencionado, fazendo jus à prevalência da liberdade de expressão e de imprensa frente ao direito ao esquecimento.

No STF, a fim de subsidiar o julgamento do caso, foi realizada audiência pública, no dia 12 de junho de 2017, presidida pelo Rel. Min. Dias Toffoli, contando com participação de 16 expositores, como a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e o Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITS) (BRASIL, 2017).

O problema suscitado no Brasil pelo caso Aída Curi em torno do direito ao esquecimento acabou ultrapassando os limites do caso concreto. O tema tem apresentado crescente complexidade, em parte, potencializada pelos novos recursos de produção e difusão de informação, como a rede mundial de computadores, a internet, e as redes sociais. Para além da colisão de direitos fundamentais, e da questão da alegada necessidade de relativização da privacidade de figuras públicas, como políticos e artistas, questiona-se a própria eficácia do Direito. Como conhecido modernamente, o Direito será capaz de asseguar a proteção da imagem e honra de alguém, quando as agressões podem partir de qualquer lugar do mundo e numa velocidade de difusão e pulverização sem precedentes, através da internet?

Outra questão atual é acerca do real sentido em que deve ser entendido e promovido o esquecimento. Como assegurar que um fato seja esquecido? E em que proporção? O fato deve desaparecer da memória coletiva? Se sim, de quais repositórios e arquivos, e como garantir a efetividade dessa supressão?

Ademais, não devem ser negligenciados os problemas sempre presentes da manipulação de dados e dos perigos da censura para a liberdades individuais e para o próprio Estado Democrático de Direito. Certa manipulação tende a ser inevitável, afinal, as memórias individual e coletiva são construídas, também, de esquecimentos, de escolhas, conscientes ou não, sobre o que será superado, esquecido e transmitido aos demais.

Nas palavras de Rodotà (2013, p. 5):

[...] o tema da verdade vem evidentemente relativizado, e torna-se funcionalizado ao modo mediante o qual se pretende alcançar o objetivo da reconciliação. Quanta verdade é compatível com essa finalidade? Quando e como é possível coordenar, entre si, memória e esquecimento?

Como construir narrativas sociais plurais frente à limitação da veiculação de informações? A competência para a realização da seleção das informações que podem ser lembradas não implicaria na institucionalização de um Ministério da Verdade, semelhante ao narrado na distópica obra de George Orwell, 1984?

Sarmento (2016, p. 193) adverte para o risco social dos magistrados assumirem tal papel, dada a “cultura censória que ainda viceja no Poder Judiciário brasileiro.”

As controvérsias envolvendo o direito ao esquecimento são muitas, abarcando questões de foro íntimo, mas também outras de importância histórica, social e política, de relevância nacional e internacional, ou mesmo questões essenciais de justiça.

3 Do direito ao esquecimento ao direito à desindexação: lacunas de uma evolução

O rápido desenvolvimento tecnológico tem apresentado novas ameaças e violações aos direitos fundamentais, resultando em constante problematização da própria capacidade de o Direito tutelar, de forma eficaz, tais direitos (INFANTE, 2016, p. 92).

Em função do rápido desenvolvimento das novas tecnologias, o direito positivado não consegue acompanhar o novo paradigma da grande rede, da socidade informacional, e vive imerso em conflitos relacionados ao direito à liberdade de expressão, à propriedade intelectual, ao uso da imagem e à utilização indevida de dados pessoais.

O direito à privacidade, segundo Maldonado (2017, p. 80), é: “[...] o direito de estar sozinho, ou de ser deixado sozinho, na ausência de razoável interesse público quanto à prática de atividades pessoais.”16 Porém, resta patente que esse conceito não abarca a grande gama de situações possíveis, diante da complexidade tecnológica atual. Especialmente, o conceito não evidencia as especificidades presentes nas atuais judicializações da pretensão de ser esquecido: o direito à desindexação.

Daí a importância do caso espanhol. O Tribunal Europeu não reconheceu o direito à exclusão do conteúdo indesejado, mas assegurou que ele não fosse lembrado pelo buscador Google. Essa solução tende a ser a decisão padrão para casos de disseminação na internet de conteúdo indesejado, haja vista ser, praticamente, impossível controlar ou inventariar a difusão de postagens na rede mundial de computadores.

