ALUCINAÇÃO: O DESEJO NA ESQUIZOFRENIA

Autores

  • Eduarda Engroff Universidade do Oeste de Santa Catarina - UNOESC, São Miguel do Oeste
  • Matias Trevisol Universidade do Oeste de Santa Catarina - UNOESC

Resumo

INTRODUÇÃO: O presente estudo tem por objetivo geral compreender, a partir da teoria psicanalítica o que existe atrás das falas desconexas de um paciente diagnosticado com esquizofrenia paranoide. Para tanto será utilizado um caso clínico para exemplificar e refletir sobre esse processo, sendo atendido pela estagiária do curso de Psicologia da Universidade do Oeste de Santa Catarina (UNOESC), ao realizar o componente curricular de Estágio Curricular Supervisionado II, ocorrendo os atendimentos na Associação Hospitalar de Tunápolis, Unidade de Saúde Mental.
DESENVOLVIMENTO: A esquizofrenia é caracterizada pela perda de contato com a realidade (psicose) gerando conflitos e dificuldades para o indivíduo (DSM 5, 2014). Segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, 5º edição (DSM 5), para receber o diagnóstico de esquizofrenia, o indivíduo deve apresentar dois ou mais dos seguintes sintomas: delírios, alucinações, desorganização do pensamento (discurso), comportamento grosseiramente desorganizado ou catatônico e sintomas negativos. Delírios são crenças fixas, resistente a mudança, surgem a partir de um estímulo externo, contudo existe a distorção do estímulo e da realidade relacionada ao acontecimento, gerando o delírio. Já, as alucinações "são experiências semelhantes à percepção que ocorrem sem um estímulo externo. São vívidas
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e claras, com toda a força e o impacto das percepções normais, não estando sob controle voluntário." (DSM 5, p.87, 2014). Ou seja, as alucinações não necessitam de um estímulo externo, são fenômenos internos sendo vividos como parte da realidade do indivíduo. A desorganização do pensamento, é caracterizado por um discurso que pode mudar de tema repentinamente ou as respostas fornecidas podem não ter relação com a pergunta realizada. O comportamento grosseiramente desorganizado pode variar de um comportamento silencioso e imóvel até agitado e agressivo sem motivo aparente. Já a catatonia é "uma redução acentuada na reatividade ao ambiente". (DSM 5, p. 88, 2014). E os sintomas negativos referem-se principalmente a expressão emocional diminuída e avolia, sendo a redução de expressões de emoção no rosto e de motivação em participar de atividade, afetando a sociabilidade do indivíduo (DSM 5, 2014). Ressaltando que os sintomas devem estar presentes pelo período de um mês.
Além disso, também é caracterizada por alterações neurocognitivas, principalmente a atenção, memória episódica, funções executivas e cognição social, possuindo a dificuldade de identificar e discernir as emoções expressas pelas pessoas, associando emoções em faces neutras. E isso, consequentemente afeta a relação do indivíduo com a realidade, levando o indivíduo a perder o contato com o meio externo e tendo um enfoque para o meio interno, sendo comum "que esses pacientes vejam ou ouçam coisas que não existem, criem formas diferentes de falar e acreditem que os outros os estejam perseguindo ou vigiando" (DE OLIVEIRA, ALVES, SAFFI, p.133, 2015).
O caso clínico abordado refere-se a um homem de 28 anos com o diagnóstico de esquizofrenia paranoide desde os 18 anos, associado com o uso de substâncias químicas. Ele descreve as alucinações e delírios como parte da sua história de vida e como acontecimentos reais, tendo dificuldades de discernir a realidade de suas alucinações, sendo uma característica da esquizofrenia. Devido ao sigilo estabelecido entre profissional e paciente, o paciente será chamado de Aaron.
Foi possível observar que Aaron apresentava as características para o diagnóstico de esquizofrenia, e como esses sintomas se sobrepunham entre
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eles demonstrando a relação do paciente com a realidade e sua própria história de vida. Inicialmente, será descrita algumas de suas alucinações, como se entrelaçam com os outros sintomas e o que expressam sobre a sua vida.
Entre os principais elementos de suas alucinações e delírios estão as possessões de arcanjos, contudo, essas possessões são uma forma de direcionar a responsabilidade sobre alguns comportamentos como não sendo seus, ou seja, se relaciona com o comportamento grosseiramente desorganizado uma vez que durante esses momentos ocorrem comportamentos agressivos em relação a si aos outros. Os arcanjos que descreveu são Rafael, associado a cura; Uriel, relacionado ao conhecimento e profecias. Esses arcanjos estão relacionados com a forma como Aaron se relaciona com a própria doença, uma forma de por fim a esse sofrimento advindo da doença, pois descreve que os primeiros sintomas foram advindos de uma macumba (profecia) e que teria fim após 10 anos. Outro arcanjo mencionado em alguns momentos foi Metatron, considerado o anjo mais poderoso, o anjo supremo da vida e da morte. Segundo Aaron, esse não foi apenas um anjo que assumiu o controle sobre o seu corpo realizando coisas ruins e agressivas, mas um anjo que morreu de overdose. Levando o grau de poder de Metatron, é importante pensar sobre o que significa este anjo morrer. Sendo o anjo da vida e da morte, pode significar o desejo que Aaron sente de ter um controle da sua vida, algo que foi tirado dele devido a doença, mas também pensar que essa morte pode ser uma experiência de quase morte que ele vivenciou, sendo que era dependente químico podendo ter acontecido uma overdose em algum momento de sua vida (BUONFIGLIO, 1993).
