ABORDAGEM INTEGRADA NO TRATAMENTO DE UMA CRIANÇA COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA E COMORBIDADES: UM ESTUDO DE CASO
Resumo
O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é definido como um transtorno do neurodesenvolvimento caracterizado por dificuldades persistentes na interação social, na comunicação e pela presença de padrões de comportamentos restritos e repetitivos. Conforme descrito no DSM-5-TR, a origem do TEA é multifatorial, envolvendo interações complexas entre fatores genéticos e ambientais. Entre os critérios diagnósticos estão: déficits na reciprocidade socioemocional, limitações no uso de comunicação verbal e não verbal, dificuldades para se adaptar a contextos sociais variados, movimentos motores ou fala estereotipados e a presença de interesses fixos e restritos. A hiper ou hiporreatividade a estímulos sensoriais é uma característica frequentemente observada. Estes sintomas devem estar presentes precocemente no período de desenvolvimento, porém, nem sempre são manifestados ou, ainda, com o passar do tempo, eles podem ser mascarados por estratégias aprendidas durante a vida. Estes sintomas também devem causar prejuízos clínicos significativos no funcionamento social, profissional ou em outras áreas da vida do indivíduo. As perturbações mencionadas anteriormente não podem ser mais bem explicadas por deficiência intelectual ou por atraso global no desenvolvimento. O diagnóstico do TEA é classificado em três níveis de gravidade, conforme a necessidade de suporte. Nível 1: Leve, necessita de suporte pontual; os pacientes apresentam dificuldades em interações sociais e em seguir normas e comportamentos, são inflexíveis e o diagnóstico pode ser mais desafiador devido à presença de masking (mascaramento ou camuflagem). Nível 2: Moderado, necessita de suporte frequente; os pacientes apresentam comportamento social atípico, rigidez cognitiva, dificuldade de lidar com mudanças e hiperfoco; podem apresentar déficits na conversação, de interação e linguagem limitada. Nível 3: Severo, necessita de suporte extensivo; os pacientes apresentam dificuldades graves no cotidiano e déficit severo na comunicação, resposta mínima a interações com outras pessoas e iniciativa de conversar muito limitada, adotando comportamentos repetitivos. Atualmente, o tratamento para o TEA é realizado através de medidas educativas, acompanhamento psicoterápico, terapia ocupacional, fonoaudiologia, fisioterapia e atividades físicas, combinadas com o uso de medicamentos. Assim, o objetivo do presente estudo foi discutir o caso de uma criança diagnosticada com TEA, enfatizando o tratamento medicamentoso instituido e a importância de intervenções psicossociais para o caso. Paciente do sexo feminino, 4 anos de idade, diagnosticada com TEA associado com atraso global do desenvolvimento (AGD), epilepsia e síndrome de Lennox-Gastaut. A família da paciente buscou auxílio especializado na Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE) da sua região, devido às dificuldades encontradas no desenvolvimento social e comportamental da criança, relatando crises epilépticas frequentes e limitações na comunicação. As comorbidades identificadas estavam impactando diretamente nas suas habilidades cognitivas, sociais e adaptativas. A abordagem medicamentosa se fez através de Vigabatrina 500 mg (1 comprimido duas vezes ao dia), Topiramato 25 mg (1 comprimido duas vezes ao dia), Valproato de sódio 12,5 mg (1 comprimido duas vezes ao dia) e Risperidona 0,5 mg (1 comprimido uma vez ao dia). A Vigabatrina é um anticonvulsivante que atua aumentando os níveis centrais de GABA (ácido gama-aminobutírico), um neurotransmissor inibitório que ajuda a estabilizar a atividade elétrica no cérebro, auxiliando na redução dos episódios epilépticos. O Topiramato é um anticonvulsivante que age modulando os canais de sódio e cálcio, além de potencializar a ação do GABA e de bloquear a ação do glutamato, o que reduz a excitabilidade neuronal. Além de tratar epilepsia, o topiramato também pode é usado off-label para reduzir sintomas comportamentais no TEA, como irritabilidade, agressividade e comportamentos repetitivos. Ele também pode, em alguns casos, auxiliar na regulação do humor e impulsividade. O Valproato de sódio é um anticonvulsivante que aumenta os níveis de GABA no cérebro, além de atuar por outros mecanismos. Ele é eficaz no controle de crises epilépticas e na estabilização do humor. Também pode ajudar a reduzir os comportamentos explosivos ou desregulados. Por fim, a Risperidona é um antipsicótico atípico que atua bloqueando receptores de dopamina (D2) e serotonina (5-HT2), modulando o funcionamento destes dois sistemas de neurotransmissão. É um dos poucos medicamentos aprovados em bula no Brasil para uso em crianças com TEA, sendo indicado para reduzir os sintomas de irritabilidade grave, incluindo agressividade, acessos de raiva e autoagressão. Além do tratamento medicamentoso, pode ser implementado um plano de intervenções psicossociais focado na promoção do desenvolvimento global da paciente. Técnicas de análise do comportamento aplicada (ABA) podem ser utilizadas para estimular habilidades sociais, cognitivas e de comunicação, enquanto estratégias de regulação emocional ajudam a minimizar comportamentos desafiadores e a promover maior autonomia. A integração sensorial também deve ser explorada como forma de melhorar a adaptação da criança a estímulos ambientais variados, reduzindo reações adversas a esses estímulos. O suporte familiar é um componente central das intervenções. Por meio de psicoeducação, os familiares recebem orientações para compreender melhor o diagnóstico da doença, além de estratégias para lidar com os desafios diários relacionados ao TEA e às comorbidades. Esse apoio emocional poderia contribuir significativamente para fortalecer o vínculo entre pais e a filha, favorecendo o engajamento no processo terapêutico. A articulação com uma equipe multidisciplinar composta por profissionais da saúde, educação e assistência social também é essencial para a personalização das estratégias de intervenção, garantindo que elas sejam adaptadas às demandas específicas da paciente. Embora o tratamento farmacológico não trate de forma eficiente os déficits centrais do TEA, como as dificuldades de comunicação e interação social, ele desempenha um papel indispensável no manejo dos sintomas que poderiam limitar o progresso nas intervenções educacionais e comportamentais. O acompanhamento contínuo do médico e do farmacêutico clínico também são fundamentais para prevenir efeitos adversos dos medicamentos utilizados, assegurando a eficácia do tratamento combinado. Já as intervenções psicossociais, integradas ao trabalho com a família e à colaboração com a escola, são cruciais para promover o desenvolvimento da criança, aumentando sua capacidade de interação social e favorecendo sua inclusão em diferentes contextos. Como considerações finais, este estudo de caso reforça a importância de uma abordagem terapêutica integrada no manejo do TEA e de suas comorbidades. A combinação de intervenções farmacológicas e psicossociais ajustadas às necessidades específicas da paciente pode ser eficaz não apenas no controle dos sintomas, mas também na promoção do seu potencial de desenvolvimento e na melhoria de sua qualidade de vida. O trabalho conjunto entre família e equipe de profissionais também pode contribuir para avanços significativos no desenvolvimento social, emocional e cognitivo da criança, destacando a relevância de estratégias personalizadas para o cuidado de crianças com TEA.
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