É nesse ponto que o direito brasileiro ainda se revela tímido.

O leading case brasileiro sobre direito ao esquecimento, o Caso Aída Curi, assim como seu parâmetro internacional, o caso Lebach, não envolviam o mesmo problema do caso espanhol, pois não tratavam de conteúdo veiculado pela internet, nem de pedidos de desindexação.

A jurisprudência nacional permanece, ainda, muito centrada na tentativa de identificação específica e eliminação de conteúdo da rede.

Em 2012, no julgamento do REsp n. 1.316.921/RJ, tendo como Rel. Min. Nancy Andrighi, a 3ª Turma do STJ entendeu que os provedores de internet somente devem remover conteúdo ilegal e/ou ofensivo, se receberem a indicação precisa e expressa do respectivo endereço virtual (BRASIL, 2012). Na ação ordinária inominada originária contra a Google, a apresentadora de televisão Maria da Graça Xuxa Meneghel buscava a eliminação dos resultados que ligavam seu nome aos termos “pedófila e “pedofilia”, em função da participação no filme “Amor Estranho Amor”, de 1982, em que a autora contracena, em situação erótica, com um ator de 12 anos de idade. A autora alegou que os resultados ofendiam a sua imagem e honra (BRASIL, 2012). Contudo, no julgamento, o STJ deu provimento ao REsp interposto pela Google, por entender que:

6. Os provedores de pesquisa não podem ser obrigados a eliminar do seu sistema os resultados derivados da busca de determinado termo ou expressão, tampouco os resultados que apontem para uma foto ou texto específico, independentemente da indicação do URL da página onde este estiver inserido.

[...]

8. Preenchidos os requisitos indispensáveis à exclusão, da web, de uma determinada página virtual, sob a alegação de veicular conteúdo ilícito ou ofensivo – notadamente a identificação do URL dessa página – a vítima carecerá de interesse de agir contra o provedor de pesquisa, por absoluta falta de utilidade da jurisdição. Se a vítima identificou, via URL, o autor do ato ilícito, não tem motivo para demandar contra aquele que apenas facilita o acesso a esse ato que, até então, se encontra publicamente disponível na rede para divulgação. (BRASIL, 2012, p. 1-2).

No ano seguinte, o STJ sedimentou esse entendimento, no julgamento do REsp n. 1.396.417/MG.17 Nas palavras da Rel. Min. Nancy Andrighi:

44. Embora reconhecido o dever da GOOGLE de providenciar a exclusão de posts no ORKUT a partir de simples notificação de usuários – portanto sem a necessidade de ordem judicial – o pedido de remoção deve ser certo e determinado, isto é, deve vir acompanhado de dados que permitam a identificação exata do conteúdo reputado ilegal e/ou ofensivo.

45. Em outras palavras, o usuário deve informar o respectivo URL (sigla que corresponde à expressão Universal Resource Locator, que em português significa localizador universal de recursos. Trata-se de um endereço virtual, isto é, diretrizes que indicam o caminho até determinado site ou página na Internet) da página na qual se encontra o conteúdo que se considera lesivo. (BRASIL, 2013b, p. 13, grifo nosso).

Esse foi, inclusive, o entendimento que logrou postitivação na Lei n. 12.965, o Marco Civil da Internet, de 2014, que, no art. 19, § ١º, prevê que a ordem judicial determinando a retirada de conteúdo ilegal e/ou ofensivo “deverá conter, sob pena de nulidade, identificação clara e específica do conteúdo apontado como infringente, que permita a localização inequívoca do material.” (BRASIL, 2014a).

Portanto, a jurisprudência e legislação brasileiras acabam por encarregar a vítima das postagens do ônus de inventariar os endereços virtuais que veiculam os dados, atribuindo-lhe, talvez, uma inglória tarefa de Sísifo.

Ademais, o foco na pretensão de exclusão de conteúdo da internet tende a se revelar uma luta vã, com alta probabilidade de fracasso, a desafiar a eficácia do Direito, dada inabarcabilidade da vastidão da comunidade internacional de computadores. O conteúdo indesejado pode ser republicado em qualquer lugar do mundo, além dos limites da jurisdição nacional.