Outro aspecto percebido no paciente é o desejo de constituir uma família, que constantemente parecer tirado dele, sendo algo presente em suas alucinações também. Aaron contou sobre a história de Romeu e Julieta, sendo na história, Aaron a personificação de Romeu e eles estavam prestes para se casar, mas que ele acabou morrendo antes do casamento. Além disso, o paralelo entre a sua vida e a de Elvis Presley e Marilyn Monroe, ambos tiveram depressão e consequentemente o uso abusivo de medicamentos,
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sendo que o motivo da morte de ambos foi por overdose de medicamentos. Aaron se declarava como a reencarnação de Elvis Presley e que estaria esperando a pessoa que seria a reencarnação de Marilyn Monroe. Contudo, se levarmos em consideração a história deste casal, sendo um relacionamento de uma noite, podemos perceber que, sendo parte das características da esquizofrenia dificuldades sociais, os relacionamentos que Aaron possui também são complicados e difícies de se manter um vínculo a longo prazo para que possa constituir uma família.
A partir disso, podemos perceber outra característica presente no paciente, a desorganização do pensamento que é expressa pelo discurso, sendo comum nos momentos em que relatava as alucinações, mudanças repentinas de tópicos. Por outro lado, é possível perceber esse discurso desorganizado devido a desorganização de sua vida, mas, apesar disso, ele está contando a sua história através desses aspectos considerados desconexos.
Em um indivíduo diagnosticado com esquizofrenia, que consiste em uma psicose, existe a predominância do id e consequentemente o afastamento da realidade. Dessa forma, as alucinações são a manifestação e realização do desejo, que sendo de uma forma tão intensa que são reavivadas até serem parte da realidade do indivíduo (FREUD, 1923) (FORTES; CUNHA, 2012). Assim, existe está fragmentação da psique em que o id se sobressai em relação ao ego afetando a sua percepção com a realidade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS: O indivíduo diagnosticado com esquizofrenia possui uma percepção da realidade alterada devido predominância do id, contudo, suas alucinações, delírios e outros comportamentos considerados estranhos ou inadequados, não podem ser ignorados ou desmerecidos, pois essa é a forma do indivíduo de contar aspectos da sua vida e história, que necessita um pouco mais de atenção para serem percebidas e interpretadas, e consequentemente, que ele possa obter um convivo social novamente, levando em consideração que as alucinações descritas pelo individuo devem ser acolhidas e não menosprezadas, pois essa é a realidade dele.
REFERÊNCIAS:
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AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais : DSM-5. 5. Rio de Janeiro ArtMed 2014.
BUONFIGLIO, Monica. Anjos cabalisticos. Editora Alfabeto, 2018, p.176.
DE OLIVEIRA, Graça Maria Ramos; ALVES, Tânia Maria; SAFFI, Fabiana. Esquizofrenia. In: SERAFIM, Antonio de Pádua; SAFFI, Fabiana (org). Neuropsicologia Forense. Porto Aalegre, Editora Artmed. 2015, cap.13, p.133-144.
FORTES, Isabel; CUNHA, Eduardo Leal. Alucinação e delírio na obra de Freud: produção de desejo. Cadernos de psicanálise (Rio de Janeiro), v. 34, n. 26, p. 145-158, 2012. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/cadpsi/v34n26/a10.pdf . Acesso em: 20/11/2023.
FREUD, Sigmund. O Ego e o Id e outros trabalhos: (1923 - 1925). Rio de Janeiro: Imago, 2006. 355 p. ISBN 85.312.0976.5.

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Biografia do Autor

Eduarda Engroff, Universidade do Oeste de Santa Catarina - UNOESC, São Miguel do Oeste

Acadêmica do curso de Psicologia da Universidade do Oeste de Santa Catarina - UNOESC, campus São Miguel do Oeste.

 

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Publicado

2023-12-18

Como Citar

Engroff, E., & Trevisol, M. (2023). ALUCINAÇÃO: O DESEJO NA ESQUIZOFRENIA. Anuário Pesquisa E Extensão Unoesc São Miguel Do Oeste, 8, e34419. Recuperado de https://periodicos.unoesc.edu.br/apeusmo/article/view/34419

Edição

Seção

Área das Ciências da Vida e Saúde – Resumos expandidos