Em julgamento concluído em 2018 (REsp n. 1.660.168/RJ), a 3ª Turma do STJ decidiu, por maioria de 3 votos a 2, aparentemente em divergência à jurisprudência da Corte. No caso, uma promotora de justiça pleiteava a desvinculação, nos resultados dos buscadores Google, Yahoo! e Bing, de seu nome à acusação de fraudar um concurso para o TJ/RJ. A autora alegava ter sido inocentada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em 2007 (BRASIL, 2018). Na decisão:

3. A jurisprudência desta Corte Superior tem entendimento reiterado no sentido de afastar a responsabilidade de buscadores da internet pelos resultados de busca apresentados, reconhecendo a impossibilidade de lhe atribuir a função de censor e impondo ao prejudicado o direcionamento de sua pretensão contra os provedores de conteúdo, responsáveis pela disponibilização do conteúdo indevido na internet. Precedentes.

4. Há, todavia, circunstâncias excepcionalíssimas em que é necessária a intervenção pontual do Poder Judiciário para fazer cessar o vínculo criado, nos bancos de dados dos provedores de busca, entre dados pessoais e resultados da busca, que não guardam relevância para interesse público à informação, seja pelo conteúdo eminentemente privado, seja pelo decurso do tempo.

5. Nessas situações excepcionais, o direito à intimidade e ao esquecimento, bem como a proteção aos dados pessoais deverá preponderar, a fim de permitir que as pessoas envolvidas sigam suas vidas com razoável anonimato, não sendo o fato desabonador corriqueiramente rememorado e perenizado por sistemas automatizados de busca. (BRASIL, 2018, p. 1, grifo nosso).

Na decisão, a Turma do STJ preocupou-se em destacar a natureza “excepcionalíssima”, do novo entendimento. Logo, o confronto da jurisprudência da Corte com o recente julgado, faz crer que o entendimento do Tribunal segue sendo pela necessidade de indicação dos endereços eletrônicos e pela primazia da liberdade de expressão. Caberá ao pretenso prejudicado por uma postagem virtual demonstrar a excepcionalidade de seu caso, a justificar a “intervenção pontual do Poder Judiciário.” (BRASIL, 2018, p. 1).

Percebe-se a importância da desindexação para a atualização e eficácia do “direito ao esquecimento”. A indexação implica na manutenção de determinada informação disponível para consulta em alguma ferramenta de busca na internet e, nesse sentido, um resultado indexado é aquele mostrado ao usuário, a partir do momento da realização de uma busca por uma ou mais palavras-chave.18

Logo, se determinado sítio é publicado, muito provavelmente este poderá ser encontrado por meio de termos inseridos em seu código-fonte. O buscador Google baseia-se no robô de rastreamento da Web, o indexador chamado Googlebot, que descobre as páginas virtuais e suas atualizações para elencá-las nos resultados das buscas pelos usuários (GOOGLE, 2018). Porém, cumpre esclarecer que o direito à desindexação não é manejável somente contra a Google, mas contra qualquer empresa que oferece o serviço virtual de buscas de páginas na internet, como o Bing (da Microsoft), abarcando buscadores que, em outros países, são mais populares que o da Google, tais como Yandex (Rússia), Naver (Coreia do Sul), Baidu (China), entre outros (MANRIQUE, 2018, p. 186-187).

É possível observar a importância de tal automatização por meio do volume de dados gerados por segundo, em toda a internet, em nível mundial. Conforme o relatório Information Economy Report 2017, publicado pela Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD), o Brasil é o país com o quarto maior número de usuários da internet. Segundo o mesmo relatório, o tráfego de dados na rede mundial de computadores previsto para 2019, será 66 vezes maior que em 2015 (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 2017).

Por outro lado, é possível a construção de uma perspectiva crítica no que diz respeito ao direito à desindexação, já que se torna difícil a determinação do que pode ser revomido ou não, especialmente, em relação a agentes públicos, como políticos e integrantes do Ministério Público e do Poder Judiciário. A incerteza desses limites ainda persiste, a despeito da evolução para além da configuração original do direito ao esquecimento. Questiona-se a relevância da manutenção de informações como ter figurado no polo passivo de processos administrativos e judiciais, cíveis e criminais.

Tal assunto não é pacífico na doutrina. Autores, como Joinet (1997) e Rodotà (2013), defendem como direito de todos o acesso aos registros processuais de demandas concluídas, ainda que pareçam restingir essa possibilidade à gravidade dos fatos imputados aos réus, por exemplo, casos de graves violações a direitos humanos. Como afirma Joinet, em texto produzido para a Comissão de Direitos Fumanos do Organização das Naççoes Unidas (ONU), em passagem que se tornou clássica, sempre citada por Rodotà:

Todos têm o inalienável direito de conhecer a verdade sobre eventos passados e sobre as circunstâncias e as razões que, mediante graves violações de direitos humanos, levaram à perpetração de crimes arrebantes. O exercício pleno e efetivo do direito à verdade é essencial para evitar que tais atos venham a se repetir no futuro. (JOINET, 1997, p. 16 apud RODOTÀ, 2013).19

Por outro lado, existe o direito individual à proteção de dados pessoais, positivado no Art. 3º, III, da Lei n. 12.965/14,20 o Marco Civil da Internet, que não ressalva a proteção a depender do conteúdo veiculado ou do cargo ou função dos envolvidos. Assim, a própria legislação brasileira sobre proteção de dados revela-se ainda muito insuficiente para dirimir controvérsias tendentes a acontecer pela colisão entre a proteção legal de informaçoes pessoais, consequentemente à honra e imagem dos envolvidos, e os direitos à liberdade de expressão e de informação.

Questiona-se se um apenado já liberto deve ficar submisso, eternamente, aos acontecimentos que o levaram a ter seus direitos restringidos em alguma medida. Tal fato diz respeito a direitos personalíssimos, já previstos na Carta Maior, como o Art 5º, X, contudo, como lidar com isso em relação às atribuições inerentes a um cargo público? Seria de interesse do cidadão brasileiro conhecer que determinado candidato, por exemplo, à chefia do Poder Executivo respondeu por alguma infração legal, especialmente se for um delito como peculato ou desvio de verbas públicas?

Outra dificuldade que permanece em aberto está na determinação das informações que dispõem de relevância social. Não há parâmetros definidos para tal juízo, com isso, cada caso tende a ser analisado de forma isolada, em prejuízo da uniformidade dos julgamentos e da observância da igualdade e segurança jurídica das partes.

Ademais, dada a conhecida morosidade dos processos judiciais no Brasil, como definir quando, por exemplo, um veredicto, seja absolutório ou condenatório, está pronto para ser “esquecido”?

Segundo o princípio da finalidade, aquele que detém determinada informação sobre outrem, deve mantê-la, apenas, pelo tempo necessário à sua utilização, conforme expõe Vidigal:

Já o princípio da finalidade impõe que o armazenamento dos dados pessoais se dê tão somente enquanto permanecerem úteis em relação ao contexto para o qual foram incialmente coletados. Assim, dados relativos a eventos passados, sem qualquer utilidade atual, podem e devem ser eliminados a pedidos do sujeito envolvido, a não ser que o mantenedor alegue e justifique as razões para a preservação. (VIDIGAL, 2017, p. 152).

Assim, o princípio da finalidade busca ser um critério para limitar a disponibilidade e acesso a dados pessoais na internet.21 Contudo, ainda persiste o problema de como assegurar o término do acesso, após o período delimitado de utilidade da informação. Além disso, a depender da utilidade pretendida pelo manipulador da informação, a finalidade pode ser por tempo indeterminado, levando a uma situação de disponibilidade permanente. O principal problema parece residir, portanto, na seleção das informações que devem ser esquecidas, por não atenderem a nenhuma finalidade legítima, apenas depois disso, emerge a questão instrumental da forma de se asseguar a efetividade do esquecimento.

Para Wagner e Li-Reilly (2014, p. 828), o referido caso espanhol, a despeito de ter avançado na questão instrumental, não esclareceu os critérios para definir quando um conteúdo é inadequado, irrelevante ou excessivo, e como tal, pronto para ser esquecido. Ele apenas definiu a via prática padrão para viabilizar de forma mais eficaz o “esquecimento”.

Assim, a desindexação pode ser observada como importante estratégia prática para a maior segurança do direito fundamental à honra e a imagem, tentando superar as deficiências encontradas na aplicação original do drieito ao esquecimento. Manrique (2018, p. 174) chega mesmo a falar em um específico direito fundamental à desindexação de dados pessoais.

Para Souza e Teffé (2018), a desindexação não pode ser apresentada como solução ideal para a resolução desse tipo colisão entre direitos fundamentais, por entender pela preponderância, prima facie, do direito da sociedade conhecer os fatos de relevância pública; ao invés de melhor informar, privilegia-se o “esconder”.

Portanto, o desenvolvimento do direito ao esquecimento para o direito à desindexação evidencia muito mais uma mudança de estratégia, de viés prátrico e instrumental, do que um amadurecimento das questões de fundo subjacentes às colisões de direitos fundamentais presentes nos casos analisados.

Conclusão

A análise dos casos elencados ao longo da pesquisa permite apreender o desenvolvimento da contemporânea pretensão jurídica de ser “esquecido”, principalmente, de sua judicialização nos tribunais superiores.

Ainda que o reconhecimento jurídico do direito ao esquecimento possa ser reconduzido as experiências pontuais anteriores, pode-se apontar como primeiro grande marco jurisprudencial internacionalmente influente os julgamentos dos casos Lebach I e II, respectivamente em 1973 e 1999, pelo Tribunal Constitucional Alemão.

Esse caso exerceu especial influência sobre o julgamento do caso Aída Curi pelo STJ (REsp n. 1.335.153/RJ), que acabou constituindo-se como o leading case brasileiro a respeito do direito ao esquecimento. Essa influência justifica-se não somente pela importância paradigmática do caso alemão, mas também pela similitude dos fatos subjacentes, uma vez que ambos tratam da pretensão de proibição da veiculação de produções televisivas que dramatizavam crimes de grande repercussão popular. Essa similitude fica ainda maior quando o caso brasileiro é comparado com o Lebach II, dado que em ambos as produções televisivas se deram muitos anos depois dos crimes ocorridos, o que tende enfraquecer a memória coletiva dos acontecimentos. Nessa linha, a analogia com o caso alemão aprece ter pautado a apreciação do REsp.

Contudo, da análise de outro importante marco na judicialização do desejo de ser esquecido, o caso de Mario Costeja González contra a Google, pela desvinculação do nome do advogado espanhol aos resultados de pesquisas virtuais no buscador da empresa, permite aferir como o entendimento jurídico sobre essa controvérsia evoluiu para além do original dirieto ao esquecimento. No caso espanhol, julgado pelo Tribunal Europeu, em 2014, houve o reconhecimento judicial do direito à desindexação, superando a ideia da proibição da veiculação midiática do conteúdo ofensivo ou da sua exclusão do ambiente virtual.

Dado que o caso espanhol ainda não havia sido julgado quando da apreciação judicial do caso Aída Curi pelo STJ, em 2013, mostra-se natural que ele não tenha exercido influência no leading case brasileiro. Ademais, o precedente europeu trazia o diferencial de tratar da veiculação de conteúdo pela internet, dando à controvérsia uma atualidade que os casos brasileiro e alemão não permitiam.

Nesse sentido, a jurisprudência brasileira segue sendo pautada pelo entendimento estabelecido no caso Aída Curi, dando preponderância prima facie à liberdade de imprensa, informação e expressão frente aos direitos à honra, imagem, intimidade e privacidade. Esse entendimento foi adapto à nova tecnologia da internet, na apreciação de outros casos, como os da apresentadora Xuxa Meneghel (REsp n. 1.316.921/RJ) e da empresa Automax Comercial Ltda. (REsp n. 1.396.417/MG). Porém, o entendimento do STJ ainda parece arraigado nas militações de paradigmas tecnológicos antigos, como aqueles presentes nos leading cases alemão e brasileiro, não se adaptando a incomparável capacidade de reprodução e difusão de conteúdo possibilitada pela internet. O STJ firmou o entendimento da necessidade de o pleiteante indicar o endereço eletrônico que hospeda o conteúdo ofensivo, atribuindo ao afendido um ônus tendente ao fracasso e à inefetividade da proteção jurídica aos seus direitos fundamentais, dada a extrema dificuldade em rastrear, em tempo real, os sites pelos quais a informação se espalha.

Recentes julgados do STJ, de 2018, têm reconhecido o direito a desindexação, entretanto, como medida extremamente excepcional, o que permite concluir que não houve uma real mudança da jurisprudência fixada em 2013.

Resta saber se o STF aproveitará o julgamento do caso Aída Curi, ainda pendente, para consolidar a evolução para além do original direito ao esquecimento, rumo ao direito à desindexação, e sem as limitações postas pelo STJ.

Pende, ainda, a necessidade de avançar nessa evolução, principalmente, estabelecendo critérios que permitam a seleção mais objetiva e clara dos conteúdos que devem (ou não) ser esquecidos. Esse avanço faz-se necessário para que o reconhecimento do direito à desindexação não se resuma apenas a um aprimoramento de natureza instrumental, de uma melhor via para esquecimento de conteúdos ofensivos, mas que se baseie em efinições mais claras de quais dados são inadequados, irrelevantes ou excessivos.

A controvérsia do direito ao esquecimento no Brasil é relativamente recente, podendo contar com o amadurecimento da questão na jurisprudência estrangeira para melhor formação de seu juízo decisório. Resta saber se os tribunais superiores, especialmente o STF, aproveitarão a oportunidade para ir além, aprendendo com os avanços alcançados com a noção de direito à desindexação, mas superando suas obscuridades ainda presentes, dando, assim, um contributo à evolução internacional da controvérsia sobre o direito ao esquecimento.

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1 Doutor em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro; Professor Titular na Universidade Federal do Rio de Janeiro; https://orcid.org/0000-0002-0845-8273; jribas@puc-rio.br

2 Mestre em Direito e Inovação pela Universidade Federal de Juiz de Fora; Professor na Universidade Federal de Juiz de Fora; Campus Universitário, Rua José Lourenço Kelmer, s/n, São Pedro, 36036-900, Juiz de Fora, Minas Gerais, Brasil; https://orcid.org/0000-0001-7277-8274; cesarandrade.mario@ufjf.edu.br

3 Graduando em Direito na Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro; Pesquisador no Grupo de Pesquisa CNPq Observatório da Justiça Brasileira (OJB-UFRJ); https://orcid.org/0000-0001-7814-4870; vitorjgv@gmail.com

4 Confira-se, por exemplo, recente condenação pelo PROCON-MG da rede de drogarias Araújo no valor de cerca de R$ 7 milhões de reais, a partir de investigaçao movida pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), sob a alegação de que a empresa condicionava descontos aos clientes ao fornecimento do número de CPF, sem aviso da abertura de cadastro. Ainda que a condenação tenha se fundamentado em prática abusiva ao consumidor, o MPMG destacou como a empresa também não fornecia nenhuma garantia da proteção dos dados, nem esclarecia como eles seriam utilizados (DROGARIA..., 2018). Percebe-se como a vinculação do uso de medicamentos ao CPF dos consumidores constitui informação que pode ser do interesse, por exemplo, de empresas de planos de saúde, constituindo, portanto, um repertório que pode ser comercializado para além do mero oferecimento de publicidade e em desfavor do consumidor.

5 Em razão dos limites possíveis ao presente artigo, a pesquisa centrou-se na análise desses dois casos estrangeiros, por considerá-los os mais influentes para o desenvolvimento da jurisprudência brasileira sobre o direito ao esquecimento (e mesmo para os países de tradição jurídica romano-germânica). Para a recuperação e análise, por exemplo, da jurisprudência norte-americana no tema, confira-se Sarmento (٢٠١٦).

6 Conforme expresso na decisão do Tribunal, em trecho citado por Schwabe (2005, p. 488): “Um noticiário posterior será, de qualquer forma, inadmissível se ele tiver o condão, em face da informação atual, de provocar um prejuízo considerável novo ou adicional à pessoa do criminoso, especialmente se ameaçar sua reintegração à sociedade (resocialização).”

7 Segundo Alcón (2016, p. 247), tecnicamente, os buscadores (ou motores de busca) podem ser considerados provedores de conteúdo, ainda que não produzam, propriamente, o conteúdo, mas informam o conteúdo publicado por terceiros, indexando-o de forma automática, e, com isso, tornando-o mais facilmente acessível aos usuários, segundo uma ordem de preferência determinada por algoritmos próprios.

8 Indexar é agregar uma página virtual da rede mundial de computadores a uma lista de resultados de um buscador, independentemente de seu formato (MANRIQUE, 2018, p. 177).

9 A Diretiva 95/46/CE foi revogada pelo Regulamento (UE) 2016/679, Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados, de 27 de abril de 2016, atualmente em vigor (EUROPA, 2016).

10 No Regulamento (UE) 2016/679, atualmente em vigor, o artigo correspondente é o Artigo 15º: “Direito de acesso do titular dos dados. 1. O titular dos dados tem o direito de obter do responsável pelo tratamento a confirmação de que os dados pessoais que lhe digam respeito são ou não objeto de tratamento e, se for esse o caso, o direito de aceder aos seus dados pessoais e às seguintes informações: [...] e) A existência do direito de solicitar ao responsável pelo tratamento a retificação, o apagamento ou a limitação do tratamento dos dados pessoais no que diz respeito ao titular dos dados, ou do direito de se opor a esse tratamento;” (UNIÃO ERUROPEIA, 2016).

11 Para Infante (2016), o próprio direito ao esquecimento não seria, propriamente, uma inovação, tratando-se, mais acertadamente, de fórmula mais clara e didática de legitimar restrições à liberdade de expressão e informação em favor de outros direitos fundamentais, como honra e privacidade.

12 Para conhecimento de positivações e julgamentos sobre exclusão de dados da internet anteriores à decisão do caso espanhol, consulte-se Manrique (2018).

13 O formulário permite ao usuário escolher, inclusive, a base da qual demanda a retirada do conteúdo, dada a variedade de produtos e plataforma gerenciadas pela Google, como Blogger/Blogspot, Google+, Pesquisa na web do Google, Google Drive e Google Docs, Google Play: Música, Google Play: aplicativos, Pesquisa de imagens, Google Photos, YouTube etc. O Formulário pode ser acesso no link: https://support.google.com/legal/troubleshooter/1114905?hl=pt-BR (GOOGLE, 2018a).

14 Sob a égide do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ/RJ), o Apelação interposta contra a decisão judicial, por parte do irmão de Aida Curi, não foi conhecido. A Décima Quinta Camara Civel é integrada pelos Desembargadores Ricardo Rodrigues Cardoso, Helena Belc Klausner e Joaquim Alves de Brito. Acrescenta-se que o placar foi 2 contra 1, sendo vencida a Desembargadora revisora, a qual provia parcialmente o recurso. Segundo Cardoso, relator do caso: “Os fatos expostos no programa eram do conhecimento público e, no passado, foram amplamente divulgados pela imprensa. A matéria foi e é discutida e noticiada ao longo dos últimos cinquenta anos, inclusive, nos meios acadêmicos. Uma entrada no site de pesquisa Google registra mais de 470.000 anotações com o nome Aida Curi, o que torna amplamente público toda a dinâmica do evento retratado.” (RIO DE JANEIRO, 2010, p. 4).

15 Para uma crítica do status do direito ao esquecimento na ordem jurídica brasileira, confira-se o parecer produzido sobre o tema por Sarmento (2016), a pedido da empresa Globo Comunicação e Participações S.A.

16 Para uma análise crítica da ligação do direito ao esquecimento e à desindexação à privacidade, vide Manrique (2018).

17 Na ação cominatória cumulado com danos materiais e morais, a empresa autora Automax Comercial Ltda. alegou que página criada na rede social Orkut, mantida pela Google, havia veiculado conteúdo ofensa a sua imagem e honra objetiva, além de veicular sua logomarca, sem autorização (BRASIL, 2013b).

18 Para uma análise técnica da indexação, confira-se Gil-Leiva (2007).

19 No original: “Every people has the inalienable right to know the truth about past events and about the circumstances and reasons which led, through the consistent pattern of gross violations of human rights, to the perpetration of aberrant crimes. Full and effective exercise of the right to the truth is essential to avoid any recurrence of such acts in the future.” (JOINET, 1997, p. 16).

20 Art. 3º. A disciplina do uso da internet no Brasil tem os seguintes princípios: [...] III - proteção dos dados pessoais, na forma da lei; [...] (BRASIL, 2014a).

21 O princípio da finalidade encontra expressa previsão na lei espanhola de proteção de dados de caráter pessoal, no Art. 4º, Ley 15/1999: “2. Los datos de carácter personal objeto de tratamiento no podrán usarse para finalidades incompatibles con aquellas para las que los datos hubieran sido recogidos. No se considerará incompatible el tratamiento posterior de éstos con fines históricos, estadísticos o científicos.” (ESPANHA, 1999).